"The Emotional Craft of Fiction” (2016) de Donald Maas é um livro curto, mas que procura ser incisivo, conseguindo-o na medida do que é possível quando falamos de arte, no caso literatura. Ou seja, Maas olha para o trabalho do escritor, para as suas ferramentas, e para o modo como as obras chegam aos leitores, em termos emocionais, e procura traçar um conjunto de ideias, princípios, que ajudem quem se interessa pela criação de emoção estética. Diria que o central do livro é desvelado no primeiro terço, ficando o restante demasiado colado a exemplos que se vão tornando de algum modo repetitivos. Dito isto, é um livro pelo qual vale a pena passar os olhos.
Existem dois pontos no livro que marcaram a minha leitura, o fundamento da emoção escrita, e os três modos de espelhar a emoção na escrita, que passo a ilustrar.
A Emoção é do Leitor
A principal ideia que Maas tenta construir no arranque do livro é que os criadores devem centrar os seus esforços em fazer com que os seus leitores sintam algo sobre si próprios e não sobre a história ou os personagens. Parece estranho, desde logo porque lemos literatura, romances, com a ideia de conhecer outras “pessoas”, outros mundos e realidades. Vamos atrás de perceber como se sentem as pessoas quando passam por eventos difíceis, com a ideia de que podemos aprender com o conhecimento dessas situações e reações. Contudo, quando Maas nos obriga a pensar no que realmente estamos a fazer quando lemos, estamos a emocionar-nos, mas essencialmente com aquilo que a nossa experiência do mundo nos permite simular do que estamos a ler. As vidas e emoções ali apresentadas são apenas estímulos que ativam as nossas conceções do mundo e consequentemente as nossas próprias emoções.
“What all that means is that readers fundamentally want to feel something, not about your story, but about themselves. They want to play. They want to anticipate, guess, think, and judge. They want to finish a story and feel competent. They want to feel like they’ve been through something. They want to connect with your characters and live their fictional experience, or believe that they have.”
No fundo, lemos para sentir aquilo que nos conseguem fazer sentir. Sim queremos saber mais, descobrir, mas queremos emocionar-nos com essas descobertas. Queremos que aquilo que nos contam seja novo, desconhecido, nos surpreenda, nos faça ver o mundo para além daquilo que já conhecíamos, e por isso sintamos o deslumbre emocional que nos afeta e dá prazer. Porque é aí que sentimos mudança dentro de nós mesmos, e a emoção só acontece com mudança de estados. Ou seja, a emoção não tem de estar na história, a história só tem de a provocar no leitor. A história pode apenas contextualizar, dar conta de algo, mas abster-se totalmente de qualquer julgamento, emocional ou moral, deixando tudo isso do lado do leitor. Para o efeito, Maas define três formas de o fazer.
1 – Modo Interior: o Contar
Aqui temos em essência, "relatos de personagens que estão a sentir tão efetivamente que os leitores acabam também por sentir" com eles. Mas não bastam descrições poéticas:
“Here’s an example: ‘His guts twisted in fear’. When you read that, do your own guts twist in fear? Probably not. Or this: ‘Her eyes shot daggers at him’. Do you feel simmering rage? Meh. Not so much. Such feelings fail to excite us because, of course, we’ve read them too many times. (…)
What gets readers going are feelings that are fresh and unexpected. (…)
Skillful authors play against expected feelings. They go down several emotional layers in order to bring up emotions that will catch readers by surprise (…)
There are many ways of looking at and feeling about what’s happening at any given moment. Stop your story at any point, ask the point-of-view character what she is feeling, and it’s never just one answer. Ask two characters what they feel about what’s happening and neither will ever say the same thing.”
2- Modo exterior: o Mostrar
Aqui a ideia não é apenas dar conta de ação, mas "provocar nos leitores o que as personagens podem estar a sentir, implicando o seu estado interior através das suas ações externas". Ou seja,
“Showing isn’t necessarily limited to external action or dialogue, or that which we can see or hear. Situations and conditions such as a state of being can be presented without emotions and, despite that, cause us to feel quite a bit.”
Maas cita Hemingway, dizendo:
“Find what gave you the emotion; what the action was that gave you the excitement. Then write it down making it clear so the reader will see it too and have the same feeling as you had.”
3- Modo Outro: diálogo entre o leitor e escritor
Aqui entramos num subtexto do que está escrita, procurando desse modo “fazer com que os leitores sintam algo que os próprios personagens da história não sentem".
“Creating that type of experience for readers requires more than just walking them through the plot. Feeling can be induced by plot developments, but only to a limited extent. Plot per se intrigues, excites, and surprises us, or so we hope, but not much more than that. As we’ve seen, characters’ emotional states also, by themselves, are limited in their impact.
The emotional wallop of a story is created by its totality. Readers experience that wallop when they must not just form an opinion about a story, but when they must study, question, and form an opinion about themselves. Simply put, they want to—they must—take an emotional journey.”
Para este efeito Maas cita nada menos do que a teoria da autodeterminação, ou seja daquilo que motiva o ser humano. Com a “Competência” a surgir como os desafios apresentados pela história que os leitores têm de resolver. Com a autonomia a ser oferecida na forma de múltiplas leituras possíveis de um acontecimento, em que o autor se abstém de condicionar o pensamento do leitor, e o deixa livre para escolher o que pensar. E por fim a relação que emerge pela proximidade com a ação e sentir dos personagens.
Naturalmente, os extratos apresentados acima parecem meras ideias soltas, mas isso acontece pela falta dos bons exemplos que Maas vai utilizando para ilustrar as abstrações.
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