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abril 30, 2018

Alexander Pushkin (1799-1837)

A minha última visita, em São Petersburgo, ocorreu à casa de Alexander Pushkin, símbolo nacional da literatura russa. Tal como Dostoiévksi nasceu em Moscovo mas foi em São Petersburgo que fez o liceu e começou a sua carreira como escritor, foi ali que se afirmou e viria também a morrer. Pushkin difere da restante galeria de autores clássicos russos, não por ser poeta mas por os ter precedido a todos e desse modo ter pertencido ao movimento do Romantismo, ao contrário dos outros grandes nomes — Dostoiévksi, Tolstói, Gogol, Turguenev, Tchekhov — todos realistas. Nesse sentido, a casa museu espelha bem a aura romanticista através de uma decoração intensamente classicista.


A entrada da casa e a sala de jantar

Não sendo eu grande adepto do romantismo, nem tão pouco do verso, optei por adquirir antes da visita o livro-coletânea "Love Poems", já que tinha apenas lido "Eugénio Oneguin" (1825). Funcionou bem, no sentido em que me permitiu chegar mais perto do verdadeiro estilo de escrita do autor, e sentir o modo intenso como descrevia o sentir humano por meio de texto. Assim ao entrar na casa, todo aquele luxo do início do século XIX, as mobílias imaculadas e de bom porte, combinariam na perfeição com os poemas que tinha lido pelas ruas de São Petersburgo.


Friendship and Love

"Friendship alone, I've heard it said,
makes our world beautiful. Without it 
there is no joy. The path we tread 
would be too hard, no doubt about it,
but for quiet friendship's light ahead.
But listen - there's another feeling:
it both caresses and torments;
in times of struggle, times of healing,
It's flame is equally intense;
it's cruel and excruciating,
it numbs our souls which, scarce alive 
with wounds profound and devastating,
the balm of hope cannot revive...
This is the passion I've endured!...
I languish, perish in my prime,
But god forbid I should be cured..."

[Tradução de Mary Hobson]


É tempo, meu amigo…

"É tempo, meu amigo, o coração cansou-se…
Cada hora voa, e é como se com ela fosse
um farrapo daquilo que pensamos vivo.
Tardará muito a morte? Ah, tudo é fugitivo.

Felicidade não, mas paz e liberdade
é quanto espera quem só ainda sonha que há-de
fugir — cansado escravo —, antes da noite escura,
a repousar nos longes da mais clara altura."

[Tradução de Jorge de Sena]


Relativamente à experiência da visita, sendo interessante a descrição do audioguia, peca por ser incapaz de dar uma visão mais concreta da pessoa por detrás do símbolo. Ou seja, sendo Pushkin um ícone nacional, o texto assume que nós já conhecemos bastante bem o escritor e foca-se quase exclusivamente nos seus últimos dias, no derradeiro duelo e nas últimas horas antes de morrer. É verdade que aquela casa é o local onde morreu, mas considero que a experiência poderia ter sido desenhada de modo mais abrangente para que pudéssemos aceder a mais do autor. Por outro lado, e olhando aos visitantes tipo, os miúdos das escolas russas, acaba por funcionar bem para eles já que ao focar-se na morte e na descrição das últimas horas, intensifica a experiência da visita pela urgência e desenrolar dos eventos ao longo das várias secções da casa.

"A. S. Pushkin’s duel with Dantes" (1860) de Adrian Markovic Volkov. A tela original pode ser vista na casa.

Mais uma vez, a peça mais interessante é o seu escritório-biblioteca, no qual podemos ver as estantes carregadas de livros, e que segundo o guia teriam chegado a perfazer 40 mil volumes (talvez exagerado, ou não) em cerca de 14 línguas distintas. Isto dá bem noção da relação do autor com o mundo das letras, da sua obsessão por estas, mas também dos seus intensos relacionamentos com toda a elite capaz de lhe proporcionar acesso a tão relevante espólio.

