"Eu, Cláudio" é de 1934, por isso se tiverem interesse em começar a ler sobre Roma Antiga e os seus Imperadores, podem começar por aqui. Na verdade, muito do que aqui está encontra-se espalhado por uma míriade de objetos culturais que criaram o imaginário do século XX sobre aquela época — desde as quezílias familiares aos assassinatos de imperadores, passando pela total insanidade de Calígula. Tendo lido muitas outras obras antes, soube-me a pouco, e por isso recomendo ainda mais que comecem por aqui. Ainda que se sinta alguma superficialidade, vale a pena a leitura pela acessibilidade da visão geral daqueles tempos, mesmo que o tom esteja demasiado impregnado pelo século XX. Por outro lado, enquanto romance deixa a desejar, já que investe muito mais na descrição do que na narração ou dramatização. Se quiserem algo mais imersivo, aconselho antes “Augustus” (1972) de John Williams, e para algo mais psicológico, "Memórias de Adriano" (1951). Mas se quiserem mergulhar diretamente na mente de um imperador então nada melhor do que ler "Meditações" (180) de Marcus Aurelius.
O registo de Robert Graves não me impressionou, ainda que talvez na altura em que saiu, na ausência das imensas obras, desde então, criadas para re-imaginar Roma Antiga, o impacto tenha sido distinto. Graves usa um registo profundamente descritivo, escusando-se na ideia de Claudius ser um historiador, e por isso olhar para a realidade de forma neutra, ausente de emoção. Mas na verdade o que leio é um relato que não consegue harmonizar muito bem o lado histórico, analítico, com o lado dramático, emotivo. Mais uma vez, não existem muias obras a precederem esta no que toca a romance histórico, e talvez por isso tenhamos de dar o benefício por ser um trabalho pioneiro, sendo ainda hoje admirado por isso.
No entanto, em pleno século XXI o registo soa profundamente ultrapassado, a ponto de a sua dramatização conseguir ficar atrás daquela que hoje nos oferecem os livros de divulgação histórica, como acontece com “SPQR: A History of Ancient Rome” (2015) de Mary Beard. É verdade que Graves cria diálogos com os personagens reais daquela época, imaginando o que terão dito, como e quando. Mas sente-se uma contenção, que diga-se é bem justificada pela escolha de Claudius, mas que acaba sabendo a pouco. Um dos pontos que mais me chocou, foi o momento em que Claudis relata um conjunto de incidentes, entre os quais o do assassinato do filho Drusus, que é despachado num único parágrafo, sem qualquer reparo sobre o que sentiu Claudius. Aceitando que é de história que se trata, é Claudius quem fala!
Mas não só, existe algo que também me desgostou, no domínio do design da personagem de Claudius, que do tempo de Augustus e Tibério para o tempo de Calígula muda totalmente. Mesmo percebendo a insanidade toda de Calígula, Graves falha em mostrar como Claudius passa de alguém que se respeita a si mesmo, para alguém que se rebaixa a tudo sem ousar qualquer questionamento. Surge tudo com uma linearidade avassaladoramente indiferente, como se não fosse de humanos que Graves falasse, mas antes de meros personagens de papel.
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