tag:blogger.com,1999:blog-54294132024-03-18T15:35:48.305+00:00VIRTUAL ILLUSIONISSN 2182-0899Nelson Zagalohttp://www.blogger.com/profile/13107799601113612022noreply@blogger.comBlogger2673125tag:blogger.com,1999:blog-5429413.post-1908897328054125502023-09-02T22:33:00.015+01:002023-12-28T16:17:19.990+00:00Nota de encerramento<p>Encerra-se aqui o Virtual Illusion que começou <a href="https://virtual-illusion.blogspot.com/2003/05/blog-post.htm" target="_blank">há 20 anos</a>. Resolvi terminar este blog agora, por se relacionar com um ciclo académico que chegou ao fim. O Virtual Illusion foi criado quando iniciei a minha carreira académica e considero que cumpriu, excedeu, o seu propósito. É por isso tempo de refletir sobre o que foi feito, mas para isso preciso de o encerrar para poder distanciar-me e conseguir chegar a um olhar de fora.</p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjdlimFguUD-pAK9ZJnrRbfhjanAjEaO05DlmycJNVFdYQbpCdH6j1ydz4nYGJ4ztXkWUHCV1Q0-GfMcQ_t7CP84LgF0nBjYRB3DUAGegAzs2A-_2UZOlJ3_P5KKbbpXVBMA6NKPU4BCaM8nylN5udWf4hfmUzQkRt8Jz-w3X3iEkonjYopOXMtgw/s800/15380808_10154207142753602_5506166258477576496_n.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="600" data-original-width="800" height="480" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjdlimFguUD-pAK9ZJnrRbfhjanAjEaO05DlmycJNVFdYQbpCdH6j1ydz4nYGJ4ztXkWUHCV1Q0-GfMcQ_t7CP84LgF0nBjYRB3DUAGegAzs2A-_2UZOlJ3_P5KKbbpXVBMA6NKPU4BCaM8nylN5udWf4hfmUzQkRt8Jz-w3X3iEkonjYopOXMtgw/w1000/15380808_10154207142753602_5506166258477576496_n.jpg" width="640" /></a></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><b><span style="font-family: times; font-size: large;">THE END</span></b></div><p>O arquivo do Virtual Illusion permanecerá aqui enquanto a Google mantiver o <i>hosting</i>. Entretanto, iniciei uma nova etapa na plataforma Substack que intitulei de Experiências Narrativas, na qual vou continuar a publicar textos focados no domínico específico da minha investigação e ensino.</p><p><br /></p><p><b>Atualização 25.11.2023</b></p><p>Acabei por ter de desistir do Substack, uma vez que a plataforma não permite a indexação dos textos pelo Google. Assim passei a publicar os resumos das narrativas que vou experienciando no Wordpress.</p><p><b>Atualização 25.12.2023</b></p><p>Acabei por ter desistir também do Wordpress, como <a href="https://narrativax.blogspot.com/2023/12/depois-do-substack-e-do-wordpress-de.html" target="_blank">expliquei num post no novo blog</a> criado no Blogger, onde comecei a publicar os novos textos e intitulado <a href="https://narrativax.blogspot.com" target="_blank">Narrativa eXp</a>.</p>Nelson Zagalohttp://www.blogger.com/profile/13107799601113612022noreply@blogger.com12tag:blogger.com,1999:blog-5429413.post-10544341648072628332023-08-31T19:01:00.002+01:002023-08-31T19:11:24.824+01:00A solidão do SerEm “Fora do Mundo”, o jornalista Michael Finkel conta a história de Chris Knight, o chamado eremita do Maine. Em 1986, com 20 anos, entrou no carro e conduziu pela floresta fora até ficar sem gasolina, abandonou o carro e as chaves, adentrou até encontrar um local suficientemente afastado da presença humana e estabeleceu-se, só voltaria a ser visto, e a falar com humanos, 27 anos depois, em 2013, quando foi preso por assaltar uma cozinha de uma área de piqueniques.<div><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjuCDp-06SEnDKL4LMIAaA7cTIMQiSFpiWFpyl5us1AH6fUaqy5scYteZidccXXYZunpIr-Q0OJTJsS5nMRlYwmXmro5ZMB5ulY_OYx42-iWLHIxnJ-FYWwcOxeeoio0cheN4Yi5A19JNErR8pGCH3E9-2BrNFdptutUAig-IDOikhvPYR2m6NG4w/s1920/20230831_181045-1.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1488" data-original-width="1920" height="496" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjuCDp-06SEnDKL4LMIAaA7cTIMQiSFpiWFpyl5us1AH6fUaqy5scYteZidccXXYZunpIr-Q0OJTJsS5nMRlYwmXmro5ZMB5ulY_OYx42-iWLHIxnJ-FYWwcOxeeoio0cheN4Yi5A19JNErR8pGCH3E9-2BrNFdptutUAig-IDOikhvPYR2m6NG4w/w1600/20230831_181045-1.jpg" width="640" /></a></div><div><br /><span><a name='more'></a></span>O livro apresenta um discurso jornalístico, entremeado com algumas citações de estudos científicos assim como de obras literárias, mas funciona bem no modo como narra a reaparecimento e readaptação de Knight, nomeadamente pelos esforços envidados para investigar o porquê do afastamento, o que teria levado alguém com competências intelectuais elevadas e uma boa família a abandonar a humanidade, sem olhar para trás, nem uma palavra dada aos pais e aos irmãos que teriam de se resignar a acreditar que teria morrido.
<p></p>
Deixo um excerto (p.148) que me tocou particularmente, por colocar em evidência tudo aquilo que <a href="https://en.wikipedia.org/wiki/Symbolic_interactionism" target="_blank">George Herbert Mead</a>, <a href="https://en.wikipedia.org/wiki/The_Presentation_of_Self_in_Everyday_Life" target="_blank">Erving Goffman</a> e <a href="https://en.wikipedia.org/wiki/Social_learning_theory" target="_blank">Albert Bandura</a> teorizaram sobre o que edifica o Eu e nos torna humanos.<p></p><blockquote>
“O que aconteceu a Knight nos bosques foi, segundo ele, inexplicável. No entanto, aceitou pôr de lado os receios e tentar. 'Não é fácil', disse ele. 'A solidão permite desenvolver algo precioso. Não posso descurar essa ideia. A solidão aumentou a minha perceção. Mas a ideia enganadora é esta: <b>quando apliquei a minha perceção aumentada a mim próprio, perdi a identidade</b>. Não havia público, não havia ninguém para quem atuar. Não havia necessidade de me definir a mim mesmo. Tornei-me irrelevante'.” <div><br /></div><div>“A linha divisória entre ele e a floresta, disse Knight, parecia dissolver-se. O seu isolamento parecia mais uma comunhão. '<b>Os meus desejos desapareceram. Não ansiava por nada. Nem sequer tinha um nome</b>. Para o dizer de forma romântica, estava completamente livre'.” </div><div><br /></div><div>(...) </div><div><br /></div><div>“Foi precisamente esta perda do <i>eu</i> que Knight experienciou na floresta. Em público, recorremos sempre uma máscara social, a uma representação para o mundo. Mesmo quando estamos sós e nos olhamos ao espelho, fingimos, motivo pelo qual Knight não guardava nenhum espelho no acampamento: abandonou todos os artifícios; tornou-se ninguém e toda a gente.”</div></blockquote><div></div></div>Nelson Zagalohttp://www.blogger.com/profile/13107799601113612022noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5429413.post-13249342982380284762023-08-29T20:09:00.008+01:002023-08-31T19:12:12.769+01:00A escrita de Sara Mesa<div>Este ano voltei a ler Sara Mesa no verão, em espanhol em audiolivro, e gostei tanto que acabei lendo dois livros dela: "Cara de Pan" (2018) e "Cicatriz" (2015). Se gostaram de <a href="https://virtual-illusion.blogspot.com/2021/09/un-amor-2020-sara-mesa.html" target="_blank">"Un amor" (2020)</a>, vão adorar, se não, é melhor passarem à frente. Sara Mesa (1976) criou um estilo próprio, construindo uma voz que nos serve como um olhar externo sobre as relações humanas, em particular a partir de jovens mulheres. Mesa não escreve para dar respostas, mas antes para se questionar, e é por isso que me atrai particularmente.</div><div><br /></div><div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi_yIzgc7ZV02XRsoMgu9kVjBX8fQ92Gsr7AVt7xVCMIMwzKx6pNtsjPlIPcuYCIzDS849jhYr1eC8fDQQMPCZQkcicrFs-1SMR7TijP0TKWL4tBkFK06Rk2kPOa_Rzr83ILEP48z0VV-DYhRDow5aLXhjnttmFDD_wSMR0alH4EAgLKPCv8-491w/s1275/sara%20mesa.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1000" data-original-width="1275" height="502" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi_yIzgc7ZV02XRsoMgu9kVjBX8fQ92Gsr7AVt7xVCMIMwzKx6pNtsjPlIPcuYCIzDS849jhYr1eC8fDQQMPCZQkcicrFs-1SMR7TijP0TKWL4tBkFK06Rk2kPOa_Rzr83ILEP48z0VV-DYhRDow5aLXhjnttmFDD_wSMR0alH4EAgLKPCv8-491w/w1000/sara%20mesa.jpg" width="640" /></a></div><p><span></span></p><a name='more'></a>Nos três livros, somos introduzidos a uma personagem feminina que deambula por espaços-tempo, e ao longo do livro vão encontrando outros personagens com os quais vão interagindo, questionando-se a si, aos outros, e ao mundo em que vivem. A particularidade advém pelo facto de nunca ser dito para onde caminham, nem porque caminham. Mesa cria as personagens e os espaços, coloca-as em movimento e depois como que se nota que vai escrevendo à procura de um sentido para o que representa a personagem naquele espaço-tempo particular. Não existe uma trama concreta, não existe uma pergunta, nem uma resposta para buscar, contudo às personagens falta algo, e é esse algo que faz mover a escrita, assim como nos mantém colados tentando perceber como se vai completar aquela personagem. <p></p>
São livros curtos, funcionam mais como novelas, mas criam experiências muito particulares. Em “Cara de Pan” temos uma miúda de 12-13 anos que encontra um vagabundo num parque urbano, com o qual começa a interagir, permitindo-nos conhecer ambas as personagens, fazendo-nos questionar sobre todos os porquês, sem respostas, mas mantendo-nos ali prevendo o pior, mas antecipando que o pior pode não advir e não ir além do nosso preconceito. Em “Cicatriz” temos uma relação bem mais exótica, com uma jovem adulta a iniciar uma relação de amizade com um amigo online que vive a centenas de quilómetros, que lhe envia livros, e depois perfumes e roupas aos molhos, de graça, porque tudo o que envia é roubado. A relação atravessa anos e nós com eles, tentando descortinar o que se passa na cabeça de cada um.</div><div> <br />
No fundo, são puzzles de espaços e personagens interagindo, que Mesa nos oferece para nos fazer embrenhar na descoberta das relações, posições, expectativas e motivações humanas.
</div>Nelson Zagalohttp://www.blogger.com/profile/13107799601113612022noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5429413.post-24987210785918846922023-08-29T19:24:00.002+01:002023-08-29T19:28:30.479+01:00"Subitamente, Sós" de Isabelle AutissierÉ uma pequena novela que tem algo muito bom para entregar, mas fá-lo de forma contida, nunca chegando a ser totalmente expresso, nem pelas palavras, nem pela forma da exposição. Estamos perante uma autora, <a href="https://en.wikipedia.org/wiki/Isabelle_Autissier" target="_blank">Isabelle Autissier</a>, que conhece de perto os sentires das personas criadas, não tivesse sido ela a primeira mulher a cumprir a volta ao mundo em veleiro a solo. O texto flui muitíssimo bem, ainda que se sinta que foi bastante editado para chegar a esta forma, o que acaba conferindo-lhe uma forma algo artificial, pouco orgânica. No entanto, começa-se a ler e não apetece parar, queremos, precisamos, de saber mais e mais. <div><br /><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg1pAIwJd-EcGS9hjljHc6ZLzoR8aEnZJw9po4LcmUNEkX3lOFpJTQ9_gITh4XGUf3V0tgKheKEFCrp-Kc3VvyHlfz8ubyFTfQTQu15CJTUc2KMgDGQal27M4meQP3zA2qO0HUKAE-4QIBws9-9jAXOaK55brnzq1on9_g7Zit5DB4H8OEN0KPVlg/s1024/003602975.jpeg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1024" data-original-width="680" height="640" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg1pAIwJd-EcGS9hjljHc6ZLzoR8aEnZJw9po4LcmUNEkX3lOFpJTQ9_gITh4XGUf3V0tgKheKEFCrp-Kc3VvyHlfz8ubyFTfQTQu15CJTUc2KMgDGQal27M4meQP3zA2qO0HUKAE-4QIBws9-9jAXOaK55brnzq1on9_g7Zit5DB4H8OEN0KPVlg/h1000/003602975.jpeg" width="426" /></a></div><div><div><br /></div><div>Mas o que realmente interessa é mesmo a capacidade de Autissier de expor passo a passo os níveis do isolamento humano, o avançar desse processo, o aprofundar dos seus efeitos, ainda que nunca se detenha para os enfatizar, fá-lo de forma natural, frontal e muito honesta. Não se procura aqui impressionar, mas apenas e só abrir espaço a um sentir humano pouco conhecido. </div></div></div>Nelson Zagalohttp://www.blogger.com/profile/13107799601113612022noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5429413.post-4017761572128396902023-08-27T20:04:00.005+01:002023-08-27T20:06:49.723+01:00Pessoa, o professor universitárioO heterónimo de Pessoa, Alexander Search, tinha um caderno de endereços assinado por si, datado de 1906 (Pessoa tinha 18 anos), em que a partir das correspondentes letras de busca, listou uma imensa bibliografia, cerca de meio milhar de livros, multilíngue — inglês, francês, espanhol e português — maioritariamente sobre filosofia, mas também psicologia, sociologia e religião, que pretendia ler nos tempos próximos. Pessoa leu muitos deles.
<p></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEigP8zmGVAypXoeIEEEgFTOUf5g731V3sGdH8LJRv9h02Jipfxak4Wt71f80pEL4of3ZKvZwUoV__Q73UX6a0ugs7LC3780ZaGZJNUqdP3iMDMdoczfGYwBdM6yNOvjBxdKn6oKX8Ht9SpBcTQc8FTFwZNmWxXjSnTyd8MXeWzP8WkH3at0UsLiYw/s944/Screenshot%202023-08-27%20at%2020.01.47.png" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="650" data-original-width="944" height="275" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEigP8zmGVAypXoeIEEEgFTOUf5g731V3sGdH8LJRv9h02Jipfxak4Wt71f80pEL4of3ZKvZwUoV__Q73UX6a0ugs7LC3780ZaGZJNUqdP3iMDMdoczfGYwBdM6yNOvjBxdKn6oKX8Ht9SpBcTQc8FTFwZNmWxXjSnTyd8MXeWzP8WkH3at0UsLiYw/w800/Screenshot%202023-08-27%20at%2020.01.47.png" width="400" /></a></div><br />Como diz Richard Zenith, na <a href="https://www.goodreads.com/book/show/60587017-pessoa-uma-biografia" target="_blank">biografia</a>, se Pessoa em 1905 em Durban tivesse ido estudar, com uma bolsa, para Oxford em vez de voltar para Lisboa, é provável que o maior génio das letras portuguesas se tivesse perdido, mas em seu lugar teria dado "um professor universitário brilhante".<div> <div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEglpSFcNAW6BMDCjEvxxs9J7vcoDRs6_jURN4FGDiiyG0nBbZ3yZg71ADsD2pkPmDyG9-GgVm1nh9siAn3Ll6xcGxE1DMibb2PmZosV8-VaDOxEqHd6kn0dkjImeupu5CKX6ZV87wpb3D8a9xk8_p0bvETcyeGnb11z6X4LQnIekwTyQzDgh3jM7g/s1258/Screenshot%202023-08-27%20at%2019.31.33.png" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1258" data-original-width="908" height="640" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEglpSFcNAW6BMDCjEvxxs9J7vcoDRs6_jURN4FGDiiyG0nBbZ3yZg71ADsD2pkPmDyG9-GgVm1nh9siAn3Ll6xcGxE1DMibb2PmZosV8-VaDOxEqHd6kn0dkjImeupu5CKX6ZV87wpb3D8a9xk8_p0bvETcyeGnb11z6X4LQnIekwTyQzDgh3jM7g/h1000/Screenshot%202023-08-27%20at%2019.31.33.png" width="462" /></a></div><p></p>
O caderno completo foi catalagado pela BNP como E3/144H, o <a href="https://purl.pt/13884" target="_blank">PDF integral</a> está acessível online.