Estúdio de Pushkin

Conjunto de pistolas de duelo, semelhantes às utilizadas por Dantes e Pushkin

Existe uma outra peça que atrai o interesse dos alunos, a caixa de armas da época, que nos oferece uma visão direta sobre o momento em que Pushkin inicia o processo da sua morte. Infelizmente são apenas semelhantes àquelas usadas no duelo de Pushkin, não são as que realmente serviram o fatídico momento. Confesso que apesar de respeitar as questões de honra, sempre me fez confusão a lógica de um duelo com armas de fogo, por oposição aos duelos de armas brancas ou simplesmente de punhos. A única explicação que encontro é que estas armas eram, à altura, muito pouco certeiras e pouco poderosas, de outro modo seria impossível sair alguém vivo dali.

Estátua de Pushkin à entrada do Museu Russo de S. Petersburgo

abril 29, 2018

Anna Akhmatova, a poetisa da dor russa

Depois do luxo arquitectónico dos Romanov e dos clássicos literários russos acabei por desaguar numa camada de história da cidade completamente distinta, o tempo soviético. Não que tenha ido à sua procura, era algo que tinha pensado evitar (a quantidade de camadas de história que se podem aqui visitar são tantas que se torna inevitável fazer escolhas), mas a visita à Fortaleza de Pedro e Paulo, onde se encontram os túmulos de toda a dinastia Romanov, é o local onde se encontra a prisão onde estiveram presos centenas de políticos de vários quadrantes. Assim, tendo saído bastante impressionado da prisão, pela apresentação das fotos e historiais dos vários presos (Gorki, Trotski, Kropotkin, Bakunin, vários políticos sociais-democratas, assim como vários membros do governo e aristocracia após a revolução de 1917), ao visitar no dia seguinte a casa da poetisa Anna Akhmatova acabei sendo completamente atirado para dentro da questão soviética.
Anna Akhmatova em sua casa, na Fountain House, nos anos 1930, em São Petersburgo. Aqui viveu quase 30 anos, casa que agora serve de museu à sua memória.

Não conhecia a poetisa antes de começar a preparar esta viagem, procurei depois saber mais na rede, mas a informação pareceu-me escassa, ao que se acrescentou, estranhamente, a ausência de obras traduzidas em Portugal (correção: descobri entretanto que a RA editou dois livros dela). Por isso tinha até alguma dúvida se devia visitar o museu, contudo ainda bem que o fiz, foi uma visita maravilhosa, inicialmente menos pelo espaço e mais pelas pessoas que ali encontrei também a realizar a visita. Diga-se que as casas de escritores não são propriamente grandes atrativos das cidades, os autocarros param em barda nos grandes museus, praças e palácios. A este pequenos museus vão apenas fãs, ou no caso de alguns nomes mais sonantes as excursões escolares. E tendo eu já visitado várias casas destas aqui, fui completamente apanhado de surpresa pelo público que ali encontrei: em grande número e maioritariamente jovem (18-30) e feminino. O facto de ser mulher torna-a mais apelativa tendo em conta que praticamente todos os autores clássicos russos são homens. (Por outro lado, foi talvez também o facto de ser mulher que impediu Estaline e os seus dirigentes de a fazer desaparecer, optaram apenas por a ignorar na esperança de que esta se suicidasse tarde ou cedo).
A casa em que viveu é um apartamento num antigo palácio da cidade, chamado Fountain House.
Poemas escritos nas paredes em redor do jardim da sua casa
A sua mesa de trabalho

Visitei então toda a casa, na qual a autora viveu quase 30 anos, podendo nós encontrar ali imensa memorabilia da mesma, materiais do quotidiano, mas também muitas cartas, telas, brinquedos, livros, etc. tudo muito bem mantido, apresentando uma estética anos 1920, ao que se acrescenta efeitos de som de ruído de vinyl, de relógios e por vezes alguma música da época. Existe uma instalação multimédia apelativa, mas toda apenas em russo, aliás muito do que se pode ver neste museu está quase só em russo, o que é uma pena. Contudo no final lá encontrei um pequeno livrinho comemorativo do museu*, em inglês, comprei-o e sentei-me num banco do jardim em que Akhmatova costumava passear, e aí começou a minha verdadeira experiência. Através do texto pude viajar até ao início do século XX e acompanhar Akhmatova e as tragédias sofridas à mão de Lenine e depois Estaline, desde logo a execução do marido, a impossibilidade de publicar os seus poemas, o rechaço do seu filho pela sociedade, e mais tarde os vários amigos artistas que foram emigrando, atirados para gulags ou que simplesmente optaram pelo suicídio.

