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março 24, 2020

“O Mar, o Mar” de Iris Murdoch

“O Mar, o Mar” (1978) é um romance feito de múltiplas camadas concebidas num entrosamento de modos, o explícito, ocupado com as necessidades narrativas de manter a história viva e apelativa ao longo de centenas de páginas, e o implícito, de questionamento reflexivo inerente à veia filosófica da autora. Murdoch foi professora de filosofia na Universidade de Oxford, sendo reconhecida tanto pela sua ficção como pelo seu trabalho filosófico. Dito isto, o livro não é nenhum tratado de filosofia, mas não deixa de ser uma obra imensamente densa, talvez até mais pela profundidade descritiva do que propriamente pelas argumentações. Nesse sentido, a escrita de Murdoch recorda Proust através do modo como descreve cenas interiores, pensamentos e memórias, na sua miríade de detalhes, como avança e recua dentro dos personagens, pondo a nu a diferença liminar entre o real exterior e alegadamente objetivo, e o mundo subjetivo criado na cabeça de cada um de nós.
O protagonista é um encenador de teatro, célebre, que na entrada da idade de reforma se retira de Londres para habitar sozinho, numa casa à beira-mar completamente isolada, sem eletricidade nem água. Apesar de desejar estar sozinho, Charles Arrowby acaba por encontrar muitos dos principais personagens da sua vida, tanto recente, como da sua infância, o que vai provocar enormes tumultos interiores, que tornarão evidente o tipo de pessoa que temos em cena, dando a entender que existe ali pouco que se possa qualificar de boa pessoa, mas no entanto vamos avançando e compreendendo que má pessoa também não é, porque no fundo é apenas um humano. Murdoch penetra pelo pensamento de Arrowby adentro e dá-nos a ver e a sentir o mundo da indecisão, da incerteza, da dúvida, do questionamento e ao mesmo tempo o da certeza, do autoritarismo, do desprezo e da discriminação. A leitura senta-nos no ombro do personagem e deixa-nos ouvir e sentir tudo o que ele pensa, o que acaba por inevitavelmente se colar a nós, às nossas próprias incertezas e desejos. Não admira que Murdoch seja comparada a Dostoiévski ou Tolstói, ou nutra grande amor por Shakespeare.

A escrita apesar de apresentar um vocabulário acessível é bastante densa, mas é exatamente por meio dessa densidade que se produz uma aura reflexiva que nos transporta continuamente para o domínio do pensar. Apesar de toda a ação se passar numa casa junto a uma praia de rochedos em que os personagens podem banhar-se, passamos a maior parte do tempo dentro de ideias, quase desligados da realidade espacial-temporal, com muitas cenas a fazer-nos recordar os mundos-história dos filmes de Ingmar Bergman.

Existem algumas partes que me parecem interessantes reter, nomeadamente o modo como olham para a arte, no caso particular do teatro, mas também como discutem a nossa ilusão de realidade, ou ainda como nos introduz à discussão dos nossos anseios e desejos. Aliás, para mim, todo o livro acaba sendo isso, uma introdução aos problemas da crença no desejo de Ser. Porque passamos vidas inteiras em busca do nosso próprio eu, de uma suposta felicidade, sem considerar que essa mesma busca, ou essa mesma felicidade, pode não corresponder àquilo que verdadeiramente queremos, mas apenas àquilo que nos parece que verdadeiramente desejamos. É daqui que emergem as maiores incertezas sobre nós mesmos, somos alguém, mas não sabemos que alguém é esse que somos, temos intuições, fazemos inferências e lançamos suspeitas, mas ao longo das nossas vidas vamos aprendendo que muito daquilo porque tanto ansiámos e acabámos por conseguir afinal não era assim tão importante...

Deixo alguns excertos em inglês, a única versão digital que tenho, apesar de ter lido o livro na edição da Relógio d'Água numa tradução para português de José Miguel Silva.