</div>Nelson Zagalohttp://www.blogger.com/profile/13107799601113612022noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5429413.post-4214884497432454912023-08-27T16:37:00.019+01:002023-08-27T19:16:48.870+01:00"Sobrevivente do Gulag Chinês", por Gulbahar Haitiwaji<p>Em 2019 <a href="https://virtual-illusion.blogspot.com/2019/10/parar-pensar-e-boicotar-china.html" target="_blank">choquei de frente com imagens provenientes de Xinjiang</a> que mostravam centenas de prisioneiros a serem encaminhados para comboios para seguirem para campos de concentração chineses que relembram as imagens reconstruídas pelo cinema do que se passou em Dachau, Treblinka e outros lugares. O livro "Sobrevivente do Gulag Chinês" foi publicado em França em 2021, e apresenta o primeiro testemunho de uma sobrevivente desses campos chineses, em pleno século XXI.</p><p>Os uigures vivem na região autónoma do Xinjiang, uma região enorme do noroeste da China, que além de funcionar como corredor central da antiga "<a href="https://en.wikipedia.org/wiki/Silk_Road" target="_blank">Rota da Seda</a>" e da atual "<a href="https://en.wikipedia.org/wiki/Belt_and_Road_Initiative" target="_blank">Belt and Road Initiative</a>" (que procura impor a agenda chinesa no mundo), é ainda uma região rica em petróleo.</p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj8FLBGaDFWUXO2GoJCLlePPPSEgf-lu_Xjk8MjL8oVnydM_hp_JZGmZ_cqybFK0yoFmuQKAj0LpFERsalk2VcDgpXUpD3doRRi_nuY5xI9bhimh1oukC35mZktusyvv9IqY4tgbPR467jgW58rG1dS4KhoizkngF9WtFgQOeFISyMmariYuXElIA/s800/1678527087.jpeg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="800" data-original-width="600" height="640" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj8FLBGaDFWUXO2GoJCLlePPPSEgf-lu_Xjk8MjL8oVnydM_hp_JZGmZ_cqybFK0yoFmuQKAj0LpFERsalk2VcDgpXUpD3doRRi_nuY5xI9bhimh1oukC35mZktusyvv9IqY4tgbPR467jgW58rG1dS4KhoizkngF9WtFgQOeFISyMmariYuXElIA/h1000/1678527087.jpeg" width="480" /></a></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">Li o livro na versão audiolivro (<a href="https://www.scribd.com/audiobook/599135215/Rescapee-du-goulag-chinois-Le-premier-temoignage-d-une-survivante-ouighoure" target="_blank">Scribd</a>)</div><p><span></span></p><a name='more'></a>Gulbahar Haitiwaji, engenheira de petróleo, fugiu de Xinjiang para França em 2006 com o marido e as duas filhas. O marido e as filhas naturalizaram-se franceses, Gulbahar decidiu manter a nacionalidade chinesa para poder continuar a visitar os familiares. Em 2016 recebeu uma chamada dos serviços do estado Chinês dizendo que tinha de voltar a Xinjiang para tratar de papéis relacionados com a sua reforma. Quando aterrou em Xinjiang mostraram-lhe uma fotografia em que a sua filha aparecia numa manifestação em França pela liberdade dos uigures, que desconhecia, e foi presa. Apesar de nunca ter participado em qualquer ação política, foi alvo de tortura, lavagem cerebral e tentativa de extorsão de informação sobre outros uigures a viver em França, ao longo de 3 anos, até que as pressões da diplomacia francesa a conseguiram libertar.<p></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi1UvSzSERc1FtJzuZfDyrl5FoY8Kvs5RL0vHzmKSVb3n6fYO8KuMpK4Ph8zbp2LG4y2FlvjwJRQyS4dn121nXjLS2gCaVzZxu6NKNxX2DjTrL24egr9-we1Tg7rC2DPuX-kU1PQqZ8qWq65Za89gQUeF8GyIJcQJBrmZBx0pEC22f_zzS3_G1v-A/s1600/Uygur-Autonomous-Region-of-Xinjiang-China.webp" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1160" data-original-width="1600" height="290" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi1UvSzSERc1FtJzuZfDyrl5FoY8Kvs5RL0vHzmKSVb3n6fYO8KuMpK4Ph8zbp2LG4y2FlvjwJRQyS4dn121nXjLS2gCaVzZxu6NKNxX2DjTrL24egr9-we1Tg7rC2DPuX-kU1PQqZ8qWq65Za89gQUeF8GyIJcQJBrmZBx0pEC22f_zzS3_G1v-A/w800/Uygur-Autonomous-Region-of-Xinjiang-China.webp" width="400" /></a></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">Mapa da China mostrando a posição geográfica de Xinjiang</div><p>Quando acabei de ler o livro fui ao site da <a href="https://www.hrw.org/news/2023/05/04/how-governments-and-civil-society-can-help-chinas-uyghurs" target="_blank">Human Rights Watch</a>, entre outros <a href="https://uhrp.org/take-action/" target="_blank">sites de luta</a> em nome dos Uigures, pois sentia uma enorme necessidade de fazer algo que pudesse contribuir para acabar com o genocídio silencioso que a China vem levando a cabo na última década. Na Europa passamos o tempo a lutar por direitos e deveres, querendo uma sociedade mais progressista, mais justa, mas no meio de todas essas preocupações esquecemos que no planeta existem muitas pessoas que continuam a não ter sequer liberdade de pensar.</p><p>Se houvesse dúvidas, a <a href="https://news.un.org/en/story/2022/08/1125932" target="_blank">31 de agosto 2022 a ONU emitiu um relatório</a> que esteve a ser preparado durante vários anos e que colocava preto no branco "que foram cometidas "graves violações dos direitos humanos" contra os Uigur e "outras comunidades predominantemente muçulmanas"". A China tem poder de veto na ONU, por isso, pouco, nada, aconteceu. Em sua defesa, veio dizer que aquilo que estão a fazer é apenas re-educação das populações para evitar que estas abracem o Terrorismo. Se isto podia "colar" no caso dos uigures, por serem muçulmanos, <a href="https://www.ohchr.org/en/press-releases/2023/02/china-un-experts-alarmed-separation-1-million-tibetan-children-families-and" target="_blank">qual é a desculpa para estarem a fazer exatamente o mesmo no Tibete</a>?</p><p>Tirando o facto da UE, UK, Canada e EUA terem começado a <a href="https://www.theguardian.com/world/2021/mar/22/china-responds-to-eu-uk-sanctions-over-uighurs-human-rights" target="_blank">aplicar a sanções já em 2021</a>, é preciso mais, é preciso cortar os laços e abandonar a China às suas práticas autoritárias. Porque como ficou claro, ainda mesmo ontem, <a href="https://www.politico.eu/article/china-xi-jinping-hardline-xinjiang-policy-uyghurs-human-rights/" target="_blank">26 de agosto 2023, Xi Jinping </a>não esta minimamente preocupado com nenhumas dessas pressões, tendo visitado a região e feito as seguintes bárbaras afirmações: "Temos de combinar a luta anti-terrorista e anti-secessionista com os esforços legalizados e regularizados para a manutenção da estabilidade. A sinoficação do Islão deve ser aprofundada de forma a lidar eficazmente com todos os tipos de actividades religiosas ilegais". Tendo, de forma descarada, dito ainda que era necessário "uma propaganda mais positiva para mostrar uma Xinjiang aberta e confiante, devendo ser feitos esforços específicos para refutar qualquer imprensa negativa".</p><p>Uma <a href="https://www.theguardian.com/world/2021/jan/12/uighur-xinjiang-re-education-camp-china-gulbahar-haitiwaji" target="_blank">síntese/introdução ao livro</a> foi publicada no The Guardian. O livro foi editado em Portugal, em 2022, pela <a href="https://www.wook.pt/livro/sobrevivi-ao-gulag-chines-gulbahar-haitiwaji/26875064" target="_blank">Objetiva</a>.</p>Nelson Zagalohttp://www.blogger.com/profile/13107799601113612022noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5429413.post-81126930099728179382023-08-27T09:49:00.010+01:002023-08-27T10:01:20.389+01:00Europa: Digital Services Act (DSA)<div>O Digital Services Act (DSA) da UE entrou em vigor, esta sexta-feira, <a href="https://www.theverge.com/23845672/eu-digital-services-act-explained" target="_blank">25 agosto 2023</a>, e representa um enorme avanço na proteção dos utilizadores das redes sociais e serviços digitais, que ao longo das últimas décadas têm sido usados como cobaias e carne para canhão pelas grandes empresas que se têm servido do melhor do design e tecnologia para proveito próprio, sem ter de obedecer a quaisquer leis.</div><div><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgKP_P8wcXJk7yDDerpnyS9crR1IFvoloC72sUNBrkEN-uqGTTliuKwD-n1jK7p2sIpOcuQQ8BvHqr95Tu8TED8FyvuuA29FCZwbe3Bhp9-XEId1TNlF4CpjjX93o-C555ko8DU4r1R8LAL7S_6e56wsCTsdRBC6_GD4D6picPOUihScFpdsX6G7g/s800/shutterstock_2149722079-800x450.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="450" data-original-width="800" height="225" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgKP_P8wcXJk7yDDerpnyS9crR1IFvoloC72sUNBrkEN-uqGTTliuKwD-n1jK7p2sIpOcuQQ8BvHqr95Tu8TED8FyvuuA29FCZwbe3Bhp9-XEId1TNlF4CpjjX93o-C555ko8DU4r1R8LAL7S_6e56wsCTsdRBC6_GD4D6picPOUihScFpdsX6G7g/w800/shutterstock_2149722079-800x450.jpg" width="400" /></a></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><span style="font-size: x-small;">Imagem: 2022 Cristian Storto/Shutterstock</span></div><div><br /></div><div style="text-align: left;"><blockquote><b>. As plataformas digitais, com mais de 45 milhões de utilizadores, passam a ser responsabilizadas legalmente pelos conteúdos que são publicados nelas: "o que é ilegal offline, deve ser ilegal online."</b></blockquote></div><div><b></b></div><blockquote><div><b>. As plataformas deixam de poder apresentar anúncios com base em dados sensíveis do utilizador (ex. origem étnica, opiniões políticas, religião ou orientação sexual);</b></div><div><b><br /></b></div><div><b>. As plataformas têm de rotular todos os anúncios e informar os utilizadores sobre quem os está a promover;</b></div><div><b><br /></b></div><div><b>. As plataformas são obrigadas a dar aos utilizadores o direito de optarem por não utilizarem sistemas de recomendação (For You vs. Following) </b></div><div><b><br /></b></div><div><b>. As plataformas são obrigadas a dar aos utilizadores o direito de optarem por não serem alvos de publicidade personalizada (ad targeting);</b></div><div><b><br /></b></div><div><b>. As plataformas deixam de poder classificar os seus próprios serviços ou produtos de forma mais favorável (auto-preferência) do que outros terceiros nas suas plataformas. (Ex. os posts com links ou os vídeos do YouTube, não podem ser despromovidos por apontarem para fora das plataformas);</b></div><div><b><br /></b></div><div><b>. Por outro lado, ficam obrigadas a partilhar dados essenciais com investigadores e autoridades, a cooperarem com os requisitos de resposta a crises e a realizarem auditorias externas e independentes.</b></div></blockquote><div><b></b></div><div>Mas tudo isto acontecerá apenas dentro das fronteiras da UE, pelo menos até que esta abordagem se comece a universalizar.</div><div><br /></div><div><br /></div><div><b>+informação</b></div><div><ol style="text-align: left;"><li><a href="https://www.europarl.europa.eu/news/en/press-room/20220701IPR34364/digital-services-landmark-rules-adopted-for-a-safer-open-online-environment">https://www.europarl.europa.eu/news/en/press-room/20220701IPR34364/digital-services-landmark-rules-adopted-for-a-safer-open-online-environment</a></li><li><a href="https://www.theverge.com/23845672/eu-digital-services-act-explained">https://www.theverge.com/23845672/eu-digital-services-act-explained</a> </li><li><a href="https://www.euractiv.com/section/law-enforcement/news/eu-digital-services-act-challenges-remain-as-enforcement-begins/">https://www.euractiv.com/section/law-enforcement/news/eu-digital-services-act-challenges-remain-as-enforcement-begins/</a></li><li><a href="https://cms-lawnow.com/en/ealerts/2023/05/europe-designates-19-platforms-as-gatekeepers-under-digital-services-act">https://cms-lawnow.com/en/ealerts/2023/05/europe-designates-19-platforms-as-gatekeepers-under-digital-services-act</a></li></ol></div>Nelson Zagalohttp://www.blogger.com/profile/13107799601113612022noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5429413.post-75042404053471906132023-08-25T10:43:00.004+01:002023-08-25T11:18:55.004+01:00"Filho Nativo" (1940) de Richard Wright <p>"Filho Nativo" (1940) é um clássico da literatura americana, um dos primeiros livros a colocar o dedo na ferida do racismo nos EUA. À altura, Richard Wright vivia sob a sedução do marxismo, que lhe serviria aqui para colocar em evidência a opressão dos valores identitários. Pouco depois haveria de abandonar a militância do comunismo por esta se recusar a sair da redoma restrita da luta de classes. Tudo isto é trabalhado segundo uma estética noir que não se coíbe de usar imagens de grande violência, a roçar o verdadeiro horror, trabalhada por uma trama repleta de surpresa capaz de envolver os mais diversos públicos. A mais recente <a href="https://www.imdb.com/title/tt6566768/" target="_blank">adaptação ao cinema de 2019</a>, por Rashid Johnson para a <a href="https://www.hbo.com/movies/native-son" target="_blank">HBO</a>, procura atualizar alguns dos tópicos em face da evolução da sociedade americana, mas sendo interessante diria que é menos conseguida, particularmente porque Wright impregna toda a sua escrita de uma raiva fervilhante que o filme é incapaz de atingir.</p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgmtL60AvcOyEHNmucHFCWL_ROFr_Is7GD7nN3dfoyhDJpEFYb0ZZ4K-vkeCCuwLNwh_i3kuhHH988ONvcPNfgtGwLvqjoV7-tnQEOCKez0rYHF0cebOoQCZKGiDZePqG8J59FzzArYH3w0nqnLM09tF8pv5zwvC13LbdnBJXdR0b1bADCwJg204w/s1736/20230821_183227.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1736" data-original-width="1636" height="640" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgmtL60AvcOyEHNmucHFCWL_ROFr_Is7GD7nN3dfoyhDJpEFYb0ZZ4K-vkeCCuwLNwh_i3kuhHH988ONvcPNfgtGwLvqjoV7-tnQEOCKez0rYHF0cebOoQCZKGiDZePqG8J59FzzArYH3w0nqnLM09tF8pv5zwvC13LbdnBJXdR0b1bADCwJg204w/h1000/20230821_183227.jpg" width="604" /></a></div><p><span></span></p><a name='more'></a>O livro tem sido amplamente discutido na academia e fora dela, nomeadamente com James Baldwin a dedicar-lhe vários ensaios no livro "Notes of a Native Son" (1955). Não aprofundei a interpretação do livro, deixei-me levar pela trama, e procurei compreender as motivações de Wright, que entretanto escreveu um ensaio de 30 páginas (publicado nesta edição) para discutir o que está por detrás da história, mas diria que não entrega muito mais. O livro é bastante direto, naturalmente exige um transporte no tempo aos EUA dos anos 1920-1940, a compreensão da história entre o Norte e Sul, e claro do modo como se desenvolveu o esclavagismo no continente americano a partir das rotas atlânticas criadas por comerciantes portugueses e britânicos entre 1500 e 1800. Wright opta por focar-se sobre a psicologia negra, sobre o modo como o capitalismo esclavagista não apenas contribuiu para torturar milhões de seres humanos, mas como essa tortura se prolongou muito para além desse tempo, criando um estigma que torna impossível a qualquer negro uma efetiva Realização Pessoal.<div><br /></div><div>O choque entre Wright e a militância comunista surge dessa sua visão do humano que só se completa pela via da realização pessoal. Assim, se para os comunistas a erradicação das classes seria suficiente para resolver todos os problemas sociais e humanos, para Wright tal nunca atingiria o âmago da questão. Wright não deixa de evidenciar os problemas produzidos pelas classes, e na interpretação da obra podemos ser levados a refletir sobre a possibilidade de que tudo se resolveria resolvendo o problema da pobreza. Contudo, é exatamente para contrabalançar essa ideia que Wright escreve toda a terceira parte, do julgamento de Bigger, para poder evidenciar que o problema é bastante mais profundo e amplo, indo ao cerne daquilo que edifica Bigger, a Identidade. Wright, escrevendo poucos anos antes de Maslow ter criado a <a href="https://en.wikipedia.org/wiki/Maslow%27s_hierarchy_of_needs" target="_blank">Pirâmide de Necessidades (1943)</a>, defende aqui que a Necessidade de Realização Pessoal está, para si, ao mesmo nível das Necessidades Fisiológicas.