fevereiro 20, 2012

Inovar na Linguagem dos Videojogos

Na última entrevista dada por David Jaffe (God of War, 2005) a propósito do novo Twisted Metal (2012) fala-nos da Linguagem da Interactividade e acaba por tocar ao longo da entrevista em vários dos assuntos sobre os quais passei anos a estudar, e outros passaram antes de mim. Falo das emoções estimuladas pelos videojogos, e essencialmente das suas capacidades para estimular Tristeza. O assunto da tristeza foi primeiramente apresentado pela equipa da Electronic Arts no lançamento da mesma, em 1982, num anúncio com a questão, "Can a Computer Make you Cry?".

Right now, no one knows. This is partly because many would consider the very idea frivolous. But it's also because whoever successfully answers this question must first have answered several others.
Why do we cry? Why do we laugh, or love, or smile? What are the touchstones of our emotions?
Until now, the people who asked such questions tended not to be the same people who ran software companies. Instead, they were writers, filmmakers, painters, musicians. They were, in the traditional sense, artists.
We're about to change that tradition. The name of our company is Electronic Arts.
No meu doutoramento fui ao ponto de dizer que existe um "paradoxo das emoções interactivas", daí que o meu livro se chame mesmo Emoções Interactivas. A questão é que conseguimos produzir este tipo de emoções, quando utilizamos cutscenes, mas tudo se complica quando não as queremos utilizar.


 Como diz Jaffe,
It's not about using cinematic techniques to express that. It's about using interactive language to express that.
Contudo apesar de estar de acordo com esta parte do discurso de Jaffe, não concordo com a sua resignação. Bem sei que andamos há décadas nisto, que já se fizeram vários doutoramentos à volta desta questão, e centenas de tentativas falhadas. Mas a questão é mesmo essa, avançar e inovar aonde existe problemas para resolver. E não seguir uma resignação como se pode ver aqui no seu discurso,
But if my only goal is to make people feel emotions and that's what I really want -- I want to make them feel sadness, or I want to make them think about man's place in the universe. Think about that. If you're really a fucking artist. If you're really a fucking artist, and you've got something to say, then you fucking pick the right medium to say it in. But if you're sitting there going, "I want to say this, I want to say this," and games have never indicated, and your game has never indicated, that the medium is capable of saying that that well, then why are you making a fucking game?
E é exatamente nesse sentido que trabalham muitas das mentes brilhantes do movimento indie, tais como Jenova Chen ou o Jason Rohrer entre muitos outros. E se falo destes dois, é porque são exactamente eles que aparecem desta vez a dar a cara num novo documentário, Us and the Game Industry (TBC), sobre a inovação proporcionada pelas equipas indie à Linguagem dos Videojogos. Este novo documentário que está a ser produzido por Stephanie Beth, tem já um trailer que é bastante inspirador.

Us and the Game Industry (TBC)

Us and the Game Industry is a film about the new thinkers at the new frontier of experimental computer game development. We delve into this untapped world of potential to meet the people who are succeeding in reinventing the medium of game design and challenging the established norms with their finely crafted work. This film explores how their motivation, design process, focus and execution are creating unique and new possibilities of connecting people and providing the possibility for uncharted experiences outside the normal realm of commercial games.

fevereiro 18, 2012

O fim da Universidade, ou a simples arrogância tecnológica

Vou deixar aqui algumas ideias sobre o assunto da aprendizagem à distância, de que se fala desde há muito. O e-learning é algo recente, mas o ensino à distância existe desde muito antes disso, fazendo uso de canais como o correio ou a televisão. Impressiona ver como as pessoas passam por cima das experiências do passado e seguem debitando ideias sem parar para pensar realmente naquilo que estão a dizer. Sobre a ideia de ter um professor a leccionar para milhões no planeta inteiro, só posso dizer que é das coisas mais insanas que alguma vez ouvi. Muitas destas ideias, seguem apenas o buzz do momento, e limitam-se a meras conjunturas pensadas sobre o joelho, ou utopias baseadas em ficção-científica.