Antes da revolução, em 1911, Akhmatova teve um caso com Modigliani que criou vários desenhos dela, este foi o único que sobreviveu. Existem várias teorias sobre o efeito deste romance no estilo e desígnios posteriores do pintor.

Quadro inacabado de Natalia Tretyakova em que se vê Akhmatova e Modigliani

É essencialmente a partir das suas várias trágicas experiências e debaixo de um controlo político cerrado, que incluiu escutas permanentes na casa, já que ela se relacionava com muita da chamada intelligentsia — Boris Anrep, Osip Mandelstam, Sergey Gorodetsky, Boris Pasternak, Alexander Blok, Natan Altman, Isaiah Berlin; foi mentora do Nobel Joseph Brodsky,  — que ela cria os seus dois mais importante poemas — “Requiem” e “Poem Without a Hero” —, escritos ao longo de anos, e apenas tornados públicos fora da Rússia nos anos 1960, e na Rússia no final dos anos 1980. A pressão sobre a mesma foi tanta, nomeadamente pela prisão e deportação para a Sibéria do filho, que ela chega mesmo a escrever poemas em defesa do governo de Estaline para o tentar salvar. Contudo, é na clandestinidade que o seu nome se vai construindo, com a passagem de mão em mão dos seus poemas que refletem o sentir de tantas outras mães, e tantos e tantos outros cidadãos russos.

“Madness with its wings
Has covered half my soul
It feeds me fiery wine
And lures me into the abyss.

That's when I understood 
While listening to my alien delirium
That I must hand the victory
To it.

However much I nag
However much I beg
It will not let me take
One single thing away:

Not my son's frightening eyes -
A suffering set in stone,
Or prison visiting hours
Or days that end in storms

Nor the sweet coolness of a hand
The anxious shade of lime trees
Nor the light distant sound
Of final comforting words.”

Excerto do poema Requiem, 1963 (poema completo em inglês escrito e declamado, partes em português)
"Anna Akhmatova" (1915) por Nathan Altman, no Museu Russo

Akhmatova fica como uma espécie de voz contra o horror causado pela Revolução Comunista, contra os espíritos ditatoriais de Lenine e Estaline, pela capacidade de colocar em palavras o sofrimento que assolou a alma russa, e por não se calar e lutar sempre, sem nunca abandonar o país.


Após chegar a casa converti o DVD que vinha com o pequeno livro, e coloquei-o online no YouTube.

abril 26, 2018

Os últimos anos de Dostoiévski

São Petersburgo é uma das grandes capitais da arte e cultura europeias, muito graças a Pedro o Grande e aos que o sucederam na dinastia Romanov nos 300 anos seguintes, que sempre tiveram um enorme interesse pelo desenvolvimento destas áreas, ainda assim e no meio de tanta e tanta cultura que se pode por aqui encontrar, existe um talento que se destaca enormemente, Dostoiévski. Não nasceu cá, mas foi aqui que morreu e escreveu praticamente toda a sua obra. Por isso torna-se obrigatório visitar o museu que a cidade lhe dedica no qual podemos aceder ao apartamento em que viveu os últimos três anos da sua vida e onde escreveu o derradeiro, e profético, “Os Irmãos de Karamazov”.

Estúdio de trabalho de Dostoiévski

O apartamento está imensamente bem mantido. Nele podemos ver o quarto dos seus filhos, o escritório da esposa, e o seu estúdio, e não deixa de ser impactante como estes três cómodos apresentam todos mesas com utensílios de escrita. Toda a família se dedicava à escrita, as crianças eram educadas desde tenra idade não apenas na leitura, mas também na escrita, e a esposa, à semelhança de tantas outras esposas de grandes escritores, era quem corrigia as provas de Dostoiévski. O autor nutria uma profunda admiração pelos filhos, considerando-os a razão para estar vivo, no quarto destes podemos ver também vários brinquedos da época. A sua filha, Lyubov Dostoevskaya, viria a publicar, em 1920, um livro com as recordações do seu pai — "Dostoyevsky as Portrayed by His Daughter" — que segundo os historiadores não é muito factual, devendo-se muito ao facto de Lyubov ter apenas 11 anos quando Dostoiévski morreu, ainda assim fiquei imensamente curioso por conhecer este relato.