<br /><p></p><p>Comparando com outro clássico, <a href="https://virtual-illusion.blogspot.com/2019/03/leitura-obrigatoria-homem-invisivel.html" target="_blank">"O Homem Invisível" (1952) de Ralph Ellison</a>, diria que Wright é mais bruto, sem pudores. Ellison carrega o seu mundo de grande poética, com particular atenção à descrição de cada cena e de cada personagem. Wright foca-se no que quer dizer e compõe os quadros para esse objetivo, sem floreios. Repare-se como Ellison opta por evocar a transparência, ou seja, o modo como os negros eram votados a uma inviabilidade social, enquanto Wright é muito mais enfático, mesmo violento, frisando a impossibilidade dessa transparência. Para Wright a cor da pele é tão presente que impossibilita a passagem pela berma, assumindo assim que a sociedade branca veda quaisquer hipóteses de afirmação da individualidade humana da pessoa negra. </p><p>O contraste entre as duas obras é fundamentalmente evidenciado pelas personagens principais. O protagonista de Ellisson apresenta-se como o negro bem comportado, inteligente, imensamente capaz, mas que a sociedade branca não consegue deixar de intimidar. Já Bigger de Wright, é todo o contrário, já que Wright quis que ele fosse exatamente aquilo que a sociedade branca dizia que todos os negros eram. Wright é frontal, não dá espaço para quaisquer atenuadores, coloca em cena um personagem cheio de problemas e vícios, mas que não deixa de ser uma pessoa, como qualquer outra, humana e pensante. Deste modo, Wright tira todas as desculpas do caminho e obriga-nos a refletir sobre o jovem de raça negra como se se tratasse de qualquer outro jovem.</p><p>Tudo isto torna-se mais relevante porque o modo como Wright entrosa a mensagem com a forma, produz um texto particular, com uma escrita trespassada pela raiva e revolta interiorizada pela cultura negra, suportada por um estilo direto, quase básico, mas pleno de significado. Por outro lado, a sua colagem à política acaba por fazer perder alguns pontos, uma vez que nos obriga a separar o discurso de Wright do discurso ideológico de um partido, e aqui o filme de 2019 ganha ao erradicar toda essa componente.</p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhV4pT1NeNTouzJPR6OaV8TAMv1s2kxuG_BL2zxtwmFJ9kpzU-Rz1ljLdlVMrBF7NR6jCS3eNXcQGeG9IifAk_KlBYRv3diXkfMtBBIjTQTqTD9TVNcz6WibC1VeQY0Pj1XaN89IDXhbdV14M7twr3R_NDiDpQRJGTIWM9qCq2LxMVSheShrH6QNQ/s1481/MV5BZDY0OTM2OTgtYmM1Mi00ZjE4LTkwY2MtMzA3OGNkZDlkZjliXkEyXkFqcGdeQXVyNzc5MjA3OA@@._V1_FMjpg_UX1000_.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1481" data-original-width="1000" height="640" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhV4pT1NeNTouzJPR6OaV8TAMv1s2kxuG_BL2zxtwmFJ9kpzU-Rz1ljLdlVMrBF7NR6jCS3eNXcQGeG9IifAk_KlBYRv3diXkfMtBBIjTQTqTD9TVNcz6WibC1VeQY0Pj1XaN89IDXhbdV14M7twr3R_NDiDpQRJGTIWM9qCq2LxMVSheShrH6QNQ/h1000/MV5BZDY0OTM2OTgtYmM1Mi00ZjE4LTkwY2MtMzA3OGNkZDlkZjliXkEyXkFqcGdeQXVyNzc5MjA3OA@@._V1_FMjpg_UX1000_.jpg" width="432" /></a></div></div>Nelson Zagalohttp://www.blogger.com/profile/13107799601113612022noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5429413.post-77742306169352779492023-08-24T10:14:00.016+01:002023-08-24T14:35:22.204+01:00“Los Vencejos” de Fernando Aramburu<div>“Los Vencejos” (2021) é o sucessor de <a href="https://virtual-illusion.blogspot.com/2021/10/patria-ou-tapecaria-humana.html" target="_blank">“Patria” (2016)</a>, o livro que trouxe reconhecimento internacional, incluindo direito a série HBO, a Fernando Aramburu. Se o estilo, de contador de histórias, permanece inalterado, o tema distancia-se, tal como a abordagem. Deixa-se para trás o terrorismo vasco e adentra-se agora os <a href="https://www.larazon.es/cultura/20210905/g2llprl3ujbcdodc52crdahc2a.html" target="_blank">efeitos sociais do pós-patriarcado</a> na figura masculina. Mantém-se a visão acutilante, mas em vez de sustentada pela tragédia, esta é agora baseada na sátira e humor negro que se tornam centrais no suportar de toda a vil misantropia ao longo de 700 páginas.</div><div><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi8Bgty8mmtVNnKHXsXJ1nqiM5XpgUG-y_dxri9wqDdD8Ai9iRKUPjkCRR_C0aPqXmsxKEikGvjhiqJXXCqh8WtRJ7Z0_lvBzwmZOUElY0YNEbS6KjsggztVqfILfG-lmu7sUtD8_bwF_18H7ID_MIKpJcko9o2EvOGEAqbz5iqaoJERDThRD6PsA/s1200/403631539.png" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1200" data-original-width="647" height="640" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi8Bgty8mmtVNnKHXsXJ1nqiM5XpgUG-y_dxri9wqDdD8Ai9iRKUPjkCRR_C0aPqXmsxKEikGvjhiqJXXCqh8WtRJ7Z0_lvBzwmZOUElY0YNEbS6KjsggztVqfILfG-lmu7sUtD8_bwF_18H7ID_MIKpJcko9o2EvOGEAqbz5iqaoJERDThRD6PsA/h1000/403631539.png" width="346" /></a></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">Imagem da web, lido na versão audiolivro com narração de Germán Gijón (<a href="https://www.scribd.com/audiobook/545662683/Los-vencejos" target="_blank">Scribd</a>).</div><div><br /></div><div><span><a name='more'></a></span>Tendo a aborrecer-me com textos misantropos, não suporto o queixume, mas mais ainda a incapacidade de racionalizar alternativas para os problemas. Como se a realidade fosse una, fechada sob um ciclo que se repete, e pior, culpa de todos os demais, quando essas realidades apresentadas são criadas apenas pelas suas próprias cabeças. É isto que me afasta de autores como <a href="https://virtual-illusion.blogspot.com/2016/06/viagem-ao-fim-da-noite-1932.html" target="_blank">Céline</a>, <a href="https://virtual-illusion.blogspot.com/2018/02/submissao-2015.html" target="_blank">Houellebecq</a> ou <a href="https://virtual-illusion.blogspot.com/2019/01/melancolia-sim-misantropia-nao.html" target="_blank">Bernhard</a>, e por isso tive de parar para refletir sobre a razão porque fui até ao fim deste livro de Aramburu.</div><div><br /></div><div>A trama roda à volta de Toni, um professor de filosofia do secundário, em volta dos 50, que decide marcar a data da sua morte para dali a um ano. O relato centra-se sobre esse ano que falta percorrer até chegar a engolir a cápsula de cianeto, entretanto adquirida. Somos brindados com a toda a realidade de uma Espanha contemporânea, nomeadamente as questões da Educação e da Política, mas particularmente da retirada de poder aos homens em virtude da equalização de forças entre os sexos, tudo apresentado numa enorme torrente de histórias suportadas em inúmeros flashbacks sobre a juventude, os pais, as namoradas, a ex-mulher e o filho. Não existe matéria que Toni apresente que não seja má, que não tenha defeito, que não seja incorreta, imoral ou injusta. Tudo é visto do seu ponto de vista, como se ele fosse o centro do mundo, alguém a quem a realidade enganou, deixando-o sozinho face a todos os outros. Por isso, Toni está cansado e quer morrer. </div><div><br /></div><div>Um cenário destes só é suportável enquanto sátira. O ridículo a que Aramburu vota Toni — desde a sua boneca sexual, Tina, ao sanchesco amigo Patachula que vota Vox “só para lixar o pessoal” — é central para tornar a perversidade numa realidade compreensível. Aramburu usa o humor negro como estratagema para fazer passar muitas das suas críticas, mágoas, mas também reconhecimento destas novas realidades. A vantagem desta estratégia é que permite ambiguidade ao autor, não o colocando em nenhum lado da barricada, é cómico, mas é negro, mau, mas tem um racional, oferecendo assim espaço ao leitor para que se posicione.</div><div><br /></div><div>Dito isto, julgo que foi exatamente aquilo que me fez voltar continuamente ao livro. As críticas ácidas suportadas por situações tão ridículas que podiam ser não só verdadeiras, como até talvez justificadas. Porque debitadas enquanto histórias, aparentemente reais e causais, plenas de sentires, que chegam a obrigar-nos, em certos momentos, a empatizar com a personagem, e por isso na leitura corrente podem parecer plenas de razão e sentido, obrigando-nos a reflexão posterior para compreender que não. Que por mais doloroso que seja o mundo de cada um, essa dor nunca lhes poderá dar o direito de pisar o mundo do outro. </div><div></div><blockquote><div><i>“¿Para qué estrujarnos el cerebro si disponemos de máquinas provistas de inteligencia artificial? Mi pronóstico es negro, muy negro. Estos chavales terminarán vitoreando algún tipo de tiranía. Es lo habitual cuando las multitudes renuncian al cultivo de la mente crítica y delegan en una instancia superior la toma de decisiones. Menos mal que yo no estaré para verlo.”</i> </div></blockquote><blockquote><div><i>(...)</i> </div></blockquote><blockquote><div><i>“No hay mayor fatuidad que creerse inmortal en la memoria frágil de los hombres. Gloria al olvido, que siempre triunfa.”</i></div></blockquote><div></div><div><br /></div><div>Por fim, o livro não será para todos, o que facilmente se percebe pelas notas baixas no Goodreads. Diria mesmo que o livro será detestável para a maioria das mulheres. Todo o mundo, toda a crítica, é criado de um ponto de vista masculino, e a mulher é aqui um dos grandes alvos a abater, ainda que como digo o livro pretenda provocar a reflexão e evocar uma nova compreensão.</div><div><br /></div><div>O livro foi editado em Portugal pela D. Quixote com o título "O Regresso dos Andorinhões".</div>Nelson Zagalohttp://www.blogger.com/profile/13107799601113612022noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5429413.post-919828485756526962023-08-18T10:01:00.007+01:002023-08-24T10:59:34.640+01:00Histórias da Noite<p>Há algum tempo que não começava a ler um livro e a experiência não fluía tão perfeita, agarrando-me, e clamando por mim sempre que dele me desligava. A escrita de Mauvignier faz lembrar Proust no modo como estende as frases de modo lírico, mas simultaneamente causal, ativando o nosso desejo por querer saber mais, e assim não conseguir parar de ler. O tema é a narrativa clássica de crime e mistério do ataque, a meio da noite, a uma casa de família por um grupo de malfeitores. Mas a forma não segue o género, é antes literária em profundidade, com uma escrita elaborada e erudita que acaba por criar uma experiência de leitura muito particular.</p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjzkpTeAwYiRc7QWnqm0ihIfOULZW5421vZxLlbCSwcoR-Jp4nyqpXds2GP1E6ZCN28M2VawKQMzGrijWSiNGm2U8l7666JzKrpVssEZjfYgg6_uklyGqrXb9Iv3tR8G_Q8-TOAqduKrTKRvTEw3CBv-wJD6meeZ1Zr0zSEr3Y6h4rO0YXLqtCWuw/s1866/histoires.png" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1444" data-original-width="1866" height="496" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjzkpTeAwYiRc7QWnqm0ihIfOULZW5421vZxLlbCSwcoR-Jp4nyqpXds2GP1E6ZCN28M2VawKQMzGrijWSiNGm2U8l7666JzKrpVssEZjfYgg6_uklyGqrXb9Iv3tR8G_Q8-TOAqduKrTKRvTEw3CBv-wJD6meeZ1Zr0zSEr3Y6h4rO0YXLqtCWuw/w1000/histoires.png" width="640" /></a></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">Imagem da web, lido na versão digital no Kindle.</div><p><span></span></p><a name='more'></a>As personagens são apresentadas por dentro, Mauvignier cria uma descrição interior intensa de Patrice e Marion. A exposição das suas fragilidades é tão verosímil que se torna impossível não sentir uma enorme empatia. Já o mundo escolhido, a ruralidade da província francesa, garante um universo coeso pelo isolamento, assim como oferece um substrato mais humilde e honesto às personagens.<div><blockquote><i>"Il avait cru en rencontrant Marion que ce serait impossible entre eux, se demandant comment elle pouvait ne pas voir qu’ils n’avaient rien en commun, quand, au contraire, elle semblait heureuse de le trouver si différent, qu’elle avait même insisté en lui envoyant des images d’elle en expliquant, pleine d’espoir, qu’elle était en train de passer un diplôme et qu’elle pourrait travailler dans une imprimerie, alors que lui hésitait à lui parler de la ferme, de La Bassée, se demandant bien comment elle pouvait imaginer y trouver de l’intérêt, oui, très bien, avait-il osé, voyons-nous. Ils s'étaient rencontrés et la première fois elle avait ri - un peu trop, comme si elle avait tenu à le trouver drôle, lui, sachant trop bien qu’il ne l’était pas - et il était resté éberlué qu’elle veuille le revoir, qu’il passe une, puis deux, puis trois, puis quatre, plusieurs soirées en ville, allant après le restaurant jusqu’à partager une soirée au bowling, puis une autre au karaoke, et puis cet écart qu’il avait trouvé entre cette fille dont le dos portait un tatouage qu’il avait fini sinon par oublier du moins par négliger, car les nuits d’amour, quand il la prenait dans ses bras, dans l’obscurité des premières chambres, avaient tout transformé, et la rose meurtrie, les épines métalliques, tout ça, donc, avait fini par s’évanouir avec la lumière. Dans l’obscurité n’étaient restés que la chaleur et la douceur de la peau de Marion, son abandon, ses boucles créoles sur la table de chevet ; cet écart qu’il pressentait, il avait fini par l’oublier totalement ou par décider de ne pas le voir, ne cherchant pas à comprendre, car le plus important et le plus extraordinaire c’était qu’une femme de cette beauté et de cette intelligence s’intéresse à lui, non pas seulement pour une nuit, mais qu’elle lui parle de projet de vie, de mariage - c’est elle qui avait avancé le mot, qui avait osé le prononcer alors qu’il brûlait les lèvres de Patrice depuis des mois."</i></blockquote><p>O ponto fundamental do romance assenta no uso de frases longas que constroem parágrafos longos, que por sua vez Mauvignier utiliza para estender o suspense. Ou seja, aquilo que queremos saber vai sendo mantido em suspenso, porque vamos sabendo mais e mais coisas sobre as pessoas e os lugares. Por vezes, acontece um certo desespero porque queremos acelerar a leitura, e não queremos saber mais sobre aquela personagem ou aquele espaço. Mas na generalidade funciona bem, porque o autor tem uma capacidade impressionante de observar e descrever no detalhe muito do que passaria normalmente despercebido pelo enfoque apenas no enredo. Não será para todos, já que a trama que se esgotaria em 140 páginas num normal romance thriller, aqui é estendida por 640 páginas.</p><p>O livro foi selecionado para a <a href="https://thebookerprizes.com/media-centre/press-releases/the-international-booker-prize-2023-longlist-is-announced#:~:text=The%2013%20books%20on%20the,and%20critic%20at%20the%20New" target="_blank">Longlist 2023 do International Booker Prize</a>.</p></div>Nelson Zagalohttp://www.blogger.com/profile/13107799601113612022noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5429413.post-2089166390355823422023-08-16T12:48:00.005+01:002023-08-24T11:07:22.568+01:00" A Trilogia de Copenhaga" de Tove Ditlevsen<p>Tove Ditlevsen (1917-1976) foi uma das mais importantes escritoras da Dinamarca no século XX, tal como Sophia Andersen (1919-2004) foi em Portugal. Mas se Andersen tinha também raízes dinamarquesas, os estatutos sociais das suas famílias não poderiam ser mais opostos. Nascida numa família da classe operária, os pais de Ditlevsen estavam mais focados em empurrá-la para o primeiro que aparecesse disposto a casar e levá-la do que a educá-la. O seu principal legado são três pequenos livros de memórias romanceadas, escritas entre 1967–1971, só totalmente traduzidas para inglês em 2019 e publicadas num volume único pela Penguin, alcançando <a href="https://www.theguardian.com/books/2019/oct/16/the-copenhagen-tirlogy-by-tove-ditlevsen-review" target="_blank">reconhecimento</a> na <a href="https://www.nytimes.com/2021/01/26/books/review/tove-ditlevsen-copenhagen-trilogy.html" target="_blank">imprensa</a> internacional em 2020 e traduzidas para português em 2022 pelo João Reis. A sua escrita é lírica mas escorreita, centrada na compreensão psicológica de si através das suas atitudes, motivações e comportamentos.</p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi1XlhVuYBNitWGL34QByAoxeZoMlBpKvCymwCpM-gAO63QSBge4eIhWPKqRafPlfNAR4zGREc91JjIVg7HGRmDqMesSlAfLz5VjnaUpW7rpBfIEdnArIdMf60CLUXDvhbNjoEYSwknAMaVZlUAEfkRglFTJwinPWaeRJQwkCPeQmWgyKwOa7pNlg/s1426/Screenshot%202023-08-16%20at%2012.38.59.png" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1426" data-original-width="954" height="640" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi1XlhVuYBNitWGL34QByAoxeZoMlBpKvCymwCpM-gAO63QSBge4eIhWPKqRafPlfNAR4zGREc91JjIVg7HGRmDqMesSlAfLz5VjnaUpW7rpBfIEdnArIdMf60CLUXDvhbNjoEYSwknAMaVZlUAEfkRglFTJwinPWaeRJQwkCPeQmWgyKwOa7pNlg/h1000/Screenshot%202023-08-16%20at%2012.38.59.png" width="428" /></a></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">Edição portuguesa da D. Quixote com tradução de João Reis</div><p><b><span></span></b></p><a name='more'></a><b>Infância (1967)</b><p></p><p>É a primeira parte do volume, no qual ficamos a saber de onde proveio, o tipo de família e mundo que a moldou. Mas é especialmente relevante pelos aspetos formais através dos quais cruza a consciência de si enquanto criança e adulta. Ou seja, Ditlevsen vai saltando entre a primeira-pessoa da criança que foi, e a primeira-pessoa da adulta que era em 1967, oferecendo desse modo não apenas um acesso ao que foi, mas também à consciência que ganhou com a maturidade. A escrita funciona como uma dança entre as duas pessoas que enriquecem a experiência de leitura.