Wonder é um filme sensorial, a sua comunicação é feita quase exclusivamente a partir do que mostra, e pouco a partir do que diz. A música incita, os personagens dançam, o espaço cola-nos à realidade estática e rígida do mundo, enquanto a câmara se move tão fluída como a própria vida. É isto Wonder, um deixar-se maravilhar pela “insustentável leveza” da vida, pela sua variabilidade, mutabilidade, elasticidade, pela total inconstância do que nos espera, sem previsões nem antevisões.
Wonder maravilha-nos porque usa a caneta de escrita do cinema, a câmara, e a singularidade do seu tempo, a montagem, para exactamente nos dar a ver o que é o maravilhamento. São pouquíssimos os planos estáticos, a edição é muito rápida, mas quase nem se sente porque se entrecortam planos de movimento de câmara dóceis e brandos, que transportam consigo a inconstância, criando um puro fluxo entre o espectador e a imagem. Mas todo este movimento perceptivo que o filme ganha, não ultrapassa nunca a linha do espetáculo, do chamar a atenção sobre si, do fim em si mesmo. Malick cria o fluxo, mas fá-lo de uma forma tão contida, quanto os sentimentos que percorrem as peças centrais da narrativa. Ao longo do filme sentimos um vai e vem constante, não só entre países, não só entre pessoas, sentimentos e emoções mas também e entre razões e lógicas. E é graças a esta espécie de espontaneidade contida da visualização que tudo isso ganha um significado congruente e coerente.
O espaço dá-nos a entender que existe algo ali, algo que não muda, mas os espaços apresentam-se vazios, seja nos EUA ou em França. Somos brindados com espaços amplos enquadrados de forma majestosa, filmados sob a luz da "hora mágica" (amanhecer e entardecer), variando entre o sol cheio de verão e o pleno cinzento de inverno. Mas a ausência de vida em redor, leva-nos a acreditar que o espaço não é aquele, que este é apenas uma expansão do verdadeiro espaço do filme, os corpos, a sua comunicação não-verbal, é aqui que se centra a espacialidade de Wonder. Os próprios espaços interiores são tão desprovidos de vida quanto os exteriores. Se na rua não existem quase pessoas, em casa não existe quase mobília, porque a mudança é uma constante, e os sentimentos estão em fluxo, não param, sentem e deixam de sentir, mas continuam a voltar atrás para a apanhar de novo o fluxo antes conhecido, apenas para descobrir, que o que antes se teve, já não volta. O fluxo é um contínuo, sempre em movimento, sempre em mutação, o fluxo é o maravilhamento, é a vida.
To the Wonder (2012) de Terrence Malick