junho 19, 2022

"Uma Estranheza em Mim" (2016)

"Uma Estranheza em Mim" (2016) precisa de ser lido lentamente para se entrar no mundo doce-melancólico criado por Pamuk e sorver tudo o que a sua escrita nos oferece. A Istambul pobre da segunda metade do século XX não parece muito diferente do Portugal pobre da primeira metade desse século, por isso é muito fácil relacionar com a galeria de personagens apresentada, os seus medos, ânsias e indefinições. Apesar da pobreza, a Istambul desse tempo apresenta-se como o El Dorado dos turcos do interior, acabando a converter a sua população de 3 milhões nos anos 1970 em 13 milhões em 2012. 

junho 17, 2022

"Dot's Home", videojogo sobre problemas sociais

"Dot's Home" (2021) é um belíssimo videojogo narrativo, criado por uma equipa de criativos multimédia em conjunto com uma ONG focada na resolução de problemas sociais, nomeadamente de habitação e discriminação racial nos EUA. O jogo foi criado no âmbito de uma campanha transmedia, a Rise-Home Stories, que produziu para além deste jogo, mais quatro artefactos digitais narrativos: "Alejandria Fights Back!",  um livro para crianças, "But Next Time" um podcast, "MINE", uma web série animada e "Steal-Estate", uma experiência online interativa. O jogo foi apresentado no final de 2021 e está agora disponível gratuitamente na App Store, Google Play e Steam.

junho 10, 2022

O Cérebro em Busca de Si Mesmo (2022)

O livro "The Brain in Search of Itself" (2022) presta uma necessária homenagem a uma importante figura da ciência do início do século passado, o espanhol Santiago Ramón Y Cajal (1852-1934), responsável pela descoberta da célula base do nosso cérebro, o neurónio. Considerado um dos pais da disciplina das neurociências, foi agraciado com o Nobel em 1906, com o que contribuiu para uma revolução no reconhecimento das ciências espanholas. Ao longo das curtas 450 páginas, Benjamin Ehrlich dá-nos a conhecer não apenas a vida de Cajal, o seu amor pela ciência e arte, mas também a vida em Espanha — de Zaragoza a Madrid, passando por Valencia e Barcelona — no fim do século XIX e início do século XX, assim como as principais teorias que conduziram à descoberta da fisiologia do nosso sistema nervoso. 

O Que Mais Teme na Vida? 'Que eu não seja quem deveria ser'

São 5 minutos magníficos. A realizadora de documentários polaca, Bartlomiej Zmuda, questiona de forma direta e sincera um conjunto de cidadãos de Varsóvia sobre o maior medo das suas vidas, no pequeno filme "What Do You Fear the Most?" (2022). Vemos apenas os momentos honestos e sentidos das respostas de cada. A intensidade emocional das suas palavras cola-se ao registo vídeo. No final, as respostas tão profundamente humanas permitem-nos relacionar com quase todos os medos, e levar-nos não apenas a sentir o quão parecidos todos somos, mas também quão frágeis acabamos por ser no meio das nossas diferenças e capas de coragem que vamos montando ao longo das nossas vidas.

junho 08, 2022

"In the Absense" (2019)

Surpreendentemente intenso. Em 2014, na Coreia da Sul, um ferry com 476 passageiros a bordo afundou-se e levou para o fundo do mar 304 pessoas, das quais 250 estudantes do secundário que realizavam uma visita de estudo. O documentário curto "In the Absense" (2019) não usa o choque gráfico, antes usa o silêncio e múltiplas fontes de informação cronológica para dar conta dos erros humanos que levariam anos depois à incriminação de homicídio do capitão e mais alguns membros da tripulação e por fim à destituição da Presidente da Coreia do Sul, Park Geun-hye.


junho 05, 2022

Na Terra Somos Brevemente Magníficos

O título, "Na Terra Somos Brevemente Magníficos" (2019), atraiu-me desde que o vi pela primeira vez, talvez por produzir um sentimento paradoxal, no sentido em que soa a pedante e simultaneamente humilde. A experiência de leitura correspondeu, definindo-se como desassossegada, num sentido pessoano, pela profundidade a que o autor consegue levar a descrição do sentir que vai edificando numa escrita de enorme beleza.

Call for special issue on ‘Hybrid Games and Interaction Design’

Call for a special issue on ‘Hybrid Games and Interaction Design’, for the Journal IxD&A (Interaction Design and Architecture), indexed by SCOPUS and ESCI.

Important dates

Deadline: January 15, 2023
Notification to the authors: February 20, 2023
Camera ready papers: March 15, 2023
Publication: begin of April, 2023


Overview

Board games gained significant momentum throughout the past two decades, with some of the best creations earning millions of dollars in funding platforms during 2021, in spite of the Covid-19 pandemic. Additionally, digital games have surpassed all other media, from film to music, in investments and returns. Board and digital games are two forms of play which use the same base of design – the game design – so it was without surprise that a new hybrid approach, that mixed both media, would appear.

Through the past five years we have seen games with Augmented Reality, board games using smartphones as assisting tools, and tablets being used as boards, or even games using real food – edible games. This combination of digital and physical components and strategies in games contribute to a new experience of play which enhance not only the player’s immersion and interaction, but also the contents, presentation, atmosphere, and control of the game. There are some questions emerging in this discussion, namely about the complementary relationship between physical and digital games: What are the borderlines between real and virtual dimensions in hybrid games? How can hybrid games provide more participatory gaming experience while players become engaged with digital and physical components at the same time? Which model of interaction design of hybrid games best favors player experience, communication and engagement?