À esquerda, a mesa do quarto das crianças (Lyubov e Fyodor). À direita, a mesa da esposa Anna Grigoryevna Snitkina

Já tinha visto fotografias do último escritório de Dostoiévski, por isso não me surpreendeu propriamente, o que me tocou mais profundamente foi o relato, do sistema audioguia, sobre o último ano de vida, junto com os objetos ali mantidos. Falo especialmente da cigarreira, na qual podemos ver inscrita pela mão da filha, Lyubov, o dia da sua morte. Apesar de avisado pelos médicos, Dostoiévski fumou sempre até morrer, e de modo intenso enquanto escrevia pela noite adentro. O relógio do escritório foi também parado no dia e hora. Além disso, podemos ver várias fotografias da família, as mesas e cadeiras, espreitar a rua pelas janelas, sentir o espaço e a vida de quem ali terá vivido.

A caixa de tabaco de Dostoiévski com a inscrição pela filha da data da morte do pai — 28 janeiro 1881. Data antiga que no nosso calendário gregoriano corresponde a 9 fevereiro 1881.

Talvez a maior novidade, para mim, tenha sido a descoberta do impacto gerado pelo seu “Discurso a Puchkin” (deixo o PDF, em inglês) para a inauguração do monumento dedicado ao poeta em Moscovo, em 1880. Dostoiévksi terá desejado enaltecer a obra de Pushkin a um ponto mitológico, fazendo dele o representante máximo da alma russa, mas ao fazê-lo, e tão perto da sua própria morte, estava já bastante doente, acabou sendo ele próprio elevado a profeta. Quando terminou, o público chorava e gritava — Profeta, Profeta, Profeta — levando-o em braços. É a apoteose de Dostoiévski, que ainda desejava escrever a segunda parte de ”Os Irmãos Karamazov” mas já não teria tempo para tal. No museu encontram-se fotografias do evento em Moscovo, e descrições do que se passou nesse dia, e tenho de dizer que aceder a tudo isto, pela primeira vez e no espaço em que ele viveu, produziu em mim um forte impacto.

Inauguração, em 1880, do monumento de homenagem a Pushkin em que Dostoiévski participou.

Dostoiévski não foi apenas um escritor, não foi sequer mero criador de movimentos literários, seja o psicologismo ou o existencialismo. A sua forma de estar no mundo deveu-se a muitas variáveis, as quais não podemos simplesmente atribuir à sua família, à prisão na Sibéria, à perda de dois filhos pequenos (uma com três meses, outro com três anos), ou à política. O que o destacou dos demais foi o seu profundo humanismo, o qual soube tão bem utilizar para descrever o ser-humano e as suas entranhas psicológicas.


Obras analisadas no VI:
"Os Irmãos Karamazov" (1881)
"Os Demónios" (1872)
"O Idiota" (1868)
"Crime e Castigo" (1866)
"Memórias do Subterrâneo" (1864)

abril 25, 2018

Pintura russa: realismo e ideologia

Aproveitando o facto de estar esta semana a dar aulas na Universidade de São Petersburgo fui ontem ao famoso Hermitage e hoje ao Museu Estatal Russo e tenho de dizer quão boa foi a surpresa de hoje. O Hermitage é o típico museu internacional, com obras de vários nomes sonantes da pintura mundial — Rembrandt, Da Vinci, Michelangelo, Raphael, Picasso, Van Gogh, etc. — mas o Museu Russo, ao ser completamente dedicado à arte russa, abriu-me portas para todo um mundo novo. Não vou fazer um relato da visita, até porque existe imensa informação online sobre o museu, incluindo a visita virtual pelo Google Art Project, mas quero deixar alguns dados e obras que adorei experienciar.

"Guarda-chuva" (1883) de Marie Bashkirtseff

O Museu Russo está, de forma genérica, dividido em dois grandes pisos: o primeiro dedicado à Arte Antiga (séculos XIV a XVII) e Clássica (século XVIII); e o rés-do-chão dedicado ao Realismo (século XIX). Existe ainda um edifício adjacente que abriga uma  terceira ala, denominada Benoit Wing, na qual são apresentados diferentes movimentos da primeira metade do século XX. Assim, se o Hermitage vale bem o tempo investido, se quiserem sentir uma experiência distinta dos restantes grandes museus internacionais, aconselho vivamente o Museu Russo.