</p><p></p><blockquote><i>"Os meus colegas acham-me imensa piada, e eu já me habituei ao papel de palhaça, do qual até retiro um prazer triste, porque, aliada à minha estupidez já profusamente confirmada, me protege da estranha maldade que manifestam com tudo o que é diferente."</i></blockquote><p></p><p><b>Juventude (1967)</b></p><p>O segundo livro é o menos atrativo do todo. A escrita continua profusamente direta, com Ditlevsen a não esconder nada do que sentiu em cada momento e por cada pessoa que foi conhecendo. Tão crua não sua necessidade por se emancipar do mundo raso de onde provinha, disposta a tudo para conseguir o que pretendia. O modo como apresenta a defesa da sua motivação artística aproxima-a totalmente do mundo defendido por Ayn Rand em "The Fountainhead" (1943). Vale tudo, pôr-se a si em primeiro e acima de todos os outros para que a sua arte possa chegar a ser reconhecida. Em sua defesa, Ditlevsen era uma adolescente de 16 anos, no vigor da idade, enfrentando o desespero da pobreza com que convivia, recorrendo a toda a força interior que conseguiu. Já Rand, limitou-se a pegar nessa energia criadora da adolescência para a transformar num modo de vida, sem nunca parar para empatizar com o outro.</p><p><b>Relações Tóxicas (1971)</b></p><p>O último livro funciona na perfeição como fechamento da trilogia, com Ditlevsen a debitar o seu trajeto mas a elevar ainda mais alto, algo que parecia impossível, o desvelar honesto e íntimo da sua pessoa. Quatro casamentos, duas filhas e uma relação intensa com opioides, tudo exposto com enorme naturalidade, a ponto de me obrigar a ir verificar se este último livro tinha mesmo sido publicado ainda em vida.</p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhbeJy7vRBM-e90cv6dEEaWiqE6sF7ZE26BNCauQ3iuYAC-WetF5ofPu8vC1GtaBe0MfD3ZTwGwQo0vhtLl2Ar1oZYS8PurnGdTeWp75z1NZVwLpPg99sBBORPaZiJfdQx9Ok8OySwX27GYorWqhsBPeLyRNeAalYl5OB_yQzXRUR1Ptiq4ppfcfw/s1200/ECgkY3iWsAAOV8n.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="900" data-original-width="1200" height="480" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhbeJy7vRBM-e90cv6dEEaWiqE6sF7ZE26BNCauQ3iuYAC-WetF5ofPu8vC1GtaBe0MfD3ZTwGwQo0vhtLl2Ar1oZYS8PurnGdTeWp75z1NZVwLpPg99sBBORPaZiJfdQx9Ok8OySwX27GYorWqhsBPeLyRNeAalYl5OB_yQzXRUR1Ptiq4ppfcfw/w1000/ECgkY3iWsAAOV8n.jpg" width="640" /></a></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">As edições inglesas, em volumes separados, publicadas pela Penguin em 2019</div>Nelson Zagalohttp://www.blogger.com/profile/13107799601113612022noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5429413.post-5618925640376456642023-08-13T14:01:00.002+01:002023-08-13T22:09:54.988+01:00A Era das Intuições<div>Eric Kandel ganhou o Nobel de Medicina em 2000 pelo seu trabalho na área da fisiologia da memória. Depois do prémio, resolveu escrever vários livros de divulgação, sendo este “The Age of Insight” (2012) um dos mais citados nomeadamente na área dos estudos da consciência (ex. <a href="https://virtual-illusion.blogspot.com/2023/06/sendo-eu-uma-ciencia-da-consciencia.html" target="_blank">Anil Seth</a>), pelo modo como relaciona os processos de consciência com os processos criativos. Dito isto, o livro é mais e menos, porque tenta fazer um dois em um, ao escrever toda uma primeira parte de enaltecimento à ciência criada na cidade de Viena, no início do século vinte, daí o subtítulo — “The Quest to Understand the Unconscious in Art, Mind, and Brain, from Vienna 1900 to the Present”; e uma segunda parte, dedicada à discussão da teorização científicia que suporta a existência da arte. A primeira parte é uma espécie de resposta, agradecimento, à oferta de cidadania da cidade após o Nobel, que tinha sido uma resposta de Viena ao facto de Kandel afirmar que o seu <a href="https://en.wikipedia.org/wiki/Eric_Kandel#Current_views_about_Vienna" target="_blank">Nobel não era austríaco, mas americano-judeu</a>. </div><div><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhDOeGJsYjBr2CUIe6Lj7PZAXCMHQ1c1vI81luLUXOSK-_k3vHPCxM5D8Mg1RVVuFAPeNg4RNOQUY22rCVCIv2UYJzzUo_RkMMdNIPyhD_a2fav03k6vF5YsYuRKzbA5epsFq_wLvz7pXRdtKOUUr1pRLTfoNw-ah1mtV7lJhNEYBQWR0BHQTmJTQ/s1579/kandel.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1579" data-original-width="1071" height="640" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhDOeGJsYjBr2CUIe6Lj7PZAXCMHQ1c1vI81luLUXOSK-_k3vHPCxM5D8Mg1RVVuFAPeNg4RNOQUY22rCVCIv2UYJzzUo_RkMMdNIPyhD_a2fav03k6vF5YsYuRKzbA5epsFq_wLvz7pXRdtKOUUr1pRLTfoNw-ah1mtV7lJhNEYBQWR0BHQTmJTQ/h1000/kandel.jpg" width="434" /></a></div><div><br /></div><div><span><a name='more'></a></span>O relato sobre os nomes que passaram por Viena é interessantíssimo, diria até mais do que o resto, uma espécie de história científico-artística dos processos cognitivos por detrás da criação artística, citando trabalhos de — Gustav Klimt, Ernst Gombrich, Oskar Kokoschka, Egon Schiele, Sigmund Freud, Arthur Schnitzler. Se Klimt aparece como centro da obra, abrindo e dando estampa à capa, eu diria que Gombrich é o elemento vital de toda a teorização, uma vez que é a partir dele que grande parte da discussão sobre a criatividade artística, e principalmente da criação de significado, emerge. Se já respeitava Gombrich antes, a história aqui trabalhada por Kandel acaba por me revelar que muitos dos grandes princípios que são hoje centrais nos estudos de arte, na semiótica e na comunicação foram primeiramente estudados e apresentados por Gombrich que acabaria por influenciar muitos que depois levariam a sua palavra até outras áreas, tais como Karl Popper, Carlo Ginzburg, Umberto Eco, Thomas Kuhn, ou David Bordwell.</div><div><br /></div><div>Os problemas surgem depois desta primeira parte, quando Kandel resolve utilizar o mesmo método, descrição histórica, para falar de conceitos sobre o consciente e não-consciente. Kandel evoca estudos e investigadores, das diferentes frentes — fisiológica, psicológica e filosófica — num sucedâneo que aproxima o trabalho mais de um carácter enciclopédico do que propriamente do livro narrativo. O livro acaba por nos entediar, tornando-se difícil de seguir, já que cada capítulo traz apenas mais uma perspetiva, outras pessoas, outros tempos, outras áreas, e pouco ou nada se trabalha no entrosamento entre tudo o que já foi dito e tudo o que ainda se quer dizer. Vão sendo apresentadas algumas conclusões, mas sem que justifiquem toda a listagem de argumentário.</div><div><br /></div><div>Por fim, e talvez o menos bom de tudo, é que Kandel não consegue nunca desligar da sua veia mais empírica, criada no mundo físico da fisiologia, mas que não pode ombrear em método a abordagens mais fenomenológicas, como as da filosofia. Os estudos da consciência continuam distantes de um quadro metodológico definido. Nesse sentido, não se pode ignorar, e não é ignorada, o enorme mundo conceptual da filosofia da consciência. Aliás, Kandel discute bastante a própria psicanálise, reconhecendo os seus contributos e os de Freud para a compreensão do não-consciente. Mas no resto, Kandel limita excessivamente a sua análise a uma ideia positivista da ciência, nomeadamente quando pretende formular as suas conclusões a partir de um quadro universalista do ser-humano. Por mais que eu me aproxime desta visão, não posso deixar de aceitar a crítica emanada das ciências sociais sobre a o poder e impacto da cultura naquilo que faz de nós o que somos em cada lugar e em cada momento. </div><div><br /></div>Nelson Zagalohttp://www.blogger.com/profile/13107799601113612022noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5429413.post-53753602496703648162023-07-22T11:10:00.005+01:002023-07-22T11:21:44.011+01:00No interior da mente de uma juíza“<b><i>A Decisão</i></b>” (2022), de Karine Tuil, apresenta uma primeira parte intensa em diálogos e introspeções que poderia facilmente ser transformada numa série de televisão de trocas acesas entre juízes e advogados. A segunda parte diverge, as discussões hipotéticas e potenciais passam aos atos, e tudo se transforma numa larga tragédia grega que nos agarra e impede de parar de virar as páginas. A autora trabalha muito habilmente a trama para nos enredar e suspender, mas não só, trabalha ainda melhor o questionamento interior das personagens, colocando-nos a assistir a tudo o que acontece na primeira fila desse espetáculo interior. Cria uma experiência que se consome sofregamente, com medo de acabar depressa demais, porque não queremos abandonar nenhuma daquelas personagens. A cereja colocada sobre tudo isto não enaltece, antes se desfaz numa subtil perceção de artificialismo, escolhas autorais certeiras para produzir emoção, ainda que possamos sem problema retirar a cereja para o lado, ou seja, suspender a descrença e deliciar com tudo o resto que a autora nos entregou.<div><br /><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhWir0qDeYaYa84YtVSvj_IOSCL3RJ7UFB3DszR7tIkVzZcQO8y1eM9ny4aZdFOIDbohdRqYJ59k8m8GjsJANCPsfDP4PA0PwMrazqLNah1FWP5RGVhdXF3mx2VH5LDzE7oIbqy4MxLbQFrzvCIAQ1oPHgzUi_3XMUZg9uvPSz0GfOQCwLbkK2r1Q/s1813/20230722_093746.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1813" data-original-width="1794" height="400" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhWir0qDeYaYa84YtVSvj_IOSCL3RJ7UFB3DszR7tIkVzZcQO8y1eM9ny4aZdFOIDbohdRqYJ59k8m8GjsJANCPsfDP4PA0PwMrazqLNah1FWP5RGVhdXF3mx2VH5LDzE7oIbqy4MxLbQFrzvCIAQ1oPHgzUi_3XMUZg9uvPSz0GfOQCwLbkK2r1Q/h800/20230722_093746.jpg" width="396" /></a></div><div><div><br /></div><div>O assunto de fundo é a vida de uma juíza que pertence à principal equipa francesa de instrução dos processos antiterroristas, situado temporalmente entre o ataque ao jornal Charlie Hebdo (<a href="https://fr.wikipedia.org/wiki/Attentat_contre_Charlie_Hebdo" target="_blank">12 mortos</a>) e à sala de espétaculos do Bataclan (<a href="https://fr.wikipedia.org/wiki/Attentats_du_13_novembre_2015_en_France" target="_blank">90 mortos</a>). Somos colocados dentro da cabeça dessa juíza que todos os dias tem de tomar decisões quanto a manter presos ou soltar potenciais terroristas.</div></div></div>Nelson Zagalohttp://www.blogger.com/profile/13107799601113612022noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5429413.post-87730442211286297522023-07-22T10:40:00.004+01:002023-07-22T11:06:32.703+01:00Biografia de Søren KierkegaardQuis ler “<b>Philosopher of the Heart: The Restless Life of Søren Kierkegaard</b>” (2019) porque tentei várivas vezes ler os livros de Kierkegaard, mas sem sucesso. A escrita de Kierkegaard é demasiado enrolada, rebuscada, escamada. Os temas demasiado fantasistas repletos de dor e sofrimento existencial entremeados por discussões religiosas. <div><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhg6ZDfJgcHDtEzDnOXGBCsX8O10Q-HFg7MO-Hd-TfkjOa24yxBPjtbShvgVDhKg13zmrShxJTgOxiumb_XYysmsPbURtlq8AijIYxKuO66MnNcFYG-aXoLO3SV9A1J6jFUW0nPYQWYw2JOcJhOzFaxAYxswPkgouD96uEmTxFs-2-djJEV6Nkhfw/s1759/20230715_143210.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1728" data-original-width="1759" height="393" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhg6ZDfJgcHDtEzDnOXGBCsX8O10Q-HFg7MO-Hd-TfkjOa24yxBPjtbShvgVDhKg13zmrShxJTgOxiumb_XYysmsPbURtlq8AijIYxKuO66MnNcFYG-aXoLO3SV9A1J6jFUW0nPYQWYw2JOcJhOzFaxAYxswPkgouD96uEmTxFs-2-djJEV6Nkhfw/w800/20230715_143210.jpg" width="400" /></a></div><div><br /></div><div>Contudo Kierkegaard é uma das referências pioneiras do existencialismo, mais particularmente da melancolia, o que me leva encontrar constantes referências ao seu trabalho. O livro de Clare Carlisle desenvolve uma biografia seguindo um registo próximo da escrita de Kierkegaard, que será excelente para quem leu avidamente o autor, mas para outros, como eu, acaba por não servir de ponte para o trabalho, mantendo tudo igualmente à distância. Interrogava-me no final se o problema estava na escrita e religiosidade do autor, ou se num desfasamento identitário promovido pela idade em mim, isto porque senti o mesmo amargo que senti no ano passado com “<a href="https://www.goodreads.com/review/show/3885770814" target="_blank">Nos Cumes do Desespero</a>” (1933) de Emil Cioran, uma desconexão total. Palavras belas de enaltecimento total do interior para questionar tudo e todos teriam sido a minha delícia com 20 anos, hoje não me dizem nada. Tivesse Carlisle realizado um trabalho documental próprio, como fez Sarah Bakewell com <a href="https://virtual-illusion.blogspot.com/2021/09/na-esplanada-do-existencialismo.html" target="_blank">o existencialismo de Heidegger e Sartre</a> e talvez tivesse adorado, mesmo que me tivesse ajudado a desistir de uma vez desses autores.</div>Nelson Zagalohttp://www.blogger.com/profile/13107799601113612022noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5429413.post-68440694276505978952023-07-16T19:41:00.007+01:002023-07-17T21:33:50.906+01:00Exalação, Ted Chiang<p>Neste segundo livro, "<b><i>Exhalation"</i></b> (2019), depois de “<a href="https://virtual-illusion.blogspot.com/2020/09/da-ficcao-cientifica-filosofia.html" target="_blank">Stories of Your Life and Others</a>” (2002), podemos voltar a perscrutar o brilho da mente de <a href="https://en.wikipedia.org/wiki/Ted_Chiang" target="_blank">Ted Chiang</a> no laborar de design fiction, ou seja, na criação de cenários credíveis de experimentação conceptual. Algumas das ideias estão centradas em problemas contemporâneos criados pelos média digitais, tornando as histórias uma espécie de variação do universo <a href="https://en.wikipedia.org/wiki/Black_Mirror" target="_blank">Black Mirror</a>. Outras, estão fundamentadas em conceitos da ciência, explorando metáforas que nos fazem questionar o nosso corpo, a nossa mente e a nossa relação com as outras espécies. Estes dois temas juntam as melhores histórias do livro. Depois temos duas histórias cliché, uma de viagens no tempo e outra de multiversos, que eu tendo, nos dias de hoje, a considerar mais fantasia do que ficção científica. Na última, Chiang diverte-se a explorar como funcionaria uma ciência baseada no criacionismo.</p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgHMG2FU1obmhZ2dZ44oJTqVrhg93jI-Fvx_A2qxRMeuaC2zcT3Ka7ymHIrB1Ik-b9qlZ794zhXtZgdJ0_SJnYitjncjThWX0gsC6Zruj-jLhAPK9II9sm-NsAhSZkcIlJbLZiUKVcfwCd77oIX7MqsQGK_BLnYkJlAmq0L3OPuDdD_d4gFWWxRzA/s1779/20230708_141114.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1446" data-original-width="1779" height="325" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgHMG2FU1obmhZ2dZ44oJTqVrhg93jI-Fvx_A2qxRMeuaC2zcT3Ka7ymHIrB1Ik-b9qlZ794zhXtZgdJ0_SJnYitjncjThWX0gsC6Zruj-jLhAPK9II9sm-NsAhSZkcIlJbLZiUKVcfwCd77oIX7MqsQGK_BLnYkJlAmq0L3OPuDdD_d4gFWWxRzA/w800/20230708_141114.jpg" width="400" /></a></div><p><span></span></p><a name='more'></a>Ficam as histórias ordenadas pela minha preferência, com notas de 1 a 5:<p></p><p><br /></p><p><b>Estilo <i>Black Mirror</i></b></p><p>1 - "<b><i>The Lifecycle of Software Objects</i></b>" (5)</p><p><i>Lifecycle</i> fala-nos de um grupo de "digients" (entidade digitais), instâncias inteligentes com formas antropomorficas de animais que populam um mundo virtual, criando uma espécie de cruzamente entre Animal Crossing e Second Life. Os jogadores/utilizadores desenvolvem relações de tutoria com os digients, que devem evoluir pela experiência ao longo de anos. A história constitui-se pelos problemas complexos que o tema convoca, nomeadamente o tipo de relação desenvolvida entre humanos e digients, tanto no plano moral, como educativo, financeiro e sexual.</p><p>2 - "<b><i>The Truth of Fact, the Truth of Feeling</i></b>" (5)</p><p>Como um sistema de log audiovisual 24/24 pode mudar aquilo que somos ao transformar o modo como criamos e acedemos a memórias do passado.</p><p>3 - "<b><i>Dacey's Patent Automatic Nanny</i></b>" (4)</p><p>A inversão do efeito da cuidadora robótica.