O protagonista, Bird de quase 30 anos, descobre que o seu filho, acabado de nascer, apresenta uma hérnia cerebral, o que representa baixas expectativas de sobrevivência sem uma operação que pode ditar o resto da vida num estado vegetal. A reação é visceral, mas colada às banalidades da vida quotidiana. Bird não se fecha na introspeção para puxar do seu existencialismo, não produz qualquer grito mudo ou pensa em qualquer haraquíri, antes desata em busca de interação com a realidade, repescando antigos colegas, não para deles sorver ânimo, mas para poder por meio da interação com eles fugir do problema.
O texto que ao terminar-se deixa um trago agridoce, pode, se assim o desejarmos, levar-nos a questionar os fundamentos da moral civilizacional. Se por um lado compreendemos a reação negativa do protagonista ao que o espera, não deixa de nos impactar a sua recusa do seu próprio filho, algo que Oe não deixa por mão alheia já que oferece todo um contorno algo negativo do protagonista. Temos muito álcool e sexo à mistura com muita indolência e displicência. Não que Oe pinte um diabo, a linha é mantida sempre coerente, com a honestidade e frontalidade do protagonista a garantir elevação, e por isso mesmo provocando em certos momentos alguma admiração. Li algures, sobre uma potencial proximidade entre este Bird de Oe e Meursault de Camus que aceito, embora e à distância sinta Meursault como alguém mais coerente e elaborado, talvez por neste caso termos uma abordagem cómica que nos impede de compreender o alcance concreto dos pensamentos do personagem, se são sentidos ou meramente sarcásticos.
Nota: A edição lida foi publicada na coleção da revista Sábado, mas existe em Portugal outra edição, pela Livros do Brasil, com outro título: "Não matem o bebé".
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