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fevereiro 02, 2023

ChatGPT e os modelos de competência linguística

Finalmente, um artigo que discute a essência da forma do texto produzido pelo ChatGPT. Desde que surgiu e realizei múltiplas experiências com o assistente, havia algo que me perturbava profundamente na sua escrita: o facto de ser corretamente límpida, mas simultaneamente “vazia”. Vazia num sentido de intencionalidade humana, de se poder sentir por debaixo das palavras desejo, vontade, viés e distorção das ideias que se presta a discutir. Chamava a isto “voz”, mas precisava de algo mais para definir o que podia ser isto, e agora uma equipa do MIT apresenta um modelo linguístico, baseado em neurociência, que desconstrói essas competências linguísticas do ChatGPT. 

setembro 06, 2018

Avicii: Necessidades e Realização Pessoal

Acabei de ver o documentário "Avicii: True Stories" (2017) que recomendo vivamente a quem tiver interesse nas indústrias criativas, e claro no mundo da música. O melhor do filme é conseguir traçar toda a curva evolutiva do criativo, enquadrando a sua proveniência, valores e mundo, enquanto coloca a nu o desenlace quase natural que viria a acontecer apenas um ano depois do filme lançado. Aliás, em vários momentos, alguns dos entrevistados quase parecem falar como prenúncio. Existem algumas notas sobre o filme e Avicii que quero aqui deixar, ainda que não sejam nada de muito novo, são mais assunções sobre o processo criativo, o seu progresso, e potencial embate assim como algumas alternativas a esse embate.




Não existirá, em 2018,  quem não tenha ouvido uma melodia do músico, e isso dá conta do modo como ele impactou o planeta à sua passagem. Se isso se deve à excelente equipa de promoção e divulgação do seu trabalho, deve-se ainda mais à sua total obsessão com a arte. Existem vários momentos no filme em que Avicii me recorda Cristiano Ronaldo (entre tantos outros, mas também imensamente mediático e contemporâneo). 16 ou mais horas em cima da criação, sempre a aperfeiçoar, sempre à procura do seu melhor. Se Ronaldo anda sempre com a bola, Avicii andava sempre com o Mac (nem poucas horas depois de uma operação como se vê nesta imagem).


A necessidade criativa é algo absolutamente intrínseco e que salta à vista nos exemplos de maior sucesso, com pessoas que vivem e respiram aquilo que fazem. Conseguem amar mais o trabalho que qualquer outra pessoa, mesmo mais do que a si próprios. Deste modo acabam transcendendo-se, e em consequência transcendendo os seus frutos, criando o novo, o nunca visto, o original. Começam pela cópia e pelo remix, mas em pouco tempo, de tanto obsessivamente criar, acabam a inventar, a inovar.

O diagrama em pirâmide surgiu da teoria psicológica de Abraham Maslow sobre a Hierarquia das Necessidades, publicada em 1943

Avicii fez, entre 2008 e 2016, mais de 800 espetáculos.

O documentário é bom porque mostra também o outro lado da criatividade desenfreada, em busca da constante ultrapassagem de si, até ao embate na parede. Avicii bateu na parede quando percebeu que não tinha mais nada para ultrapassar. Os concertos deixaram de o fazer feliz, e tudo passou a ser stress e ansiedade. Avicii já não tocava porque interiormente assim o desejava, mas apenas porque era essa a vontade de outros, o que acabou a destruir a sua força motivacional (cf. com a "teoria da auto-determinação" de Deci e Ryan). Por outro lado, e seguindo Maslow e a sua Pirâmide das Necessidades Humanas (ver diagrama acima), Avicii cumpriu todas as necessidades, não havia mais nada na pirâmide para ele. A realização pessoal foi total, estando todas as outras necessidades também plenamente garantidas, o que fazer quando nos realizámos plenamente até ao topo?

Provavelmente a única maneira de lidar com tal passa por desenhar novos sonhos, de preferência impossíveis. O Cristiano Ronaldo tem um Mundial para ganhar, Avicii precisava de algo que lhe garantisse curiosidade e desejo, e desse modo "necessidade". Não existindo tal dentro da arte, é preciso abrir as palas da realidade, ver para além do nicho de realidade a que nos deixámos sucumbir. Avicii terá cometido o erro de se fechar no mundo da música, ou de se rodear de pessoas que limitaram o seu mundo e universo. Viajava e visitava lugares belos, paradisíacos e em parte inacessíveis, mas nada disso serviria a motivação, isso não passavam de recompensas extrínsecas, totalmente incapazes de puxar pelo seu interior. Avicii precisava de ter encontrado outro objeto em que pudesse descarregar toda a sua energia criativa, que o desafiasse a ir além de si próprio, que lhe colocasse obstáculos reais. Tinha demasiada energia, tinha necessidade de se realizar em algo que o estimulasse, mas isso só poderia ter chegado por via da dificuldade, da impossibilidade. Pensemos em Arthur Rimbaud.

Tim Bergling, aka Avicii, [1989 - 2018]

agosto 31, 2018

Ilusões Perdidas de Balzac

As ilusões discutidas são tantas que é difícil fazer uma resenha sobre tudo aquilo que trespassa este livro, mas diga-se que sem uma reflexão sobre o que se leu, uma análise do todo e daquilo que o autor parece querer dizer, podemos acabar por ficar à porta das intrigas e conflitos, muito bem urdidos, mas não propriamente o mais consequente da obra. A história terá uma base forte autobiográfica, mas mesmo assim Balzac não se limita ao seu pequeno mundo, coloca em questão um jogo de caminhos, encruzilhadas e soluções que nos falam da teia com que a sociedade nos enlaça e da qual cada um de nós tem de, da melhor forma, desenvencilhar-se. "Ilusões Perdidas" (1843) não é um simples "coming of age" ou "bildungsroman", é antes um mapeamento das diferentes possibilidades proporcionadas para o devir em sociedade.


A obra centra-se em dois personagens, aparentemente opostos, mas muito similares em termos de desejos, motivados não pelo que em si sentem, mas pelo que a sociedade lhes parece exigir, pelo que o mundo lhes pede que sejam, façam, devenham. Existe toda uma crítica não aos personagens, mas aos seus modelos do mundo, à ideologia que os sustenta, que os faz rodar e viver. Se David Séchard sonha em inventar um novo tipo de papel, não é porque o seu mote seja a criatividade ou a invenção, mas é apenas porque lhe renderá fortuna. Já Lucien parte à procura de aclamação para o seu romance, quando aquilo que na verdade lhe interessa é a aclamação da sua pessoa e as benesses que essa aclamação lhe possa oferecer. De maneiras diferentes, ambos acabam compreendendo que o mundo é complexo e difícil de domar, e se David parece aceitar e deixar-se domar, Lucien Chardon não aceita, percorrendo a saga igual a si próprio do início ao fim, e até para além deste livro (este livro tem uma segunda parte, menos conhecida, em "Esplendores e Misérias das Cortesãs" (1847)). Se num dos caminhos as ilusões se perdem e a resignação toma lugar, no outro caminho, as ilusões que se perdem não são as de quem segue o caminho, mas as de quem, como nós, vai acreditando que com os erros se aprende, e que tarde o cedo quem erra e sofre corrigirá o caminho, até que compreendemos que existe quem nunca aprende, perdendo nós a ilusão de ver a pessoa crescer e transformar-se.


