setembro 30, 2012

da instalação para a curta de animação

Snail Trail é uma curta de animação criada a partir de uma técnica de animação inovadora. Depois de criados os elementos gráficos no 3ds Max, as imagens foram projectadas por meio de laser numa superfície fosforescente, e aí foi capturado o movimento, imagem a imagem, com o Dragon Stop Motion. No final as imagens foram editadas no After Effects, tendo sofrido vários efeitos de coloração e duplicação.


A curta surge a partir de uma instalação de escultura a laser homónima criada por Philipp Artus na KHM (Academia de Media Arts de Colónia, Alemanha). Na música o trabalho é da portuguesa Madalena Graça, agora radicada na Alemanha. As imagens foram projectadas sobre uma superfície a 360º que obrigava a audiência a circular em redor da peça para poder seguir o caracol. Devido ao material fosforescente o movimento à superfície deixava rastos que desapareciam lentamente. A instalação tinha uma duração de cerca de dois minutos, enquanto o filme ficou com três minutos.


Como diz Artus, o filme pretendia apenas ser um registo da instalação, mas acabou por se envolver de tal modo com as imagens que o resultado acabou por ser um filme completamente autónomo em termos estilísticos. Podemos dizer que em termos de animação temos aqui algo único, devido ao processo de construção, mas também devido ao trabalho gráfico realizado antes e depois, e toda a sua envolvência em luz, e arrastos de movimento. Em termos de ideia, Artus diz-nos que o trabalho reflecte sobre a evolução da natureza através de largos milénios,
The basic idea of the work is inspired by processes of exponential acceleration, which can be observed at different levels. Thus, the evolution of life proceeds at an extremely slow pace for more than 3 billion years, until it suddenly seems to explode in the Cambrian period. The tools of human beings progress relatively little during the Stone Age until there comes a rapid cultural development during the Holocene. Nowadays, a similar acceleration process is generated by the exchange of information through the internet. From this perspective, the exponential spiral on a snail shell may almost appear like a miraculous wink of nature.
Snail Trail (2012) Philipp Artus


[Enviado por Iuri Monteiro]

setembro 29, 2012

alguns jogos de Edmund McMillen

O meu artigo desta semana na Eurogamer, Criadores e Críticos - Das obras e da discussão à volta destas, fala sobre as teorizações que se fazem à volta das obras de arte e que muitas vezes esquecem as obras e os seus aspectos intrínsecos, focando-se apenas e só nos potenciais significados e contextos.


Falo concretamente da discussão em redor de dois autores importantes do mundo indie dos videojogos, Jonathan Blow e Edmund McMillen. O primeiro muito bem visto pela crítica intelectual, o segundo nem por isso.
Aproveito para deixar aqui links para alguns jogos de Edmund Mcmillen que estão disponíveis grátis online e que podem jogar directamente no browser.

Triachnid (2006)
Coil (2008)
Aether (2008)
Meat Boy (2008)
The C Word (2008)
Time Fcuk (2009)

Aether (2008)

"Looper" com trailer a óleo

Looper (2012) tem talvez o trailer mais belo alguma vez feito na história do cinema. São 700 quadros pintados à mão por Zach Johnson e animados por Noah Fisher. Em termos estéticos fez-me recordar a fantástica curta, Khoda (2008) de Reza Dolatabadi.


Looper é um filme de Rian Johnson com Bruce Willis, Joseph Gordon-Levitt e Emily Blunt, com uma premissa interessante,
In 2072, when the mob wants to get rid of someone, the target is sent 30 years into the past, where a hired gun awaits. Someone like Joe, who one day learns the mob wants to 'close the loop' by transporting back Joe's future self.

Sobre o filme em si nada sei, mas a julgar pelo 8.5 do IMDB e pelos 87 do Metacritic poderemos ter algo interessante. Mas mesmo que não seja, o trailer já ficará na história dos trailers de cinema. O trailer regular pode ser visto aqui.




