janeiro 27, 2012

A dependência dos Independentes

A propósito de uma conversa com académicos de jogos do Brasil no Facebook que tivemos há umas duas semanas, quase que podia dizer que o pessoal da Dorkly leu a discussão, e fez um vídeo sobre a mesma, "Mario is too Mainstream! Não que eu esteja em total acordo com o vídeo, porque as personagens/jogos indie utilizadas são, para mim, bastante ricas em termos de novas abordagens à linguagem dos videojogos, mas de uma forma geral toca na mouche. Como dizia a Renata Gomes,


"Renata: desabafo aqui: tou bem de saco cheio desses games repetitivos nos temas, dinâmicas de jogo e formas narrativas, viu? E tenho cá a impressão de que a crítica (?) e a academia precisa abordar isso frontalmente ou os games morrem por pura irrelevância..."

Aliás a Renata não dá tréguas e bate mesmo em Braid e Limbo que o Emmanoel Ferreira e eu defendemos, mas que vai em total sintonia com o este vídeo do Dorkly Bits.

"Renata: vocês nao acham que, no fundo, eles ainda são todos muito... Bobos? Nao joguei Flower, só joguei o demo de Limbo (mas o visual é bacana), a jogabilidade de Braid é genial e a forma como ela constrói, na prática, alguns sentidos "narrativos" do game é sensacional (embora o final, pra mim, seja uma viagem... E Machinarium é lindo e tal, mas... Ainda me frustram (e olha que estamos falando da crème de la crème!) Também apontaria os games do Steve Lavelle - esses, sim, radicais. Tem coisa, é claro que tem, mas nao chega sequer a ser um nicho. Enquanto isso, a indústria é de uma preguiça absurda, de uma previsibilidade pior do que o pior de Roliúde!)."

Apesar de até condescender sobre a qualidade de Braid, depois do Emmanoel insistir

"Emannoel: Tomemos, só pra início, o caso de Braid. Não sei se você o jogou (todo), mas a forma com que ele reúne gameplay + retórica é fantástica (a tal retórica procedimental, de Bogost). Ou seja, o jogo comunica (e algo bem forte) através do gameplay. Claro que gráficos, trilha sonora, texto, dão suporte a essa comunicação, mas a relação gameplay - conteúdo, nele, é fantástica"



Mas tenho que lhe dar razão quando fala do seguidismo indie, da quase dependência face à linguagem mainstream,

"Renata: Não surge um autor, mesmo que seja um autor-dentro-do-cânone, no game porque a forma como a "indústria" se coloca em relação a ela mesma (e a seu "fora") sequer permite detectar as singularidades emergentes nos diversos processos de criação de jogos. E mesmo quando isso acontece, essas manifestações são engolidas por ela no segundo seguinte, tratando de achatar qualquer diferença, de aparar qualquer aresta, de endireitar qualquer ruído. Aliás, mesmo o "fora" da indústria - o universo dos games "independentes" - se coloca em movimento almejando ir parar "dentro" e isso já achata os games "independentes" (que parecem querer apenas se tornarem "dependentes"!) do nascedouro: quando produtoras brasileiras (ou portuguesas) replicam temas, formatos narrativos/de jogabilidade e mesmo a língua dos games industriais etc."



Da minha parte acredito ainda assim na indústria indie e que existe muita coisa boa no meio das massivas quantidades de mediania. Julgo que faz muita falta os media deixarem de se centrar apenas no mainstream. Os jogos diferentes, radicais, que não dão as experiências esperadas pelo grande público, precisam de ser discutidos, digeridos, mastigados por críticos, curadores e especialistas. Só assim poderemos avançar no terreno. Se os media continuarem a dar espaço apenas ao que é familiar, às sequelas das sequelas, aí será sempre muito difícil que a arte evolua. E o que a Renata diz dos jogos poderem cair na irrelevância é uma realidade inevitável, como já vai acontecendo com a indústria de Hollywood. Aliás o Roger Tavares acha que isto já não tem mesmo salvação, e que a única forma séria de resolver o assunto da indústria dos videojogos, era com um novo Crash.

Apesar de tudo ainda vamos vendo algumas mudanças, como a EDGE que este ano já apresentou uma lista de Indies de 2011, embora muitíssimo limitada. Acredito também que um dos problemas que os media têm, é conseguir exatamente triar as quantidades de novos jogos criados pelo mundo fora. Mas eles não se podem demitir desse papel, apesar da complexidade. Sei bem que é muito mais fácil pegar nos fabulosos Press Releases que as grandes editoras mandam para as redações das revistas no mundo inteiro, com a papinha toda feita, pronta a publicar. Mas a continuar assim as revistas vão morrer antes dos jogos, aliás como já se vai sentindo. A morte de algumas publicações de jogos não acontece só pela crise mas muitas vezes pela falta de relevância, ou valor acrescentado face à informação que os leitores já possuem. Neste sentido, e porque não basta apontar o dedo, deixo algumas pistas de nomes de autores e jogos do último pelos quais nutro consideração e respeito.

