António Damásio
Assim Damásio começa por definir a consciência, como aquilo que nós perdemos quando entramos num sono profundo sem sonhos, ou quando estamos sob o efeito de anestesia, e que recuperamos quando saimos desses estados. Isto que recuperamos, Damásio divide em dois elementos
- a Mente, um fluxo de imagens mentais
- o Eu, percepção das imagens mentais
E diz-nos, que a consciência, é a Mente com um Eu dentro. Ou seja, o Eu introduz na mente, nas imagens mentais, uma perspectiva subjectiva. Assim nós só estamos completamente conscientes quando o Eu, volta à Mente. O Eu é o responsável por nos manter enquanto pessoa, reconhecível por nós e pelos outros. É o garante do fluxo contínuo das nossas acções, de que nos recordamos do que fomos ontem, do que somos hoje, e do que queremos ser amanhã.
A Soul in Heaven (1878) de William Bouguereau
A grande questão aqui, é como é que se constrói este Eu? E isso é o que milhares de anos a matutar nos levou a pensar que poderia ser algo imaterial externo, perdurável para lá do corpo, uma alma. Mas se ouvirmos Damásio explicar como é que as imagens mentais se interligam para criar a Mente, começamos a suspeitar que a resposta da alma, pouco tem que ver com isto. Assim aqui fica o modo como Damásio vê o Eu a construir-se,
"Nós geramos mapas cerebrais do interior do corpo, e utilizamos esses mapas como referência para todos os outros mapas (mente)"Simples. É verdade, funciona como uma Grande Estrutura distribuída pelos neurónios do nosso cérebro, e que foram e vão sendo criadas a partir das respostas do nosso corpo como um todo. E porque é que isto faz mais sentido que uma Alma? Na minha opinião porque simplesmente, quando uma qualquer zona do nosso cérebro é afetada, perdemos o controlo das partes do corpo que estavam anteriormente sob o controlo daquelas zonas do cérebro, podendo todo o resto do corpo continuar a funcionar. É da mais elementar lógica.
Mas podemos questionar ainda, então como se explica que alguém possa ficar totalmente inanimado fisicamente, e ainda assim a sua consciência continuar a funcionar. E é isto que Damásio explica como sendo uma pequena zona em concreto localizada no Tronco Encefálico, entre o cérebro e a medula, a que ele chama de Regulador das informações que vêm do corpo, e que vêm do cérebro. Se o fluxo que vem do cérebro para a zona de regulação for cortado (ex. AVC), entramos em coma. Ou seja deixamos de ter acesso ao fluxo do Eu, às imagens mentais. As imagens mantém-se lá, mas não conseguindo aceder-lhes, perdemos a consciência, deixamos de nos sentir, de saber que existimos.
Se o fluxo que vem de baixo for cortado (ex. queda com entorse na zona do pescoço), perdemos o acesso à informação que vem do corpo, mas o Eu continua a funcionar, criando a sensação de "preso dentro do próprio corpo". Damásio cita o magnífico filme de Julian Schnabel, Le Scaphandre et le Papillon (2007).
Le Scaphandre et le Papillon (2007) de Julian Schnabel
Para fechar Damásio fala sobre os níveis da Consciência, e os níveis que partilhamos com os outros animais, deixando como exclusivo nosso apenas a capacidade do Eu se Autobiografar. E é desta capacidade de autobiografia que surge a imaginação, a memória de longo prazo, a razão, a criatividade, assim como tudo aquilo a que chamamos de cultura, desembocando num processo que podemos definir de Regulação Sociocultural. Este processo aqui definido por Damásio, abre portas a toda uma outra discussão, que anda em volta das questões que definem as acções humanas na produção de cultura, e que se tem definido por uma batalha entre o campo que defende a biologia como origem de tudo, e os que defendem o social como o criador das acções humanas. Mas como disse, é toda uma outra discussão. Vejam a Talk e interroguem-se vocês mesmo.
Ted Talk de Antonio Damasio, The quest to understand consciousness (2011)