</p><p><br /></p><p><b>Baseadas em Ciência</b></p><p>4 - "<b><i>Exhalation</i></b>" (5)</p><p>O que mais gostei nesta história foi sem dúvida o modo como Chiang metaforizou o funcionamento da mente humana num sistema de pequenas peças mantidas em posições que geram padrões através do ar que as atravessam. É brilhante.</p><p>5 - "<b><i>The Great Silence</i></b>" (4)</p><p>Pequena história que nos obriga a refletir sobre a relação que desenvolvemos com as outras espécies neste planeta.</p><p>6 - "<b><i>What's Expected of Us"</i></b> (3,5)</p><p>Interessante, mas sobre um assunto que entretanto a ciência conseguiu perceber não ser bem aquilo que parecia. Falo do processo de antecipação que o cérebro parece realizar aos nossos comandos conscientes.</p><p><br /></p><p><b>Fantasia disfarçada de Ciência</b></p><p>7 - "<b><i>The Merchant and the Alchemist's Gate</i></b>" (3,5)</p><p>Para muitos, considerada a melhor história do livro. Está muito bem escrita, mas não passa de mais um portal do tempo aqui focado na exploração das consequências do determinismo.</p><p>8 - "<b><i>Anxiety Is the Dizziness of Freedom</i></b>" (3,5)</p><p>Portal de multiversos que permite contactar outras versões de nós mesmos.</p><p>9 - "<b><i>Omphalos</i></b>" (4)</p><p>Como seria uma ciência criada por Criacionistas</p>Nelson Zagalohttp://www.blogger.com/profile/13107799601113612022noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5429413.post-65031531980253760132023-07-15T10:48:00.008+01:002023-07-15T10:57:18.903+01:00I Am, I Am, I Am<p>Humano. Feminino. Maternal. “Estou Viva, Estou Viva, Estou Viva”. <a href="O’Farrell" target="_blank">Quarto livro</a> de Maggie O’Farrell que li nos últimos 2 anos, o que evidencia o quanto me apaixonei pelo seu trabalho desde que li “<a href="https://virtual-illusion.blogspot.com/2022/01/hamnet-2020-de-maggie-ofarrell.html" target="_blank">Hamnet</a>”. A sua escrita não é meramente bela, é dotada de uma capacidade descritiva particular pelo modo como produz parágrafos longamente fluídos descrevendo ações a partir dos seus efeitos psicológicos. Tendo a compará-la, ainda que cada um na sua particularidade, a <a href="https://virtual-illusion.blogspot.com/search/label/franzen" target="_blank">Jonathan Franzen</a> e <a href="https://virtual-illusion.blogspot.com/search/label/zadie">Zadie Smith</a>. O conteúdo do que cada um destes tende a expressar não podia ser mais distinto, nomeadamente O’Farrell não é comparável em erudição, mas o seu realismo junto à pele é bastante mais cortante. O modo é tão relevante a ponto de neste livro de memórias discordar várias vezes da sua definição do mundo, mas a intensidade honesta e humilde da forma usada apaga toda a distância que existe entre esse seu mundo e o meu.</p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgw083yHX4nsfdssPyOsoMN4J2F_WAnE_uj2X4SWPjVn8D23rR_QP1ccUrrR-uKbGCydq0BwW-5S9Ml9p8f2TEVuDIHPl2jry_sioUTy0R8JPaJesd3C2iJhf5oFgfkYB0XdzgC_ljP06eWlpf3n_H8IJzdx2JCEUAlr-pz3U444_tzMtdBHyYCUA/s2082/20230715_104154.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1844" data-original-width="2082" height="354" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgw083yHX4nsfdssPyOsoMN4J2F_WAnE_uj2X4SWPjVn8D23rR_QP1ccUrrR-uKbGCydq0BwW-5S9Ml9p8f2TEVuDIHPl2jry_sioUTy0R8JPaJesd3C2iJhf5oFgfkYB0XdzgC_ljP06eWlpf3n_H8IJzdx2JCEUAlr-pz3U444_tzMtdBHyYCUA/w800/20230715_104154.jpg" width="400" /></a></div><p><span></span></p><a name='more'></a>Este é um livro de memórias incomum. O mote que suporta o contar das peripécias de uma vida não assenta na cronologia, nas conquistas ou amores, mas antes em 17 momentos da vida de O’Farrell em que esta quase morreu. Só por si, serviria a tragédia de modo intenso, mas nem sempre é dela que nos fala a autora. Aliás, chegado ao final percebe-se o porquê deste enfoque que tem mais que ver com a condição de doença que atacou O’Farrell aos 8 anos, uma encefalite viral que transformaria por completo todo o seu sistema de perceção que afeta até hoje o seu controlo motor. <p></p><p>Apesar de ser um livro de memórias, “Estou Viva, Estou Viva, Estou Viva” está escrito como romance. Não se segue a cronologia, mas o fluxo dramático necessário ao contar da história, e a produção da experiência desejada pela autora. Por isso somos levados com ela, não apenas pelas descrições por vezes bizarras da condição de saúde, mas particularmente pelo modo encantatório como nos seduz pela sua escrita, do entrosar de factos em ritmos e cadências que nos envolvem. O’Farrell fala de si, mas o foco está situado fora de si, na sua relação com a família, em particular com os seus filhos, e depois a mãe e o marido. </p><p>O’Farrell não se coíbe de tentar interpretar-se a si mesma, procurando entender como a doença lhe ofereceu mais do que uma segunda oportunidade, uma nova forma de estar e viver, e como isso lhe providenciou maior clarividência, nomeadamente menor temor e maior capacidade de correr riscos. Mas simultaneamente, e talvez inadvertidamente, faz trespassar a intensidade com que a maternidade impactou e transformou a pessoa que a autora é hoje.</p>Nelson Zagalohttp://www.blogger.com/profile/13107799601113612022noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5429413.post-51976937712610410562023-07-08T08:19:00.006+01:002023-07-08T08:42:13.047+01:00Their Eyes Were Watching God (1937)<p>"De Olhos Pousados em Deus" é uma obra de 1937, e a principal ficção de Zora Neale Hurston, uma autora hoje reconhecida pelo seu <a href="https://virtual-illusion.blogspot.com/2023/04/humanamente-possivel-2023.html" target="_blank">legado humanista</a>. Formou-se pelas Universidades de Howard, Barnard e Columbia, onde realizou estudos graduados e pós-graduados em Antropologia, ao lado de Margaret Mead. Hurston tornou-se numa força cultural pelo modo como <a href="https://www.youtube.com/watch?v=IqLOKDxrdww" target="_blank">usava a etnografia para compreender a comunidade afro-americana</a> e depois trasladava esse conhecimento para a sua produção criativa e ativismo cultural, transformando-se no rosto de vários movimentos, nomeadamente o <a href="https://en.wikipedia.org/wiki/Harlem_Renaissance" target="_blank">Harlem Renaissance</a>.</p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg3H1qId-vBtwXMTKiJWVzodAFuR2l2ZBtc5Na8Z9OHJr-FFTKtHicJhRfy0yj1JkXQQ-y6EJT4PZ0Jb3MO5QTI35fJqsZ9O_gv22nM3mqcTvl9kEbUmLSQlUggq7-rGSskThZuSD8bh8jq2OjCK6Ike31XEdiN3qRhkTIDCEmoR4Yj60OPgo6sfA/s1748/20230625_204426-1.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1694" data-original-width="1748" height="388" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg3H1qId-vBtwXMTKiJWVzodAFuR2l2ZBtc5Na8Z9OHJr-FFTKtHicJhRfy0yj1JkXQQ-y6EJT4PZ0Jb3MO5QTI35fJqsZ9O_gv22nM3mqcTvl9kEbUmLSQlUggq7-rGSskThZuSD8bh8jq2OjCK6Ike31XEdiN3qRhkTIDCEmoR4Yj60OPgo6sfA/w1000/20230625_204426-1.jpg" width="400" /></a></div><p><span></span></p><a name='more'></a>"De Olhos Pousados em Deus" apresenta claras evidências da formação de Hurston, desde logo pelo modo cativante como usa a linguagem efetiva das comunidades negras da Flórida. O livro é curto, mas o suficiente para em poucas cenas se traçarem as vivências das comunidades, famílias e principalmente das mulheres. O foco assenta assim não apenas na análise da cor de pele, mas essencialmente do papel da mulher. Neste sentido, Hurston cria um grande livro do feminismo, ao ilustrar a vida de uma regular mulher negra que decide atravessar a vida em busca do prazer interior. Hurston expõe as forças pesadas da tradição e crença que oprimem o ser-humano, e dá conta da energia necessária para ultrapassar essas forças.<p></p><p>O mais impressionante deste registo é que dando conta de uma personagem que luta contra o <i>status quo</i>, não a apresenta como típica heroína, como personagem sobredotada que vê o que os outros não vêem. A protagonista é como toda e qualquer mulher, que simplesmente rejeita dar-se por vencida, rejeita cruzar os braços, disponibilizando-se sempre para continuar a seguir novos caminhos, por mais cautelas e medos que lhe sejam apresentados. Não é o típico espírito inquebrantável e desafiador, é antes o espírito humano que nos imbui a todos, mas que a maior parte de nós acaba por optar por auto-reprimir. É inevitável ler na protagonista traços e ideais que nortearam a vida da própria Hurston.</p><p>Em termos formais, o texto apresenta alguns problema, nomeadamente porque os diálogos estão imensamente bem conseguidos, nota máxima para o coloquialismo a roçar o dialecto. Contudo, a componente do narrador, com a tentativa de produzir algum lirismo, acaba por ser um contraponto muito fraco, capaz de cortar a nossa imersão por breves momentos, não admirando <a href="https://lithub.com/the-first-reviews-of-their-eyes-were-watching-god-ranged-from-positive-to-downright-hostile/" target="_blank">algumas críticas mais fortes na época</a>.</p><p>Documentário recomendado: "<a href="https://www.pbs.org/wgbh/americanexperience/films/zora-neale-hurston-claiming-space/" target="_blank">Zora Neale Hurston: Claiming a Space</a>" (2023), PBS</p>Nelson Zagalohttp://www.blogger.com/profile/13107799601113612022noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5429413.post-12035643293273917982023-07-02T20:02:00.006+01:002023-07-02T20:04:05.065+01:00Livros não terminadosDois livros que queria muito ler, mas que não consegui terminar depois de perceber que não tinham nada de novo para oferecer. Ficam duas notas breves sobre os mesmos:<div><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhmMvECxBEiYaZwHEI0kQnBNnmynfmBdDsBJn9nLfYjrqyewMfS1cKvIHOUb30K-Cvb9rIHYD1aycLjbBnDJi1Ch5AFVDO3rDHrMXGLZskYb1TmZh37vQCWLTNLy602OMAWo07iiT0h8RA4iSITIgCq5l68kghcB2RNSbsxRKyVKwczRXZ7eoYeQg/s1322/covers.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="998" data-original-width="1322" height="484" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhmMvECxBEiYaZwHEI0kQnBNnmynfmBdDsBJn9nLfYjrqyewMfS1cKvIHOUb30K-Cvb9rIHYD1aycLjbBnDJi1Ch5AFVDO3rDHrMXGLZskYb1TmZh37vQCWLTNLy602OMAWo07iiT0h8RA4iSITIgCq5l68kghcB2RNSbsxRKyVKwczRXZ7eoYeQg/w640-h484/covers.jpg" width="640" /></a></div><div><br /><span><a name='more'></a></span><div><br /></div><div>"<b><i>Culture: The Story of Us, From Cave Art to K-Pop</i></b>" (2023) de Martin Puchner</div><div><br /></div><div><div>O livro é apresentado como "A New World History" (na edição britânica), mas não foi isso que senti. Puchner usa argumentos, usados por outros antes, de que vários historiadores têm afirmado a cultura como pertença de países e geografias. Mas o facto de Jared Diamond construir uma visão do mundo a partir da Geografia, não quer dizer que ele defenda que a cultura de cada uma dessas zonas era estanque. Não digo que não tenham existido historiadores, ao longo da História, a usar dessa abordagem, tentando justificar que a Antiga Grécia, Roma, a Europa, etc. eram lugares especiais. Mas em essência, e na atualidade, é impossível olhar à História fechados numa bolha dessas.</div><div><br /></div><div>Ou seja, Puchner defende aqui que a Cultura é fruto da fusão e transmissão de informação entre diferentes culturas. Ora, isso é a visão atual do mundo do conhecimento visto pelas Ciências Cognitivas. Evoluímos pelo encontro com a diferença. Não é por acaso que a União Europeia investe milhões na preservação das línguas e dialetos do continente Europeu, porque sabemos que quanto mais diversos formos mais ricos culturalmente seremos. Por isso, a questão é: era preciso Puchner escrever um livro sobre isto em 2023? O que teria sido de Roma sem todo a cultura helénica? O que teria sido do helenismo sem a Babilónia? E o que teria sido do Renascimento Italiano sem a cultura helénica preservada pelas universidades do norte de África e retraduzidas para latim em Toledo? E do renascimento português sem o Brasil, África, Goa ou Japão? Assim, fazer um livro em que se conta um conjunto de histórias superficiais ao longo dos últimos milénios para suportar essa ideia parece-me uma perda de tempo, porque não acrescenta nada ao que já sabemos.</div><div><br /></div><div>Percebo que Puchner não escreveu este livro para interessados em História, ou Cultura, menos ainda em Ciência, mas para quem tende a ignorar tudo isso, daí o piscar de olhos à K-Pop na edição americana. Puchner quer demonstrar que nem a direita tem razão em falar de singularidade cultural de nações, nem a esquerda tem razão em querer proibir a apropriação cultural. Mas quem precisaria de ler o livro para poder compreender o teor dessa mensagem não o vai ler, por isso acaba por, em minha opinião, ser uma missão votada ao fracasso.</div><div><br /></div><div><br /></div><div>"<b><i>The Patterning Instinct: A Cultural History of Humanity's Search for Meaning</i></b>" (2017) de Jeremy Lent</div></div></div><div><br /></div><div><div>Queria muito ler este livro pelo título, mas ele é profundamente enganador. O instinto de padronização é algo que nos define enquanto humanos, define o modo como olhamos a realidade, a reduzimos a padrões e registamos como novos factos, memórias e conhecimento. Mas daí a usar esse conceito para discutir a evolução histórica ao longo dos séculos, parece-me bastante desinteressante. O processo cognitivo é poderoso e dá conta do modo como os humanos funcionam, mas é um processo. Os processos contaminam o modo como se constroem conteúdos, ideias, mas daí a tentar distinguir toda a história humana em função de um processo vai um salto grande. Nomeadamente porque não existem outras espécies para podermos comparar diferentes formas de processar a informação. També, porque não mudámos este processo ao longo do tempo, somos assim há alguns milhares de milénios. Por isso, não havendo como distinguir o processo de qualquer outro, sendo ele o único meio de aceder, torna-se inconsequente a tentativa de traçar uma história por meio deste processo.</div><div><br /></div><div>Mas o maior problema acaba por sugir na superficialidade do que se discute e na fraca estrutura de todo o livro. Os tópicos vão surgindo uns atrás dos outros, com hierarquia conceptual pouco definida, sentindo-se saltos informativos por vezes difíceis de justificar.</div><div><br /></div><div>Falta rigor, falta método, falta profundidade. Percebe-se porquê quando vemos que a formação de base do autor está distante dos assuntos que tenta aqui abordar. Por outro lado, Lent apresenta-se como um filantropo interessado na melhoria da humanidade, agora que vive de rendimentos feitos com a venda de empresas nos tempos áureos da internet, mas deveria ter procurado aprender um pouco mais sobre as metodologias de construção de novo conhecimento.</div></div>Nelson Zagalohttp://www.blogger.com/profile/13107799601113612022noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5429413.post-35903949368607679352023-07-01T17:57:00.003+01:002023-07-01T18:02:38.300+01:00O Ponto Azul-Claro (1994) Carl SaganVoltar a ler Carl Sagan, em particular ouvir, aproveitando o facto de nos ter deixado uma <a href="https://www.scribd.com/audiobook/349820282/Pale-Blue-Dot-A-Vision-of-the-Human-Future-in-Space" target="_blank">versão áudio do livro “Pale Blue Dot”</a>, é por si apenas toda uma experiência. Há muitos anos que não o lia. Os seus livros “The Demon-Haunted World”, “The Dragons of Eden”, “Contact”, mas muito particularmente “Cosmos” tornaram-se parte daquilo que hoje sou. Não tinha ainda lido “Pale Blue Dot”, considerado uma espécie de sucessor de “Cosmos”, mas quanto mais o tempo foi passando menos o considerava adequado ler. Sentia o receio de alguma desilusão. As leituras de fim de adolescência raramente são para repetir, nomeadamente se nos marcaram tão indelevelmente. Por isso, não me surpreendeu não ter “voado” com “Pale Blue Dot”, ainda que tenha andado muito perto. Já não vivo sob o manto da inocência de outro tempo, em que a crença otimista no humano dependia de acreditar na nossa capacidade para transformar o mundo. Sagan dá-nos uma lição de humildade, mas simultaneamente de enorme ambição, o que passado 30 anos sobre o livro, e analisada a evolução da nossa espécie nesse tempo, torna muito difícil de aceitar.