[via Brainstorm9]

setembro 28, 2012

Jonah Lehrer forjou citações

É com enorme tristeza que faço este artigo neste blog. Mas depois de ter lido os seus três livros, e os ter analisado para este blog, seria imperdoável se não o fizesse - Imagine: How Creativity Works (2012), How We Decide (2009), Proust Was a Neuroscientist (2007). Quando soube inicialmente desta notícia nem quis acreditar, resolvi esperar para tentar perceber em detalhe o alcance daquilo que se dizia. Mas chegou a altura de o escrever aqui, divulgar que o autor Jonah Lehrer procedeu à fabricação de citações e mentiu sobre as suas fontes.


Jonah Lehrer com apenas 30 anos tinha acabado de conseguir ser contratado pela New Yorker, uma das revistas mais selectas do mundo. E se o conseguiu foi porque nos seus três livros e nos muitos textos que publicou na Wired, no Wall Street Journal e em vários outros jornais e revistas de renome, demonstrou uma enorme inteligência, perspicácia, e acuidade para interpretar a realidade à luz dos novos preceitos da neurociência. Aliás basta ver que o seu livro Imagine chegou ao primeiro lugar do NYT na primeira semana.

Imagine: How Creativity Works (2012), How We Decide (2009), Proust Was a Neuroscientist (2007)

Deste modo o seu contrato com a New Yorker não durou sequer um mês, e pode-se ver na sua coluna online, que teve apenas tempo para realizar cinco entradas. Em todas essas é agora possível ler pedidos de desculpa da New Yorker a propósito de autoplágio. Ou seja, partes daqueles textos foram publicados previamente em outros textos. Mas não foi por isto que a New Yorker o despediu. Quando isto foi descoberto, o editor ainda desculpou o autor, esperando que não voltasse a acontecer. O problema acontece a seguir quando se descobre que Lehrer forjou citações de Bod Dylan para o livro Imagine. Ou seja, no livro Imagine aparecem frases, que supostamente terão sido ditas por Dylan, mas que nunca o foram, e é aqui que a carreira de Lehrer começa a sua queda vertiginosa.

Nota de aviso da Wired

A New Yorker despede Lehrer, e começa uma enorme investigação a tudo o que Lehrer escreveu e publicou. Desse modo no final de Agosto, e depois de se descobrirem mais problemas nos textos na Wired, é a vez da Wired o despedir. Entretanto a editora Houghton Mifflin Harcourt dos livros de Lehrer retira do mercado Imagine e começa também uma investigação que ainda decorre aos três livros. Depois foi a vez do Wall Street Journal retirar também dois artigos da sua página online, e corrigir dois outros.

Nota de aviso da New Yorker

As notícias correm online em vários sítios de referência. Nota-se contudo alguma contenção por parte de quem escreve, porque acredito que muitos devem ter ficado tão chocados como eu fiquei, tornando-se muito difícil de digerir tudo isto. Apesar de tudo isso e procurando não me deixar levar por esse viés, concordo totalmente com o professor de jornalismo, Charles Seife, contratado pela Wired para analisar os seus posts, que acaba o seu parecer dizendo o seguinte,
Lehrer's transgressions are inexcusable—but I can't help but think that the industry he (and I) work for share a some of the blame for his failure. I'm 10 years older than Lehrer, and unlike him, my contemporaries and I had all of our work scrutinized by layers upon layers of editors, top editors, copy editors, fact checkers and even (heaven help us!) subeditors before a single word got published. When we screwed up, there was likely someone to catch it and save us (public) embarrassment. And if someone violated journalistic ethics, it was more likely to be caught early in his career—allowing him the chance either to reform and recover or to slink off to another career without being humiliated on the national stage. No such luck for Lehrer; he rose to the very top in a flash, and despite having his work published by major media companies, he was    operating, most of the time, without a safety net. Nobody noticed that something was amiss until it was too late to save him.
Fica aqui explícito, que não é apenas uma questão de verificação, para mim é uma questão de vida em alta-velocidade. Em todos os trabalhos criativos, todos temos que cada vez dar mais, e mais, e mais, em cada vez menos, e menos, e menos tempo. E isso complica tudo. Eu próprio apesar de ser muito arrumado em termos de organização de ficheiros, textos e imagens, já dei por mim a tentar perceber se uma determinada frase que estava num txt/doc era minha ou retirada de uma qualquer página da net. Tentar perceber se o tipo de escrita era minha, e claro fazer a pesquisa no Google, que nem sempre ajuda, caso tenhamos entretanto já mexido na frase. Face ao Lehrer tenho a vida facilitada, porque o facto de escrever em Português e usar maioritariamente fontes em inglês, ajuda a distinguir facilmente os textos que vamos colando nas folhas de texto.

