“Retrato de Uma Senhora” (1881) é considerada a obra central do legado de Henry James. A mim serviu de porta de entrada, ficando a conhecer o mesmo, mas apesar de alguma admiração suscitada, deixou-me sem motivação para o continuar a ler. James realiza um trabalho soberbo de análise dos processos da consciência humana, na senda do que já nos tinha dado Balzac e Dostoiévski, capturando a nossa atenção ao longo de páginas e páginas de escalpelização dos mundos interiores dos seus personagens. Diga-se que James era irmão de William James, um dos grandes pioneiros da psicologia. O problema surge no conteúdo, nos personagens trabalhados, pela pertença à aristocracia, ou a uma burguesia muito próxima, que torna aquilo que se conta muito pouco interessante.
Existem temas interessantes, como a liberdade e o destino, nomeadamente no campo feminino, mas diga-se que é tudo muito estéril. A senhora, Isabel Archer, que veio dos EUA, dedica-se a passear pela Europa, diz querer ser livre, mas apenas busca alguém com quem casar. O primo, Ralph, que vive há muito em Inglaterra, aparentemente por ser doente, dedica-se a respirar, e como tem de respirar, passeia um pouco menos. Já a tia, vive em passeio pela Europa, enquanto vai maldizendo deste e daquele. Para o resto, existem criados e serviçais, mas desses não é preciso falar. Segundo James, os seus personagens vivem vidas muito complicadas, carregadas de decisões pesadas, que os impedem de desfrutar livremente das belezas de Veneza e Florença. Assim, o livro arrasta-se ao longo de centenas de páginas, pondo à prova a resistência dos mais pacientes, ainda que no final exista uma reviravolta que anima um pouco todo aquele universo.
Reconheço que independentemente da classe social em que se vive o ser humano arranja sempre forma de viver angustiado. Veja-se o caso exposto em “La Familia Grande”. Mas quando se escreve uma obra com esta dimensão, 700 páginas, e com um aprofundamento psicológico deste calibre, espera-se que seja com o objetivo de ilustrar algo relevante para quem lê. Verdade que em 1881 só a alta burguesia e aristocracia deveriam ter tempo e literacia para se dedicarem à leitura. Mas a seguir por este caminho, James castrou o interesse das suas obras, o que me ajuda a compreender porque apesar do seu nome surgir amiúde em textos de análise crítica, as suas obras são bastante menos lidas e citadas que as de outros autores da mesma época.
Entretanto descobri que John Banville gosta tanto de Isabel Archer que passados 140 anos resolveu escrever uma continuação da história da heroína de James — “Mrs Osmond” (2017). Não me admira, já que não fiquei propriamente impressionado com o seu “O Mar” (2005) que ganhou o Booker.
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