outubro 17, 2021

Abelardo e Heloísa

Pedro Abelardo foi um filósofo francês que ficou conhecido pela tragédia proporcionada a partir do seu romance com a erudita Heloísa de Argenteuil. O seu legado é maior, teve grande impacto na filosofia e teologia da época medieval e influenciou o ensino tendo tido influência no surgimento da própria Universidade enquanto instituição. Ousado e muito à frente do seu tempo, muito deve, segundo ele, ao castigo que lhe foi infligido. O tio de Heloísa, após descobrir o casamento em segredo de ambos, mandou castrá-lo. Como legado pessoal, ficaram as cartas que escreveram um ao outro, numa época posterior e que podemos ler nesta obra. O texto das mesmas é bastante direto, expondo de forma clara o impacto dos acontecimentos sobre a pessoa de cada um deles.

Catalisadores de mudança comportamental

"The Catalyst: How to Change Anyone's Mind" (2020) é o segundo livro de Jonah Berger que leio, longe de ser tão bom como o primeiro — “Contagious: Why Things Catch On” (análise VI) — não deixa de ser imensamente interessante. O livro é pequeno e apresenta um modelo de intervenção persuasiva, por meio do acrónimo REDUCE que resume 5 princípios — "Reactance - Endowment - Distance - Uncertainty - Corroborating Evidence "— que são discutidos, um por capítulo, e suportados com exemplos relevantes, ainda que por vezes acabem roçando o anedótico.

outubro 16, 2021

A vida de Thomas Mann (2021)

"The Magician", publicado no passado dia 7 de setembro, não foi o livro que esperava ler sobre Thomas Mann. A meio senti mesmo uma enorme desilusão, senti falta do que tinha imaginado que este livro seria. Tinha criado expectativas muito concretas. Mas Colm Tóibín surpreendeu-me. A partir desse meio, por via de toda a construção até ali, comecei a sentir cada vez mais Mann e o seu mundo. Continuo a sentir falta daquilo que eram as minhas expectativas, mas tenho de conceder que Tóibín criou uma obra admirável. Mann foi uma pessoa que viveu intensamente, mas interiormente, a ponto de nem a si mesmo (nos seus diários) se revelar. Alguém que passou pela vida, procurando sempre não perturbar nada nem ninguém, porque muito determinado em seguir o seu próprio caminho. Esta forma de estar levanta muitas objeções morais, mais ainda quando passou pela vida, mesmo nos momentos mais terríveis da guerra, com grande conforto. Mas o retrato oferecido por Tóibín é feito sem julgamentos nem endeusamentos, e talvez por isso mesmo, capaz de nos aproximar do que terá sido conviver com Mann.

outubro 09, 2021

O Mapa do Conhecimento

Adorei a viagem proporcionada pelo livro "The Map of Knowledge" de Violet Moller. A obra pode não ser perfeita, podem existir problemas e erros, mas tendo em conta o que se pretendia, uma visão geral sobre a travessia do conhecimento durante a Idade Média, e não uma discussão sobre a veracidade histórica ou importância dos conceitos e teorias, a obra é muito conseguida. A sua leitura oferece-nos um enquadramento do registo e movimento do conhecimento ao longo de mais de 1000 anos, ajudando a compreender melhor certos lugares, os seus rituais e os seus personagens. Para além disso, no final, emerge algo ainda mais importante, o modo particular como se cria ciência, as suas necessidades e condições para o florescimento.

outubro 05, 2021

"Mil Cérebros" (2021), sem Emoção

"A Thousand Brains: A New Theory of Intelligence" (2021), tinha tudo para ser um grande livro, acaba por ser mera montra de ideias, e algumas delas com sérias deficiências. Apesar disso, a teorização proposta por Jeff Hawkins é interessantíssima, só requer que se leia com uma boa bagagem sobre o cérebro, consciência e emoção por forma a garantir suficientes competências ao pensamento crítico necessário à leitura. Aliás, essa mesma bagagem acaba por se revelar em falta em Hawkins o que responde por alguns dos problemas da sua discussão. Hawkins é uma pessoa peculiar, foi capaz de fundar a Palm em 1992 e criar o antecessor do smartphone, mas ao mesmo tempo nunca conseguiu integrar-se na academia, justificando que esta nunca foi capaz de compreender a sua visão. Mais recentemente fundou a sua própria empresa de neurociências e IA, a Numenta.

outubro 02, 2021

A Emoção que justifica a Leitura

"The Emotional Craft of Fiction” (2016) de Donald Maas é um livro curto, mas que procura ser incisivo, conseguindo-o na medida do que é possível quando falamos de arte, no caso literatura. Ou seja, Maas olha para o trabalho do escritor, para as suas ferramentas, e para o modo como as obras chegam aos leitores, em termos emocionais, e procura traçar um conjunto de ideias, princípios, que ajudem quem se interessa pela criação de emoção estética. Diria que o central do livro é desvelado no primeiro terço, ficando o restante demasiado colado a exemplos que se vão tornando de algum modo repetitivos. Dito isto, é um livro pelo qual vale a pena passar os olhos.

setembro 26, 2021

Incas e Europeus: para que servem as histórias alternativas?

"Civilizations" é um excelente sucessor de "A Sétima Função da Linguagem" (2015) (análise VI), deixando para trás as teorias da comunicação para se focar na história da descoberta do Novo Mundo, só que agora o Novo Mundo já não é a América, mas a Europa. "Civilizations" usa um artifício inicial para garantir imunidade adquirida às populações das Américas aquando da chegada dos espanhóis, a partir do que se desenvolve todo um volte-face. Assim, em vez de termos Pizarro a dominar Atahualpa, como muito bem nos conta Jared Diamond, em "Guns, Germs, and Steel" (1997) (análise VI), temos Atahualpa a dominar Carlos V, o grande Imperador Romano-Germânico. 

Representação do Deus Sol Inca

setembro 19, 2021

Cortázar, o hipertexto e Joyce

Rayuela” (1963) (em Portugal “O Jogo do Mundo”) é reconhecido como uma das maiores obras da literatura da América latina. É reconhecido pelo pioneirismo do uso da não-linearidade hipertextual (ligações que permitem saltar páginas e capítulos). O seu autor, Julio Cortázar, foi imortalizado graças a este livro. Contudo, a minha experiência ficou bastante aquém, diga-se que muito provavelmente por defeito de profissão — trabalho, há mais de 20 anos, o design de narrativas hipertextuais. Esperava mais. Esperava ver uma obra que por ser criada por uma mente literária, rasgasse todos os preceitos da literatura e principalmente da linearidade narrativa. Acaba por não o fazer, em nenhuma das frentes. Com um registo demasiado colado a Joyce, oferece muito pouco à literatura. A forma sustenta o nosso interesse pela novidade estrutural, mas desvendado o padrão seguido tudo começa a cair.

A Torre de Montaigne

Enquanto leio "Civilizations" (2019) de Laurent Binet dou por mim atirado para um castelo que possui uma torre, na qual se encontra uma biblioteca com traves munidas de inscrições em latim e grego. Acreditando ser a biblioteca de Montaigne (1533 — 1592) fui procurar informação na rede e acabei recolhendo um conjunto de imagens que aqui deixo. Pode ser que um dia, quando volte a passar por Bordéus, ainda consiga fazer um desvio e vá visitar tão iluminada torre.