Sobre o teatro:
“The theatre is an attack on mankind carried on by magic: to victimize an audience every night, to make them laugh and cry and suffer and miss their trains. Of course actors regard audiences as enemies, to be deceived, drugged, incarcerated, stupefied. This is partly because the audience is also a court against which there is no appeal. Art’s relation with its client is here at its closest and most immediate. Drama must create a factitious spell-binding present moment and imprison the spectator in it. The theatre apes the profound truth that we are extended beings who yet can only exist in the present. It is a factitious present because it lacks the free aura of personal reflection and contains its own secret limits and conclusions. Thus life is comic, but though it may be terrible it is not tragic: tragedy belongs to the cunning of the stage. Of course most theatre is gross ephemeral rot; and only plays by great poets can be read, except as directors’ notes. I say ‘great poets’ but I suppose I really mean Shakespeare. It is a paradox that the most essentially frivolous and rootless of all the serious arts has produced the greatest of all writers.”
Nós e a realidade
“We are such inward secret creatures, that inwardness is the most amazing thing about us, even more amazing than our reason. But we cannot just walk into the cavern and look around. Most of what we think we know about our minds is pseudo-knowledge. We are all such shocking poseurs, so good at inflating the importance of what we think we value.”
“Time can divorce us from the reality of people, it can separate us from people and turn them into ghosts. Or rather it is we who turn them into ghosts or demons. Some kinds of fruitless preoccupations with the past can create such simulacra, and they can exercise power, like those heroes at Troy fighting for a phantom Helen.”
“in a few weeks or a few months you’ll have run through it all, looked at it all again and felt it all again and got rid of it. It’s not an eternal thing, nothing human is eternal. For us, eternity is an illusion. It’s like in a fairy tale. When the clock strikes twelve it will all crumble to pieces and vanish.”
“The worshipper endows the worshipped object with power, real power not imaginary power, that is the sense of the ontological proof, one of the most ambiguous ideas clever men ever thought of. But this power is dreadful stuff. Our lusts and attachments compose our god. And when one attachment is cast off another arrives by way of consolation. We never give up a pleasure absolutely, we only barter it for another.”

Nota quantitativa no GoodReads.

outubro 11, 2019

Prémio José Saramago 2019

E como não tivemos apenas o Nobel esta semana, fica uma discussão sobre o recente Prémio José Saramago. Eu fui um dos que defenderam, aqui, o prémio Leya atribuído ao Afonso Reis Cabral em 2014 pelo livro "O Meu Irmão". Contudo este prémio pelo livro "Pão de Açúcar" é totalmente desprovido de senso. O que me ocorreu quando o prémio foi atribuído, foi que não haveriam melhores concorrentes neste ano. Mas se assim fosse, mais valia fechar a nação e deixar a produção escrita aos outros.


O livro não é mau, mas não vai além de exercício de escrita. Não me incomodam as potenciais falhas de análise do processo judicial, mas como livro é parco em reflexão, ou melhor, essa está totalmente ausente, dando pouco mais do que um conjunto de artigos de jornal. Na verdade, isso não nos deve espantar, 29 anos não oferece propriamente um lastro de experiência grande, ainda mais para quem se dedique a analisar uma realidade que está nas antípodas da vivida por si.

Escrever um texto de jornal, no seu tom semi-imparcial e distanciado, quase qualquer um pode fazer. Escrever um livro, colocar-se no centro da ação, ver de dentro e em todas as direções, e a partir da mente interior dos envolvidos, requer muito mais do que investigação sobre o que terá acontecido. É preciso experiência, vida vivida e sentida nos lugares e com as pessoas, para se chegar aos interstícios dramáticos. É disso que se faz a grande literatura. É por isso que essa tende a falar das realidades dos seus autores, e não daquelas que eles gostariam de ter vivido.

Outras perspetivas: Diogo Vaz Pinto, Eduardo Pitta, e Maria do Rosário Pedreira


Atualização:
Nem por acaso, fizeram-me chegar a informação de que o prémio passará a ser atribuído apenas a maiores de 40 anos, talvez por que tentar atribuir prémios de relevo abaixo desta idade é complicado.

março 20, 2014

Vencedores do 16º Independent Games Festival

Foram anunciados ontem à noite no decorrer da Game Developers Conference os premiados do festival mais importante consagrado aos jogos independentes, o Independent Games Festival. De todos os premiados o único que ainda não tive oportunidade de jogar foi o vencedor da categoria de estudante, os restantes podem ver as análises no texto sobre os jogos jogados em 2013.

Papers, Please (2013) de Lucas Pope, premiado com Grand PrizeExcellence in NarrativeExcellence in Design

Papers, Please (2013) de Lucas Pope venceu 3 das 8 categorias, o Grande Prémio, Narrativa e Design. Merecido, e em parte esperado, o grande prémio, é muito interessante verificar que leva para casa dois prémios que raramente andam juntos, o Design e a Narrativa, e isso deve-se ao simples facto de Lucas Pope ter conseguido encontrar o design ideal para a narrativa ideal, tudo o que fazemos interactivamente dentro de Papers, Please tem consequências na narrativa. Deste modo jogamos verdadeiramente a história, somos atores e decisores do que acontece em cada jogo que se realiza. Existe um contexto, são-nos dadas as funções que devemos cumprir no âmbito desse contexto, cabe-nos a nós determinar o progresso e o desenlace da história do mesmo. Assim, ao BAFTA em Strategy And Simulation, e ao meio milhão de cópias vendidas, Pope junta agora o prémio de 30 mil dólares.