<p></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiV5C2UHpgPU-vX2TToVNJTjg0u6jbvWjopCaOFD_NMQ1017Zj4yZm7vwYzHFxjYfOmNfKOWItQyT1Cr1HThBI-baO1ueSHqOUPFWvkVaMg8Ywyp3MDfxZb3HCDcVZbNc03zq7v4JRXBD_LMnXEcV2Ay1mhNppKdGA_AvzCWnjhxkqtBB_kHuhQ5A/s2023/20230625_204343-1.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1788" data-original-width="2023" height="354" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiV5C2UHpgPU-vX2TToVNJTjg0u6jbvWjopCaOFD_NMQ1017Zj4yZm7vwYzHFxjYfOmNfKOWItQyT1Cr1HThBI-baO1ueSHqOUPFWvkVaMg8Ywyp3MDfxZb3HCDcVZbNc03zq7v4JRXBD_LMnXEcV2Ay1mhNppKdGA_AvzCWnjhxkqtBB_kHuhQ5A/w800/20230625_204343-1.jpg" width="400" /></a></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><span style="font-family: courier;">Versão portuguesa pela Gradiva. A versão audio inglesa apresenta apenas os primeiros 5 capítulos lidos por Carl Sagan, os restantes capítulos perderam-se, tendo sido lidos por Ann Druyan para uma nova versão em 2017.</span></div><p></p>Continua a valer pela beleza das suas descrições, e principalmente das suas metáforas. Continua a valer pela enorme paixão que transmite. Mas é inevitável sentir que se tornou datado.
<div><br /></div><div>Sobre o Ponto Azul-Claro, fica o link para a <a href="https://solarsystem.nasa.gov/resources/536/voyager-1s-pale-blue-dot/" target="_blank">missão Voyager</a>, onde podem encontrar toda a informação base que suporta este livro.</div>Nelson Zagalohttp://www.blogger.com/profile/13107799601113612022noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-5429413.post-87363870420297574542023-07-01T09:33:00.008+01:002023-07-01T09:47:24.183+01:00 Black Mirror, Temporada 6, 2023<p>É a temporada menos conseguida, nomeadamente porque 2 episódios não possuem qualquer relação com o conceito <a href="https://en.wikipedia.org/wiki/Black_Mirror" target="_blank"><i>Black Mirror</i> </a>(4º "Mazey Day" e 5º "Demon 79"), enquanto outros 2 ( 2º "Loch Henry" e 3º "Beyond the Sea") usam o conceito apenas como veículo para se focar noutros problemas, restando um episódio, 1º "Joan Is Awful", que se mantém totalmente fiel ao conceito. Pode pensar-se quem já tudo foi dito nas temporadas anteriores e por isso a série teve de seguir em frente, algo que não faz sentido porque o tema é simplesmente infinito. Quando muito, podemos dizer que <a href="https://en.wikipedia.org/wiki/Charlie_Brooker" target="_blank">Charlie Brooker</a> se cansou do tema, preferiu voar para outras paragens, mas devia ter assumido isso mesmo e criado uma nova série.</p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhDux_ZqSdS5TqmlNoy455xd7bGAm7ESQThWwtiisXzdInVZY07ddPIdU0p5ux8ubFN6o4l6Wr4KHYs0q_pZu7ggRMjnulCrc8EbyqfvSpTq349s_Ym7KVNCNVTJAWYfjTqw427gAzl30DGZqx-R2Y1om5rJF3igUykvJySevLeIlxegltJ8FjERA/s1000/black-mirror-season-6-review.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="439" data-original-width="1000" height="280" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhDux_ZqSdS5TqmlNoy455xd7bGAm7ESQThWwtiisXzdInVZY07ddPIdU0p5ux8ubFN6o4l6Wr4KHYs0q_pZu7ggRMjnulCrc8EbyqfvSpTq349s_Ym7KVNCNVTJAWYfjTqw427gAzl30DGZqx-R2Y1om5rJF3igUykvJySevLeIlxegltJ8FjERA/w1000/black-mirror-season-6-review.jpg" width="640" /></a></div><p><span></span></p><a name='more'></a>Muito rapidamente, o conceito por detrás de Black Mirror assenta no uso de especulação científica centrada nos efeitos das tecnologias de comunicação, em particular dos média. A própria designação da série, dá conta dos ecrã negros a partir dos quais acedemos à realidade mediada. Sobre isto, Brooker trabalha cada episódio com base no suspense que cria a partir de pequenas alterações do dia-a-dia que servem para depois apresentar a ideia central a partir de uma reviravolta na história, seguindo de forma decalcada o modelo narrativo criado por Rod Serling com <a href="https://en.wikipedia.org/wiki/The_Twilight_Zone_(1959_TV_series)" target="_blank">The Twilight Zone</a>.<p></p><p><b>Black Mirror em 1º grau</b></p><p>"Joan Is Awful", segue as linhas mestras do conceito Black Mirror, e apresenta-nos um mundo em que a IA e os dados pessoais se misturam para dar corpo à criação de conteúdos personalizados e assim garantir a verdadeira experiência única a cada espectador de um serviço de stream. O episódio dá conta dos problemas que decorrem da exposição da vida pessoal, do modo como as empresas esperam poder vir a rentabilizar esses conteúdos, mas também do potencial evolutivo dos próprios personagens a partir do momento em que ganham consciência de si.</p><p style="text-align: left;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjdX1uQl2NtCEh5AreEGF85PJO4ScXDudmJzAUeNXZ-mCwgrMi6WHBmMPBHWMfm99rQD2VEL5abRbXkvCgscX2A5XM4cUC5jzATO1djL-Af0FMZck2j250slcFbowWTmjMUhWyItEmnKlW7YO8h1BTRyH84wOPOkSxhyVQIrJDH6tM2DuvBW2mzEw/s1422/AAAAQUAVL37HF-UaYOB4uFjdaKMyziCQ1rM6xRdxrsHfe8Vv77nyDrmZF5pZOKqgliWAvwjPdqKCmsHhjEO642mXjMjzDXLK2TRIE5M8h0XC4w7eFtwFE10ZQtPyAITnoTDu03X16N9bQIcV8pGax1ngI8EREj8.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em; text-align: center;"><img border="0" data-original-height="750" data-original-width="1422" height="338" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjdX1uQl2NtCEh5AreEGF85PJO4ScXDudmJzAUeNXZ-mCwgrMi6WHBmMPBHWMfm99rQD2VEL5abRbXkvCgscX2A5XM4cUC5jzATO1djL-Af0FMZck2j250slcFbowWTmjMUhWyItEmnKlW7YO8h1BTRyH84wOPOkSxhyVQIrJDH6tM2DuvBW2mzEw/w1000/AAAAQUAVL37HF-UaYOB4uFjdaKMyziCQ1rM6xRdxrsHfe8Vv77nyDrmZF5pZOKqgliWAvwjPdqKCmsHhjEO642mXjMjzDXLK2TRIE5M8h0XC4w7eFtwFE10ZQtPyAITnoTDu03X16N9bQIcV8pGax1ngI8EREj8.jpg" width="640" /></a></p><p><b>Black Mirror em 2º grau, horror-crime em 1º grau</b></p><p>"Loch Henry" apresenta-nos uma história aparentemente verídica de um conjunto de crimes ocorridos numa remota aldeia da Escócia. A relação com os média acontece porque um jovem casal de estudantes de cinema decide dar vida audiovisual aos crimes, para o que tem de realizar uma investigação junto da comunidade. O twist final, apesar de horror policial, pode convocar uma ideia black mirror, se visto pelo lado da pressão que os média colocam sobre nós a ponto de nos dispormos a revelar o mais sórdido sobre nós e a nossa família.</p><p style="text-align: left;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhqL6mVbxIcdkgi1MWzuLWrPnLvDpWkymfnGvad29WyqDqxfZpZ-WNMSMGqLd29tsy0PC_Nc_LlgFT5S9tdbegGDWGH3pvQkgWf5Cdcbas6HznkiS7PaXI43aPZybjyBS5po4REPbiyFXBwsbS0aQUeLVl-wh1475KCsam98qS_dSbRJlyqBtzTRw/s1284/Loch-Henry-Black-Mirror.webp" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em; text-align: center;"><img border="0" data-original-height="856" data-original-width="1284" height="426" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhqL6mVbxIcdkgi1MWzuLWrPnLvDpWkymfnGvad29WyqDqxfZpZ-WNMSMGqLd29tsy0PC_Nc_LlgFT5S9tdbegGDWGH3pvQkgWf5Cdcbas6HznkiS7PaXI43aPZybjyBS5po4REPbiyFXBwsbS0aQUeLVl-wh1475KCsam98qS_dSbRJlyqBtzTRw/w1000/Loch-Henry-Black-Mirror.webp" width="640" /></a></p><p>"Beyond the Sea" começa como um verdadeiro trabalho Black Mirror, com 2 astronautas em missão que podem colocar os corpos em descanso para se conectar com andróides na Terra onde mantém uma vida normal com as suas famílias. O conceito é fabuloso, mas depois não é aprofundado, seguindo por um caminho totalmente paralelo do horror das relações masculinas.</p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgt7T0zrk-2hhxsk2vn7zpxGr_9FaN4UqJHldcfDyOolPwZkz8wn9p-tmkPh5laC28sRg15gd-fDxj5ZwDDjvudn6s-6eF2Sts4hq5ea_BbO_6-Kg8oeyMkZ0TwKpq5n6Cj35EdOTMZCI97pMbNjHjRGumYuMiM6ysgg18mJKYA69TDQ4FmUotzsg/s2560/BM-FirstLooks-4-new.webp" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1440" data-original-width="2560" height="360" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgt7T0zrk-2hhxsk2vn7zpxGr_9FaN4UqJHldcfDyOolPwZkz8wn9p-tmkPh5laC28sRg15gd-fDxj5ZwDDjvudn6s-6eF2Sts4hq5ea_BbO_6-Kg8oeyMkZ0TwKpq5n6Cj35EdOTMZCI97pMbNjHjRGumYuMiM6ysgg18mJKYA69TDQ4FmUotzsg/w1000/BM-FirstLooks-4-new.webp" width="640" /></a></div><p><b>Black Mirror ausente, mera fantasia juvenil</b></p><p>"Mazey Day" e "Demon 79" não valem sequer o esforço de discussão, porque se limitam a introduzir variáveis de fantasia fugindo a qualquer raciocínio lógico Black Mirror.</p><div><br /></div>Nelson Zagalohttp://www.blogger.com/profile/13107799601113612022noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5429413.post-16595935430100753782023-06-24T10:10:00.012+01:002023-06-24T12:20:54.602+01:00Românticos de JennaDepois de ler o belíssimo <a href="https://virtual-illusion.blogspot.com/2023/05/alexander-von-humboldt-1769-1859.html" target="_blank">"The Invention of Nature" de Andrea Wulf</a> senti vontade de continuar a ler Wulf e como "Magnificent Rebels: The First Romantics and the Invention of the Self" (2022) era o seu último livro, resolvi lê-lo de seguida. Interessou-me particularmente o subtítulo "the Invention of the Self", querendo acreditar que Wulf se centraria nessa discussão. Contudo não é disso que a autora nos fala. "Magnificent Rebels" usa como personagem principal a pequena cidade alemã de Jenna, e a sua Universidade, que em finais do século XVIII se tornaria no centro de ideias que viriam a definir o movimento hoje referenciado como Romantismo. Em Jenna conviveram alguns nomes de referência clássica como Goethe, Fichte, Novalis, Schiller, Schelling, Hegel, os irmãos Humboldt, os irmãos Schlegel e Caroline Schelling. Wulf dedica-se a dissecar os principais ideais, conversas e afetações de cada um destes autores, tentando apresentar o "Círculo de Jenna" ao nível do "Círculo de Viena" ou da "Escola de Frankfurt".<div><br /><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhoNzVkmq0BDmWlGOvFNq_n3FCwgoCLQ3OzR5JvK7gO0X4La6OKhxw9k6_tk50WMXMiR1Yb0OGawMqnmqE7w8h-GoOZIXiaxxbY0emy3wlnuh_DNXkiCduLPH55A_3eVn3a5AxcwrJIW3EIdLzqoeXKIgYGrwDYcL2dPAPhokOcfzS5ToISB-69-w/s1789/20230603_105549.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1785" data-original-width="1789" height="399" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhoNzVkmq0BDmWlGOvFNq_n3FCwgoCLQ3OzR5JvK7gO0X4La6OKhxw9k6_tk50WMXMiR1Yb0OGawMqnmqE7w8h-GoOZIXiaxxbY0emy3wlnuh_DNXkiCduLPH55A_3eVn3a5AxcwrJIW3EIdLzqoeXKIgYGrwDYcL2dPAPhokOcfzS5ToISB-69-w/w1000/20230603_105549.jpg" width="400" /></a></div><p><span></span></p><a name='more'></a>A Universidade de Jenna foi criada em 1558, em 1900 tinha cerca de 1000 alunos que se multiplicaram por 20 até ao início deste novo milénio. O seu ponto alto, enquanto influencia internacional, foi exatamente este período do final do século XVIII, em que conseguiu juntar num breve período algumas das figuras mais relevantes das ideias da época, nomeadamente da poesia e filosofia.<p></p><p>O livro começa muito bem com Caroline Schelling a ser presa grávida por tentar defender ideias afetos à Revolução Francesa, algo que a Prússia tentava abafar a todo o custo com medo dos potenciais impactos na estrutura do poder. O mote de partida não podia ser mais ilustrativo, a Revolução Francesa, a liberdade do humano acima de qualquer outro valor que contribuiria para criar o marcador de relevância cultural o indivíduo, com a elevação do criador singular a génio.</p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg0LUzbSjjVrzjJiU8VoRxBmmI-DXSQqnQgeCguB0G-Xcbhk460gp0h8vE6-d0cXjjFfqSiRX-MkLEbBEC3nZobE4RYTt1y2dU-O4vO5yHTziWRRPdlY91wh7yjvaZgsR0q5jOrv0EVWu5gDSd55bxIfyroKDrBxmhiPbkuFLHwakX0RqLL2E8a0A/s4000/20230603_105507.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1844" data-original-width="4000" height="296" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg0LUzbSjjVrzjJiU8VoRxBmmI-DXSQqnQgeCguB0G-Xcbhk460gp0h8vE6-d0cXjjFfqSiRX-MkLEbBEC3nZobE4RYTt1y2dU-O4vO5yHTziWRRPdlY91wh7yjvaZgsR0q5jOrv0EVWu5gDSd55bxIfyroKDrBxmhiPbkuFLHwakX0RqLL2E8a0A/w1000/20230603_105507.jpg" width="640" /></a></div><br /><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEitoh1AjATWLAb7JzuHKHbfaRxLFXP0NOrwBK5CfDMbwHRVr6cM4JHXXTULLTTZmtSEekHyVj4os4fF9NN7HUVNuJSuji252TNR9yIlqy8plfEQnS8OCm7LvIxUB7shktqa7cUpok5cI_fM8J0eq3ozaJiPT4Ck2ZHTuqXi5g78rE6-99Xzil5Srw/s4000/20230603_105540.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1844" data-original-width="4000" height="296" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEitoh1AjATWLAb7JzuHKHbfaRxLFXP0NOrwBK5CfDMbwHRVr6cM4JHXXTULLTTZmtSEekHyVj4os4fF9NN7HUVNuJSuji252TNR9yIlqy8plfEQnS8OCm7LvIxUB7shktqa7cUpok5cI_fM8J0eq3ozaJiPT4Ck2ZHTuqXi5g78rE6-99Xzil5Srw/w1000/20230603_105540.jpg" width="640" /></a></div><p>Contudo, o registo das grandes ideias vão-se perdendo, para dar lugar ao diz que disse, e em particular, e de modo quase irritante, aos amores e desamores de cada um dos nomes acima identificados, mas com maior destaque para Caroline Schelling, a grande anfitriã que casou com Böhmer, Schlegel e Schelling. É verdade que o romantismo se liga ao fenómeno do amor, mas nem este se define pelos boatos e intrigas, nem ele é sequer o principal ingrediente do movimento. Teria sido mais interessante Wulf questionar-se sobre os impactos da Revolução Industrial, do Iluminsmo, ou contrastar com tudo aquilo que já vinha emergindo desde o Renascentismo. Mas não é isso que faz.</p><p>Fica-se a saber mais sobre as vidas de cada um, fui particularmente surpreendido com o percurso de Hegel e o impacto de Novalis, assim como sobre o efeito de Napoleão em muitos destes pensadores. De Humboldt, o pouco que é dito soa repetição daquilo que Wulf já nos tinha dado em "Invention of Nature". Por outro lado, Goethe é ilustrado ao longo de boa parte do trabalho, aprofundando-se mais a sua pessoa do que as suas ideias.</p><p>Uma leitura interessante e fluída, mas que acaba por ficar à porta de algo maior.</p></div>Nelson Zagalohttp://www.blogger.com/profile/13107799601113612022noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5429413.post-11238915270852814912023-06-18T17:56:00.014+01:002023-06-19T08:23:16.569+01:00Sendo Eu, uma ciência da Consciência<p>Anil Seth é professor de neurociências computacionais, com uma formação de base em ciências naturais e um doutoramento em ciências da computação. O seu trabalho no domínio das ciências da consciência tornou-se uma referência nos últimos anos, sendo não só altamente citado pela academia, como seguido pelos média tradicionais. Para esse reconhecimento terá contribuído a <a href="https://www.ted.com/talks/anil_seth_your_brain_hallucinates_your_conscious_reality" target="_blank">TED</a> que realizou em 2017, “Your brain hallucinates your conscious reality”, que conta com 14 milhões de visualizações, e pode ser vista como uma síntese de tudo aquilo que nos apresenta neste livro “<b><i>Being You: A New Science of Consciousness</i></b>” (2021).</p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgkOPNsc-14nBjiN6_it5GlmiUks39PLyqDBioBmlRTeV5cF1V8akdz5K92rS8H1BruS9wvAHzfCbKroSiLT6OuSN5sIsO88eZCBWA5oaXtx1iZM-sr9QyGjB4BlxId_RmWVrzGT-wAy2znSJ_lhIzkzmWFf_ddh4kc-YmUsz_bHfs60cnp2xI/s2560/E-Q9sxFXsAAiDWd.jpeg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1478" data-original-width="2560" height="370" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgkOPNsc-14nBjiN6_it5GlmiUks39PLyqDBioBmlRTeV5cF1V8akdz5K92rS8H1BruS9wvAHzfCbKroSiLT6OuSN5sIsO88eZCBWA5oaXtx1iZM-sr9QyGjB4BlxId_RmWVrzGT-wAy2znSJ_lhIzkzmWFf_ddh4kc-YmUsz_bHfs60cnp2xI/w1000/E-Q9sxFXsAAiDWd.jpeg" width="640" /></a></div><p><span></span></p><a name='more'></a>Seth procurou uma forma diferente de abordar a Consciência por forma a evitar os problemas de que padecem outras abordagens, nomeadamente deixou de questionar o que é a consciência, passando a centrar-se na busca de explicações sobre como funciona a consciência. Deste modo, Seth construiu uma teorização imensamente robusta que ainda que contenha alguns problemas — excesso de funcionalismo e metáforas delimitadas pelas teorias da informação —, nos oferece uma visão muito clara e lógica do que está, ou pode estar, por detrás daquilo que somos.<p></p><p>A teoria segue uma tendência dos últimos 25 anos nas neurociências que olham para a dualidade corpo e mente como una e indissociável, de que António Damásio foi um dos percursores. Damásio defendeu que não existia emoção sem marcadores somáticos (registos de experiências anteriores fixados pelos nervos e sensores do nosso corpo). Seth defende que não existe consciência sem uma interação entre cérebro e corpo, daí que não acredite na hipótese de uma consciência criada pela IA, sustentada numa ideia simplesmente ilustrada pela seguinte frase: “<b><i>Consciousness and intelligence are very different things. You don't have to be smart to suffer, but you probably do have to be alive</i></b>.” </p><p>No resto deste texto, resolvi extrair um conjunto de citações da <a href="https://www.ted.com/talks/anil_seth_your_brain_hallucinates_your_conscious_reality" target="_blank">Ted Talk</a>, da <a href="https://www.quantamagazine.org/anil-seth-finds-consciousness-in-lifes-push-against-entropy-20210930/" target="_blank">entrevista à Quanta</a>, e do seu livro, e dar conta dos 4 pontos principais — A função da consciência; o como sou Eu; a percepção do livre arbítrio; e a Energia Livre — discutidos e defendidos por Anil Seth. No final, faço uma discussão mais crítica da proposta.