À L'École, representação da visão da escola para o ano 2000, vista a partir de 1910

Muito se tem falado das aulas do MIT e Yale que já se podem encontrar gratuitamente online, mas foi agora com a recente decisão do MIT de começar a oferecer certificação online gratuita que os discursos se inflamaram. Para alguns, isto é o sinal do fim das Universidades estatais americanas, e de milhares de universidades espalhadas pelo globo. Alguns referem como exemplo para o futuro da escola, as famosas aulas vídeo da Khan Academy, outros referem que os alunos aprendem directamente a partir da Wikipedia e do Facebook. Nomes conceituados das TIC como Bill Gates, afinam pelo mesmo diapasão, afirmando que as Universidades são uma espécie em vias de extinção. Outros escrevem sobre um futuro em que a cultura disponível no mundo online e uma abordagem DIY (Do-it-Yourself) criará as condições para que as Universidades se tornem obsoletas. Tudo isto ideias, que de algum modo parecem assentar no velho mito do self-made man.


Mas mais interessante, é que todos estes discursos são proferidos, não pela sociedade em geral, mas tudo por pessoas oriundas dos sistemas de ensino mais elitistas do planeta. O defensor da auto-formação via Wikipedia/Facebook doutorou-se em Yale, a autora do texto apocalíptico sobre a Universidade pós-elearning tem um MBA da Universidade de Chicago, o fundador da Khan Academy, possui 3 licenciaturas do MIT e um MBA, assim como o atual presidente da Khan Academy possui 4 licenciaturas do MIT. Bill Gates esteve na Universidade de Harvard alguns anos, apesar de não ter terminado a licenciatura, não por não querer, mas por se ter envolvido na criação da Microsoft. A autora do movimento DIY-U é formada em Yale. E isto deve-nos fazer questionar sobre o que seria cada uma destas pessoas, sem estes sistemas de ensino por detrás, teriam chegado todos até aqui?

Salman Khan

As pessoas esquecem que a escola sempre existiu, o que nasceu no século XVIII não foi a escola, mas o modelo de escola moderno que hoje temos. A escola existe desde que iniciámos a caminhada neste planeta enquanto espécie gregária, enquanto espécie social, que depende do grupo para sobreviver. No grupo, os mais velhos sempre tiveram o papel obrigatório e fundamental de ensinar os mais novos, para que estes pudessem evitar perigos conhecidos, através do conhecimento empírico legado pelas gerações anteriores. Com o passar de milénios fomos criando formas de registo externas, sendo as primeiras formas, as próprias ferramentas de pedra e madeira esculpidas há um par de milhões de anos. Mas tivemos de esperar que o nosso sistema de linguagem evoluísse para que ideias mais complexas se criassem, e isso criasse em nós a necessidade de dar corpo material a essas mesmas ideias.

A escola representada em pinturas do antigo Egipto

Assim a linguagem apareceu apenas há cerca de 50 mil anos, e os primeiros registos externos vieram em forma de pintura há 40 mil anos espalhados por algumas cavernas do centro-sul da Europa. A linguagem e a pintura levariam à criação dos primeiros sistemas de partilha de informação codificada, criando assim os primeiros sistemas de escrita há uns meros 4 mil anos atrás. Tudo o que criámos depois disto, são mesclas conceptuais permitidas pela evolução tecnológica e artística. Registos como a fotografia e o vídeo que descendem directamente da pintura, ou os videojogos que descendem directamente da escultura.

Pinturas nas cavernas de Lascaux, datadas de 40 mil anos

Todas estas formas de registo, aliviaram os nossos constrangimentos de memória, libertando a nossa mente para se dedicar mais e mais à inovação. Mas os mais velhos nunca deixaram de ser importantes, na transmissão do conhecimento, porque aquilo que verdadeiramente se transmite de geração em geração não se pode definir num punhado de dados discretos, mas reflecte-se antes num conjunto de experiências que se ramificam e inter-conectam com lugares, pessoas, e momentos no tempo.

Ruínas da Universidade de Nalanda, criada em 400 A.C.

