Vou elencar alguns dos elementos imensamente positivos e relevantes para quem pretende seguir uma carreira artística, seguido dos vários problemas enunciados ao longo do discurso:
Lado Positivo e Criativo
- Proposta de escrita de "morning pages" (todos os dias de manhã escrever 3 páginas do que nos vier à cabeça, para alguns isto já acontece com o Diário, para outros com um blog...)
- Proposta de escrever a partir do nosso passado, a partir de sonhos não realizados, de gostos e preferências de criança, de objetos espaços e locais que falam ao nosso Eu.
- Proposta de escrever sobre vidas imaginárias que gostaríamos de ter vivido.
- Todo o modo como trabalha os bloqueios criativos, especialmente os medos e a baixa autoestima para garantir a criação de espaços e tempos criativos, tal como parar de nos recriminar, de nos culpar, queixar ou questionar a capacidade de fazer.
Lado Problemático
Para além de ser um livro de autoajuda, vem ainda disfarçado de livro de terapia, o que acentua o problema destes livros que se baseiam exclusivamente na experiência pessoal dos autores, suportados em mero anedotário, não corroborados por quaisquer estudos. Funcionará muito bem para pessoas que se enquadrem no tipo de personalidade e experiência de vida da autora, mas dirá muito pouco a uma grande parte de leitores. Alguns dos exemplos problemáticos que esta abordagem nos dá:
- Uma visão demasiado assente em princípios teológicos, disfarçados pelos conceitos do movimento New Age.
- Uma visão demasiado egocêntrica, por vezes quase a roçar o Objetivismo de Ayn Rand
- Demasiada ingenuidade (ou de sobranceria) quanto às definições da Arte, agravando-se na definição do Artista.
Se querem um livro sobre como desenvolverem-se como artistas, não posso deixar de recomendar vivamente o livro de Stephen King “On Writing: A Memoir of the Craft” (2000), ainda que baseado na experiência do autor, resulta de um método aplicado durante décadas e com largos frutos, não havendo lugar a justificações transcendentes. O que é feito neste livro é a tradução em texto de um processo criativo, o que permite a qualquer pessoa aprender pela imitação, sem espaço para qualquer autopiedade.
Por outro lado, e agora falando em concreto das pessoas, porque isso é também relevante, já que a autora faz questão de trazer a sua vida pessoal para o centro da cena, a verdade é que pesquisando a vida e obra de Julia Cameron, não existe aquilo que à partida pareceria existir, ou seja, uma vida de produções artísticas, nem grandes nem pequenas, apenas uma mão cheia, sendo a coisa mais importante um episódio da série Miami Vice, e o casamento de um ano com Martin Scorsese. Cameron escreveu mais de 20 livros, mas todos após o sucesso deste, e todos a falar destas mesmas coisas. Ou seja, seguir Cameron não é um processo de imitação do processo de desenvolvimento de um artista, mas antes ouvir boas palavras de incentivo à persistência. No fundo Cameron tornou-se uma guru da autoajuda para iniciantes ou desejosos de se tornarem artistas, e isso também explica muito das discussões em sua defesa que encontramos na net.
Obrigada pela excelente resenha e explicação dos pontos positivos e negativos. Foi-me bastante útil!
ResponderEliminarDe nada, fico muito contente sabendo que o que aqui se escreve serve a quem lê.
ResponderEliminarObrigado pela tua opinião, num tema tão importante nos dias que correm, relativamente à criação artística.
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