Claro que nada disto desculpa a sua atitude. Chegamos a um ponto em que percebemos que isto era o seu modo de funcionar, o constante remix de tudo o que digeria. E na verdade Lehrer era excelente nisso, era brilhante mesmo. E por isso mesmo alguns dizem, que apesar de ter caído tão fundo, ainda voltaremos a ler a sua escrita. E a realidade, é que a última notícia sua que temos, é que este está neste momento a escrever sobre todo este assunto.

setembro 27, 2012

audiência e marketing de Psycho em 1960

Hitchcock foi um génio no campo da criação e manipulação de expectativas. O que eu não sabia apesar de existirem evidências, nomeadamente toda a imagem de culto que este ajudou a construir sobre si próprio, é que a sua capacidade não se tinha limitado à linguagem cinematográfica, mas que tinha transbordado para os domínios do marketing.


A Academia de Cinema americana colocou este ano na rede um filme raro que foi criado pela Paramount para explicar aos distribuidores das salas de cinema como deveriam proceder durante a exibição de Psycho. No filme explica-se em detalhe a regra de ouro - ninguém poderá entrar na sala depois da hora - e são dados detalhes sobre o modo como devem ser anunciadas as horas, como devem entrar e sair as pessoas das salas, os cartazes que devem ser afixados e o que devem dizer. E no final o mais importante para as salas, o retorno garantido que tudo isto trará. 



Na verdade Psycho era um filme de pequeno orçamento, em 1960 nada o distinguia particularmente de muitos outros filmes, aparte a brilhante cena do chuveiro e claro o twist psicológico. Não há ali nada que pudesse fazer deste filme à partida, um grande blockbuster, ainda para mais tratando-se de um thriller de choque que elimina logo uma enorme franja de público mais novo. 

"If you can't keep a secret, please stay away from people after you see Psycho."
"After you see Psycho Don't give away the ending. It's the only one we have."
Este documento abre-nos novas interpretações sobre a recepção de Psycho em 1960. E questiona-nos sobre o modo como hoje os filmes nos chegam. Se bem que hoje temos outros instrumentos, teasers, trailers, páginas na internet, jogos, comics, entrevistas da equipa, posters, e merchandising. É verdade que o cinema nunca deixou a gestão de expectativas ao acaso, e a indústria em que se transformou os filmes de trailers é disso um bom exemplo.

setembro 26, 2012

Illustração e método de Pascal Campion

Pascal Campion é um ilustrador francês a viver e trabalhar nos EUA. Já trabalhou para Dreamworks, Disney TV, Cartoon Network, Nickelodeon, PBS entre outros. A beleza do seu trabalho está na constância do uso de cores alegres, quentes e brilhantes, no domínio da luz e no traço suave e fino.


Para se compreender o trabalho de Campion a Onyx realizou um pequeno documental sobre o artista que se pode ver abaixo. O documentário é muito inspirador porque Campion emana amor pelo que faz, e claramente seduz as pessoas a enveredar pela área. Ao longo dos sete minutos fala-nos das usas inspirações, do desenho como um super-poder, e dos seus efeitos de dopping.

Campion inicia os esboços no Flash e não no Illustrator

Da visita ao seu site fiquei deveras impressionado com o número descomunal de trabalhos ali apresentados, são para cima de 500, todos de grande qualidade. Entretanto visitando o seu blog percebo que faz disto uma tradição, o Sketch of the Day, e assim ao longo dos últimos 6 anos produziu e publicou no blog mais de 1000 esboços. Isto não é mera paixão, é uma necessidade intrínseca de comunicar, de expressar ideias, e a sua forma natural de o fazer acabou por se transformar em esboço.