</p><p><b><br /></b></p><p><b>1- A Função da Consciência</b></p><p>Este é o primeiro grande ponto do livro, no qual Seth não se dedica a responder ao que é, mas antes ao como funciona. Aqui começa a abordagem de Seth, assente nos princípios computacionais da informação:</p><p></p><blockquote><p> “Whenever we are conscious, we are conscious of something, or of many things. These are the contents of consciousness. (…) Imagine, for a moment, that you are a brain. Really try to think about what it’s like up there, sealed inside the bony vault of the skull, trying to figure out what’s out there in the world. There’s no light, no sound, no anything – it’s completely dark and utterly silent. When trying to form perceptions, all the brain has to go on is a constant barrage of electrical signals which are only indirectly related to things out there in the world, whatever they may be. (…) How does the brain transform these inherently ambiguous sensory signals into a coherent perceptual world full of objects, people, and places?” Book</p><p>“So perception -- figuring out what's there -- has to be a process of informed guesswork in which the brain combines these sensory signals with its prior expectations or beliefs about the way the world is to form its best guess of what caused those signals. The brain doesn't hear sound or see light. What we perceive is its best guess of what's out there in the world.” TED</p><p>“All this puts the brain basis of perception in a bit of a different light. Instead of perception depending largely on signals coming into the brain from the outside world, it depends as much, if not more, on perceptual predictions flowing in the opposite direction. We don't just passively perceive the world, we actively generate it. The world we experience comes as much, if not more, from the inside out as from the outside in.” TED</p></blockquote><p></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi0otfdfMsBqViQWLrDZR2Hyu4eJQY37IBby0X8IrxvWSSyAcZLMn9AwPHk5azYXV5z6EZGTk1HbPLso5uBPjxcWmqRBUiqz7JOI0rUt-Ni0jhVQ_qrhZeWzlk3DG2w6MNjxJU4hcq0JW2unz56rIbpulBn5qTx8-z_cUb7pFQP_PXGcemluas/s1840/Picture%201.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="716" data-original-width="1840" height="250" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi0otfdfMsBqViQWLrDZR2Hyu4eJQY37IBby0X8IrxvWSSyAcZLMn9AwPHk5azYXV5z6EZGTk1HbPLso5uBPjxcWmqRBUiqz7JOI0rUt-Ni0jhVQ_qrhZeWzlk3DG2w6MNjxJU4hcq0JW2unz56rIbpulBn5qTx8-z_cUb7pFQP_PXGcemluas/w1000/Picture%201.jpg" width="640" /></a></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><span style="text-align: left;"><span style="font-family: courier;">Esta famosa ilusão é utilizada por Seth para demonstrar que não vemos o que realmente os nossos sensores (olhos) estão a ver, mas antes uma construção entre o que os olhos veem, e aquilo que o nosso cérebro pensa que deveria estar a ver. No caso desta ilusão, é impossível vermos que o cinzento de A e B são iguais, porque o nosso cérebro realiza um ajustamento sobre o que vemos, a partir da sombra que é lançada pelo cilindro verde. </span></span></div><p>Seth aprofunda depois o modo como é processada a informação exterior, como é que a nossa consciência a transforma nas ideias internas sobre a realidade que está a experienciar. Para isso, usa o conceito de inferência bayesiana, em substituição dos processo de raciocínio lógico — dedutivo e indutivo —, para explicar como processamos o mundo.</p><p></p><blockquote><p>“Abductive reasoning – the sort formalised by Bayesian inference – is all about finding the best explanation for a set of observations, when these observations are incomplete, uncertain, or otherwise ambiguous. Like inductive reasoning, abductive reasoning can also get things wrong. In seeking the ‘best explanation’, abductive reasoning can be thought of as reasoning backward, from observed effects to their most likely causes, rather than forward, from causes to their effects – as is the case for deduction and induction.</p><p>Here’s an example. Looking out of your bedroom window one morning, you see the lawn is wet. Did it rain overnight? Perhaps, but it could also be that you forgot to turn off your garden sprinkler. The aim is to find the best explanation, or hypothesis, for what you see: given the lawn is wet, what is the probability (i) that it rained overnight, or (ii) that you left the sprinkler on? In other words, we want to infer the most likely cause for the observed data.</p><p> Bayesian inference tells us how to do this. It provides an optimal way of updating our beliefs about something when new data comes in. Bayes’ rule is a mathematical recipe for going from what we already know (the prior) to what we should believe next (the posterior), based on what we are learning now (the likelihood). Priors, likelihoods, and posteriors are often called Bayesian ‘beliefs’ because they represent states of knowledge rather than states of the world.</p><p>(…)</p><p>Bayesian inference has been applied to great benefit in all sorts of contexts, from medical diagnosis to searching for missing nuclear submarines, with new applications emerging all the time. Even the scientific method itself can be understood as a Bayesian process, in which scientific hypotheses are updated by new evidence from experiments.” Book</p></blockquote><p></p><p>A partir deste modo de conceber a Realidade, Seth vai dizer então que aquilo que vemos como Realidade não passa de um processo de Alucinação por parte da nossa consciência, mas não uma alucinação qualquer:</p><p></p><blockquote><p>“Now, think about this for a minute. If hallucination is a kind of uncontrolled perception, then perception right here and right now is also a kind of hallucination, but a controlled hallucination in which the brain's predictions are being reined in by sensory information from the world. In fact, we're all hallucinating all the time, including right now. It's just that when we agree about our hallucinations, we call that reality.” TED</p><p>“These perceptual expectations shape our conscious experience. When we agree with each other about our hallucinations we call it “reality”; when we don’t we’re described as “delusional”. Book</p></blockquote><p>Assim, a nossa alucinação controlada ganha respaldo, ou seja, é confirmada pelas alucinações controladas dos nossos pares. Quando todos alucinamos o mesmo, esta ganha um selo de autenticidade, de verdade partilhada, com o que passamos a gerir o mundo à nossa volta. Mas isto não é assim só porque nos parece funcionar bem de um ponto de vista da psicologia social, Seth explica porque acontece assim:</p><p></p><blockquote><p> “Why do we experience our perceptual constructions as being objectively real? On the controlled hallucination view, the purpose of perception is to guide action and behaviour – to promote the organism’s prospects of survival. We perceive the world not as it is, but as it is useful for us.” Book</p><p></p></blockquote><p>Ou seja, a consciência é a alucinação que melhor serve as nossas hipóteses de sobreviver neste planeta.</p><p><b><br /></b></p><p><b>2 - Como Sou Eu?</b></p><p>No seguimento do ponto anterior, se a consciência é uma alucinação controlada, guiada pela necessidade de sobrevivência, de onde surge o Eu? Porque numa primeira leitura, e seguindo uma outra velha metáfora, o Eu poderia ser aquele que está sentado dentro do nosso cérebro a ver o “filme interior”. Contudo, não existe qualquer “filme interior” (algo que o próprio Seth diz ter reconhecido após uma interação com Daniel Dennett), já que a experiência da consciência é apenas a soma das diferentes alucinações produzidas. Assim:</p><p></p><blockquote>“your experience of being a self, the specific experience of being you, is also a controlled hallucination generated by the brain. This seems a very strange idea, right? Yes, visual illusions might deceive my eyes, but how could I be deceived about what it means to be me? For most of us, the experience of being a person is so familiar, so unified and so continuous that it's difficult not to take it for granted. But we shouldn't take it for granted. Many experiments show, and psychiatrists and neurologists know very well, that these different ways in which we experience being a self can all come apart. What this means is the basic background experience of being a unified self is a rather fragile construction of the brain.” TED </blockquote><p></p><p></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgkNbb1C7-ecsqYQ9sMk1-zXKem4NGE96ngVSZ4MDuWKCSrH7qzSCodiV-vNIEXAXeWU8mvR3aabru1EJN0CwkuuOrujOiBKm1nKudStofOSljsfpPW9gJQRj3Wu-GpY7iZfnsPZ8wEwZrqJPO1wT7VsHOSTboIFuXbenBZHsNzEOlkTCSinjk/s918/Picture%202.png" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="460" data-original-width="918" height="320" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgkNbb1C7-ecsqYQ9sMk1-zXKem4NGE96ngVSZ4MDuWKCSrH7qzSCodiV-vNIEXAXeWU8mvR3aabru1EJN0CwkuuOrujOiBKm1nKudStofOSljsfpPW9gJQRj3Wu-GpY7iZfnsPZ8wEwZrqJPO1wT7VsHOSTboIFuXbenBZHsNzEOlkTCSinjk/w1000/Picture%202.png" width="640" /></a></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><span style="text-align: left;"><span style="font-family: courier;">Seth usa mais um experiment famoso, o da <a href="https://www.youtube.com/watch?v=sxwn1w7MJvk&ab_channel=BBC" target="_blank">mão de borracha</a>. Esta ilusão consegue levar-nos a acreditar que a mão de borracha é nossa.</span></span></div><p></p><p></p><blockquote>“The self is not an immutable entity that lurks behind the windows of the eyes, looking out into the world and controlling the body as a pilot controls a plane. The experience of being me, or of being you, is a perception itself – or better, a collection of perceptions – a tightly woven bundle of neurally encoded predictions geared towards keeping your body alive. And this, I believe, is all we need to be, to be who we are.” Book</blockquote><p></p><p>Não construímos a ideia do Eu apenas a partir da percepção do nosso corpo externo, usamos ainda a <a href="https://en.wikipedia.org/wiki/Interoception" target="_blank">interocepção</a> para aceder ao interior, a partir do que procedemos a uma construção de hipóteses:</p><p></p><blockquote><p>“We don't just experience our bodies as objects in the world from the outside, we also experience them from within. We all experience the sense of being a body from the inside. And sensory signals coming from the inside of the body are continually telling the brain about the state of the internal organs, how the heart is doing, what the blood pressure is like, lots of things. This kind of perception, which we call interoception, is rather overlooked. So experiences of having a body are deeply grounded in perceiving our bodies from within.” TED </p><p>“What we consciously see depends on the brain's best guess of what's out there. Our experienced world comes from the inside out, not just the outside in. The rubber hand illusion shows that this applies to our experiences of what is and what is not our body. And these self-related predictions depend critically on sensory signals coming from deep inside the body. And finally, experiences of being an embodied self are more about control and regulation than figuring out what's there. So our experiences of the world around us and ourselves within it -- well, they're kinds of controlled hallucinations that have been shaped over millions of years of evolution to keep us alive in worlds full of danger and opportunity. We predict ourselves into existence” TED </p></blockquote><p></p><p>No fundo, a consciência de mim, o meu EU, é apenas a consciência da minha existência que me é garantida por um conjunto alargado de sinais e estímulos agregados pelo cérebro:</p><p></p><blockquote>“For a conscious creature, there is something that it is like to be that creature. There is something it is like to be me, something it is like to be you, and probably something it is like to be a sheep, or a dolphin. For each of these creatures, subjective experiences are happening. It feels like something to be me. But there is almost certainly nothing it is like to be a bacterium, a blade of grass, or a toy robot. For these things, there is (presumably) never any subjective experience going on: no inner universe, no awareness, no consciousness.” Book</blockquote><p></p><p><b><br /></b></p><p><b>3 - Livre Arbítrio, um simulador futuro</b></p><p>Seth começa por retirar da mesa duas definições — “spooky free will” e o determinismo. A primeira, assume que uma qualquer entidade em nós, toma as decisões sem olhar a qualquer condicionante natural, porque se assim não for, então temos um determinismo que regula tudo aquilo que podemos ou não fazer. Seth diz, “Once spooky free will is out of the picture, it is easy to see that the debate over determinism doesn't matter at all.” </p><p></p><blockquote><p>“free will is not illusory at all. So long as we have relatively undamaged brains and relatively normal upbringings, each of us has a very real capacity to execute and to inhibit voluntary action, thanks to our brain’s ability to control our many degrees of freedom. This kind of freedom is both a freedom from and a freedom to. It is a freedom from immediate causes in the world or in the body, and from coercion by authorities, hypnotists and mesmerists, or social-media pushers. It is not, however, freedom from the laws of nature or from the causal fabric of the universe. It is a freedom to act according to our beliefs, values, and goals, to do as we wish to do, and to make choices according to who we are.” Book</p></blockquote><p>Mas o interessante da sua discussão acaba sendo mais uma vez a discussão em redor da função do livre arbítrio: </p><p></p><blockquote>“our sense of free will is very much about feeling we ‘could have done differently’. This counterfactual aspect of the experience of volition is particularly important for its future-oriented function. The feeling that I could have done differently does not mean that I actually could have done differently. Rather, the phenomenology of alternative possibilities is useful because in a future similar, but not identical, situation I might indeed do differently. If every circumstance is indeed identical on Tuesday as on Monday, then I can do no differently on Tuesday than on Monday. But this will never be the case. The physical world does not duplicate itself from day to day, not even from millisecond to millisecond. At the very least, the circumstances of my brain will have changed, because I’ve had an experience of volition on Monday and paid attention to its consequences. This, by itself, is enough to affect how my brain can control my many degrees of freedom when setting out to work again on Tuesday.