E as Universidades não foram criadas no século XVIII, a primeira Universidade, com 10 mil alunos de que temos registos, data de 400 A.C. na India, a Universidade de Nalanda. A ocidente na Europa, teríamos de esperar até ao início do segundo milénio D.C. para ver nascer a Universidade de Bolonha. Mas o que aconteceu então no século XVIII? Foi criado o modelo industrial de escola. Um modelo estruturado no tempo e com métodos de avaliação e classificação, que requerem muito da componente de memorização, assim como raciocínio humano, mas que acima de tudo ignora o estilo individual de aprendizagem e busca um padrão que sirva a massificação do ensino. E é esta a ideia de escola que criticamos. No entanto depois de tanta discussão em redor deste problema, que parece ter sido compreendido por uma grande parte da sociedade, através do magnífico trabalho de pessoas como Ken Robinson ou Howard Gardner, tudo parece ter sido esquecido.

Universidade de Bolonha, criada em 1088

De repente parece já não ter importância, ter massas de pessoas a aprender de forma igual, e a aprender o mesmo, mas queremos mais do que isso, queremos um sistema universal, que chegue aos milhões de pessoas. Queremos que um único professor debite a sua perspectiva subjectiva, e formate todo o planeta como um só. Dizem-nos que as Universidades vão desaparecer, e vão apenas restar as grandes Universidades, as que possuem uma Marca, capaz de imprimir diplomas importantes!!! Mas?! Alguém se questionou porque é que o canudo do MIT é importante, não será o facto de esta ser altamente exclusiva, que faz dela uma marca de "qualidade"? A regra básica da persuasão social, diz-nos que a raridade dos elementos, torna-os apetecíveis, o seu contrário torna-os desprezíveis. Mas mais do que as regras de marketing, fará sentido recorrer a uma visão única do conhecimento para a resolução de problemas singulares, com particularidades próprias das zonas geográficas aonde se encontram, com as particularidades sociais e culturais das comunidades em questão, e acima de tudo com as especificidades psicológicas, emocionais e motivacionais de cada indivíduo?!

Voltando ao discurso dos senhores da elite universitária, que agora adivinham o fim do sistema. Estes só demonstram que quem usa massivamente as tecnologias para criar e inovar, não são os autodidatas que não foram à universidade, mas são aqueles que frequentaram as universidades. Ou seja para poder usar as tecnologias, construir, criar algo, não é preciso aprender a usar as tecnologias, que cada vez tornamos mais fáceis no seu uso. É preciso antes aprender a pensar, aprender a aprender, aprender a ser autónomo, proactivo, empreendedor, e é preciso construir uma forte bagagem cultural. Tudo isto não se aprende com um simples acesso à web, depende antes de uma interação forte com professores e alunos. O e-learning ajudará, mas de forma alguma conseguirá substituir-se ao ensino presencial, porque o que está em causa é a forte interação humana.

A Telescola portuguesa

Apesar de ser um grande defensor das tecnologias interactivas, dos videojogos na educação, não tenho qualquer dúvida sobre of facto de estes não poderem servir o fim do ensino de modo exclusivo. A Telescola não o fez, e não será agora por termos mais informação e a possibilidade de desenvolver tecnologias interactivas, que isso vai acontecer. A razão principal para eu ver isto deste modo, é só uma, o processo de socialização humano. Mais do que os conteúdos na especificidade, a escola é um dos principais pilares no processo de construção do Eu, desde a Infantil à Universidade. Deste processo que se constrói lentamente ao longo de anos, fazem parte duas questões essenciais ao humano, a mímica e a empatia, que por sua vez se tornam responsáveis pelo desenvolvimento de competências para a construção de novos comportamentos, novas visões, e claro novos horizontes. Voltando à primeira imagem deste texto, aprender não é meramente absorver o que está escrito num livro.

Fold.it, jogo de investigação

Os videojogos são hoje uma forma de representação de tal forma eficiente, ao ponto da investigação científica os ter começado a utilizar como ferramenta de observação e experimentação. Este é o assunto do meu texto desta semana para a Eurogamer, e sobre o qual resolvi deixar aqui mais alguns apontamentos a propósito de um jogo em particular.