Como Campion nos diz,
Art and talent is not a gift from god. I don't subscribe at all at all to this point of view. The art of drawing is purely mechanical. The more you practice, the better you get. There's no secret involved, no formulas, no crutch. If you want to become an artist...DRAW! Don't look for formulas and shortcuts.

Inspirational Artists: Pascal Campion (2011) criado por Onyx Cinema

[via The Concept Blog]

setembro 25, 2012

Perigos do Facebook: dados, perfis e controlo

O estudante de direito austríaco, Max Schrems, apresentou 22 queixas contra o Facebook. Após muita insistência, Max Schrems conseguiu um CD com toda a informação colectada durante os três anos em que fez parte da rede, quando impresso, o conteúdo do CD formava uma pilha de 1200 páginas.


Todos os dados - mensagens, estados, comentários, toda a informação submetida, todas as alterações realizadas, assim como as datas dessas alterações, etc. - eram classificados em 57 categorias que possibilitam facilmente o cruzamento de dados, e assim descobrir qualquer informação que se pretenda sobre a vida pessoal, profissional, religiosa ou política de qualquer utilizador do Facebook. Além desse material, todas as mensagens, fotos e outros arquivos que ele tinha apagado continuavam armazenados nos servidores do Facebook. Quando questionado sobre isto, o Facebook afirmou que apenas "removia da página" e não que "apagava".


Isso significa tão somente, que tudo aquilo que for escrito no Facebook, jamais será apagado. Até as alterações de ideias no tempo ali ficarão registadas. O grande perigo de tudo isto não é, de todo, a venda de dados para efeitos comerciais, mas é muito mais profundo que isso porque significa que se algum dia algum governo quiser impor um regime ditatorial num país, não precisará sequer de criar uma PIDE. Através desta mina de informação será possível estabelecer todos os perfis dos cidadãos de um país. Escolher aqueles que devem ser arredados e eliminados logo à partida, chantagear e pressionar os outros, e simplesmente regular os menos incómodos.


É insustentável tudo isto. E se ontem aqui falava a propósito do meu desinteresse com as memórias digitais, hoje peço que esse desinteresse seja a norma, e que aquilo que eu disser num registo digital de conversação assuma exatamente o mesmo registo daquilo que eu digo numa conversação oral, não dure mais do que o estritamente necessário. Este assunto explodiu no ano passado e a Comissão Europeia já começou a tentar regular tudo isto, mas a verdade é que do meu uso do Facebook acredito que nada mudou ainda. E a reposta dada esta semana a um dos processos em curso pela Comissão de Dados da Irlanda é esclarecedora quanto ao poder do Facebook.

 

Os objectivos dos 22 processos movidos por Max Schrems, no âmbito do Europe-v-Facebook.org, passam por:

Transparency. It is almost impossible for the user to really know what happens to his or her personal data when using facebook. For example “removed” content is not really deleted by facebook and it is often unclear what facebook exactly does with our data. Users have to deal with vague and contradictory privacy policies and cannot fully estimate the consequences of using facebook.
A company that constantly asks its costumers to be as transparent as possible should be equally transparent when it comes to the use of its costumers personal data. [Request a full copy of all your personal data, “request your data!”].

Opt-in instead of Opt-out. Facebook often claims that all users have consented to the use of their personal data. But in reality facebook users know that facebook is more of an “opt-out”-system: If you do not change all the preset privacy settings most personal data will be visible without restrictions. Users that do not want this have to struggle with endless buttons and settings. This oftentimes means that the more privacy a user wants, the more clicks and the more care for every detail is necessary. Older or inexperienced users may not even be able to do so. New functionalities are activated automatically without proper information of the users.

Decide yourself. There are people that do not want to share too much information online. But facebook found a way to get their personal data too: Facebook is encouraging other users to deliver their data. Examples of this practice is the possibility of synchronizing mobile phones, importing e-mail addresses or by “tagging” other users in photos, videos or even at certain locations.
By allowing this, facebook is ignoring another principle of European data protection law: Only the individual user can consent to the use of his or her data. It is not sufficient that some other user think that they can tag you in an embarrassing picture or send other people’s e-mails to facebook. Other social networks have solved this problem and do not process the data until the individual user has agreed to the use of the specific data.