Uma das questões que me coloco face a Balzac é o porquê de uma "Comédia Humana" com quase uma centena de volumes. Balzac acaba por explicar nas suas próprias obras, ao construir personagens a partir da realidade vivida e experienciada. Porque se Rastignac (de "Pai Goriot") e Lucien ("Ilusões Perdidas") são ambos jovens à procura de ascensão social parisiense, Goriot (o pai de "Pai Goriot") e Jérôme-Nicolas (o pai de "Ilusões Perdidas"), são ambos pais dessa “Comédia”, mas em polos afetivos completamente opostos. Aquilo que mais nos toca em "Pai Goriot" é a figura desse pai, que aqui Balzac mostra de ângulo diametralmente oposto, totalmente ignóbil e desprezível. Por outro lado, Balzac não se coíbe de ir reutilizando personagens de uns romances para os outros, Rastignac surge aqui e conversa com Lucien, tal como o prisioneiro fugitivo de "Pai Goriot", que depois assumirá o papel de protagonista na segunda parte das Ilusões, em "Esplendores e Misérias das Cortesãs". Balzac concebeu o seu mundo literário, a "Comédia Humana", como um mundo paralelo, espelho da realidade, mas construída à sua vontade e desejo, permitindo-lhe enfatizar, pintar, o mundo como ele próprio o via. Um desses destaques é o choque entre a pobreza e a riqueza, e os modos como se passa de um lado para o outro, daí que a ascensão social seja uma constante nos seus livros.

Tendo falado dos principais personagens, David e Lucien, quero apenas destacar os seus dois mundos, duas realidades tão distintas, mas que pouco ou nada mudaram em 175 anos. Por um lado, David tentando inventar e patentear uma revolução tecnológica no mundo do papel (em nada diferente de uma Apple, Facebook ou Google), por outro, Lucien tentando afirmar-se no mundo das artes, dando conta do quão estas se definem pela rede de amizades, mais do que pelo mérito. Ambos em busca da ascensão, da liberação da miséria, em busca de algo melhor, respeitando as regras, tentando aprender com os seus erros. Existe aqui uma luta dual que Balzac explora.

Marcel Proust agarrou-se à segunda parte, à arte e sociedade. Em certa medida fico a pensar que Proust escreveu "Em Busca do Tempo Perdido" como resposta a "Ilusões Perdidas". Ambos, Proust e Balzac, criticam o vazio da sociedade e o modo como só se é aceite e aclamado estando bem posicionado nas redes de "amigos" (as cunhas, o networking, as alianças, os lados da barricada). Mas Balzac parece quase submeter-se a esse desígnio, aceitando-o como uma inevitabilidade das sociedades humanas, parecendo desistir da possibilidade de poder existir algo mais na arte. Ora Proust escreve 7 tomos, abrindo e fechando um ciclo de ideias, que explicam o que tem a arte e a literatura para nos oferecer. Proust vai em busca da transcendência do sentido da literatura, para nos levar a acreditar no desígnio da mesma. Se Balzac atira tudo para a lama, Proust levanta e ergue de novo o edifício da arte literária, mostrando um mundo que só a ela pode oferecer, acabando deste modo a demonstrar como a própria obra de Balzac encarna em si mesmo essa transcendência.

No outro caminho, Balzac persegue os ideais capitalistas, da mais valia, da diferenciação e ganho de valor face à concorrência, colocando mesmo David a explicar a diferença entre o mercado Europeu e o Chinês, num discurso que se fosse hoje lido num jornal, seria aceite como tendo sido expresso nos nossos dias. Se Balzac parece a momentos acreditar nas capacidades inventivas do humano, na capacidade de nos deslocarmos no sentido do melhor para todos, de um suposto progresso, esse mesmo caminho surge aqui amputado, e agora não apenas pela falta de conhecimentos e rede, mas pela banca e pelo estado. A banca que empresta sob a condição de receber o dobro daquilo que emprestou, e o estado que tudo faz pelos direitos de quem detém o poder e empresta, esquecendo os mais frágeis e em piores condições de cumprir, impondo-lhes mordaças que os afastam da sociedade justa que tanto proclamam. Por isso mesmo a admiração expressa por Marx várias vezes à “Comédia” de Balzac.
"A mão de obra não vale nada na China; ali uma jornada vale três soldos, e assim os chineses podem pôr o seu papel, folha a folha, ao sair da forma, entre as lâminas de porcelana branca aquecidas, por meio das quais o prensam e lhe dão esse brilho, essa consistência, essa leveza, essa suavidade de cetim que o torna no primeiro papel do mundo. Pois bem! É preciso substituir o processo chinês por uma máquina. Com as máquinas conseguiremos resolver o problema do baixo custo que a China consegue à conta do baixo preço da sua mão de obra." (p.119)
“Como um grande estabelecimento bancário tem todos os dias, em média, uma ‘Conta de Devolução’ num valor de mil francos, recebe diariamente vinte e oito francos pela graça de Deus e pelas leis da Banca, uma formidável realeza inventada pelos Judeus, no século XII, e que hoje em dia domina os tronos e os povos. Por outras palavras, mil francos rendem então a esse estabelecimento bancário vinte e oito francos por dia ou dez mil e duzentos e vinte francos por ano. Se triplicarmos a média das ‘Contas de Devolução’, veremos que o rendimento é de trinta mil francos, vindo de capitais fictícios. Assim, não há nada que se cultive mais carinhosamente do que as ‘Contas de Devolução’.” (p.559)
As ilusões são atiradas pela janela, mas já sabíamos disso quando começámos a ler, estava escrito no título, mas nem por isso nos custa menos ver o quão desencantado Balzac se terá sentido para o escrever. "Ilusões Perdidas" pode já não ser atual em termos legislativos, mas deveria talvez ser uma obra obrigatória de leitura, não como mero grito de alerta aos jovens e seus sonhos de fama (pense-se no mais recente sonho de muitas crianças: ser YouTuber) mas como grito à sociedade nas suas múltiplas capacidades e necessidades — inventores, artistas, jornalistas, banqueiros — mas acima de tudo, governadores e políticos.
“É difícil (..) ter ilusões sobre qualquer coisa em Paris. Aqui há impostos para tudo, vende-se tudo, fabrica-se tudo, até mesmo o sucesso.”
Uma nota final sobre a leitura. As primeiras 50 páginas podem parecer paradas, Balzac tende a exceder-se na contextualização das personagens, e volta a fazê-lo sempre que alguma nova surge, mas o livro vai ganhando velocidade a ponto de se tornar imparável. Posso dizer que demorei uma semana para passar a primeira parte, mas num dia li toda a segunda metade.

janeiro 29, 2018

Projetual sim, mas não em modo exclusivo

"Lifelong Kindergarten" (2017) é o mais recente livro de Mitchel Resnick, professor do MIT Media Lab e criador do Scratch, sobre o qual devo começar por dizer que não é um livro de ciência, é um livro de divulgação de ciência. Neste sentido, e apesar de ter o selo da MIT Press, vem juntar-se ao livro “Whiplash” (2016) de Joi Ito (diretor do MIT Media Lab), que também se foca mais no dar a conhecer e menos nos fundamentos. Seguem ambos um mesmo padrão: escrita leve, escorreita, sintética, que podemos ler muito rapidamente para conhecer contornos gerais. Contudo, se tive críticas a apontar a Joi Ito, Resnick não passa incólume, não por seguir a mesma abordagem de divulgação, mas antes pela filosofia de base que suporta o que dizem, e que apresentam ambos, como se fossem caminhos únicos, sem alternativa, que todos deveríamos seguir. Também não será aqui, num texto de blog, que poderei desmontar e contra-argumentar, estou a escrever artigos mais longos ligados ao assunto, que mais tarde aqui darei conta, mas para já deixo algumas das linhas gerais suscitadas por esta leitura.