No campo da investigação científica em biologia, foi criado o jogo Fold.it (2008), no qual os jogadores são convidados, fazendo uso de mecânicas de puzzles gráficos tridimensionais, a dobrar e a torcer modelos de estruturas de proteínas, no sentido de encontrar a melhor configuração tridimensional possível tendo em conta os requisitos. Estes modelos são por sua vez enviados para uma base de dados online que vai catalogando cada um dos modelos enviados.


A importância das acções dos jogadores tem sido de tal modo importante nos avanços da investigação deste grupo, que num dos artigos publicados pelo grupo na revista Nature em 2010, foram mencionados os jogadores como parte da equipa responsável pelos resultados de investigação. No entanto seria 2011 a ficar marcado por Fold.it, com a publicação de resultados conseguidos por um grupo de jogadores que conseguiram criar modelos que viriam a ajudar os investigadores a avançar no decifrar das estruturas causadoras do vírus da Sida nos macacos.





UPDATE 19 Fevereiro 2012

Como forma de complemento a este texto, e ao publicado na Eurogamer, fica aqui a minha mais recente descoberta. A NASA também resolveu passar a utilizar a linguagem dos videojogos para comunicar com as audiências. Por um lado existe aqui uma estratégia de promoção, mas é mais do que isso, são jogos que têm como objectivo assumido, o aumento da literacia em STEM ("Science, Technology, Engineering, and Mathematics").

fevereiro 12, 2012

Amazing Stories, no domínio público

Amazing Stories foi a primeira revista de sempre integralmente dedicada ao género da Ficção Científica (FC). Tendo entrado no domínio público pode agora ser disponibilizada de modo gratuito, e é o que começou a fazer o Projecto The Pulp Magazines. Os primeiros seis números (de Abril 1926 a Setembro 1926) já podem ser lidos aí na íntegra.

Amazing Stories, nº 1, Abril 1926

A revista foi criada em 1926 por Hugo Gernsback e seria responsável por publicar os primeiros textos de três dos maiores autores de FC de sempre Isaac Asimov, Arthur C. Clarke e Robert A. Heinlein, entre muitos outros. Hugo Gernsback tinha nascido em Bonnevoie, um bairro da capital do Luxemburgo, aonde por acaso eu próprio vivi alguns anos, e mudou-se para os EUA em 1905. Em 1908 criou a revista Modern Electrics que viria a servir de base para o lançamento da Amazing Stories.

A primeira história de H.G Wells publicada na Amazing Stories nº1

A importância da Amazing Stories e Hugo Gernsback na criação do movimento da FC é enorme. No final do século XIX apareciam os primeiros contos de autores como H.G. Wells, Jules Verne ou Edgar Allan Poe que eram publicados de forma avulso em várias revistas de ficção literária. Foi preciso esperar por 1926 para que alguém acreditasse na existência de um movimento, e criasse uma revista inteiramente dedicada, fomentando assim o aparecimento de mais e mais textos na área.

O primeiro editorial e a definição de Scientifiction, que viria tornar-se em Science Fiction

A verdade é que o próprio nome Ficção Científica viria a ser cunhado por Hugo Gernsback, embora este preferisse chamar-lhe "scientifiction". E daí que não se estranhe que o maior prémio na área da FC, reconhecido internacionalmente, dê pelo nome de Prémios Hugo, em sua homenagem.

A consciência de Damásio, o Eu ou a Alma

Damásio na sua TED Talk, The Quest to Understand Consciousness, falou sobre o seu assunto de sempre, a criação da consciência. Tem trabalhado desde sempre sobre esta, numa tentativa de tentar perceber como se cria, como emerge a consciência. Nesta talk vai sem dúvida mais longe no desvendar desse mistério, derrubando cada vez mais os misticismos criados por milénios e milénios de filosofia e teologia. Este é um assunto complexo mas que a neurociência vem trabalhando em pequenos passos, ajudando a simplificar. Ainda não há muito tempo tinha falado aqui sobre a germinação da consciência a propósito do livro Musicophilia (2007) de Oliver Sacks.