Data Minimization. Have you ever looked at your facebook wall all the way to the end? How much information have you collected that is useless (to you)?
Facebook offers no sufficient way of deleting old junk data. Every inconsiderate comment, every invitation to an event (e.g. a demonstration) and every “like” is recorded for an indefinite amount of time.

Open Social Networks. Today Facebook is a monopoly. Because Facebook drained the users from all other networks there is no realistic choice to chose an other provider. The failed Google+ experiment shows that not even Google was able to provide for an alternative in the market. This is typical for a “closed system”: Like a black hole Facebook managed to get more and more users until there was a point where everyone had to join because all of their friends moved to Facebook.

Uma outra reportagem em inglês da EuroNews.

setembro 24, 2012

The Renter (2011)

O vencedor do Grande Prémio Cinanima 2011 acaba de ser colocado online. The Renter (2011) foi criado pelo americano Jason Carpenter, tendo iniciado a sua produção quando ainda andava na CalArts, apenas o terminaria um par de anos depois do curso. Carpenter diz-nos que a história permaneceu, porque é baseada na sua infância, ainda que exagerada aqui e ali, o universo criado faz parte das suas memórias.


Em termos expressivos o trabalho explora de forma inovadora a animação de pintura, do borrão de tinta, do ruído visual tudo dentro de uma enorme coerência visual. Ao ver o filme pela primeira vez, pensei que existia ali muita arte tradicional, muito papel riscado, mas algumas coisas pareciam demasiado vectorizadas para o ser. Na verdade Carpenter diz que optou por utilizar apenas ferramentas digitais, queria explorar e ver o que elas lhe conseguiam dar. Usou o extensivamente Photoshop para trabalhar as texturas e o Flash para animar, e isso nota-se mas nem por isso como um mau efeito antes servem para demonstrar que o que conta é a identidade visual que se procura, e não a ferramenta que se usa.




Based on a true story, it follows a young boy, who discovers that daycare can be a harsh and confusing world, where caring is shown in unexpected ways. ​

The Renter (2011) de Jason Carpenter

[Via Short of the Week]

sufocado pela perda

Grounded é uma curta experimental de ficção científica, criada por Kevin Margo director de VFX na Blur. O experimentalismo ocorre ao nível da narrativa que busca expressar sentimentos de Kevin Margo em relação ao seu falecido pai, e para isso utiliza efeitos de recorrência narrativa criando realidades paralelas para dar corpo à sua história. A introspecção é expressa num registo minimal jogando com o espectador, obrigando-o a uma atenção redobrada em busca de pistas que o possam ajudar no processo de inferição de sentidos.


Em termos de mensagem Grounded é uma obra muito interessante porque apesar de todo o aparato CGI envolve-nos em sentimentos pessoais e íntimos. Temos aqui o autor a socorrer-se do meio que melhor domina para exorcizar as suas culpas, medos, e desejos. Como diz Jason Sondhi do Short of the Week, é um trabalho CGI que ao contrário da corrente atual não se limita a ser um espectáculo visual, tem algo para nos dizer, algo profundamente humano.



No campo formal a beleza e perfeição das atmosferas conseguidas exigem anos de experimentação ao nível da direcção de arte visual assim como na criação de efeitos visuais. Para se entrar pela técnica adentro aconselho verem os VFX Breakdowns (aqui abaixo) depois de verem o filme. Por mais que veja estes breakdowns nunca me canso, porque são a prova de que os sistemas de produção se alteraram drasticamente, e hoje fazer um filme não se mede mais pelo número de pessoas que temos nem pelo dinheiro que conseguimos angariar, mas mede-se apenas e só pelo talento e empenho dos criadores.

