abril 18, 2014

"Monument Valley", estéticas do impossível

Uma obra-prima de design, tanto no design de jogo como no design gráfico. Monument Valley está carregado de influências, não num sentido intertextual, mas antes como raízes conceptuais criativas, que vão de M.C. Escher a Fez (2012), passando por Echochrome (2008) e Wonderputt (2011).



É evidente que não existiria Monument Valley sem MC Escher, um artista gráfico que tem servido de inspiração a muitos de nós pela força do seu trabalho. Escher demonstrou por via do grafismo como a realidade que vemos e que tanto sentido faz, é por vezes verdadeira ilusão. As suas dimensões impossíveis continuam a exercer forte encantamento sobre nós, pela forma como misturam o real e o virtual, criando uma espécie de caminhos para o possível.

Relativity (1953) M.C. Escher

Monument Valley serve-se dessa força encantatória do impossível para criar o seu mundo de jogo e para nos seduzir. Mas se fosse apenas por Escher, seria apenas mais um jogo como Echochrome (2008), entre múltiplos outros pequenos jogos que já tentaram explorar esta ideia. Muitos têm tentado explorar as lógicas visuais de Escher, porque quando olhamos para as suas obras sente-se uma tremenda vontade de lhes dar vida, de as colocar em movimento, de passear dentro delas. Mas a verdade é que muitos dos trabalhos que se têm socorrido deste universo visual ficam-se pela sombra de Escher, não conseguindo ir além daquilo que já temos nas telas.

Echochrome (2008) Sony Japan

Por isso quando tomei conhecimento de Monument Valley fiquei logo algo receoso de ser apenas mais uma mera tentativa de gamificar os mundos de Escher. Mas quando começamos a jogar percebemos que é claramente mais do que isso, uma das primeiras evidências surge com o design gráfico e a atmosfera, que seguem o minimalismo do trabalho de Escher, na evolução visual das suas obras pela cor, movimento e som. Cada um dos níveis possui uma atmosfera bem delineada, e acima de tudo muito coerente em si e no conjunto dos 10 níveis. Todos os elementos — cor, movimento e traço — trabalham para solidificar o universo de jogo, transformando-o num espaço imensamente atrativo e envolvente.

Mas se Monument Valley fosse apenas um conjunto coerente de universos audiovisuais envolventes, seria apenas uma interessante animação. O design de jogo é ele próprio brilhante, no sentido em que serve o universo impregnando-o de interesse, motivando-nos assim a perscrustar cada detalhe de cada ecrã, muito na linha de Wonderputt (no meu Top 10 2011). Porque o design não se limita à resolução dos espaços impossíveis, ele é servido por um conjunto de personagens muito relevantes, que conferem uma camada adicional de valor e envolvência ao espaço, gerando narrativa e jogabilidade, tal como temos em Fez (no meu Top 10 2012).

Wonderputt (2011) de Reece Millidge

Fez (2012) de Phil Fish

De forma geral, podemos dizer que o design é progressivo e bastante balanceado. A cada novo nível, novos elementos são trazidos para o espaço de jogo, e apesar de sentirmos que o jogo espera mais de nós, cognitivamente na sua resolução, nunca nos sentimos presos num espaço por tempo demasiado. Ou seja, a dificuldade foi algo muito bem balanceado, demonstrando que os autores estavam mais interessados em criar um universo interativo que fosse gerador de emoções estéticas do que de resolução de problemas. Aliás a demonstrar esta vontade de criar uma experiência estética, e não uma fórmula de puzzles, é o facto de o jogo conter apenas dez níveis, preocupados em desenhar uma experiência única — com um princípio, meio e fim — longe do mero sucedâneo de níveis sem fim.


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