António Damásio

Assim Damásio começa por definir a consciência, como aquilo que nós perdemos quando entramos num sono profundo sem sonhos, ou quando estamos sob o efeito de anestesia, e que recuperamos quando saimos desses estados. Isto que recuperamos, Damásio divide em dois elementos
  1. a Mente, um fluxo de imagens mentais
  2. o Eu, percepção das imagens mentais

Visualização tridimensional dos fluxos de informação no cérebro

E diz-nos, que a consciência, é a Mente com um Eu dentro. Ou seja, o Eu introduz na mente, nas imagens mentais, uma perspectiva subjectiva. Assim nós só estamos completamente conscientes quando o Eu, volta à Mente. O Eu é o responsável por nos manter enquanto pessoa, reconhecível por nós e pelos outros. É o garante do fluxo contínuo das nossas acções, de que nos recordamos do que fomos ontem, do que somos hoje, e do que queremos ser amanhã.

A Soul in Heaven (1878) de William Bouguereau

A grande questão aqui, é como é que se constrói este Eu? E isso é o que milhares de anos a matutar nos levou a pensar que poderia ser algo imaterial externo, perdurável para lá do corpo, uma alma. Mas se ouvirmos Damásio explicar como é que as imagens mentais se interligam para criar a Mente, começamos a suspeitar que a resposta da alma, pouco tem que ver com isto. Assim aqui fica o modo como Damásio vê o Eu a construir-se,
"Nós geramos mapas cerebrais do interior do corpo, e utilizamos esses mapas como referência para todos os outros mapas (mente)" 
Simples. É verdade, funciona como uma Grande Estrutura distribuída pelos neurónios do nosso cérebro, e que foram e vão sendo criadas a partir das respostas do nosso corpo como um todo.  E porque é que isto faz mais sentido que uma Alma? Na minha opinião porque simplesmente, quando uma qualquer zona do nosso cérebro é afetada, perdemos o controlo das partes do corpo que estavam anteriormente sob o controlo daquelas zonas do cérebro, podendo todo o resto do corpo continuar a funcionar. É da mais elementar lógica.

Mas podemos questionar ainda, então como se explica que alguém possa ficar totalmente inanimado fisicamente, e ainda assim a sua consciência continuar a funcionar. E é isto que Damásio explica como sendo uma pequena zona em concreto localizada no Tronco Encefálico, entre o cérebro e a medula, a que ele chama de Regulador das informações que vêm do corpo, e que vêm do cérebro.  Se o fluxo que vem do cérebro para a zona de regulação for cortado (ex. AVC), entramos em coma. Ou seja deixamos de ter acesso ao fluxo do Eu, às imagens mentais. As imagens mantém-se lá, mas não conseguindo aceder-lhes, perdemos a consciência, deixamos de nos sentir, de saber que existimos.

Ponto Regulador da informação proveniente do cérebro e do corpo

Se o fluxo que vem de baixo for cortado (ex. queda com entorse na zona do pescoço), perdemos o acesso à informação que vem do corpo, mas o Eu continua a funcionar, criando a sensação de "preso dentro do próprio corpo". Damásio cita o magnífico filme de Julian Schnabel, Le Scaphandre et le Papillon (2007).

Le Scaphandre et le Papillon (2007) de Julian Schnabel

Para fechar Damásio fala sobre os níveis da Consciência, e os níveis que partilhamos com os outros animais, deixando como exclusivo nosso apenas a capacidade do Eu se Autobiografar. E é desta capacidade de autobiografia que surge a imaginação, a memória de longo prazo, a razão, a criatividade, assim como tudo aquilo a que chamamos de cultura, desembocando num processo que podemos definir de Regulação Sociocultural. Este processo aqui definido por Damásio, abre portas a toda uma outra discussão, que anda em volta das questões que definem as acções humanas na produção de cultura, e que se tem definido por uma batalha entre o campo que defende a biologia como origem de tudo, e os que defendem o social como o criador das acções humanas. Mas como disse, é toda uma outra discussão. Vejam a Talk e interroguem-se vocês mesmo.