"Meio-dia no campo" (1864) de Petr Sukhodolsky

"O Degelo" (1871) Fyodor Vasilyev

"No Campo" (1872) de Mikhail Klodt

"Rebocadores do Volga" (1870-73) Ilya Repin

"Na Floresta" (1883) Ivan Shishkin

"Escolhendo penas" (1891) de Aleksey Kivshenko

Se tiverem pouco tempo, recomendo todo o piso dedicado ao Realismo, nomeadamente para quem gosta dos clássicos da literatura russa. Posso dizer que a experiência foi deslumbrante, exatamente por permitir ver algo que tinha apenas imaginado aquando das leituras. Existem obras menores que se socorrem da narrativa para agarrar o espectador, mas existem obras de enorme valor capazes de nos transportar no tempo, de nos fazer sentir a Rússia de Dostoiévski, Tolstói, Turgueniev ou Gogol. O realismo russo deixa para trás os ícones religiosos, a mitologia e a aristocracia para nos dar a ver o povo, os campos abertos, as condições de trabalho, acedemos assim ao pulsar de vida, algumas obras são mesmo capazes de apresentar marcas da impressão psicológica que parecia estar apenas ao alcance dos grandes mestres da literatura.

"Lev Tolstói descalço" (1901) de Ilya Repin

Já na área dedicada à primeira metade do século XX, temos imenso modernismo, cubismo, algum impressionismo e surrealismo, digo desde já que desconhecia a imensidão de obras aqui presentes que alargam os horizontes daquilo que se produziu no centro da Europa nesta época. Mas o que mais me tocou foi o sentir do impacto da Revolução de 1917. Aos poucos, enquanto viajamos pelas diferentes alas, vamos sentindo mais e mais o impacto político sobre a arte, não apenas nos conteúdos, mas intensamente nas suas formas e cores. É algo como se o tempo e seu significado passasse através de nós por meio das obras criadas pelos artistas. Refiro-me aqui apenas ao caráter da experiência de transformação, sem qualquer juízo sobre a qualidade das obras ou das ideologias defendidas por estas.

"Trabalhadoras dos Têxteis" (1927) Alexander Deineka

"Mulher com Baldes" (1928) de Vyacheslav Vladimirovich Pakulin

"A Agricultora de Bicicleta" (1935) Alexander Deyneka


Por fim, para quem tiver tempo para percorrer todas as galerias, deixo um bónus que vale a pena procurar numa das salas deste museu.

março 26, 2011

de Moai a Mark Rothko

Na passada terça-feira passei uma tarde de contemplação maravilhosa, repartida entre o The British Museum e o Tate Modern, genericamente apreciando a evolução da história da civilização no primeiro, e a criatividade e inventividade contemporâneas no segundo. O que me levou a cada um destes museus em concreto foi a vontade de apreciar duas obras específicas, que não defraudaram em nada todas as minhas expectativas. Falo aqui de "Hoa Hakananai'a" uma estátua trazida da Ilha da Páscoa para o British Museum, e da sala de Mark Rothko no Tate Modern.
Não me lembro da primeira vez que ouvi falar sobre a Ilha da Páscoa, tenho apenas a memória presente em mim como algo que sempre me perseguiu desde os tempos de criança. Muito provavelmente relacionado com todos os mitos criados em redor destas estátuas, mitos mágicos mas essencialmente sobre a sua ligação a formas de vida extra-terrestre. Algo que sabemos não fazer o menor sentido nos dias de hoje mas que mesmo assim sempre contribuíram para o desenvolvimento e adensamento de mistério na narrativa que envolve estas obras.

[Foto da Wikipedia]
A Ilha da Páscoa faz parte de um rol de itens e locais no nosso planeta que têm servido a nossa necessidade tão humana de misticismo, criado por narrativas que vivem de fortes incertezas e laivos de inexplicabilidade. Nesta categoria enquadram-se por exemplo as Pirâmides do Egipto, as Pirâmides Maias, as Cidades Perdidas (Atlantis, Angkor, Machu Picchu) entre outros.