Começando pelo melhor, temos um sumário do trabalho de Resnick, daquilo que veio a dar-nos o Scratch, não apenas a ferramenta, mas a Comunidade Scratch, que é o culminar de um esforço iniciado por Papert há quase 40 anos, que Resnick soube muito bem continuar. Deste modo, talvez o mais importante do livro seja a apresentação e discussão, que perpassa todo o livro, sobre a criação e gestão das Computer Clubhouses, ou seja os clubes em que as crianças aprendem a programar, entre outras atividades ligadas às tecnologias. A filosofia de base é o melhor do livro, professa a visão de Resnick, que não sendo nova, pode e deve servir àqueles que desejem enveredar por este tipo de associações ou grupos de aprendizagem. Tenho sido um seguidor de Papert e Resnick desde sempre, e muito do meu fascínio com o seu trabalho está ligado à filosofia que suporta estas comunidades de crianças e que assenta no brincar, no aprender fazendo, no colaborativo e na partilha.

As "computer clubhouses" de que Resnick fala surgiram com as primeiras comunidades de hackers de informática, mas nunca desapareceram, antes se diversificaram, existindo hoje não apenas os clubes, mas também os eventos de congregação como as Hackathons, Codefests ou Game Jams.

Indo agora ao pior, ou o problema que tanto me incomodou: a monodirecionalidade da abordagem, que acaba parecendo-se mais com uma religião, com as suas crenças de que é possível fazer tudo com o mesmo “martelo”, mesmo quando se reconhece que as crianças são todas diferentes. Resnick reconhece as diferenças entre crianças mas não reconhece a diferença entre métodos de ensino, e isso é um problema grave. Não porque não os conheça, mas simplesmente opta por ignorar os mesmos, e defender o seu modelo como caminho único. O elefante no meio da sala de Resnick, é a defesa intransigente do construcionismo quando sabemos que nem todos os conteúdos são adaptáveis a essa abordagem de ensino. Quando sabemos que a forma e a estrutura é apenas uma parte de um todo, que tem de ter um conteúdo e um significado. Pensar que se pode ensinar tudo por meio de estratégias projetuais é no mínimo ingénuo.

Só que o problema agrava-se, e bastante, quando Resnick chega ao seu 4º e último “P”, o do “Play”. Para suportar a sua preferência pelo conceito de “playfulness” em vez de “play”, Resnick vai suportar-se nas vivências de Anne Frank durante o tempo em que esteve presa. Considero este momento marcante em toda a leitura, porque dá conta do paradoxo apresentado ao longo de todo o livro. Resnick diz-nos que aprendeu mais sobre o conceito de Play a partir da visita que fez à casa de Anne Frank, em Amesterdão, do que a partir da conferência sobre tecnologias de videojogos em que estava a participar nessa cidade. Pode parecer uma banalidade, e até pode parecer suportar a ideia que o autor quer defender, mas contém a essência da limitação da abordagem construcionista.

Ou seja, Resnick não chega à compreensão do conceito abstrato de Play por meio da construção de projetos, mas por meio da leitura que fez do livro de Anne Frank, por meio da exposição aos sentires, preocupações, enfados, e essencialmente pela descrições que ela realiza nesse livro e nos permitem ficar a conhecer a sua personalidade. Mas é ainda mais grave, porque Resnick foge à essência da base educativa fornecida pelos pais de Anne Frank. Resnick foca-se no modo como Anne passava o tempo encetando projetos para entreter o tempo, a sua atitude brincalhona, e em nenhum momento faz referência às centenas de livros que Anne Frank, a irmã e os pais liam. Sim, porque Anne Frank só escreveu o livro que escreveu, porque lia muito, muito mesmo. E se tinha uma imaginação fértil, era porque esta era alimentada com o mundo que lhe entrava pelas janelas dessas páginas. Se Anne Frank tivesse sido educada na base do método aqui apresentado por Resnick, exclusivamente assente na realização de projetos, nunca se teria tornado na escritora que ainda conseguiu ser antes de desaparecer prematuramente.

Eu faço referência a isto porque já tinha acontecido alguns capítulos antes, quando se compara o Scratch com uma caneta que permite expressar ideias (a comparação é boa, o problema é a base). Resnick fala na necessidade de treinar a escrita, de treinar a comunicação, mas nunca refere a necessidade de ler, ler para conhecer factos, conhecer mundo, para poder expressar algo significativo. Porque essa é a essência dos problemas de muito daquilo que se pretende rotular de criativo. Criar não é apenas estrutura, dar forma, “pôr a funcionar” ou “pôr bonito”, criar é dar sentido à realidade. Basta olhar para os primórdios do Cinema e ver os filmes feitos por engenheiros, ou uma boa parte dos jogos digitais ainda hoje criados por equipas constituídas exclusivamente por informáticos, para compreender que não chega ser capaz de fazer, nem fazer bem. Até mesmo na literatura, basta ver o que fazem autores como Pedro Chagas Freitas, que escrevem centenas de livros e ainda dão workshops de escrita criativa. Se não existe conteúdo para colocar dentro, não existe comunicação. Quem não é exposto e confrontado com os sentires do mundo, quem não consome, analisa, discute e critica, não cria verdadeiramente.

Dito tudo isto, deixei o texto parado para refletir sobre o que tinha escrito, o que me obrigou a repensar o que tinha escrito, dado o enquadramento geral da área da Educação. Na realidade, a discussão em redor da aprendizagem é um território terrível no qual as trincheiras estão muito bem definidas, e não existe muito espaço para o meio-termo. Se Resnick discursa desta maneira não é por acaso, ele tem razão na maior parte do que diz, e não diz nada de errado, apenas omite o outro lado. E omite porque nesse outro lado, existe um conjunto de ideólogos prontos a disparar a todo o momento. Em Portugal isto é bem conhecido, apresentam-se como demonizadores daquilo que eles definem como “Eduquês”, o seu maior expoente, Nuno Crato, chegou mesmo a Ministro da Educação, e vimos no que deu. No entanto, depois de quase escorraçado, e ter passado por um pequeno período de silêncio, ainda por estes dias voltou a dar um ar da sua graça, lançando fel no texto: “Eles hoje aprendem de maneira diferente… Ah é?!”.