Ted Talk de Antonio Damasio, The quest to understand consciousness (2011)

fevereiro 10, 2012

Movimento de: Gogh, Munch e Picasso

Continua a ser fascinante a ideia de pegar numa tela, famosa ou não, e dar-lhe vida, transforma-la num filme, contar uma história. Partir do momento, capturado na tinta, estender a dimensão do tempo em busca de respostas, de algo mais que nos explique a razão de tanta atracção.


Existem vários trabalhos, um dos mais interessantes, acaba de ser publicado online, por Petros Vellis, criado a partir de The Starry Night (1889) de Van Gogh. Impressionante acima de tudo pela forma como conseguiu criar movimento mantendo a estética inequívoca de Van Gogh. Mas Vellis foi mais longe, não se limitou ao vídeo, e deu-lhe interactividade, com recurso ao Openframeworks, permite que "toquemos" na tinta e a coloquemos em movimento, uma verdadeira obra-prima.




Entretanto no mês passado, tinha surgido uma animação de The Scream (1893) de Edvard Munch. Bem menos profundo que o trabalho de Vellis, mas assumidamente muito mais narrativo. Sebastian Coso vai mesmo buscar uma passagem dos escritos de Munch para suportar a ideia da sua animação sobre quadro,
I was walking along a path with two friends – the sun was setting – suddenly the sky turned blood red – I paused, feeling exhausted, and leaned on the fence – there was blood and tongues of fire above the blue-black fjord and the city – my friends walked on, and I stood there trembling with anxiety – and I sensed an infinite scream passing through nature.” Edvard Munch, 1893



E para fechar vou repescar um trabalho bastante mais antigo, A 3D Exploration of Picasso's Guernica, mas que continua a ser uma referência neste campo, em que declaradamente entramos para dentro do quadro e nele passeamos. É um projecto que Lena Gieseke apresentou para conclusão do seu Mestrado em Animação 3d na Universidade da Georgia, EUA em 2007. Neste estudo podemos discernir elementos do quadro de novas perspectivas, ganhando toda uma nova visão sobre o trabalho de Picasso.

a internet (blogs) a fazer História, 3d

Ainda aqui há algum tempo publiquei aqui um artigo que falava sobre o modo como a História do cinema tem vindo a ser rescrita graças à Internet, e muito graças à Wikipedia.


Entretanto o que agora encontrei é verdadeiramente fascinante, se por um lado a internet tornou possível que o mundo visse pela primeira vez um trecho de filme, filmado em 1972, há 40 anos atrás, o que me surpreendeu ainda mais, foi ler num blog os relatos em primeira mão, dos filhos e sobrinhos dos criadores desse filme.


Não estamos a falar de um filme qualquer, mas sim de um trecho de filme que reporta as primeiras experiências científicas de geração de imagens tridimensionais por computador na Universidade de Utah nos EUA. Neste filme podemos ver as primeiras experiências realizadas por nomes de culto da computação gráfica como Ed Catmull e Fred Parke. Nomes que eles próprios serviram para identificar algoritmos de rendering, e de shading.


O filme foi descoberto por Robby Ingebretsen, filho de Robert B. Ingebretsen o senhor que modelou os títulos iniciais e finais do filme. Este resolveu digitalizar o filme e colocá-lo online no seu próprio blog, depois de autorizado pelo Ed Catmull. As primeiras reacções ao filme não se fizeram esperar, e muitos foram os que apontaram o dedo e disseram que era falso, que não passava de mais um hoax da internet. E é aqui que o blog, mas mais ainda as caixas de comentário a esse post, ganham toda uma nova dimensão histórica.


Ver o filme e depois seguir os comentários no blog, é algo de maravilhoso em termos históricos. Quando comecei a ler os relatos das pessoas a dizer que eram filhos do Ivan Sutherland e Dave Evans, ou o próprio Fred Parke a escrever ali em discurso directo, senti uma espécie de calafrio, como se estivesse a tomar contacto directo com história viva.