The Stanley Parable (2013) da Galactic Cafe, premiado com Audience Award

Confesso que para ambas as categorias, Narrativa e Design, tinha em mente candidatos diferentes, no caso da Narrativa acreditei que iria para DEVICE 6 (2013) da Simogo que já joguei mas ainda não terminei, acabando por ficar com o melhor Audio, o que não discordo. No caso do design sempre pensei que fosse para The Stanley Parable (2013) da Galactic Cafe, mas acabou por ficar apenas com o prémio do público.

Luxuria Superbia (2013) dos Tale of Tales, premiado com Nuovo Award

Sem surpresa também é a categoria Nuovo, atribuída aos jogos mais inovadores, que vai para o belíssimo Luxuria Superbia (2013) dos Tale of Tales. Nos BAFTA o prémio inovação tinha ido para outro jogo independente, não menos relevante, Brothers: A Tale of Two Sons (2013) [Análise]. Na Arte Visual atribuída a Gorogoa (2013) de Jason Roberts do qual só joguei a demo, mas fiquei muito bem impressionado, não só pelo aspecto como pelo design de interacção também.

Gorogoa (2013) de Jason Roberts, premiado com Excellence in Visual Art

Deixo a lista dos premiados com os links para os jogos analisados, aqui no blog e na Eurogamer.


Seumas McNally Grand Prize
Papers, Please by Lucas Pope [Análise]

Excellence in Visual Art
Gorogoa by Jason Roberts

Nuovo Award
Luxuria Superbia from Tale of Tales [Análise]

Excellence in Audio
DEVICE 6 from Simogo

Excellence in Narrative
Papers, Please by Lucas Pope [Análise]

Best Student Game
Risk of Rain from Hoppo Games

Audience Award
The Stanley Parable by Galactic Cafe [Análise]

Excellence in Design
Papers, Please by Lucas Pope [Análise]

março 03, 2014

a noite de Gravity

A lista dos Óscares 2014 poderia ter sido apenas mais do mesmo, mas não foi, com a excepção de melhor filme para o ultraclássico “12 Years a Slave”, a surpresa da noite foi mesmo "Gravity" que conseguiu arrecadar Melhor Realizador, e acumular um total de 7 óscares.


"Gravity" leva 7 óscares: Best Director, Film Editing, Cinematography, Original Score, Visual Effects, Sound Editing, e Sound Mixing.

"Gravity"que aqui analisei, mereceu plenamente os 7 óscares, não sendo o típico clássico acabará por se encaixar, daqui a muitos anos, nos chamados filmes de culto. Não há dúvidas que o trabalho estético feito em torno da montagem, cinematografia, e efeitos visuais e sonoros superou tudo o que até aqui conhecíamos, e por isso Gravity é um justo vencedor.

"Her" vence Original Screenplay

A juntar a Gravity fiquei muito contente também com o óscar de Melhor Argumento Original entregue a Spike Jonze pelo belíssimo argumento que apresentou com Her, do qual também já aqui falei.

De resto fiquei desiludido com o óscar de melhor animação, Frozen não merecia este prémio, assim como fiquei triste por Daniel Sousa não ter conseguido o óscar para o seu "Feral", de que aqui também falei.

março 09, 2013

BAFTA e as pequenas experiências interactivas

Fiquei muito contente com os BAFTA Games deste ano, as nomeações já tinham sido muito boas, com uma lista de jogos de pequena dimensão absolutamente impressionante - Fez, Journey, Super Hexagon, Thomas Was Alone, The Walking Dead, Proteus, Dear Esther, The Unfinished Swan, The Room. E os vencedores anunciados esta semana só reflectem o momento de qualidade que se vive na arte.


Das categorias que mais me interessam vários dos jogos que nomeei na minha lista do Melhor de 2012 estão aqui. No campo da Inovação o justíssimo vencedor, The Unfinished Swan [análise], um jogo que tenho visto ser demasiado preterido nos vários festivais. The Walking Dead [análise] leva inevitavelmente a melhor História. O belíssimo Thomas Was Alone [análise] leva a melhor performance para a fantástica narração de Danny Wallace. E Journey [análise] como não podia deixar de ser, arrecada nada menos do que cinco Baftas, entre os quais o Game Desin, a Arte e a Música. Desta vez o melhor do ano não coube a nenhum dos pequenos jogos, mas foi para aquele que terá sido quase o único lançamento original de 2012 nos jogos AAA, Dishonored. A demonstrar que vale a pena arriscar, e deixar as sequelas descansar. Só tive pena de Dear Esther [Análise] que apesar de ter tido cinco nomeações não conseguiu nenhuma, tudo porque as categorias em que estava nomeado foram todas as que já referi acima, exceptuando-se a de melhor jogo Inglês, mas esse foi também muito bem entregue a The Room [Análise].