Hoa Hakananai'a (1000 D.C) que quer dizer "Amigo Roubado ou Escondido",
apresentado no The British Museum

Apesar de todo o meu interesse pelos Moais sei que dificilmente algum dia os poderei visitar fisicamente dada a distância e os valores envolvidos numa viagem a esta ilha, mas o facto de poder apreciar uma dessas estátuas presencialmente criou em mim sensações de transcendência. Para além de tudo isso foi muito interessante descobrir que as estátuas contém traços e desenhos nas costas, algo que eu desconhecia até ver este Moai no British Museum. Se tiverem mais curiosidade sobre a ilha em si e alguma explicação sobre a razão de tanto mistéiro, recomendo a leitura de Collapse (2005) de Jared Diamond, ou então a visualização da sua TED de 2003.
No British Museum existe muito mais do que o Amigo Escondido, são tantas as obras que se podem ali encontrar, provenientes de quase todo o planeta que é possivel contar a história da humanidade apenas com recurso aos objectos existentes neste museu. E foi isto mesmo que Neil MacGregor diretor do museu fez no livro A History of the World in 100 Objects (2010).

Chegado ao Tate fui direto ao terceiro andar, à sala 3, aonde me deparei com uma sala sem janelas e com luminosidade bastante reduzida, como se pode ver na imagem abaixo. Sentado ali permaneci por uns bons dez minutos de frente para Black on Maroon (1958) o meu preferido das nove telas presentes na sala. As condições em que as obras são apresentadas ajudam bastante à criação do estado contemplativo necessário para apreciar plenamente o que temos na nossa frente.

Sala no Tate Modern, exclusivamente dedicada a Mark Rothko,
com 9 telas de 1958-59 apresentadas em penumbra

Existe aqui algo de mágico, os quadros parecem funcionar como portais para outras dimensões, ajudando à transcendência do nosso estado e das nossas sensações. Algo que nos interroga na racionalidade como é que traços tão simples podem ser detentores de tanta força.

Black on Maroon (1958), Mark Rothko (2667 x 3812 mm) [imagem do Tate]

Para ajudar a entrar no espírito de Rothko aconselho vivamente o visionamento da série documental Power of Art (2006) com 8 episódios, dos quais um deles é inteiramente dedicado a este artista.

março 29, 2009

Arte em Manchester

Durante a curta visita para dar aulas a Manchester aproveitei para ver a exibição de "Ten Drawings by Leonardo da Vinci from the Royal Collection" na Manchester Art Gallery. Não que as minhas expectativas fossem muito elevadas, mas como é natural qualquer coisa em que génios como Leonardo tenham tocado despertam sempre a atenção. Ainda para mais no caso desta exposição específica, podemos ganhar um mais aprofundado conhecimento da obra no site da Royal Collection do que vendo os desenhos ao vivo. Isto porque estes não podem ser expostos a muita luz e como tal a legibilidade não era das melhores. Destaco aqui apenas um dos desenhos, aliás o único que me despertou verdadeiro interesse dos 10. Aliás são 12, mas são apresentados como 10, porque dois deles estão desenhados nas costas de outros dois.

A skull sectioned, Leonardo da Vinci, Itália, 1489

O que Leonardo tentou fazer neste desenho foi localizar no cérebro o ponto nevrálgico do chamado "senso comune". O chamado ponto de interface entre a mente e o mundo. Para poderem ver o trabalho em detalhe aconselho vivamente uma visita ao site da Royal Collection que fez um excelente trabalho na sua reprodução digital e na interface de acesso.

Para além desta exibição gostei de ver alguns trabalhos das galerias permanentes, nomeadamente europeus do século XVII e XVIII. Ao contrário do que acontece com os desenhos do Leonardo, alguns dos trabalhos que mais gostei não me atrevo a colocar aqui a sua imagem porque as reproduções são muito fracas, nomeadamente as pinturas de grande detalhe e de grande diversidade de cor como Work, de Ford Madox Brown, Inglaterra, 1852 ou The Chariot Race, de Alexander von Wagner, Alemanha, 1882.

Sir Thomas Aston at the Deathbed of his Wife painting, John Souch, Inglaterra, 1635

Autumn Leaves, Sir John Everett Millais, Escócia, 1856

Sappho, Charles-August Mengin, France, 1877