Para fechar. Sou grande defensor da abordagem projetual, e continuarei a ser, só não quero é que esse caminho seja visto como exclusivo. Esta abordagem para funcionar plenamente, e permitir a criatividade brotar com sentido, precisa de ser suportada por muita exposição e confrontação de ideias. No fundo é aquilo que já hoje usamos nas nossas universidades, que distingue aulas teóricas de teórico-praticas e laboratoriais. O trabalho projetual é essencial para que o aluno cresça, ganhe autonomia, colabore com os pares e desenvolva competências, mas antes disso acontecer tem de ser exposto aos múltiplos conceitos teórico-abstractos do domínio.

dezembro 02, 2017

O futuro do Audiovisual

No ano passado, uma equipa do motor de jogo Unity apresentou uma curta na Game Developers Conference 2016, intitulada "Adam: Episode 1" (2016). O impacto passou da conferência para a rede, deixando todos boquiabertos. A história tinha mistério, a intriga lançava múltiplas questões, mas foi o impacto do realismo da animação e da cinematografia, tudo renderizado em tempo-real, que mais impactou a comunidade. Algo completamente impensável pouco anos antes, o puro cinema virtual que Gaeta vinha falando. Se tudo isto já seria mais do que suficiente para o nosso espanto, a Unity resolveu adotar uma estratégia criada antes pela Blender com o seu modelo de Open Movies, e colocou online, de modo livre, todos os materiais utilizados no desenvolvimento do projeto, permitindo assim a quem o desejasse, continuar o mesmo. Como cereja no topo do bolo, quem resolveu pegar no projeto foi nada menos que Neill Blomkamp, o realizador sul-africano, que se internacionalizou com "District 9" (2009), tendo depois disso criado dois blockbusters, "Elysium" e "Chappie", sempre no género de ficção-científica.



Num qualquer momento do nosso futuro, começaram a retirar os corpos biológicos aos prisioneiros, e a carregar os seus seres em corpos de robôs.

Este pequeno resumo é suficientemente impressionante, tendo tudo para lançar discussões infindáveis sobre o futuro do cinema e audiovisual, sobre os seus aspetos relacionados com atores, cinematografia, tecnologia, vfx, mas também direitos de autor, entre muitas outras questões. Contudo, se fiz este post não foi tanto para discutir esses detalhes, que já não são novos no mundo das tecnologias 3d audiovisuais, mas antes para falar do que se seguiu a "Adam". Se o primeiro episódio criado pela equipa do Unity, que lançava a premissa, era instigante, os dois novos episódios — "Adam: The Mirror (episode 2)" e "Adam: Episode 3" — criados por Blomkamp, não ficaram nada atrás, antes pelo contrário, elevaram o nível para esmagador, verdadeiramente provocantes.

Aconselho vivamente verem os 3 episódios seguidos, mas preparem-se para a montanha-russa de sensações em cada um dos episódios. Não são questões novas para quem segue o trabalho de Blomkamp, contudo o facto de estar imensamente bem conseguido, aliado ainda ao facto de estarmos a ver algo criado em tempo-real, tudo ajuda na intensificação das sensações, e do reconhecimento. Se o primeiro e o segundo nos fazem pensar em "AI: Artificial Intelligence" (2001) ou "SOMA" (2015), este terceiro parece querer atirar-nos para os universos gótico-religiosos da série "Alien", particularmente do último "Covenant" (2017).


"Adam: Episode 1" (2016)

"Adam: Mirror (episode 2)" (2017)

"Adam: Episode 3" (2017)

outubro 29, 2017

Questões que a automação coloca à Arte

As tecnologias continuam a desenvolver-se, notando-se uma aceleração nos processos de automação e das chamadas "inteligências artificiais" (IA), que não passam de algoritmos que controlam e acedem a bases de dados gigantes, detentoras de saber acumulado construído com base na mímica de ações de milhares de humanos. O mais recente exemplo vem na forma de uma reportagem da BBC feito a partir da Adobe Max Conference anual, que indica as futuras adições de IA ao Photoshop.




O que Adobe nos apresenta é excepcional, dá vontade de começar a utilizar desde já, é imensamente atrativo, e parece apresentar um enorme avanço no que toca a Edição de Imagem, estática e dinâmica, contudo não deixa de levantar questões sobre o que apresenta, e ainda mais sobre o que nos reserva para os anos vindouros o seu natural progresso. Deixo algumas dessas questões que me surgiram ao ver o vídeo de apresentação:
. Estaremos a abrir a porta ao fim do virtuosismo na criação artística?

. Iremos cada vez menos precisar de investimento técnico, menos esforço, e tudo ficará à mão de meia-dúzia de cliques e escolhas?
. Deixaremos de reconhecer o trabalho e reconheceremos apenas as ideias e os resultados? 
. Sem esforço, podendo qualquer um criar o que quer que seja com grande qualidade técnica, fazendo explodir a produção, não se tornará praticamente impossível a individualização das ideias e desses resultados?
. Abandonaremos a ideia de contexto na criação, porque o contexto não pertencerá ao criador, mas ao sistema que propícia a técnica? 
. etc. etc.

Ver o vídeo no site da BBC.

janeiro 15, 2016

"Information Doesn't Want to Be Free: Laws for the Internet Age"

Cory Doctorow é sobejamente conhecido pela sua luta contra o copyright, com formação em tecnologia e editor de um dos blogs internacionais mais influentes — Boing Boing — assim como com vários livros publicados, muitos de forma independente, é uma pessoa com uma visão alargada do estado do copyright assim como das tecnologias que dão vida à atual web. Este seu novo livro surge num tom bastante retórico sustentado pela sua experiência pessoal, acumulada ao longo das últimas duas décadas.


Do lado positivo, além da sua experiência e amplo envolvimento no debate internacional, o livro vem carregado de analogias que nos permitem facilmente ganhar uma compreensão do que está em causa em toda esta discussão. O cerne do seu argumento não se foca na abolição do copyright, de todo, antes na proposta de uma nova regulação para o mesmo, estando o verdadeiro problema, para Doctorow na grande indústria de entretenimento. Doctorow ataca sem dó nem piedade tudo o que ela representa desde a música, cinema às editoras livreiras.

Diga-se que o foco é bem definido e sustentado, se fossemos aceitar tudo o que essa grande indústria deseja, viveríamos hoje debaixo de uma autêntica ditadura, totalmente amordaçados, tudo em nome de algo que nunca foi consagrado na lei do copyright. É contra isto que Doctorow se move, e toda a sua argumentação está cheia de casos recentes que conferem enorme força à sua luta, e digo mesmo que era bom que fosse ouvido.

O problema é que o livro acaba por sofrer desta abordagem, de pura retórica, mais tipo TED Talk ou post de blog, estendidos num livro, sem metodologia de fundo que sustente toda a argumentação, acabando por surgir caso a caso, mais anedotário do que cientificamente sustentado, conferindo-lhe assim baixa credibilidade. Doctorow mete os pés pelas mãos ao misturar assuntos imensamente mais complexos — banca, terrorismo, pedofilia — do que aquilo que a indústria de entretenimento anda a tentar fazer com o PIPA, a SOPA ou a ACTA. Doctorow tenta tocar em tudo aquilo que a internet toca, e ao fazê-lo perde-se, porque apesar de eu concordar com o facto de esta ser o sistema nervoso da sociedade contemporânea, isso não quer dizer que não tenha de existir regulação, como ele próprio acaba por admitir por entre frases ao longo do livro.

Por outro lado, e talvez por ser um discurso sentido e quase confessional com o leitor, que se espera serem os novos criadores, Doctorow acaba fazendo um discurso muito relevante para todos aqueles que pretendam entrar no mercado da cultura criativa. Sempre que apresenta alguma coisa boa que a internet pode fazer pelo artista independente, nunca se esquece de apresentar o reverso da medalha, explicitando bastante bem os problemas, as armadilhas, mas sem deixar de incentivar sempre à criação. Aliás, o modo como termina o livro vai exatamente nesse sentido quando diz simplesmente:
If I have to choose between twenty hours’ worth of blockbusters every summer and sixty hours of “personal” video every second on YouTube, I’ll choose the latter (..) I think we can tell a good copyright system from a bad one by what kind of work gets made under its rules. A bad copyright system has fewer creators making fewer types of work, enjoyed by fewer people. A good copyright system is one that enables the largest diversity of creators making the largest diversity of works to please the largest diversity of audiences.

novembro 09, 2015

Automação da arte

Nos últimos anos temos assistido à automação de tarefas um pouco por todas as esferas da atividade humana. Qualquer atividade que requeira repetição de passos, sem grande variabilidade, é rapidamente sujeita a processos de informatização que permitam a sua automação por máquinas. Ora se existe área onde isto não parece fazer muito sentido é na criação artística, já que aquilo que se espera neste domínio é sempre a criação de novo, diferente, original. Contudo parece que já nem sempre assim é.