Prémio Inovação foi para The Unfinished Swan (2012)

A tendência na análise do ano de 2012 foi claramente para a valorização dos pequenos jogos, mais do que o facto de serem independentes. Isto porque torna-se complicado qualificar de completamente independente The Walking Dead ou até mesmo Journey e Unfinished Swan que operam sob a protecção da Sony. Todos os jogos que refiro no parágrafo anterior, exceptuando Dishonored, resultam em experiências curtas de uma a três horas. Esta ideia dos pequenos jogos vem de encontro aquilo que já ando a escrever desde o Games 2004, e que a Brenda Laurel já tinha em parte discutido no seu livro seminal, Computers as Theatres a propósito das narrativas interactivas. Deixo aqui um excerto da minha argumentação em favor dos pequenos jogos,
"Vejamos ainda as durações médias aproximadas das seguintes experiências de entretenimento: livro (50h); filme (1h45); Teatro (1h30); Álbum Musical (1h); Documentário TV (50m). Lembremos ainda que Hollywood possui uma regra quase intransponível de duração máxima para os seus filmes que se situa nas 2h15.
É inegável que a experiência do videojogo de aventura gráfica se aproxima, a nível sensorial, muito mais do filme ou do teatro do que propriamente do livro. Dessa forma, retirando o livro, a média da duração das experiências pode ser calculada numa duração total de cerca de 1h15.
Não é de todo nossa intenção, apontar esta duração como “a duração ideal”, mas é um valor que nos pode fazer reflectir. Assim a experiência do storytelling interactivo, terá de se sintetizar e apresentar como uma experiência mais intensa e de menor duração."
Por outro lado esta tendência fez-me agora pensar numa diferença que existe entre os videojogos e o cinema. No cinema temos longas e curtas metragens, e estes nunca se misturam, pelo menos em festivais. Mas nos videojogos, temos apenas jogos, nunca foi feita uma classificação entre grandes e pequenos, ou longos e curtos. A continuar desta forma, interrogo-me sobre se no futuro não teremos de pensar nesta distinção. Acaba por ser algo injusto ter todos a competir para as mesmas categorias. Por outro lado, poderemos também chegar à conclusão, pelo menos no que toca aos jogos narrativos, que o seu futuro passa verdadeiramente por serem encurtados. Julgo que esta segunda ideia acabará por vingar. Apesar das pessoas quando compram quererem um jogo que dure bastante, a realidade é que no final o que conta verdadeiramente, é a experiência emocional proporcionada pelo jogo, e isso fica bem evidente nos vários premiados deste ano nos BAFTA, nos DICE e em muitos outros festivais de jogos.

Para fechar fica a lista completa dos nomeados e premiados dos BAFTA Games 2013. E já agora a menção ao facto do prémio que distingue carreiras significativas na arte dos videojogos ter sido este ano entregue a  Gabe Newell. Um reconhecimento imensamente merecido por tudo o que tem feito por esta indústria, principalmente desde que fundou a Valve em 1996.

fevereiro 28, 2011

Oscars 2011: a Origem d'Alice

Começando pelas categorias que mais nos interessam, as das artes visuais e expressivas, todos os filmes que tinha listado aqui como potenciais vencedores no final de Janeiro, ganharam nessas categorias e mais algumas.

Inception (2010) Christopher Nolan
Tal como esperava leva para casa todas as estatuetas técnicas, não é por acaso que lhe fiz várias referências aqui. Assim temos a Cinematografia (Wally Pfister), os Efeitos Visuais (Chris Corbould, Paul J. Franklin, Andrew Lockley, Pete Bebb), a Mistura de Som (Lora Hirschberg, Gary Rizzo, Ed Novick), e o Design de Som (Richard King).
Richard King leva o terceiro Oscar no design de som, depois de em 2008 ter trabalhado também Cristopher Nolan em The Dark Knight (2008), em em 2003 para Master and Commander: The Far Side of the World (2003). Já Wally Pfister vê finalmente o seu trabalho reconhecido. Tinha sido nomeado antes para The Dark Knight (2008); The Prestige (2006) e Batman Begins (2005). Ou seja não foi à 3ª, mas à 4ª que conseguiu.