Grounded (2011) de Kevin Margo

One astronaut's journey through space and life ends on a hostile exosolar planet. Grounded is a metaphorical account of the experience, inviting unique interpretation and reflection by the viewer. Themes of aging, inheritance, paternal approval, cyclic trajectories, and behaviors passed on through generations are explored against an ethereal backdrop.

VFX Breakdowns

Para chegar a este resultado final Kevin Margo utilizou uma 5D II para as cenas base, e uma 7D para criar cenas a 60fps, com três lentes - 24, 50 e 135. A montagem foi feita com o Vegas, e o tracking com PFtrack. Para o desenvolvimento 3D, usou o Zbrush, Vray e o 3ds Max. Na composição final de tudo trabalhou com o Fusion e o AE/MagicBullet para a gradação de cor.

memórias perdidas

Curta inspiradora sobre as memórias digitais, sobre as transformações na sociedade que todo este poder de registo externo tem vindo a operar, e ao mesmo tempo sobre toda a sua efemeridade e desconexão da realidade humana. Lost Memories (2012) é um filme de Francois Ferracci que tem trabalhado como director de arte e de VFX.


Um casal que tira fotografias num lugar turístico, e que em vez de aproveitar o momento, se perde no meio do processo de registo desse momento. O contraste entre o digital e o analógico tão bem explorado por via do casal que eleva a discussão para o patamar daquilo que faz de nós seres humanos. São as experiências que criam a nossa identidade, e não os registos dessas experiências. Este é um vídeo que vem totalmente de encontro a um texto que escrevi para a Eurogamer sobre a Posse e a Experiência.


De tudo, a única coisa que realmente importa são as relações humanas e não os espólios exibicionistas e narcisistas. O momento em que a Polaroid regista aquela imagem esclarece tudo isso, não queremos ser apenas uma imagem, continuamos a ser feitos de emoções e momentos.



Fica aqui o link para o breakdown dos VFX.

setembro 23, 2012

Monsterbox, 3d com muita cor

Mais um filme da escola de Bellecour (Lyon, França) da licenciatura em Infografia 3d. Depois de na semana passada ter aqui trazido Destiny do mestrado em 3d e Entretenimento, agora é a vez de Monsterbox de Ludo Gavillet, Lucas Hudson, Colin Jean-Saunier et Dérya Kocaurlu. Uma escola a continuar a seguir.



O que me impressionou mais foi a cor, de tão brilhante quase fluorescente, de uma diversidade enorme, e com excelentes contrastes. Claramente nos atira para as sequências iniciais em Sunnyside no filme Toy Story 3 da Pixar. A história não é original, um dos monstros até é demasiado parecido com Stitch, ainda assim o final está muito bem conseguido e consegue surpreender.



Vale a pena dar uma vista de olhos no making of depois de ver o filme.

Prometheus, a arte da forma

Não vi quando saiu, mas desde então tenho lido muitos comentários ao filme, muitos negativos, e isso foi bom, porque me baixou imensamente as expectativas, contribuindo provavelmente para o facto de eu ter sentido o filme como uma obra poderosa. Um filme é muito mais do que aquilo que diz, para mim é a forma como o diz que mais interessa.


Prometheus serve-nos uma atmosfera que em nada fica a dever a Alien (1979), cruza uns rasgos musculados de Aliens (1986) mas pouco. O filme suga-nos para o seu interior, e por duas horas sentimos aquele espaço como real, existente e consequente. Isto era o forte da série, e continua a ser aqui. Esteticamente assistimos a um ambiente que mescla muito bem cenários e mecânicas barrocas que nos atiram para o nosso passado, trabalhados num tom grotesco, com cenários de um futuro tecnologicamente avançado. O cruzamento funciona ainda entre o puramente orgânico e o puramente artificial, criando uma mistura que nos deixa pouco à vontade, e cria a estranheza em nós para que o thriller não se sinta forçado, mas antes faça parte do ambiente de modo natural. Já não é apenas HR Giger que temos aqui, porque o grotesco foi minorado, no sentido em que as criaturas são agora totalmente antropomórficas (não todas), criando familiaridade e proximidade afastando-nos do puro grotesco. Mas o seu sentido atmosférico continua aqui a imperar nomeadamente na tendência para um monocromático de tons azulados.