O mais recente exemplo surgiu esta semana no campo da criação de ambientes virtuais em tempo real, para usar na plataforma Unreal. Trata-se do Landscape Auto Material criado pela VEA Games, e que permite criar todo um ambiente florestal, altamente original de cada vez, porque personalizado em termos de posição e dimensão, assim como elementos e texturas. Basta arrastar o rato para rapidamente criar um trilho com ervas, pedras, arbustos, riachos, assim como criar relevos. É o mais próximo que já vimos da criação artística através do clique de um botão.

Como dizíamos acima isto não é novo, em 2010 tínhamos visto a Adobe apresentar a ferramenta Content Aware que faz algo muito parecido em fotografia 2d no Photoshop. Estamos no fundo a falar de algoritmos que conseguem usar informação sobre objetos pré-existentes para criar novos. Aliás o próprio mundo do webdesign já imensamente fustigado pelas gigantescas bases de dados de templates, começa também agora a conhecer ferramentas deste tipo, com IA que se adapta às necessidades mais específicas de cada utilizador. Por um lado tudo isto parece em certa medida ficção científica, por outro começa mesmo a parecer o início do fim das artes, mas será mesmo?

Na verdade não. Primeiro, porque falamos de atividades criativas altamente repetitivas, profundamente orientadas a um objetivo, ou mesmo tarefa. Nada nestes processos é muito criativo, tendo em conta a quantidade de objetos semelhantes criados antes. Ou seja, de que modo podemos separar hoje o desenho de um website, ou de um terreno florestal 3d, do esculpir de uma caneca de barro? Na verdade nada, e por isso mesmo é que estas ferramentas surgem, e cada vez teremos mais. Mas isto não quer dizer que deixaremos de precisar de criadores de universos de paisagens virtuais, ou de criadores de websites.

Simplesmente porque estas ferramentas são apenas e só tecnologias criativas, tecnologias que trazem embebidas em si, conhecimento de suporte à criação. Ou seja ferramentas que permitem a quem nada percebe do assunto rapidamente construir algo, e assim aceder ao universo em questão, encontrando-se em termos criativos. Assim como permitem a um criativo profissional rapidamente executar algumas das tarefas mais repetitivas, sem contudo deixar nunca de executar o seu trabalho, aquele pelo qual verdadeiramente é pago, a ideação e a comunicação, ou seja a capacidade de pensar de forma única, inovadora, e de transformar esse pensar, a imaginação, numa forma real e expressiva.

Por mais automação que venhamos a criar, a ideação e sua expressão são uma espécie de último reduto intransponível. Mesmo que venhamos a conseguir dotar máquinas de consciência um dia, aí passaremos a ter entidades por detrás dos processos de ideação, o que implicará que esses processos continuarão a não ser catalogados de automação, mas sim de criação, ainda que não sejam fruto de uma mente humana.

"UE4 Pack: Landscape Auto Material" (2015) da VEA Games

setembro 10, 2015

Criatividade em remix no “Hell’s Club”

Antonio Maria Da Silva, provável lusodescente, residente em Paris, criou um trabalho brilhante de montagem e composição vídeo a partir de dezenas de sequências de diferentes filmes chave de Hollywood. O filme conta com quase 10 minutos, nos quais somos convidados a viajar até ao “Hell’s Club”, um clube ficcional criado por Antonio Maria Da Silva, por meio de uma edição e correcção de cor tão perfeitas que tudo parece ter sido verdadeiramente filmado para este filme.



A base do trabalho consiste num apanhado de sequências cinematográficas passadas em discotecas, retiradas de filmes como: “Star Wars", "Saturday Night Fever", "Hellraiser", "Scarface," "Carlito's Way", “The Terminator", "Matrix", “Trainspotting” "Pulp Fiction", "Robocop”, “Collateral Damage” entre outros. Com as sequências em mão o autor terá procurado uma linha condutora de acção e conflito, que acaba por resultar plenamente, ao contrário de muitos outros trabalhos de remix que se ficam pelas simples piadas ou fragmentos narrativos.

Para tornar credível todo o cenário de "Hell’s Club” foi necessário proceder a um enorme trabalho de correcção de cor, já que as luzes da discoteca de "The Matrix" são completamente distintas das de "Saturday Night Fever", e mesmo quando aproximadas, são-no apenas na nossas recordações, já que o clube de Tony Montana sendo filmado nos anos 1970 não tem qualquer afinidade com um clube filmado nos anos 2000, para parecer um futuro distante em "Star Wars Episode II: Attack of the Clones". Sobre tudo isto existe toda uma quantidade de pequenas composições internas nas imagens, com sequências de filmes a surgirem em reflexões de outras sequências, com personagens a surgirem em profundidade de campo, ou ainda no uso de sombras que simulam personagens que passam por outras que nos mantêm ali fixados, seduzidos, e crentes na existência do Hell's Club.



Se a edição de cor é o garante da unidade audiovisual, aquilo que verdadeiramente garante a cola narrativa de todo o filme é o trabalho de enorme minúcia realizado sobre o "gaze" (o olhar de cada personagem no enquadramento). Toda a história é construída com base nos olhares dos personagens de cada filme, com Antonio Maria Da Silva a trabalhar cirurgicamente o cruzamento constante de olhares entre os diferentes actores, indo mesmo além, quando coloca o mesmo actor mas em diferentes filmes, como que a olhar para si próprio, sem dúvida daqueles momentos que marcam qualquer trabalho na mente do espectadores.

"Hell's Club" (2015) de Antonio Maria da Silva

Analisando o canal YouTube de Antonio Maria Da Silva podemos verificar como tudo isto pode ser novo para nós, mas não é algo recente, nos seus trabalhos anteriores podemos notar que há vários anos que ele vem trabalhando a imaginação de conflitos cinematográficos por meio de remontagens e remisturas de filmes tais como Bruce Lee vs. Bruce Lee (2013), ou Terminator vs. Robocop (2010). Aliás, o seu canal Youtube revela-se interessantíssimo para compreendermos o processo evolutivo das suas competências de edição e composição audiovisual. São várias dezenas de vídeos, essencialmente mashups, que podemos aí encontrar, criados ao longo dos últimos sete anos, que funcionam como uma evidência clara de o talento resulta da prática, da persistência, da vontade de continuar a fazer mais, e sempre melhor.

maio 17, 2015

A criatividade digital na encenação de "Marvel vs. DC"

Trago mais um brilhante exemplo de criatividade digital proporcionado pelas tecnologias criativas, um trabalho ficcional que seria impossível de criar apenas há alguns anos atrás, por apenas uma pessoa e em apenas três meses. Saruhan Saral criou um filme de animação que coloca em cena uma batalha tantas vezes imaginada por todos aqueles que seguem o universo dos super-heróis, Marvel ou DC, apesar de ter sido representada em 1996 na série "DC vs. Marvel".