Alice in Wonderland (2010) de Tim Burton
Arrecada como esperado a Direcção de Arte (Robert Stromberg e Karen O'Hara) e o Costume Design (Colleen Atwood). Robert Strombreg faz um bis na direcção de Arte, já que no ano passado tinha levado a estatueta para o seu belíssimo trabalho em Avatar (2009). Não tenho aqui qualquer dúvida em afirma que Stromberg é um autêntico mago no que toca à criação de "mundos história".

Toy Story 3 (2010), Lee Unkrich (Pixar)
Não teve competição à altura este ano. How to Train your Dragon (2010) até tem uma boa história, e bons personagens, mas tecnicamente foram feitas opções que tornaram o filme muito menos rico, nomeadamente no campo dos cenários e da iluminação.



The Lost Thing
(2010) de Shaun Tan, Andrew Ruhemann
Na altura do texto anterior não tinha falado sobre as curtas de animação, porque ainda tinha esperança de ver todas as curtas que estavam a concurso. Tinha aí uns apontamentos que apontavam para The Lost Thing ou The Gruffalo, por isso julgo que o prémio foi muito bem entregue. Um filme produzido pela Passion Pictures Australia subsidiária da casa mãe inglesa Passion Pictures que no campo da publicidade e efeitos visuais tem sido brilhante.

Agora indo às categorias mainstream, The King's Speech (2010) levou como esperado Melhor Filme, Melhor Actor (Colin Firth), Melhor Argumento Original (David Seidler) e Melhor Realização (Tom Hooper). Natalie Portman Melhor Actriz Principal (Black Swan (2010)). The Social Network (2010) levou a melhor Montagem (Kirk Baxter, Angus Wall) que deveria ter ido para Jon Harris em 127 Hours (2010), melhor Argumento Adaptado (Aaron Sorkin), e melhor música (Trent Reznor e Atticus Ross). Inside Job (2010) levou a melhor no documentário face a alguma expectativa para Exit Through the Gift Shop (2010).

Julgo que a questão da ausência de surpresas não se prende propriamente com a cerimónia mas com a quantidade de outros festivais e concursos prévios, aonde os mesmo filmes estão nomeados o que acaba por contribuir para a total ausência de interesse que a cerimónia dos Oscars se vem tornando com o passar dos anos.

Quando comparado com os outros grandes momentos do ano (Cannes, Veneza, Berlim e Sundance), este festival acaba por ser o menos original. A título de exemplo, desde Dezembro que perdi a conta ao número de prémios que Natalie Portman e The King's Speech ganharam. Desde os Bafta aos Golden Globes passando por quase uma dezena de Associações de Críticos Americanas (Austin, Boston, Ohio, Chicago, Dallas, Florida, Broadcast Film).


A lista completa dos Oscars 2011 pode ser vista na IMDB.

janeiro 28, 2011

Premio ZON 2010 - Reconhecida a Arte dos Videojogos em Portugal

Diria que os Prémios Zon relativos ao ano de 2010 ontem atribuídos no Museu do Oriente em Lisboa marcam um momento decisivo na história dos videojogos em Portugal. Foi uma noite em grande para a indústria dos videojogos nacionais. Não existindo uma categoria a concurso dedicada aos Videojogos, a indústria conseguiu arrecadar 40% dos prémios, dos 10, 4 foram para a área, e dos 4 prémios principais (3 primeiros lugares e 1 grande prémio), as empresas do ramo arrecadaram 3.
Claramente que o destaque vai para a grande obra nacional, Under Siege, criado pela Seed Studios do Porto. Levou o primeiro prémio na categoria de Conteúdos e Aplicações Interactivas e levou o Grande Prémio da noite. Se na categoria de aplicações não houve grandes dúvidas, o Grande Prémio foi um ponto marcante. Em três anos é a primeira vez que o Prémio Zon sai da categoria das Curtas. A categoria que tem sido o ex-libris do prémio, até pela dimensão do número de submissões nessa área, o dobro das outras categorias. Depois o peso do Cinema face aos Videojogos como indústria, como Arte, particularmente em Portugal, tem sido muito superior. Os videojogos foram até agora olhados como algo que vem do estrangeiro, ou quando feito em Portugal como meros trabalhos amadores. Julgo que ontem isso alterou-se de vez. O grande prémio é o reconhecimento de que a Arte dos Videojogos em Portugal pode ombrear com as outras artes e outras indústrias.