A essência narrativa do filme está na ausência de respostas para as questões levantadas, nomeadamente o graal, tantas vezes buscado. Ainda que aqui a semi-resposta tenha procurado fundir o esoterismo com alguma cientificidade. Diria mesmo que nesta primeira parte Prometheus nos lança numa espécie de ideal semi-criacionista. Semi porque não está de acordo com as datas nem com a identidade do criador definido por esse movimento. Aliás talvez mesmo para fugir a essa ligação, os "criadores" sejam aqui apelidados de Engenheiros. Ainda assim a tese é um tanto ridícula no sentido em que a hipótese apresenta o planeta Terra plenamente desenvolvido, com toda a atmosfera necessária à existência de vida já estabelecida, e no entanto incapaz de dar origem à vida, o que não faz qualquer sentido numa perspectiva evolucionária. Ou seja, aqui advoga-se que teria sido necessário o aparecimento de uma estrutura (DNA) vinda de fora do planeta para acender a centelha da vida.


Não sei como se confirmará tudo isto numa segunda parte, já que se entre-abre a discussão sobre quem criou os engenheiros, atirando-nos para o mito de Prometeu. O filme foi claramente feito a pensar numa segunda parte, e sem ela fica tudo em aberto. É mais do que jogar no minimalismo, ficam mesmo muitas pontas soltas que só poderão ser fechadas numa segunda parte. Não é contudo por não acreditar nesta ideia criacionista a partir do exterior que desdenho o filme, se não teria de o fazer em muitos outros ângulos, trata-se de um filme ficcional, estamos no reino do mito, e o filme nada perde com isso.







setembro 22, 2012

OffBook #28: "The Art of Web Design"

O episódio desta semana na OffBook é sobre The Art of Web Design. Pequena revisão histórica sobre a evolução do design na web, desde o HTML, CSS e Flash passando pelas discussões sobre forma ou conteúdo, até aos fundamentos da experiência do utilizador.



Uma das questões mais interessantes levantadas pelo documentário está relacionada com as plataformas móveis que vieram alterar profundamente o desenho em função do utilizador e do contexto. Não é possível saber se um site vai ser visto: rodeado de milhares de pessoas num concerto num ecrã diminuto; na intimidade de um quarto num tablet; ou num escritório num ecrã de 27'. É preciso desenhar experiências visuais que sejam adaptáveis, moldáveis e fluídas. Se esse desafio já me preocupava quando tínhamos três ou quatro resoluções de ecrã e dois browsers nos anos 1990, nos dias de hoje tudo isto se multiplicou e complexificou enormente.


"The explosion of the internet over the past 20 years has led to the development of one of the newest creative mediums: the website."

Lista do Plano Nacional de Cinema

Está feita a selecção dos primeiros 36 filmes da melhor iniciativa realizada na Educação portuguesa nos últimos anos. A selecção foi feita por Graça Lobo, ex-dirigente do Cineclube de Faro e responsável pelo inovador programa nacional, Juventude Cinema Escola, que aqui serviu de modelo.

A Suspeita (1999) de José Miguel Ribeiro

Sobre a lista em si, são 36 filmes dos quais exatamente 50% (18) são portugueses. Temos 9 animações, 6 portuguesas. Tim Burton aparece listado três vezes, embora O Estranho Mundo de Jack não seja seu (foi realizado por Henry Selick, mas a estética é do Tim Burton), ainda assim é claramente excessivo. Numa lista de 36 filmes assume demasiada predominância uma estética em particular. Tematicamente compreendo a escolha, mas julgo que pelo menos um destes podia ter sido trocado por O Meu Vizinho Totoro ou Princesa Mononoke de Miyazaki.

