Aproveitando o facto de estar esta semana a dar aulas na Universidade de São Petersburgo fui ontem ao famoso
Hermitage e hoje ao
Museu Estatal Russo e tenho de dizer quão boa foi a surpresa de hoje. O Hermitage é o típico museu internacional, com obras de vários nomes sonantes da pintura mundial — Rembrandt, Da Vinci, Michelangelo, Raphael, Picasso, Van Gogh, etc. — mas o Museu Russo, ao ser completamente dedicado à arte russa, abriu-me portas para todo um mundo novo. Não vou fazer um relato da visita, até porque existe imensa informação online sobre o museu, incluindo a
visita virtual pelo Google Art Project, mas quero deixar alguns dados e obras que adorei experienciar.
"Guarda-chuva" (1883) de Marie Bashkirtseff
O Museu Russo está, de forma genérica, dividido em dois grandes pisos: o primeiro dedicado à Arte Antiga (séculos XIV a XVII) e Clássica (século XVIII); e o rés-do-chão dedicado ao Realismo (século XIX). Existe ainda um edifício adjacente que abriga uma terceira ala, denominada Benoit Wing, na qual são apresentados diferentes movimentos da primeira metade do século XX. Assim, se o Hermitage vale bem o tempo investido, se quiserem sentir uma experiência distinta dos restantes grandes museus internacionais, aconselho vivamente o Museu Russo.
"Meio-dia no campo" (1864) de Petr Sukhodolsky
"O Degelo" (1871) Fyodor Vasilyev
"No Campo" (1872) de Mikhail Klodt
"Rebocadores do Volga" (1870-73) Ilya Repin
"Na Floresta" (1883) Ivan Shishkin
"Escolhendo penas" (1891) de Aleksey Kivshenko
Se tiverem pouco tempo, recomendo todo o piso dedicado ao Realismo, nomeadamente para quem gosta dos clássicos da literatura russa. Posso dizer que a experiência foi deslumbrante, exatamente por permitir ver algo que tinha apenas imaginado aquando das leituras. Existem obras menores que se socorrem da narrativa para agarrar o espectador, mas existem obras de enorme valor capazes de nos transportar no tempo, de nos fazer sentir a Rússia de Dostoiévski, Tolstói, Turgueniev ou Gogol. O realismo russo deixa para trás os ícones religiosos, a mitologia e a aristocracia para nos dar a ver o povo, os campos abertos, as condições de trabalho, acedemos assim ao pulsar de vida, algumas obras são mesmo capazes de apresentar marcas da impressão psicológica que parecia estar apenas ao alcance dos grandes mestres da literatura.
"Lev Tolstói descalço" (1901) de Ilya Repin
Já na área dedicada à primeira metade do século XX, temos imenso modernismo, cubismo, algum impressionismo e surrealismo, digo desde já que desconhecia a imensidão de obras aqui presentes que alargam os horizontes daquilo que se produziu no centro da Europa nesta época. Mas o que mais me tocou foi o sentir do impacto da Revolução de 1917. Aos poucos, enquanto viajamos pelas diferentes alas, vamos sentindo mais e mais o impacto político sobre a arte, não apenas nos conteúdos, mas intensamente nas suas formas e cores. É algo como se o tempo e seu significado passasse através de nós por meio das obras criadas pelos artistas. Refiro-me aqui apenas ao caráter da experiência de transformação, sem qualquer juízo sobre a qualidade das obras ou das ideologias defendidas por estas.
"Trabalhadoras dos Têxteis" (1927) Alexander Deineka
"Mulher com Baldes" (1928) de Vyacheslav Vladimirovich Pakulin
"A Agricultora de Bicicleta" (1935) Alexander Deyneka
Por fim, para quem tiver tempo para percorrer todas as galerias, deixo um
bónus que vale a pena procurar numa das salas deste museu.