Saral cruzou o melhor que o universo digital tem para oferecer e criou toda a sua própria plataforma criativa. A partir de vários videojogos, nomeadamente "Marvel vs. Capcom 3" (2011) e "Injustice: Gods Among Us" (2013), obteve materiais previamente criados por outros: modelos e animações 3d de vários personagens Marvel e DC; assim como várias excertos audio de vozes. A estes juntou depois cenários, efeitos, e novas animações criadas no Blender. Por fim integrou e compôs tudo no After Effects, para assim poder contar a história que pretendia.

Capa do nº1 da série "DC vs. Marvel" (1996)

Este filme de animação não é um machinima, porque não foi produzido apenas com recurso a materiais a correr em tempo-rela em sistemas de jogo, assim como também não é uma regular animação 3d, é antes fruto da mescla de ambos. Saral não se limita a remisturar materiais pre-existentes, ele recorre a estes para colmatar a dificuldade de modelar personagens tridimensionais de personagens conhecidos, assim como a impossibilidade de criar vozes credíveis, e sobre estes cria de raiz todo um conjunto de novas camadas de materiais, que depois de integrados funcionam como um todo.

"Marvel vs. DC - The Ultimate Crossover" (2015) de Saruhan Saral

O filme em si funciona bastante bem para o género, embora nem tudo me agrade nomeadamente a repetitividade na sucessão de batalhas individuais, que se percebe pela dificuldade que seria integrar múltiplos personagens num mesmo cenário. Os ambientes também não são propriamente muito elaborados. Contudo tendo em conta a metodologia empregue, os recursos humanos, e o tempo, podemos dizer que é um bom trabalho.

as tecnologias criativas

Esta semana saiu o resultado de mais um projecto do engageLab, o livro "Creativity in the Digital Age", dedicado a aprofundar as questões por detrás das tecnologias criativas. O livro foi publicado pela Springer e sucede a um número da revista Comunicação e Sociedade, nº22 (2012), também dedicado ao tema. O domínio das tecnologias criativas tem servido como um dos motores de ação no trabalho, que tenho desenvolvido conjuntamente com o Pedro Branco, no engageLab.


Este volume que agora editamos começou a ser preparado quando saiu o nº22 da revista Comunicação e Sociedade, ou seja teve um percurso de quase três anos até ver a luz. Na altura sentimos que ainda não tínhamos conseguido ir ao âmago da questão. É verdade que o domínio é em si extremamente abrangente, mas tínhamos algumas ideias bastante concretas do que queríamos aprofundar. Nesse sentido fomos trabalhando um position paper sobre o domínio, que tínhamos intenção de submeter a um journal, mas que acabou servindo de capítulo de abertura deste novo livro, sendo depois intitulado - "The Creative Revolution That Is Changing the World".

"Tecnologias Criativa", nº22 (2012)

As dificuldades de concretizar a temática deveram-se muito ao hype gerado em torno da ideia de criatividade nos últimos anos, de que fazemos menção no prefácio do livro, e que nos levou a recusar várias propostas, mesmo de pessoas que tínhamos previamente convidado a participar no projecto, por não se enquadrarem na abordagem que pretendíamos focar. Tudo isto arrastou a produção do livro, atrasando o seu fecho e submissão ao peer-review final dos editores da colecção Springer Series on Cultural Computing.

Dito isto, o resultado final satisfaz-nos bastante, julgamos que estão representados neste volume as áreas centrais do domínio das tecnologias criativas, e esperamos que este trabalho possa servir no lançamento de outras iniciativas, capazes de alavancar e sustentar o futuro da área.

fevereiro 10, 2015

Reconstruindo a aura de personagens

Casey, uma jovem americana de apenas 17 anos, com recurso ao GarageBand, Final Cut Pro e iMovie, compilou num filme de 14 minutos, os momentos mais relevantes do personagem Severus Snape da série de filmes de "Harry Potter", reconstruindo assim não apenas o apelo do personagem, mas também todo o ponto de vista do universo, que passa aqui por ser dado pelo seu tom, pela sua visão, pelas suas emoções.


Mais uma vez o poder do remix a demonstrar o quão ricas podem ser todas as tecnologias que se têm disponibilizado às pessoas, que requerem tão poucas competências, apenas vontade, motivação e persistência para expressar uma ideia. Casey refere que resolveu criar este filme como homenagem ao personagem, para contrabalançar todo o ódio e incompreensão que ele destilou em muitos dos seguidores da série. JK Rowling apenas revelou verdadeiramente quem era Snape no último livro.

"Severus Snape 1960-1998" (2015) 

julho 10, 2014

Daqui a 30 anos, segundo Negroponte

Nicholas Negroponte é um dos principais responsáveis por eu fazer o que faço hoje. Nesta sua TED de 2014 diz a certo ponto que quando a Wired saiu, os miúdos deixaram de comprar a Sports Illustrated para passar a comprar a Wired, no meu caso deixei de comprar a Cahiers du Cinema, mudando claramente os meus interesses. Mas provavelmente o mais importante tenha sido o seu livro "Being Digital" (1995) que me fez despertar para todo um novo mundo da tecnologia no qual o computador passava a assumir o lugar de extensão expressiva do humano.



Nesta TED Negroponte passa em revista as 14 TED talks que deu, um número que dá bem conta da sua importância na arena dos desenvolvimentos das tecnologias da comunicação. Ao mesmo tempo aproveita para enfatizar o facto de ter sido responsável por alguns projectos e algumas afirmações visionárias que em tempos foram motivo de chacota ou refutação mas que hoje são amplamente usadas ou aceites.

Nesse sentido, e respondendo à questão que Chris Anderson (director da TED) lhe tinha lançado, “qual é a sua previsão para daqui a 30 anos?”, Negroponte responde com uma ideia simples, mas ao mesmo tempo tão ficção-científica, que nos parece tão impossível como ter um carro nas estradas sem condutor!
“one of the things about learning how to read, we have been doing a lot of consuming of information going through our eyes, and so that may be a very inefficient channel. So my prediction is that we are going to ingest information You're going to swallow a pill and know English. You're going to swallow a pill and know Shakespeare. And the way to do it is through the bloodstream. So once it's in your bloodstream, it basically goes through it and gets into the brain, and when it knows that it's in the brain in the different pieces, it deposits it in the right places. So it's ingesting.”


Acredito nesta previsão, só não sou tão optimista como Negroponte, talvez porque como ele diz, daqui a 30 anos já cá não estará, mas eu talvez ainda cá esteja. Por isso acredito antes que isto possa vir a ser possível dentro de 50 anos. Mas tenho de acrescentar aqui uma variação ao que é dito por Negroponte, eu não acredito que esta ingestão venha substituir a leitura, pela simples razão que aquilo que vamos ingerir não serão comprimidos de texto. Aquilo que vamos ingerir são os filmes e videojogos do futuro, realidade virtuais que simularão no nosso cérebro histórias, acções e experiências. Aliás falei disto quando aqui discuti o último filme de Ari Folman, "The Congress" (2012).

julho 01, 2014

Corrida contra a automação da informação

Erik Brynjolfsson e Andrew McAfee são dois académicos de economia do MIT que procuram perceber os impactos e efeitos das tecnologias de informação sobre o trabalho e a produtividade. “The Second Machine Age: Work, Progress, and Prosperity in a Time of Brilliant Technologies” (2014) é o resultado de vários anos de investigação, e uma espécie de edição definitiva do livro que ambos auto-publicaram em 2011, “Race Against The Machine”.