Deixo aqui o filme de 6 minutos, que vale todos os segundos, a ver e a rever, e depois leiam a discussão nos comentários do blog.


fevereiro 07, 2012

Jogos da UA em HTML5

O Carlos Santos teve a amabilidade de me enviar alguns jogos realizados pelos seus alunos da licenciatura em Novas Tecnologias da Comunicação da Universidade de Aveiro deste primeiro semestre. Fiquei muito agradado com o que vi, nomeadamente por se tratarem de jogos criados em HTML5.

Bitzz (Tiago Almeida)

Nós na UM optámos este ano por ainda manter o Actionscript 2.0 e 3.0, mas não é um assunto trivial, de todo. Existem muitas alterações a decorrer no mercado da web gráfica dinâmica. O Flash perdeu muita da apetência por causa do iPhone, ainda assim na UM considerámos que o Flash é ainda uma ferramenta importante, nomeadamente ao nível do AS3.0. Consideramos que no domínio dos jogos online ainda vai estar por cá durante mais uns bons anos. Mas sabemos que a um nível mais generalizado, menos focado nos jogos ou narrativas interactivas, o HTML5 está muito rapidamente a ocupar o terreno. Apesar de estranhamente existirem ainda problemas de intercompatibilidade entre browsers, como o próprio Carlos Santos refere. Para além disso falta-nos ainda um editor de HTML5 estável, como temos neste momento para o AS3.0.

Brightness de Ana Sofia Paiva, Alexandre Pereira, António Alves e Júlia Farias

Apesar da Adobe ter lançado o preview do editor deles para HTML5, o Edge, algumas das melhores soluções têm sido desenvolvidas por pequenas equipas. Assim um dos editores de HTML5 mais interessantes do momento, o Melon JS, foi utilizado com bons resultados pela equipa de Brightness.

Mas nem todos os jogos utilizaram editores, alguns foram feitos directamente em código javascript, e desses podem ainda experimentar ainda um nostálgico The ASCII Crusader de João Pina, Marcolino Melo e Rui Raposo, ou o casual Zumix de Fábio Ferreira, João Paulo Fernandes, Marco Nunes e Valério Vaz.

fevereiro 06, 2012

Prémio Zon 2011, ano da Animação

A cerimónia deste ano do Prémio Zon 2011 decorreu no estonteante auditório da Fundação Champalimaud, com uma sala praticamente lotada, com a presença de ministros e comunicação social, o tamanho do prémio em atribuição a isso obrigava. A Zon disponibilizou entretanto um pequeno vídeo desse momento.

Entrega Prémio Zon 2011 no Auditório da Fundação Champalimaud

Se o ano passado tinha sido o da consagração dos videojogos, este ano foi o da consagração da categoria de Animação Digital. Lançada pela primeira vez no Prémio do ano anterior, acabou este ano por arrebatar o Grande Prémio Zon. Aliás o grande prémio, por se tratar de um objecto cinematográfico, veio de certo modo compensar algum desaire criativo surgido na categoria das curtas-metragens, que não teve este ano qualquer premiado.

Grande Prémio Zon 2011 - Ginjas (2011)

Ginjas (2011) de Humberto Santana e Zepe


Na categoria de Animação Digital os premiados foram,

1º Lugar - Ginjas de Humberto Santana (Animanostra) e Zepe

2º Lugar - Depressure de David Mourato

3º Lugar - As Extraordinárias aventuras de Dog Mendonça e Pizza Boy II - Trailer de João Alves

Menção Honrosa - O Cágado de Luis da Matta Almeida

Menção Honrosa - Independência de Espírito de Nuno Beato

Na categoria de Aplicações e Conteúdos Multimédia, o primeiro lugar foi para uma equipa da Universidade do Porto coordenada por Carlos Guedes que nos apresentou um excelente trabalho na área da arte generativa musical. Este ano houve ainda assim espaço para duas menções honrosas na área dos videojogos, StringZ e DTeam.

1º Lugar - GimmeDaBlues de Carlos Guedes et al.

2º Lugar Ex-aequo - Smart Companion de Paula Silva

2º Lugar Ex-aequo - iFlexi.mobi de Edgar Rosa

Menção Honrosa - StringZ de João Lopes

Menção Honrosa - DTEAM de Paulo Gomes