Autores a seguir: Edmund McMillen, Terry Cavanagh, Stephen Lavelle,  entre outros como o Paolo Pedercini, Jonathan Blow, Thomas Brush, Austin Breed, Amir Rao, Jason Rohrer, Krystian Majewski, Daisuke Amaya, Stephen Whichello, Kevin McGrath, Evan Miller, Guy Lima, Evan Miller, Mattia Traverso...

Experiências diferentes: Binding of Isaac, Oíche Mhaith, ImmorTall, Grey, Coma, A Mother in Festerwood...

3 comentários:

  1. (Copiando abaixo meu comentário na nova discussão do Facebook -- ah, como eu <3 as redes sociais! -- que foi destinado ao Emmanoel Ferreira)

    Emmanoel Ferreira, minha confissão pessoal é: mesmo um game único como Braid não faz por mim o que fazem certos filmes, livros e espetáculos teatrais (para colocar a minha ordem pessoal de paixões). Quaaase faz: a epifania do "voltar no tempo" é espetacular e a forma como ela se desdobra ao longo do jogo também. Mas é quaaaase (pra mim, pelo menos).

    Mas que fique claro que não estou querendo nivelar as 'affordances' de cada uma dessas mídias/linguagens - eu também já gastei muito verbo para defender que game é game e tem que ser entendido por suas próprias potências e continuo convicta disso.

    Agora, me parece que o game não consegue dar um salto maior, mesmo dentro das suas próprias potências e criar experiências que façam por mim o que fizeram "A Metamorfose", do Kafka ou "O Céu de Suely", do Karim Aïnouz, para citar duas das minhas obras favoritas nesta vida inteira. Mesmo que tenhamos que considerar que qualquer experiência que ele crie vai ser bem diferente da literatura de Kafka e do cinema do Karim.

    Acho que Braid consegue algo notável (mas ainda tenho que jogar a lista que o Nelson Zagalo fez, só não sei quando...) porque, como disse, cria um game complexo e que constrói seu sentido pela jogabilidade numa experiência que dura mais do que o tempo de uma sacada (como, por exemplo, são os games do Lavelle que eu conheço, os do Pedercini, os do Frasca).

    O que me incomoda mesmo é que eu acho que esse salto não é dado quase que exclusivamente por uma sabotagem da própria indústria, que é, sim, como o Roger Tavares bem falou, apenas parte da indústria do entretenimento (mas que, como bem constrói o excelente "Games of Empira", tem na indústria de games seus procedimentos mais nefastos).

    Ou seja, até onde me consta, nada de estritamente técnico impede que haja um game que adapte (na verdade: transcrie) "A Metamorfose" para uma experiência imersiva, participativa, audiovisual. O exemplo não é dos melhores, porque acho - concordando com você, aliás, isso é bem consensual entre nós todos - que os games nem precisam, nem merecem ter que adaptar nenhum "conteúdo" que lhe é anterior (e exterior). Mas, enfim, nada impede games que criem uma experiência imersiva ruidosa, complexa, desconcertante como "A Metamorfose" (ou "O Processo", eu tenho vontade de fazer um game a partir do livro há tempos - ah, se apenas eu SOUBESSE fazer games, rs...)

    Então, de tudo o que joguei (e joguei Braid até o final, com a preciosa ajuda do Diogo Rodrigues, rs), acho que temos um ou outro game que toca algumas coisas, mas até hoje nenhum que blew my mind como essas obras que aponto. Continuo achando que estamos na fase primeiro cinema dos games, na medida em que a analogia é sequer minimamente aceitável.

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  2. Obrigado pelo comentário Renata, é verdade que em termos dramáticos os jogos ainda têm um caminho a percorrer. Acredito que muito porque se acredita que o jogo digital em si, deve replicar a atividade de jogo humana, e nesse sentido deve antes de mais conduzir a uma experiênca Fun.
    Mas existem agumas experiências que têm sido feitas em contra-ciclo, e uma das mais recentes e interessantes é o último jogo do Edmund, e por isso mesmo aproveito para deixar aqui em adenda à discussão a entrevista que ele deu ontem ao IndieGames

    Interview: Edmund McMillen Spills The Beans on The Wrath Of The Lamb & More

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  3. Joguei Limbo até o final e ele cria uma narrativa impressionante, mesmo o game não tendo texto você pode concluir o que se trata com o personagem.Poucos jogos tem isso ou cada vez ta ficando mais escasso surgindo jogos de ação e só ação.
    A primeira vez que joguei Half-Life fiquei impressionado, era um jogo de tiro mas que fugia no tradicional, os novos FPS são ocos apenas a ação se sentido.
    É difícil fazer uma game como Braid ou Limbo mas os poucos que existi anima bastante fiquei muito feliz ao jogar Abobo Revenge hahhaahha este game é sensacional.

    Abraço a todos.

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