Under Siege, Grande Prémio Zon 2010

Outro primeiro prémio, agora na categoria de Animação Digital, foi conseguido pela dupla Gameinvest / Blueshark Studios. A Gameinvest como produtora, a Blueshark como a criadora da animação digital Daydream Chronicles. Não sendo uma obra final interactiva, é um trabalho desenvolvido por especialistas da área e demonstra a versatilidade dos artistas.

Daydream Chronicles, 1º Lugar em Animação Digital

Ainda a destacar o excelente trabalho da Biodroid que ficou em terceiro lugar na categoria "Conteúdos e Aplicações Multimédia" com o seu videojogo Billabong Surf Trip para a plataforma iPad. Surf Trip que está já muito perto de atingir os 150 mil downloads na App Store da Apple.

Billabong Surf Trip, 3º Lugar em Conteúdos e Aplicações Multimédia

Aqui fica a lista completa dos vencedores. Mais informações e excertos das obras podem ser vistas na página do Prémio Zon.

Grande Prémio
Seed Studios - Under Siege



Conteúdos e Aplicações Multimédia
1º - Seed Studio - Under Siege
2º - Beam Team, Rui Martins - Beam Browser
3º - Biodroid - Billabong Surf Trip

Menção Honrosa - Carlos Alves Jorge – Bedtime Stories

Curtas-Metragens
1º - Pedro Resende - Maybe
2º - Bernardo Gramaxo - Quando os monstros se vão embora
3º - Henrique Pina e Francisco Baptista - Tejo

Animação Digital
1º - Gameinvest / Blueshark Studios - Daydream Chronicles
2º - André Letria e Humberto Santana – Foxy & Meg
3º - Carlos Matias e Pedro Pinto - Dream Factory

Menção Honrosa - Cristiano Mourato - Smolik
Menção Honrosa - João Seabra – Tens que largar a mão

Fica aqui também a constituição do júri que avaliou as obras. Mais sobre cada um dos elementos do júri pode ser visto também na página do Prémio Zon.

Júri do Prémio Zon 2010
Rodrigo Costa
Manuel Sequeira
João Sentieiro
Leonor Silveira
José Alberto Carvalho
Isabel Mimoso
Fernando Galrito
Nuno Cintra Torres
Antunes João
Nelson Zagalo
Pimenta Alves
Lourenço Medeiros
Nuno Sena
Mário Augusto

março 23, 2010

Bafta Videojogos 2010

Por um lado parecia quase uma sessão de distribuição de prémios por todas as aldeias, mas se atentarmos, temos algumas surpresas, e a principal é sem dúvida o Best Game que vai para Batman: Arkham Asylum (2009).
Outra surpresa a ausência de qualquer prémio para Assassin’s Creed II (2009), já muito menos surpreendente os 4 prémios para Uncharted 2: Among Thieves visto as 11 nomeações que tinha.
Adorei ainda dois outros prémios o de Artistic Achievement para Flower (2009) excelente e o prémio carreira Fellowship para Shigeru Miyamoto.

Na apresentação do prémio a Miyamoto é dito que Mario é um dos personagens mais reconhecidos na Terra só superável pelo Mickey, o que acredito ser verdade, a julgar pelos pequenitos que tenho cá em casa. E que provavelmente "Myamoto poderá ser responsável pelo consumo de maior número de milhões de horas de tempo humano em toda a história" o que também acredito. Se tivermos em conta Mario, Zelda e a Wii, muito dificilmente se poderá encontrar outra criação ou criações da mesma pessoa que supere o tempo que lhes é ou foi dedicado, tendo em conta toda a população e claro exceptuando as religiões e os seus cultos.

Miyamoto tem recebido imensos prémios e reconhecimentos desde a Ordre des Arts et des Lettres em França em 2006, ao primeiro lugar na lista da TIME das "100 Most Influential People of 2008".

Aqui fica um compacto da sessão de entrega dos 6th British Academy Video Games Awards decorrida a 19 Março 2010.

