outubro 18, 2019

Parar, Pensar e Boicotar a China

Não é possível continuar calados a propósito do que está a acontecer na China, na região de Xinjiang. Daqui a umas dezenas de anos vamos olhar para trás e dizer, mais uma vez, que um regime Comunista Totalitário cometeu um Genocídio de proporções inimagináveis. O problema é que desta vez, todos nós, sem exceção, seremos culpados.



Desde 2017 que têm surgido relatos de maus-tratos na região de Xinjiang dirigidos maioritariamente a uma minoria étnica, os Uigurs. Esses relatos começaram por ser sobre pessoas que eram levadas e trazidas alteradas. Depois passaram a ser relatos de pessoas que estando fora da China não podiam telefonar aos familiares, pois esses seriam castigados por contactos com o exterior. Durante 2018 os relatos de pessoas fugidas foi aumentando, e a ONU até chamou a atenção da China que respondeu que estava a lutar contra grupos organizados de radicais naquela região, que formavam grupos de terroristas, inclusive dizendo que muitos se tinha alistado na Síria. Mas no início de 2019 os relatos aumentaram, e as imagens por satélite começaram a mostrar campos cada vez maiores, nos relatos falava-se em desaparecimento completo de muitas pessoas, incluindo investigadores e professores universitários, assim como maus-tratos profundos. Mais recentemente surgiu um vídeo (imagens abaixo) que mostra uma cena que parece tirada de Auschwitz. É preciso agir, não podemos cruzar os braços, temos de boicotar e podemos pressionar países, governos, empresas e a ONU, podemos contribuir para associações humanitárias, podemos fazer muitas ações, tais como simplesmente alertar para o problema, falar sobre ele, não permitir que seja calado como tanto deseja a China.

A Europa, Portugal, e todo o restante planeta compra diariamente milhões de produtos fabricados na China, alimentando esse regime, alimentando as atrocidades perpetradas por ele. Compramos diariamente Huawei, Xiaomi, Lenovo, Haier, Hisense, Anker, Cheetah Mobile, para não falar no gigante Alibaba e nas lojas chinesas espalhadas por todo o país, Europa e EUA, e para tudo isto a palavra de ordem de compra é — barato — sem parar para pensar nos efeitos desse barato.

Sayragul Sauytbay, uma médica que passou por estes Campos de Concentração, conseguiu fugir e obter asilo na Suécia. A história pode ser lida no Haaretz, mas atenção aos mais sensíveis.

A ideia que passa e alivia as consciências ocidentais é que a China é um país grande, vendido nos anos recentes como igual a todos os outros, por isso se estas pessoas foram presas é porque o mereciam. Pois leiam mais este relato, de Sayragul Sauytbay, uma médica que passou por estes Campos de Concentração, conseguiu fugir e obter asilo na Suécia, de entre os vários que têm sido publicados desde 2017. Nestes relatos é possível ler sobre a violência atroz, ao nível do que já lemos sobre Auschwitz, Dachau ou Treblinka, só faltam as câmaras de gás, por agora, mas até os comboios carregados de prisioneiros já temos (ver imagens abaixo). Isto é inaceitável, e nós não podemos continuar a compactuar com isto.




Imagens de vídeo captadas na província de Xinjiang. Os comboios descarregam milhares de pessoas, com a cabeça rapada, e os olhos vendados, que depois são transportados para os campos de concentração.

Sei bem que muitos dos produtos europeus e americanos que compramos são produzidos na China, e muito pouco podemos fazer no imediato, mas podemos fazer muito desde já no que toca a produtos especificamente chineses, existem alternativas, e os preços nem sempre são mais caros, basta procurar, basta ganhar consciência, tomar as rédeas daquilo que compramos de forma consciente. Nem que por vezes tenhamos de pagar um pouco mais, estaremos a agir em plena consciência de estar a castigar um país que não pode continuar a passar impune, a pavonear-se pela cena internacional como um dos mais ricos, poderosos, e pior aquele que pretende ser o farol nos próximos anos da Cultura Internacional. Podemos ainda contribuir para associações como a Amnistia Internacional que já lançou vários alertas.

Aliás, não podemos esquecer que isto não é sequer um problema de supostas minorias étnicas, menos ainda radicais como a China tem vendido, naquele país existe já todo um sistema informático de vigilância permanente de toda a sociedade, sem excepção, e que tem sido definido como Crédito Social (sistema que atribui pontos em função dos comportamentos bons e maus dos cidadãos, uma espécie de pontos de carta de condução para tudo o que fazemos enquanto cidadãos).

Ainda na semana passada tivemos um dos maiores ataques de sempre às grandes empresas americanas por parte da China, apenas por se terem levemente manifestado a favor de Hong Kong — ver os casos Apple, BlizzardNBA e uma análise geral dos porquês.

E quem quiser atirar pedras, dizendo que todas estas notícias sobre os campos de concentração na China são apenas uma manobra de contra-informação americana por causa da guerra comercial, podem ficar descansados, os relatos sobre o que se passa em Xinjiang começaram bem antes, existem notícias de 2017 e ramificações a políticas da China para aquela região que remontam a 1949. Tendo-se notado um recrudescimento dos relatos desde a alteração da Constituição chinesa, em 2018, que passou a permitir que Xi Jinping pudesse ser Presidente da China para sempre, seguindo Mao.

A brutalidade do que está a acontecer tem sido amplamente documentada, é tempo de deixar de fazer de conta, é tempo da ONU agir, da Europa agir, dos EUA agirem, de todos nós agirmos, ou então ficarmos com o peso na consciência de não só nada ter feito, como ter contribuído para que milhões de pessoas fossem extirpadas da sua humanidade.


Ligações para os vários Relatos recentes sobre Xinjiang e os Uigurs

A Million People Are Jailed at China's Gulags, Haaretz, 17.10.2019
Leaked drone footage purports to show Xinjiang prisoners blindfolded and tied up, Business Insider, 8.10.2019
'Think of your family': China threatens European citizens over Xinjiang protests, The Guardian, 17.10.2019,
‘There’s no hope for the rest of us.’ Uyghur scientists swept up in China’s massive detentions, Science Magazine, 10.10.2019
Disturbing video shows hundreds of blindfolded prisoners in Xinjiang, CNN, 7.10.2019
Despite China’s denials, its treatment of the Uyghurs should be called what it is: cultural genocide, The Conversation, 24.7.2019
China putting minority Muslims in 'concentration camps,' U.S. says, Reuters, 3.5.2019
China Targets Prominent Uighur Intellectuals to Erase an Ethnic Identity, NYTimes, 5.1.2019
Uyghur scholars and students interned or disappeared, University World News, 30.1.2019
Inside China's Massive Surveillance Operation, Wired, 9.5.2019
China's Jaw-Dropping Family Separation Policy, The Atlantic, 4.9.2018

Notícias anteriores, provindas da Ásia de 2017
China: Uyghur women and children endure heavy labor amid detentions in Xinjiang's Hotan, Radio Free Asia, 16.10.2017
Uyghur Biodata Collection in China, The Diplomat, 28.12.2017

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