O cerne da teorização apresentada assenta sobre a ideia de que a Primeira Era das Máquinas (revolução industrial) tratou da automação do trabalho manual, enquanto a Segunda Era das Máquinas trata da automação do trabalho com informação. Esta segunda era é motivada pela quantidade de informação acessível em tempo-real e os algoritmos de tratamento da mesma, sendo um dos grandes exemplos apontado pelos autores, o carro sem condutor da Google, algo que foi apenas possível graças ao manuseamento de massas de dados existentes combinados de forma contínua com a captura em tempo real de dados no carro.

Lexus da Google sem condutor

A primeira parte do livro centra-se sobre as alterações na paisagem tecnológica, sustentando-as com exemplos e demonstrações do que está acontecer no mundo em que nos movemos. Os autores trabalham sobre a exponenciação da capacidade tecnológica baseando-se no princípio de Moore, trabalham questões sobre a digitalização de cultura, sobre a inovação e os efeitos benéficos destas alterações. Nesta fase do livro o discurso é bastante optimista, o futuro será melhor e mais fácil graças ao desenvolvimento tecnológico, e essencialmente ao avanço das tecnologias de informação e de aprendizagem por parte das máquinas. É aqui que se introduz um dos conceitos chave do livro, BOUNTY (recompensa), que dá conta dos ganhos que a sociedade viveu nas últimas décadas graças ao avanço da computação. O facto de podermos aceder a cada vez mais e melhor tecnologia, e consequente conforto, pagando cada vez menos para tal, assim como o facto de termos cada vez mais tempo livre que nos permite gerar toda uma nova economia social.

No entanto o livro não se fica pelos ganhos, nem pelo avanço tecnológico, os autores especialistas em economia, passam a segunda metade do livro a trabalhar o assunto do ponto de vista das pessoas, dos seres humanos que se relacionam com a tecnologia, e os impactos que esta teve e terá sobre as suas vidas. Nesta segunda parte é introduzida o segundo conceito chave do livro SPREAD (distanciamento) que dá conta do aumento do fosso entre aqueles que conseguem aproveitar o que as tecnologias oferecem, e aqueles que por várias razões não as conseguem dominar, ou sequer aceder. Os impactos estão à vista com a mais recente crise de 2008 como se pode ver na obra “Capital” (2014) de Thomas Piketty, que se estende num conglomerado de problemáticas, algumas bem evidenciadas por Lanier em ”Who Owns the Future?” (2013). Como é dito a certa altura,
“Eventually, the economy will find a new equilibrium and full employment will be restored as entrepreneurs invent new businesses and the workforce adapts its human capital.
But what if this process takes a decade? And what if, by then, technology has changed again? This is the possibility that Wassily Leontief had in mind his 1983 article when he speculated that many workers could end up permanently unemployed, like horses unable to adjust to the invention of the tractors. Once one concedes that it takes time for workers and organizations to adjust to technical change, then it becomes apparent that accelerating technical change can lead to widening gaps and increasing possibilities for technological unemployment. Faster technological progress may ultimately bring greater wealth and longer lifespans, but it also requires faster adjustments by both people and institutions.”
Neste sentido o livro fecha as duas partes - Bounty e Spread - apresentando um conjunto de soluções para se atuar primeiro a um nível individual, e em seguida a um nível político. Deste modo podemos dizer que estamos perante um trabalho bastante abrangente, que procura identificar o bom e o mau da revolução de informação que vivemos no momento, refletindo e apresentando soluções plausíveis e exequíveis. É sobre essa parte que me irei deter um pouco mais aqui, não que o resto do livro não seja muito interessante também, mas porque é aquilo que me parece mais relevante discutir. Julgo que depende de todos nós, e cada um pode à sua maneira, e no limite das suas possibilidades procurar a mudança. Assim deixo alguns dos pontos que me parecem mais relevantes.


. Trabalhar com as máquinas, não contra elas
“The teams of human plus machine dominated even the strongest computers. The chess machine Hydra, which is a chess-specific supercomputer like Deep Blue, was “no match for a strong human player using a relatively weak laptop. Human strategic guidance combined with the tactical acuity of a computer was overwhelming.The surprise came at the conclusion of the event. The winner was revealed to be not a grandmaster with a state-of-the-art PC but a pair of amateur American chess players using three computers at the same time. Their skill at manipulating and “coaching” their computers to look very deeply into positions effectively counteracted the superior chess understanding of their grandmaster opponents and the greater computational power of other participants. Weak human + machine + better process was superior to a strong computer alone and, more remarkably, superior to a strong human + machine + inferior process.” Kasparov citado no livro

. As áreas em que ainda fazemos a diferença
“Picasso’s quote [“But they (computers) are useless. They can only give you answers.”] is just about half right… Computers are not useless, but they’re still machines for generating answers, not posing interesting new questions. That ability still seems to be uniquely human, and still highly valuable. We predict that people who are good at idea creation will continue to have a comparative advantage over digital labor for some time to come, and will find themselves in demand.”
Os três conceitos chave em termos de competências humanas para o futuro serão - a ideação (ter ideias), a criatividade (fazer diferente) e a inovação (criar novo). As três abordagens estão ligadas ao pensamento “fora-da-caixa”, algo que os computadores apresentam muita dificuldade em fazer, uma vez que estão limitados ao framework que lhes é dado. Ou seja, os computadores são excelentes a reconhecer padrões, mas muito maus a irem além destes. Uma das razões pelas quais somos bons nisto, tem que ver com o facto de combinarmos os vários sentidos para absorver e analisar a realidade, o que acaba reflectindo-se na forma como depois nos expressamos face à realidade.
“The Spanish clothing company Zara exploits this advantage and uses humans instead of computers to decide which clothes to make. For most apparel retailers, forecasting and sales planning are largely statistical affairs… Zara takes a different approach… To answer the critical question “Which clothes should we make and ship to each store?” Zara relies on its store managers around the world to order exactly, and only, the merchandise that will sell in that location over the next few days. Managers figure this out not by consulting algorithms but instead by walking around the store, observing what shoppers (particularly cool ones) are wearing, talking to them about what they like and what they’re looking for, and generally doing many things at which people excel. Zara store managers do a lot of visual pattern recognition, engage in complex communication with customers, and use all of this information for two purposes: to order existing clothes using a broad frame of inputs, and to engage in ideation by telling headquarters what kinds of new clothes would be popular in their location.”
Outra razão em que eu tenho vindo a reflectir bastante nos últimos anos, tem que ver com o facto de como seres humanos errarmos, estarmos autorizados a errar, porque faz parte de nós. Enquanto a máquina não pode errar. Ora acredito que se a máquina não pode errar, não pode sair do caminho predeterminado, então muito dificilmente alguma vez poderá ser verdadeiramente criativa.