maio 24, 2009

um dia feliz para Portugal

É a primeira vez que um filme português consegue tal feito, a curta-metragem Arena de João Salaviza ganhou a Palma de Ouro em Cannes 2009.
Depois de ganhar o grande prémio no Indie Lisboa 2009, no início deste mês, foi agora a vez desta produção da Filmes do Tejo ganhar no mais importante festival de cinema do mundo. O filme fala-nos de: "Mauro vive em prisão domiciliária. As tatuagens ajudam-no a queimar o tempo. Três putos do bairro aproximam-se da sua janela. Lá fora, o sol bate com a força do meio-dia". Sobre o filme João Salaviza, com 25 anos e o curso de cinema inacabado, escreveu um statement que se transcreve a seguir,
"What interests me more than capturing the transformations a place might undergo, is the tension that builds in the moments where nothing changes. The lead in “Arena” is restricted by limitations of both space and time. By filming Mauro in home confinement I was faced with the situation of a man with nowhere to go. I followed through with that idea from the script to the editing.
With the rule that no shot would prefigure the protagonist’s trajectory, nor suggest to him paths he simply could not see. That is right for someone who lives in a house with bars on the windows, and who secretly hopes that things will change by themselves. "
Não podemos ver o filme mas podemos ver bocados entrecortados com uma entrevista ao João Salaviza, no trabalho realizado pelo programa da RTP Fotograma,



Quero apenas aqui a deixar bem frisado que esta é a primeira vez que Portugal ganha tal prémio. A razão para eu frisar esta situação é dupla, por um lado porque é importante, mas por outro para se perceber de uma vez por todas que o cinema português dito de qualidade que não agrada ao público português mas que "vende bem em festivais internacionais" cai aqui por terra. Manoel de Oliveira ganhou apenas no ano passado uma Palma de Ouro mas atribuída pela carreira (Lifetime achievement award for his work), não por um trabalho em particular em concurso regular, uma espécie de doutoramento Honoris Causa.

Ainda sobre os Prémios Cannes2009, Michael Haneke leva pela segunda vez a Palma para a longa "Das Weisse Band".

abril 17, 2009

the Mill e Cinema4d

A empresa criativa inglesa The Mill recebeu o prémio para Outstanding Matte Paintings in a Broadcast Program or Commercial, pelo trabalho de Fx no episódio Silence in the Library da série Doctor Who, no 7th Annual Visual Effects Society.

O trabalho foi realizado com recurso à plataforma Cinema 4d, a plataforma recentemente eleita para ser utilizada como base de trabalho 3d no Mestrado em Audiovisual e Multimédia da UM.

To achieve the realism required, The Mill turned to the new Global Illumination (GI) render engine in Cinema 4D...

According to The Mill’s Lead Matte Painter, Simon Wicker, CINEMA 4D and its Advanced Render 3 module played a vital role in the creation of the episode. "The results were amazing,” says Wicker. I could render a 175 frame camera animation at wides-creen PAL resolution overnight on a Mac Pro without a trace of GI flicker. Without that, these shots would never have been completed on time. Cinema 4D has always been bulletproof for my work." [in CGW]

março 30, 2009

Autonomous Agents Research Award

Manuela Veloso acaba de ganhar o prémio “Autonomous Agents Research Award”, de 2009, da ACM, mais concretamente do SIG em Artificial Intelligence (ACM/SIGART).
"The selection committee for the ACM/SIGART Autonomous Agents Research Award is pleased to announce that Prof. Manuela M. Veloso of Carnegie Mellon University is the recipient of the 2009 award. Prof. Veloso has made significant and sustained contributions to Autonomous Agents and Multiagent Systems in the areas of planning and control learning in multi-agent systems. Prof. Veloso's research is particularly noteworthy for its focus on the effective construction of teams of robot agents where cognition, perception, and action are seamlessly integrated to address planning, execution, and learning tasks. She has made significant contributions to agents in uncertain and dynamic environments, including distributed robot localization and world modeling, strategy selection in multiagent systems in the presence of adversaries, planning by analogical reuse, and more recently, robot learning from demonstration. Her research contributions have also been realized concretely in the form of teams of robot soccer playing agents that have won several international championships at the annual RoboCup robot soccer competitions. Her impact and visibility has been consistently high over the past two decades for her technical contributions, for her impressive robot teams, and for her leadership within the research community."
A professora portuguesa recebeu o grau de doutoramento, pela Universidade de Carnegie Mellon, em 1992. É bacharel em Engenharia Electrotécnica e possui o mestrado em Engenharia Electrotécnica e Informática, pelo Instituto Superior Técnico.

