abril 03, 2014

“Metro: Last Light” (2013)

Comecei a jogar “Metro: Last Light” sem saber da existência do primeiro da série, “Metro 2033” (2010), mas sem grandes expectativas, uma vez que jogo poucos FPS. Provavelmente por não esperar muito, fui surpreendido pelo modo como me agarrou e envolveu desde os primeiros instantes. Esse engajamento deveu-se essencialmente à qualidade da atmosfera e do design de jogo e narrativa.




Metro: Last Light” (MLL) não é propriamente um jogo leve, trabalhando atmosferas próximas de "Doom 3" (2004), no que toca a medo e terror. Mas MLL trabalha num registo atmosférico que vai muito para além do mero terror, sendo capaz de apresentar nuances de thriller político, assim como de drama humano. E é este alargamento temático que faz sobressair a qualidade das atmosferas do jogo, demonstrando a sua eficácia comunicativa e emocional. Ora estamos num labirinto às escuras sob tensão pura com medo das aranhas que nos rodeiam, ora assistimos a um comício político das várias facções e compreendemos que existe alguém pronto a trair-nos, ora circulamos pelo metro e assistimos às difíceis condições em que as pessoas sobrevivem. Cada uma destas é desenvolvida através de uma belíssima arte visual e de um excelente design de som.

A estratégia de promoção de MLL passou por criar um pequeno filme de ação real como epílogo para a narrativa do jogo. Como o próprio título indica, "Metro: Last Light - Enter the Metro" (2013), dá conta do momento em que a população decide abrigar-se e entrar para o metro.

No campo do design da narrativa, é muito interessante verificar como sendo um FPS não se limita a um conjunto de cutscenes intervaladas por várias sessões de túneis de tiros. Desde o início que é a interactividade com os personagens de IA que gera a componente central da narrativa, sendo que todo o design da mesma se vai suportar num conjunto de companheiros IA que nos vão acompanhar ao longo das várias missões. O facto de se ir trocando de companheiro parece estranho ao início, mas rapidamente se entranha, compreende e até deseja. Cada um desses companheiros encarrega-se de nos situar na narrativa, tornando o storytelling muito mais ágil e próximo, é claro que para isso contribui uma noção muito clara do ritmo do storytelling necessário à compreensão da história. Os personagens companheiros são sempre suficientemente desenhados para nos permitir criar algum tipo de ligação com os mesmos, o que contribui imenso para o engajamento e interesse no jogo. O facto de se tratar de uma história com diversidade temática - terror, política e drama - permite abrir a experiência e torná-la mais estimulante. No final, e por conta da interacção com os personagens e os seus diferentes interesses, acabamos conhecendo muito melhor o nosso personagem, Artyom, e preocupamo-nos verdadeiramente com ele.

*** SPOILER***
Em termos de interactividade narrativa, existe um sistema de moral embebido, que nunca é revelado ao jogador, mas que quantifica o tipo de acções boas e más que este vai realizando ao longo do jogo. Existem alguns momentos chave em que podemos perceber que o que acabámos de fazer pode ter consequências à frente, já que os diálogos assim o indicam, mas nunca nos é dada a oportunidade de "jogar" com esse sistema. O sistema acaba por ser crucial no tipo de final que nos é servido, e assim dependente do tipo de acções que tenhamos realizado, no final podemos morrer, ou ser salvos pela família do Dark One. Se quiserem voltar a jogar, podem ver a lista de pontos morais na wiki do jogo, ou ver os diferentes finais. Do que me foi dado a perceber do jogo, existem dois momentos cruciais em que podemos perdoar e deixar viver, ou simplesmente matar os criminosos, e são esses que definem no final se o pequeno Dark One volta para nos salvar ou não.
*** END***

O design do jogo em si, não é menos interessante que a própria narrativa, já que é ele o responsável por condicionar assim como intensificar as atmosferas e o storytelling. Enquanto estamos no mundo subterrâneo do metro podemos circular à vontade, sem preocupações de maior, mas quando temos de ir para o exterior ou zonas corrompidas pela radioatividade temos de usar máscaras que se suportam em filtros com tempo limitado de vida. Este pequeno detalhe contribui para o desenho de uma jogabilidade que vai muito para além dos meros tiros, e da gestão das armas e balas, porque é um elemento narrativo profundamente ligado a toda a atmosfera do jogo. O sufoco que podemos sentir com o fim de um filtro, é uma metáfora do sufoco que se vive num mundo pós-apocalípico em que a única área habitável são os subterrâneos do metro. A duração dos filtros condicionam todo o modo como escolhemos realizar as nossas acções, já que nem sempre podemos optar por stealthing quando próximos das criaturas mais temerosas, pois o tempo que temos pode tornar-se curto em função dos filtros que apanhámos antes.

O design é também muito enriquecido pelo facto de os nossos inimigos não se limitarem a monstros criados pela radiatividade, mas antes diferenciarem-se entre os anormais radioativos e os supostamente normais mas ferozes, e mais interessante ainda, os inimigos, por motivo das facções políticas, serem por vezes também próprios humanos. Isso contribui para uma experiência de shooting que ganha dimensão narrativa, em vez de se limitar a um mero conjunto de elementos a abater.

A variação atmosférica, narrativa e do design muito bem executada em termos de organização e ritmo, cria um videojogo completo e imensamente compensador para o jogador, criando a motivação necessária à progressão no sentido do objectivo final proposto ao nosso soldado. Interessante ainda, saber que “MLL” é um jogo totalmente desenvolvido na Ucrânia, criado pelo estúdio 4A Games, fundado por elementos da extinta GSC Game World, responsável pelo aclamado "S.T.A.L.K.E.R.: Shadow of Chernobyl" (2007).

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