. A escola no meio de tudo isto

Para que estas competências se desenvolvam precisamos de uma escola diferente, capaz de estimular a autonomia, a automotivação e o envolvimento. Mas tudo isto não pode ser desligado de uma profunda capacidade de análise crítica da realidade, algo que tem vindo a ser descurado, essencialmente no ensino superior, fase em que esta competência deveria ser profundamente estimulada.
“Arum and Roksa made use of the Collegiate Learning Assessment (CLA), a recently developed test given to college students to assess their abilities in critical thinking, written communication, problem solving, and analytic reasoning. Although the CLA is administered via computer, it requires essays instead of multiple-choice answers. One of its main components is the ‘performance task,’ which presents students with a set of background documents and gives them ninety minutes to write an essay requiring them to extract information from the materials given and develop a point of view or recommendation. In short, the performance task is a good test of ideation, pattern recognition, and complex communication.
Arum, Roksa, and their colleagues tracked more than 2,300 students enrolled full-time in four-year degree programs at a range of American colleges and universities. Their findings are alarming: 45 percent of students demonstrate no significant improvement on the CLA after two years of college, and 36 percent did not improve at all even after four years. The average improvement on the test after four years was quite small. What accounts for these disappointing results? ”
Arum, Roksa, and their colleagues document that college students today spend only 9 percent of their time studying (compared to 51 percent on “socializing, recreating, and other”), much less than in previous decades, and that only 42 percent reported having taken a class the previous semester that required them to read at least forty pages a week and write at least twenty pages total."
No fundo não chega querer, menos ainda chega entrar na universidade pretendida, ou no curso pretendido, é preciso trabalhar, e muito, para construir as competências. A universidade e o professor são apenas a ponta do iceberg, os resultados só aparecem com o trabalho em profundidade individual do estudante. Não é por acaso que Bolonha impôs metas para o trabalho individual a realizar pelo aluno fora de aulas. Estudos como, “How College Affects Students: A Third Decade of Research”, de Ernest Pascarella e Patrick Terenzini concluíram que “the impact of college is largely determined by individual effort and involvement in the academic, interpersonal, and extracurricular offerings on a campus”.

Deste modo Erik Brynjolfsson e Andrew McAfee acabam por concluir que apesar das máquinas estarem a automatizar e a tornar tudo mais fácil em nosso redor, nem por isso o mundo à nossa volta será mais fácil para a grande classe média. Conseguir emprego será cada vez mais difícil, e para se precaver só existe um caminho,
“our most fundamental recommendation to students and their parents: study hard, using technology and all other available resources to ‘fill up your toolkit’ and acquire skills and abilities that will be needed in the second machine age.”
Esta é uma realidade que por mais que queiramos escamotear nos bate à porta em todas as estatísticas e recomendações, como bem dá conta o relatório publicado no mês passado pela Comissão Europeia sobre o emprego na Europa,
“Low qualified workers encounter increasing difficulties to find a job, face lower job stability and are out-competed by medium-skilled workers even in elementary occupations.”

Por fim quero apenas deixar um ponto abordado a determinada altura no livro, e que tem que ver com a investigação que realizamos nos nossos laboratórios todos os dias. Nós que trabalhamos com tecnologias de informação e comunicação estamos constantemente preocupados em desenvolver novos sistemas que automatizem as atividades humanas. O que os autores dizem é, e se não fosse assim? E se em vez de procurarmos automatizar as tarefas, procurássemos antes novas formas de criar actividades, de tornar as pessoas, os seres humanos, mais ativos, mais criativos? (Isto é em parte algo que tenho vindo a trabalhar mais recentemente sob a designação de Tecnologias Criativas). No final, nenhum de nós procura verdadeiramente parar de trabalhar, o trabalho é essencial ao ser-humano por estranho que possa parecer! Esse é um ponto aqui defendido, e com o qual concordo particularmente,
“It’s tremendously important for people to work not just because that’s how they get their money, but also because it’s one of the principal ways they get many other important things: self-worth, community, engagement, healthy values, structure, and dignity, to name just a few. Whether the focus is on the individual or the community, the conclusion is the same: work is beneficial.”

“The Second Machine Age" é um livro carregado de ideias, questões, dúvidas, hipóteses e imensa reflexão sobre algo que nos preocupa a todos. De tudo isso dei aqui conta apenas de uma brevíssima síntese sobre algumas dessas ideias, o resto fica para lerem no próprio livro. Entretanto se quiserem saber mais, vale a pena ver as duas TED talks dos autores.

maio 08, 2014

O "regresso" do 2d

O regresso do 2d, e em força, graças à Ubisoft. Primeiro foram dois novos tomos de Rayman, que nos devolveram às origens do personagem e à essência da sua jogabilidade, agora chegou a vez de dar o salto e usar a base de trabalho não apenas para o gameplay mas também para o storytelling. Uma das críticas que tinha feito aqui a "Rayman: Origins" (2011) e "Rayman: Legends" (2013), tinha sido exactamente sobre a ausência de storytelling, algo em que as duas novas produções - "Child of Light" (2014) e “Valiant Hearts: The Great War” (TBD) - parecem agora querer deslumbrar.





Esta revolução operada pela Ubisoft está assente num motor de design de jogos proprietário, chamado UbiArt Framework, que não é mais do que um motor de jogos desenhado exclusivamente para criar jogos 2d. Pareceria anacrónico, não fossem os resultados que estão à vista com “Child of Light” (2014), acabado de sair, e “Valiant Hearts: The Great War” (TBD) que deverá sair em Junho. A ideia surge da equipa de Michel Ancel que trabalha a partir de Montpellier em França com uma equipa imensamente reduzida de pessoas (cerca de 10) quando comparado com as equipas que a Ubisoft tem no Canadá, acima das 2000, e noutras partes do globo, para desenvolver séries como “Assassins Creed”, “Far Cry”, “Tom Clancy’s” ou o tão aguardado “Watch Dogs”.

Trailer “Child of Light” (2014)


Trailer de “Valiant Hearts: The Great War” (TBD)

Este motor de jogos permite que se comece a desenvolver e a testar mecânicas de jogo imediatamente a partir de esboços de concept art [videos explicativos do funcionamento do motor 1 e 2 ]. Aliás quando olhamos para "Rayman" é isso que nos parece que temos ali, concept art ainda no seu estado puro, mas quando olhamos para "Child of Light" e “Valiant Hearts” toda a fasquia estética se eleva. Com "Child of Light" a operar numa base mais de aguarela, e “Valiant Hearts” recorrendo a composições de banda desenhada. Interessante ainda nestes dois novos jogos, é que não só se privilegiou o storytelling, como cada um destes o faz sob géneros de jogo distintos, sendo "Child of Light"orientado a RPG, e “Valiant Hearts” a aventura.
"The [UbiArt] pipeline for integrating art is really straightforward. An artist can draw concept art and integrate it directly in-game. It also allows level designers to create levels quickly and modify them on the fly. It’s the same for the animation system, which utilizes a puppet system that is very quick." [interview]
Mas esta revolução não se fica pela Ubisoft, basta olhar para o que a Unity tem andado a promover nos últimos tempos, acenando com ferramentas específicas para 2d, quando sempre se assumiu como um motor 3d. Os tutoriais e assets nesse campo não param de aumentar, e o interesse da comunidade é cada vez maior. De certa forma isto é também uma resposta ao colapso do Adobe Flash enquanto ferramenta de desenvolvimento de 2d interactivo.

Unity 2d Power

No meio de tudo isto não basta ter plataformas de desenvolvimento. Existe até um movimento na web para que a Ubisoft disponibilize o UbiArt em open source. Mas o essencial acaba por não estar aí, mas antes em toda a sensibilidade que a Ubisoft soube desenvolver para cativar os melhores artistas 2d, nas suas múltiplas variações, a trabalhar na Ubisoft.