[a partir de CiênciaHoje, CMU, SIGART]

março 01, 2009

o melhor do FLASH

Os 20 melhores trabalhos de sempre realizados na plataforma Flash pela revista .net. Fiquei nostálgico ao rever Eye4U, aqui na lista em 8º lugar. É sem dúvida um clássico, e ver isto em 98 na web, através de um modem 56Kb, foi um impacto tremendo, uma sensação de maravilhamento (já passaram 10 anos, impressionante). Eye4U foi o reconhecimento do poder dinâmico do flash da possibilidade de fazer uso de todo o browser sem preocupação com a resolução do ecrã, do uso de música com sentido visual e qualidade superior ao mero midi, muito em voga no html. Foi com este exemplo que o Flash se consagrou por completo e se afirmou como uma necessidade na criação diâmica para a web.
"When the first version of Flash was launched in 1996, little did we know how it would revolutionise website design over the ensuing decade. The FWA’s Rob Ford counts down the Top 20 Flash sites of all time."
20: Nike Air (2006)
Claim to fame: Pioneering user-generated motion effects.

19: Mono*crafts (1999)
Claim to fame: The experimental master inspired a community.

18: Saab Animal Vision(2005)
Claim to fame: The combination of video and atmosphere made for a winning campaign.

17: NRG.be(1998)
Claim to fame: One of the first examples of shape tweening, this laid strong foundations for the web we know today.

16: Comcastic!(2005)
Claim to fame: Using a mobile phone to play with a puppet.

15: PDK(2004)
Claim to fame: Animation allows corporate to be cool.

14: Philips Bodygroom (2006)
Claim to fame: Site of the year... for your genitals?

13: Red Universe (2007)
Claim to fame: A live chat community with a twist.

12: tokyoplastic (2003)
Claim to fame: Proving that personality wins through.

11: Leo Burnett Canada (2005)
Claim to fame: One of the best agency sites of all time.

10: Audi R8 (2006)
Claim to fame: High quality 3D video with incredible results.

9: Neostream (2002)
Claim to fame: Using a mascot to full potential.

8: EYE4U (1998)
Claim to fame: A classic example of what Flash used to be.

7: Who’s We Studios (2002)
Claim to fame: The power of attitude and humour.

6: Full Throttle (1999)
Claim to fame: Still standing the test of time.

5: Get The Glass! (2007)
Claim to fame: Taking production levels to new heights.

4: Advanced Studios v3 “Expansions”(2001)
Claim to fame: The most copied website ever.

3: Gabocorp (1996)
Claim to fame: This is where it all started.

2: Road Runner (2003)
Claim to fame: Proving how Flash can handle content.

1: Vodafone Future Vision (2003)
Claim to fame: The best Flash site ever!

fevereiro 23, 2008

Urso para Padilha

Mais um trabalho, aqui analisado, que acaba de ser premiado. Tropa de Elite (2007) de José Padilha recebeu, na semana que passou, o Urso de Ouro para o Melhor Filme do 58º Festival Internacional de Cinema de Berlim. O júri presidido por Costa-Gravas decidiu unanimemente e sem grandes dúvidas e contra todas as expectativas da imprensa especializada pela escolha do filme de José Padilha. A cerimónia de entrega dos prémios pode ser vista aqui.

fevereiro 11, 2008

prémios em discussão

Mais um prémio, agora na área de vídeo, para a Diana Carvalho, aluna da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro do curso de Comunicação e Multimédia pelo filme Journey into Nature. O prémio foi atribuído pela UNESCO, no âmbito de um concurso de estudantes relativo à comemoração do International Year of Planet Earth. Este prémio é referente à categoria de país, neste caso Portugal e o júri da UNESCO foi constituído pelo "respective National IYPE Committees" tendo por objectivo atribuir até 5 prémios por país, até um máximo de 350 prémios no mundo. Os artefactos a premiar podiam ainda variar entre: essay: maximum of 1600 words; poem/song: maximum of 400 words; drawing/painting: maximum A3; video message: maximum of 10 minutes. Na final em Paris, teremos 43 países e cerca de 100 estudantes.
Journey into Nature de Diana Carvalho (2007)

O filme pode ser visto no Canal de Vídeos do Público, no qual se podem desde já ler também alguns comentários críticos relativos à qualidade técnica e estética do filme. Na generalidade concordo com as ineficiências apontadas, o filme apresenta sérias deficiências e julgo mesmo que neste caso e não existindo melhor não deveriam ter atribuído qualquer prémio. A razão é simples, julgo que a ideia da Diana é boa, mas socorreu-se do medium errado para verbalizar a sua mensagem. Valeria mais ter escrito um ensaio ou ter feito um desenho. Julgo até que o filme se suportaria melhor se fosse eliminada toda a parte real de fotografia e vídeo e mantido apenas a animação. Apesar do objectivo do concurso, na vertente vídeo, pedir apenas uma mensagem a verdade é que não acredito que no caso do ensaio escrito fossem capazes de premiar um ensaio apenas pela ideia descurando sérios problemas gramaticais, caso existissem.