In this special issue we want not only to present the current state-of-the-art of the hybrid games, as the possibilities beyond current days, making use of speculative approaches to design, as design fiction, but we want to dig deeper through the lenses of interaction design, in order to understand the new needs in the realm of technologies. Furthermore, we want to understand the full impacts and effects of this move on human interaction with game artefacts and consequently find out what should we expect from the discipline of interaction design while using ludic approaches in the next decade.

Topics of Interest

The indicative list of topics of interest for this special issue devoted to Hybrid Games and Interaction Design’ includes, but is not limited to: 

Hybrid digital/physical games

Methods of hybrid game design 

Design Fiction and Hybrid Interaction Design

Interaction design relation with game design

Play Hybridism 

Hybrid systems;

Hybrid design models;

Hybrid game mechanics and patterns;

Hybrid storytelling models;

Hybrid Game interaction models;

Cognition and game design;

Aesthetics of Hybrid Digital/Physical Games;

Board-games and Digital Games;

Hybrid-games design;

Hybrid game User Experience;

Players physical/digital behaviour modelling;

NPC behaviour and Physical Characters.


Guest editors

Nelson Zagalo, DigiMedia, University of Aveiro, Portugal
Fotis Liarokapis, University of Technology, Cyprus
Micael Sousa, University of Coimbra, Portugal
Ana Patrícia Oliveira, University of Aveiro, Portugal


Submission procedure 

All submissions must be original and may not be under review by another publication.

The manuscripts should be submitted anonymized either in .doc or in .pdf format. 

All papers will be blindly peer-reviewed by at least two reviewers. Perspective participants are invited to submit a 8-20 pages paper (including authors' information, abstract, all tables, figures, references, etc.). 

The paper should be written according to the IxD&A authors' guidelines (http://www.mifav.uniroma2.it/inevent/events/idea2010/index.php ).

Submission page -> https://www-2020.ixdea.uniroma2.it/ojs/ixdea   

(when submitting the paper please choose the section: 'SI: Hybrid Games and Interaction ')

Online call link, for scientific advices and for any query please contact the guest-editor: nzagalo [at] ua [dot] pt, marking the subject as: 'IxD&A Hybrid’.


junho 04, 2022

Escassez: Porque ter muito pouco significa muito

"Scarcity: Why Having Too Little Means So Much" já é de 2013, ou seja pertence a uma época em que economia comportamental, dos vieses cognitivos sobre a racionalização, se estava a afirmar. Aqui, o enfoque, de Sendhil Mullainathan e Eldar Shafir, é todo realizado sobre a ideia de escassez, algo que já conhecemos do mundo da persuasão social, mas aqui é analisado de uma perspectiva distinta. Ou seja, sabemos que as pessoas reagem de forma mais interessada quando um produto é escasso (ex. o ouro; daí a criação dos NFT). Ou seja, as pessoas tendem a focar-se no que há pouco, nomeadamente no que lhes faz falta. Daí, Mullainathan e Shafir tentaram compreender como é que essa focagem cognitiva afeta as nossas vidas, e fá-lo não só a partir do caso financeiro, mas também das dietas, da solidão, ou da falta de tempo. 

maio 30, 2022

O Tio Vânia (1898)

A primeira leitura é boa, mas não conseguindo seguir todos os personagens facilmente, porque não estamos a ver os atores em placo, apenas temos a etiqueta dos nomes, volta-se então ao início e recomeça-se uma segunda leitura, e aí então a emocionalidade começa a latejar pelos poros de todos os personagens, que já nos são tão familiares. Uma maravilha, porque na segunda leitura conseguimos ter tempo para reparar como Chekhov vai introduzindo toda a informação necessária sobre todos pelo meio de pequenos apontamentos que quase parecem despicientes, mas são essenciais à formação mental do mundo em que aquelas personagens habitam. Deixo um extracto que dá conta do que nos oferece:

"Professor reformado, estás a ver, côdea velha, peixe seco da ciência... Gota, reumatismo, enxaqueca, fígado inchado de ciúmes e inveja... Pois este peixe seco vive na herdade da sua primeira mulher, ou antes, é forçado a viver porque não tem meios para viver na cidade. E sempre a queixar-se das suas desgraças, embora, no fundo, esteja incrivelmente feliz. Imagina a sorte do homem! Filho de um salmista, aluno da escola primária eclesiástica, lá conseguiu os seus títulos académicos e uma cátedra na universidade, foi promovido a sua excelência, depois tomou-se genro do senador, etc., etc. Aliás, nada disto tem qualquer importância. Mas vê outra coisa. O homem anda há vinte e cinco anos a ler e a escrever sobre a arte, mas não percebe patavina de arte. Anda há vinte e cinco anos a mastigar as ideias dos outros sobre realismo, naturalismo e outros disparates; há vinte e cinco anos que anda a ler e a escrever coisas que os inteligentes já sabem há muito e que os parvos não querem saber... o que significa apenas isto: durante vinte e cinco anos, foi como chover no molhado. E no entanto, que presunção! Que pretensões! Reformou-se, ninguém o conhece, é um perfeito desconhecido; quer dizer que durante vinte e cinco anos ocupou um lugar alheio. Mas olha para ele: tem a passada de um semideus!" 
Excerto de "O Tio Vânia" (1898) de Anton Chekhov, trad. Nina Guerra e Filipe Guerra, Relógio D'Água 

GoodReads