História Trágica com Final Feliz (2005) de Regina Pessoa

Sobre os filmes em si, a lista denota uma clara preocupação com a mensagem social, definida no âmbito da formação dos jovens, pois falamos de públicos com idades entre os 10 e os 18 anos. Nesse sentido percebem-se as faltas no campo da história e estética da arte cinematográfica, desde Eisenstein a Tarkovski, de Murnau a Dreyer, passando por Welles e Kubrick, ou ao nível nacional João César Monteiro ou Pedro Costa. O cinema português fica ainda assim muito bem representado, e o que eu espero verdadeiramente, é que este programa sirva para fomentar a discussão em torno da arte, que ajude a desconstruir o poder expressivo, e a compreender o seu potencial. Não para criar novos públicos, embora também, mas acima de tudo para criar potenciais novos criadores.

O Garoto de Charlot (1921) de Charles Chaplin

Segundo ciclo do ensino básico
"Estória do gato e da lua" (1995), Pedro Serrazina (curta-metragem CM).
"O estranho mundo de Jack" (1993), Tim Burton (longa-metragem LM).
"A bola" (2001), Orlando Mesquita Lima (CM).
"Com quase nada" (2000), Margarida Cardoso e Carlos Barroco (LM).
"Aniki-Bobó" (1942), Manoel de Oliveira (LM).
"As coisas lá de casa" (2003), José Miguel Ribeiro (CM).
"O garoto de Charlot" (1921), Charles Chaplin (LM).
"ET, o extraterrestre" (1982), Steven Spielberg (LM).
"Diz-me onde fica a casa do meu amigo" (1987), Abbas Kiarostami (LM).

Terceiro ciclo do ensino básico
"História trágica com final feliz" (2005), Regina Pessoa (CM).
"A noiva cadáver", Tim Burton (2005) (LM).
"Saída do pessoal operário da camisaria confiança" (1896), A. Paz dos Reis (CM).
"A invenção de Hugo" (2011), Martin Scorsese (LM).
"Serenata à chuva" (1952), Stanley Donen (LM).
"Shane" (1953), George Stevens (LM).
"Adeus, pai" (1996), Luís Filipe Rocha (1996) (LM).
"Eduardo mãos de tesoura" (1990), Tim Burton (LM).
"Romeu + Julieta" (1996), Laz Luhrman (LM).
"A suspeita" (1999), José Miguel Ribeiro (CM).
"O Barão" (2011), Edgar Pêra (LM).
"Um outro país" (1999), Sérgo Tréfaut (LM).

Ensino Secundário
"Persépolis" (2004), Marjane Satrapi e Vicent Paronnaud (LM).
"A noite" (1999), Regina Pessoa (CM).
"Douro, faina fluvial" (1931), Manoel de Oliveira (CM).
"Jaime" (1974), António Reis (CM).
"Rafa" (2012), João Salaviza (CM).
"Cidade das luzes" (1931), Charles Chaplin (LM).
"Os 400 golpes" (1959), François Truffaut (LM).
"Senhor X" (2010), Gonçalo Galvão Teles (LM).
"A esquiva" (2004), Abdelatif Kechiche (LM).
"Belarmino" (1964), Fernando Lopes (LM).
"Fado lusitano" (1995), Abi Feijó(CM).
"Os respigadores e a respigadora" (2000), Agns Varda (LM).
"Viagem à Lua" (1902), Georges Mélis (CM).
"O estranho caso de Angélica" (2010), Manoel de Oliveira (LM).
"Os salteadores" (1993), Abi Feijó (CM).
"A cortina rasgada" (1966), Alfred Hitchcock (LM).

a inevitabilidade do destino

Destiny é uma animação sobre o tema das viagens no tempo, dos mundos possíveis e das múltiplas realidades. Socorre-se destes temas para nos apresentar a inevitabilidade do destino.



Destiny é mais um filme brilhante de estudantes - Fabien Weibel, Sandrine Wurster, Victor Debatisse e Manuel Alligné - de animação 3D da Escola Bellecour que agora chega à rede. Em termos técnicos podemos dizer que é quase perfeito, desde o desenho dos personagens e cenários ao ritmo tão bem delineado pela montagem, iluminação e música. Mas é a narrativa o seu melhor, porque apesar de tratar um tema já muitas vezes explorado na ficção científica, consegue ainda assim prender-nos, e surpreender-nos.



[via Short of the Week]