‡ The usefulness of feeling ‘I could have done otherwise’ is that, next time, you might.” Book</blockquote><p></p><p><b><br /></b></p><p><b>4. O que nos mantém coesos: Free energy</b></p><p>Este último ponto é o menos discutido, não aparece ainda na TED, mas é para mim o mais relevante de toda a teorização, ou pelo menos a parte mais original. Seth usa o conceito de Energia Livre</p><p></p><blockquote><p>“I think the simplest articulation of the free-energy principle is this: Let’s think about living systems — a cell or an organism. A living system maintains itself as separate from its environment. For example, I don’t just dissolve into mush on the floor. It’s an active process: I take energy in, and I maintain myself as a system which maintains its boundaries with the world.” Quanta</p><p>“The free-energy principle is not itself a theory about consciousness, but I think it’s very relevant because it provides a way of understanding how and why brains work the way they do, and it links back to the idea that consciousness and life are very tightly related. Very briefly, the idea is that to regulate things like body temperature — and, more generally, to keep the body alive — the brain uses predictive models, because to control something it’s very useful to be able to predict how it will behave. The argument I develop in my book is that all our conscious experiences arise from these predictive models which have their origin in this fundamental biological imperative to keep living. ” Quanta</p><p>“We live with an exaggerated, extreme form of self-change-blindness, and to understand why, we need to understand the reason we perceive ourselves in the first place. We do not perceive ourselves in order to know ourselves, we perceive ourselves in order to control ourselves.” Book</p><p>“I eventually get to the point that consciousness is not there in spite of our nature as flesh-and-blood machines, as Descartes might have said; rather, it’s because of this nature. It is because we are flesh-and-blood living machines that our experiences of the world and of “self” arise. ” Quanta</p></blockquote><p><b><br /></b></p><p><b>Discussão crítica</b></p><p>Por mais que tenda a olhar criticamente para toda esta visão, profundamente devedora de um modelo computacional assente numa teorização de informação, à semelhança da crítica que fiz ao livro do mesmo ano, "<a href="https://virtual-illusion.blogspot.com/2021/10/mil-cerebros-2021-sem-emocao.html" target="_blank">A Thousand Brains: A New Theory of Intelligence</a>" (2021) de Jeff Hawkins, a verdade é que a relação apresentada entre o corpo, a natureza e a evolução faz sentido. Esta abordagem leva-nos a ponto de se permitir conceber a consciência sem qualquer natureza excecional, apenas como uma parte natural de nós que serve para garantir a manutenção do corpo. </p><p>Contudo, e Seth cita também <a href="https://virtual-illusion.blogspot.com/2018/12/a-construcao-inata-das-emocoes.html" target="_blank">Lisa Feldman-Barrett</a>, esta abordagem parte do fundamento do Quadro em Branco, com a Consciência a ser apresentada como mero gestor de hipóteses. Porque se a abordagem evolucionista do comportamento pode servir para explicar parte daquilo que somos, como <a href="https://virtual-illusion.blogspot.com/2013/10/a-ciencia-por-detras-da-arte.html" target="_blank">Denis Dutton fez muito bem com a Arte</a>, na verdade estas abordagens ficam aquém da complexidade daquilo de que somos feitos. Movemo-nos por mais do que necessidades fisiológicas. É impossível atirar borda fora tudo <a href="https://en.wikipedia.org/wiki/Maslow's_hierarchy_of_needs" target="_blank">o resto de que necessitamos</a> e que depende da volição da nossa consciência. </p><p>Feldman-Barrett diz que as emoçoes não são inatas porque não existem <a href="https://www.nytimes.com/2015/08/02/opinion/sunday/what-emotions-are-and-arent.html" target="_blank">marcadores biológicos da emoção</a>. Ou seja, não é possível identificar qualquer componente biológica que funcione como produtor de emoções em todos nós. Contudo, se formos além, também não deverão existir marcadores biológicos da personalidade, ou da vontade humana, e no entanto tais elementos não deixam de circunscrever aquilo que constitui a nossa consciência. Se Freud nos via como movidos pela vontade do prazer, Alfred Adler pela vontade do poder, e Frankl pela vontade do significado, de alguma forma temos de dar conta de marcadores que enviesam totalmente a nossa capacidade para calcular probabilidades e agir sobre o mundo. Podem não existir marcadores biológicos, ou podemos simplesmente não ter encontrado forma de os identificar. Contudo, esses marcadores continuam a fazer parte da nossa psicologia e naturalmente da nossa consciência. </p><p>A consciência pode ter nascido de uma necessidade fundamental de suporte à vida. Mas a linguagem que sustenta as relações humana não tem por base esse desígnio, e é ela a maior responsável pelo incremento da complexidade com que o nosso cérebro interpreta a realidade. Precisamos de sobreviver, e contamos com a Consciência para nos manter enquanto identidade única, mas sobre ela, contamos com múltiplas outras dimensões que formam e condicionam essa identidade. Não podemos simplesmente atirar tudo borda fora, com a desculpa de que não existe qualquer homúnculo ou de que não existem elementos físicos que o suportem. Precisamos de continuar a trabalhar e a aprofundar para chegar a compreender efetivamente de que é que somos feitos.</p>Nelson Zagalohttp://www.blogger.com/profile/13107799601113612022noreply@blogger.com6tag:blogger.com,1999:blog-5429413.post-30185724023060373862023-06-18T09:56:00.005+01:002023-06-18T12:05:27.612+01:00“Internato” (2017/2023)“Internato”, de Serhij Zhadan, conta a história de um professor de Língua Ucraniana que parte da sua cidade, numa viagem de 3 dias, para trazer de volta o seu sobrinho que se encontra num internato situado num território ocupado pela guerra. Sabemos que tudo se passa no Leste da Ucrânia, mas pouco mais é dito sobre o local, assim como quem combate quem. O livro foi publicado em 2017, três anos depois da <a href="https://en.wikipedia.org/wiki/Revolution_of_Dignity" target="_blank">Revolução Maidan</a>, a favor da <a href="https://www.imdb.com/title/tt4908644/" target="_blank">aproximação da Ucrânia à UE</a>, que provocou a invasão Russa que acabaria tomando a Crimea, mas não conseguiria <a href="https://en.wikipedia.org/wiki/War_in_Donbas_(2014%E2%80%932022)" target="_blank">tomar o Donbass.</a> <div><br /><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgymozfBobMCxdVhpkXYoWybM5ZyVXe0r7uitAaxh2gkPfiqnZLT3xS2vqldki-Ex6A4s8qOSv1GIA90_TMmOqisGZgVVvDsrBGxvpjGPet1Kf1JbQvjYI5e_EdFzku7YG0K4m6-OJJZCuKkncky5NrWiuG-T3CYor9Xw2II8cWL3iP-mnvgos/s2069/20230615_090027.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1844" data-original-width="2069" height="356" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgymozfBobMCxdVhpkXYoWybM5ZyVXe0r7uitAaxh2gkPfiqnZLT3xS2vqldki-Ex6A4s8qOSv1GIA90_TMmOqisGZgVVvDsrBGxvpjGPet1Kf1JbQvjYI5e_EdFzku7YG0K4m6-OJJZCuKkncky5NrWiuG-T3CYor9Xw2II8cWL3iP-mnvgos/w800/20230615_090027.jpg" width="400" /></a></div><br /><div><div><span><a name='more'></a></span>Numa primeira nota, o livro é mais atmosférico do que de aventuras na estrada. Para o efeito contribuem as competências descritivas de Serhiy Zhadan que dão conta não apenas do estado dos territórios — muita destruição urbana, faltando condições básicas como electricidade e água, e explosões constantes — mas acima de tudo do espírito vivenciado pelas populações assente em dois grandes denominadores: o medo e a desconfiança. É fácil reconhecer aqui distopias lidas em tantos outros romances, com a diferença de que esta está a acontecer enquanto lemos aquelas linhas, o que contribui de forma muito intensa para produção da atmosfera dentro de nós.</div><div><p></p>
O medo atravessa o sentir das personagens, ainda que alguns tentem a indiferença, mas a evidência do mesmo surge exatamente pela desconfiança que grassa entre todos. As pessoas evitam o contacto e quando necessário procuram de imediato perceber de que lado está o interlocutor. Falar ucraniano diz pouco, falar russo com sotaque ucraniano também. Por isso, não restam muitas formas de distinguir uns dos outros, o que obriga as relações a pairarem sobre uma rede constante de desconfiança. Sem apêgo, a desoladora destruição material ganha sentimentos ainda mais negros.
<p></p>
No entanto, o livro não defende qualquer lado, não aponta o dedo, assume-se como visão neutra do que podemos encontrar no território. Desde logo porque o nosso protagonista é apartidário, não vê televisão, não toma partido por nada, nem ninguém. Por isso, à chegada ao Internato, o mesmo é confrontado pela diretora que coloca o dedo sobre aquela que parece ser uma das grandes feridas do conflito:
<p></p><blockquote><i>
"Like it has nothing to do with you. Even though you should've made up your minds and picked a side a long time ago. You're so used to hiding. So used to staying out of things, letting someone else decide everything for you, letting someone else take care of things for you. Nobody's going to decide for you, nobody's going to take care of things. Not this time. Because you saw what was going on, you knew. But you kept silent, you didn't say anything. Nobody's going to judge you for that, obviously, but don't count on your descendants' appreciation. Basically," Nina says, standing up resolutely, "what I'm saying is, don't delude yourself—everyone's going to answer for this. And those who aren't used to answering for anything will be the worst off.”
</i></blockquote><p></p>
É uma novela, com uma escrita embelezada, mas assume um carácter histórico, procurando ser o mais próximo à realidade factual possível. Cabe assim ao leitor usar os dados que detém sobre a região, que em 2023 são mais concretos, para interpretar o que se passa ali, e porque reagem as pessoas como reagem. O que cria toda aquela desconfiança, do que se defendem, porque se defendem, em quê e em quem acreditam. </div></div></div><div><br /></div><div>"Internato" foi publicado em 2017, traduzido para inglês em 2021 e para português em 2023, tendo sido publicado em Portugal pela Elsinore. Como complemento, sugiro o visionamento do filme <a href="https://www.imdb.com/title/tt8282042/" target="_blank">"Donbass" (2018)</a> de Sergey Loznitsa, disponível no <a href="https://www.filmin.es/pelicula/donbass" target="_blank">FilmIn</a>.</div>Nelson Zagalohttp://www.blogger.com/profile/13107799601113612022noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5429413.post-83514002298228759012023-06-12T09:21:00.013+01:002023-06-13T19:59:39.106+01:00"Infra 5" de Max Richter<p>O álbum "Infra" (2008) de Max Richter é talvez o álbum que mais vezes ouvi. Em particular a faixa "Infra 5" tem estado nos últimos anos quase sempre nos primeiros lugares das músicas mais ouvidas no meu Spotify. Existe algo por debaixo desta sonoridade que faz mover o meu interior. Assim que começa, desligo de tudo o resto. Fico ali, atento, a tentar seguir o tom, o ritmo, os instrumentos, tentando perceber para onde vai evoluir a cada momento, aonde me vai conduzir. Hoje, resolvi voltar a pesquisar sobre o álbum e encontrei um <a href="https://www.youtube.com/watch?v=NvcXMhA1r9E&ab_channel=MaxRichterMusic" target="_blank">pequeno vídeo do compositor em que explica a motivação por detrás do álbum, e depois detalha a "narrativa" que suporta a "Infra 5"</a>. Deixo a transcrição:</p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg-_s5U6tXNW_p64joU_dM5-QK0_tuqRk7Bqm8xFOt9KMhhVYUTychb9493uR6otDCthaNx2NGtlsxpG2ouBPENdXJwRW3-fTkaOP4IlBt2WdnX0Eiml6InIcI62-BOhQNlJGKv2XuI8nnSVq6-k7vcFs6JuYBIr6HbMAL0bUcbffjaRtKu1f8/s1812/Screenshot%202023-06-12%20at%2008.46.27.png" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="961" data-original-width="1812" height="340" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg-_s5U6tXNW_p64joU_dM5-QK0_tuqRk7Bqm8xFOt9KMhhVYUTychb9493uR6otDCthaNx2NGtlsxpG2ouBPENdXJwRW3-fTkaOP4IlBt2WdnX0Eiml6InIcI62-BOhQNlJGKv2XuI8nnSVq6-k7vcFs6JuYBIr6HbMAL0bUcbffjaRtKu1f8/w1000/Screenshot%202023-06-12%20at%2008.46.27.png" width="640" /></a></div><p></p><blockquote>"So Infra is a ballet [choreographed by <a href="https://waynemcgregor.com/" target="_blank">Wayne McGregor</a>] based around the events of 7/7 [subway bombings in London]. And I guess the other thing that feeds into that is the psychological landscape of the wasteland, T.S. Eliot's "<a href="https://en.wikipedia.org/wiki/The_Waste_Land" target="_blank">The Waste Land</a>", which sets up this idea of an unreal city, this kind of hallucinatory sort of vision of a city. The music of Infra is a series of reflections on those events."</blockquote><blockquote>"<a href="https://www.youtube.com/watch?v=3KP7e88Gba0&ab_channel=MaxRichterMusic" target="_blank"><b>Infra 5</b></a> is probably the most, I guess, directly representative music on the record, in the sense that you have this music which basically gets faster and faster. So, the image of people running, that's what Infra 5 is about. And there are various kinds of other things buried in the music. Like, there's sort of melodic material, which is sort of basically sirens. The violins just play these kind of siren melodies. So it sort of embodies that people running, trying to get out. So, yeah, that's Infra." </blockquote><blockquote>"Music is a sort of catalyzer for thought and reflection." </blockquote><blockquote>-- Max Richter </blockquote>Nelson Zagalohttp://www.blogger.com/profile/13107799601113612022noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5429413.post-49927599797402273662023-06-11T11:16:00.010+01:002023-06-11T12:49:13.042+01:00A Floresta Sombria, Cixin Liu<p>Li o primeiro livro da trilogia "<a href="https://virtual-illusion.blogspot.com/2020/11/o-problema-dos-tres-corpos.html" target="_blank">The Three-Body Problem</a>", de Cixin Liu, em 2020 e disse que não leria o resto da série. Contudo, há dias parei na livraria a ler as primeiras páginas da recente edição portuguesa do volume 2 o que acabou por me reconquistar. Agora com as expectativas bastante mais baixas, não foi difícil gostar imenso de Cixin Liu, apesar de no revisitar da minha análise do primeiro volume tenha relembrado porque não me entusiasmou o primeiro livro. Assim, e como tantos outros leitores, acabei com a sensação de que este segundo volume supera o primeiro. Menos policial, mais existencial, mais humano. Ainda assim, Liu poderia deixar-se levar um pouco mais pelas questões que faz emergir das tramas que cria, ainda que isso fizesse perder algum público que procura ação, alimentaria mais um outro que se interessa pela especulação das hipóteses científicas.</p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiecMvNJFt_gB328s2aRSWj4jEvNcZ38fMO3ynRjaO1BzSPF1aWCiLfnpcBWwRHXG9e3Gm2UvjwHcOIEpA69Dh-NTgOD_1I4lEV2fVMfmjDUxFQ-ZAHFYY_jgMMHejBEIF5Cr-yXs7yK6Ixh5R1mJ753RBnYZhe0VouAydY3ycvbR9ba_aqggg/s2102/20230603_105721.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1636" data-original-width="2102" height="311" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiecMvNJFt_gB328s2aRSWj4jEvNcZ38fMO3ynRjaO1BzSPF1aWCiLfnpcBWwRHXG9e3Gm2UvjwHcOIEpA69Dh-NTgOD_1I4lEV2fVMfmjDUxFQ-ZAHFYY_jgMMHejBEIF5Cr-yXs7yK6Ixh5R1mJ753RBnYZhe0VouAydY3ycvbR9ba_aqggg/w800/20230603_105721.jpg" width="400" /></a></div><p><span></span></p><a name='more'></a>Neste segundo volume, os trissolarianos, do planeta Trisolaris, situado a 4.21 anos-luz da Terra, estão a caminho do nosso planeta, prevendo-se a sua chegada para daqui a 400 anos. O seu poder de fogo é devastador. A instabilidade do seu sistema planetário fê-los rumar a uma nova galáxia, a nossa, estando nós cá a mais. O resto do livro atravessa a ansiedade humana ao longo destes séculos na busca por uma forma de ultrapassar a extinção anunciada. <div><br /></div><div>As propostas de Liu são baseadas em ciência, com algumas liberdades, nomeadamente a criogenação que permite viajar para o futuro, mas suficientemente realistas para nos colocar no lugar a imaginar o que poderíamos/deveríamos fazer, enquanto espécie, naquela situação.<div><div></div><blockquote><div><i>"“Nothing serious?” Luo Ji opened his bloodshot eyes wide. “I’m madly in love with a fictional person from a novel of my own creation. I’ve been with her, I’ve traveled with her, and I’ve even broken up with my real-life girlfriend over her. Is that nothing serious to you?”</i></div><div><i>The doctor smiled tolerantly.</i></div><div><i>“Don’t you get it? I’ve given my most profound love to an illusion!”</i></div><div><i>“Are you under the impression that the object of everyone else’s love actually exists?”</i></div><div><i>“Is that even a question?”</i></div><div><i>“Sure. For the majority of people, what they love exists only in the imagination. The object of their love is not the man or woman of reality, but what he or she is like in their imagination. The person in reality is just a template used for the creation of this dream lover. Eventually, they find out the differences between their dream lover and the template. If they can get used to those differences, then they can be together. If not, they split up. It’s as simple as that. You differ from the majority in one respect: You didn’t need a template.”"</i></div></blockquote><div></div><p></p><p>Assim, Liu começa por evocar o <a href="https://en.wikipedia.org/wiki/Fermi_paradox" target="_blank"><b>Paradoxo de Fermi</b></a>, que pergunta "Onde estão todos?", ou seja, se existe uma enorme possibilidade de encontrar vida inteligente no universo, dada a sua quase-infinitude, porque é continuamos sem qualquer evidência da sua existência? </p><p></p><blockquote><i>“The universe is a dark forest. Every civilization is an armed hunter stalking through the trees like a ghost, gently pushing aside branches that block the path and trying to tread without sound. Even breathing is done with care. The hunter has to be careful, because everywhere in the forest are stealthy hunters like him. If he finds other life—another hunter, an angel or a demon, a delicate infant or a tottering old man, a fairy or a demigod—there’s only one thing he can do: open fire and eliminate them. In this forest, hell is other people. An eternal threat that any life that exposes its own existence will be swiftly wiped out. This is the picture of cosmic civilization. It’s the explanation for the Fermi Paradox.”</i></blockquote><p></p><p>Em face deste, apresenta a <b><a href="https://en.wikipedia.org/wiki/Dark_forest_hypothesis" target="_blank">Hipótese da Floresta Negra</a></b>, de David Brin que afirma que existem realmente muitas outras espécies no planeta, mas que se mantém silenciosas e à espreita. A novidade da proposta de Liu Cixin, é que tenta explicar porque isso acontece, para o qual propõe os seguintes 2 axiomas: </p><p></p><blockquote><p>1: <i>"A sobrevivência é a principal necessidade da civilização." </i></p><p>2: <i>"A civilização cresce e expande-se continuamente, mas a matéria total no universo permanece constante."</i></p><p></p></blockquote><p>Todo o livro se digladia à volta deste paradoxo, hipótese e axiomas, usando do mistério, suspense e especulação científica para nos manter totalmente engajados ao longos das mais de 500 páginas. Agora, fico à espera que a Relógio d'Água edite o 3º volume.</p></div></div>Nelson Zagalohttp://www.blogger.com/profile/13107799601113612022noreply@blogger.com0