janeiro 09, 2014

Educação e Tecnologia, criação em "multitasking"

Cathy Davidson é directora da HASTAC (Humanities, Arts, Science, Technology Advanced Collaboratory) uma organização que se dedica a pensar o futuro da educação com as TIC. Em 2010 foi eleita para o Conselho do National Endowment for the Humanities dos EUA, e em 2012 recebeu o prémio Educators of the Year do World Technology Network. O seu livro "Now You See It: How the Brain Science of Attention Will Transform the Way We Live, Work, and Learn" (2011) apresenta várias ideias sobre o impacto da internet sobre os processo de multitasking e seus efeitos em contexto de escola que parecem estar na origem do relevo que a autora tem obtido no contexto educativo tecnológico americano.


É assim com alguma surpresa que constatamos que aquilo que nos traz neste seu livro não passa de “wishful thinking” sem suporte científico, propostas que mais parecem anseios e desejos de múltiplas agendas do mundo das TIC. Na verdade, e tendo em conta o que escrevi abaixo contra muito do que é dito ao longo deste livro, tenho que aceitar que o livro está bem escrito e toca em vários pontos relevantes. Porque se assim não fosse dificilmente me teria dignado a escrever tantas linhas de resposta como acabei por fazer. Dito isto, espero que o leiam, se partilho as minhas ideias é mais para poder lançar a discussão de uma forma crítica, e espero que construtiva.

Assim para aclarar a minha resposta ao livro, dividi a análise em duas partes, a primeira sobre a escola, e a segunda sobre o multistasking.



1. A Escola

1.1 – Diz Toffler que o modelo de escola atual é uma originalidade da Industrialização.

Davidson usa Toffler para iniciar todo o seu ataque à escola atual. Até aceito que Toffler tenha alguma razão no que diz, mas julgo que devemos ser cautelosos para não embarcar em generalidades. Julgo que muitos, incluindo o próprio Ken Robinson, caíram nesta ideia de generalizar a escola como um resultado da industrialização. Porque se existe algo industrial na escola da atualidade, e algo tipicamente século XX, é a massificação da escola, e não a escola enquanto conceito. Ou seja, o que é fruto da industrialização e “taylorização” é a massificação que obrigou a criar espaços de formação em série. Que por sua vez obrigou a estratificar a aprendizagem numa hierarquia fechada e a generalizar o que se aprende de forma igual para todos. Ensinar milhões de pessoas, tinha de ser diferente de ensinar uma elite.

Do que se fala é então de um problema logístico que é claro que acarretou imensos problemas para o ideal de escola, mas se olharmos para os efeitos na sociedade, esses problemas foram mais do que compensados. Uma sociedade educada, mesmo que através destes sistemas de massas, tem melhor qualidade de vida e é mais feliz do que uma não educada.

Quanto ao conceito de escola, não surge com a revolução industrial, mas com o conceito de civilização. A necessidade de passar conhecimento a quem está a aprender o que é o mundo, a quem está a aprender uma profissão, para que estes não tenham de começar do zero. A invenção da escrita facilitou o processo, as pessoas não precisavam de esperar que alguém lhes dissesse o que fazer e como fazer, podiam a seu tempo ler. Por outro lado complexificou tudo, tornou o conhecimento mais profundo, mais denso, mais detalhado. Obrigou a aumentar o tempo de aprendizagem do mundo, porque era preciso dominar um nível de abstração, a escrita, antes de chegar à realidade. Daí aos Gregos, Romanos, Renascimento, múltiplos meios de registo de comunicação, incluindo a internet, é tudo uma ordem de evolução natural.

De uma forma genérica, a escola de hoje difere pouco daquilo que eram as Guildas criadas no final da Idade Média. Para quem queria ser profissional de uma qualquer atividade, era preciso passar por um processo que durava longos anos até ser aceite por quem regia o meio. A diferença entre elas e a escola de hoje, está na obrigação que hoje existe de todos terem de atingir determinados níveis de escolaridade. Ou seja, não é o conceito que está em causa, mas o valor que a sociedade lhe passou a atribuir. Porque a ideia de todos serem obrigados a ir à escola até um certo ano, está ligada com os dados empíricos que demonstram os resultados de se ter uma sociedade mais educada. Uma pessoa que fica para trás na escola, não cria um problema apenas para si, mas para toda a sociedade, se esta for inclusiva.

1.2 – A revolução industrial e a escola criaram uma absurda “categorização, divisão e hierarquização”, segundo Cathy Davidson.

Como disse acima, em termos logísticos, foi necessário proceder assim. Não é um problema da industrialização, mas da massificação, de muitas mais pessoas poderem aceder a patamares superiores da hierarquia social. A “categorização, divisão e hierarquização” é uma ideia do mercado laboral do século XX, segundo Davidson! Será? Como é que vos parece que seria possível gerir um site com os milhões de encomendas diárias que tem a Amazon, sem este tipo de estruturas?

Mas não é uma questão logística, é antes fruto da progressão e avanço do conhecimento que detemos enquanto espécie. Porque avançar nessa compreensão implica avançar na criação de camadas de abstração sobre a realidade. E estas camadas são naturalmente constituídas por categorias, hierarquias, divisões e indexações, pois são elas que permitem a interligação conceptual, entre as várias camadas de abstração, e nos permitem conhecer em maior profundidade o mundo que nos rodeia. Basta pensar em qualquer sistema que nos rodeia desde o biológico ao solar. O que são estes sistemas, se não camadas de abstração criadas por nós, que nos ajudam a conceber mentalmente o mundo. O que são se não categorizações, comparações, classificações, relações, efeitos e impactos?!

1.3 - "A Escola Mata a Criatividade"

A ideia de que as escolas matam a criatividade é mais uma ideia muito em voga, proclamada ad nauseum desde que Ken Robinson proferiu uma TED talk em 2006 sobre o tema que se tornou viral. Mas a esta ideia também respondo não. Porque não posso, nem criticar, nem criar nada de novo, se não absorver muito daquilo que existe [leia-se a simples recomendação de Stephen King, "se quer escrever, leia"]. Mesmo quando quero criar o totalmente novo, preciso de conhecer o mundo em que me insiro. A escola deve dar a conhecer o que existe no mundo, deve fornecer saber e informação, e deve fazê-lo apresentando sempre o pró e o contra, e só desta base surgirão as competências para articular o pensamento, e agir criticamente. A reflexão não pode ser feita no vazio, correndo o risco de ser totalmente inconsequente. A escola formata, sem dúvida, mas cabe a cada um de nós depois "sair da caixa", como nos diz David Foster Wallace no discurso inaugural de 2005 na Universidade Kenyon College ou José Saramago,
“A escola deveria ensinar a ouvir. Cabe-lhe ensinar o aluno a escrever corretamente e também explicar por que as regras são assim, e não de outra maneira. Mas a escola não será o lugar onde se subverte e revoluciona a estrutura da língua. Essa tarefa pertence aos escritores, se estes consideram que têm motivos para o fazer. (…)
Os estilos saem do ovo da sua própria necessidade. Ensine-se a pensar claro e a escrita será clara. E, já agora, gostaria que houvesse uma luta implacável contra o erro de ortografia. A língua é uma ferramenta de comunicação de todas a mais perfeita, e as ferramentas (pergunte-se a um operário) têm de estar limpas e em condições de trabalhar eficazmente. (…)
A escola não é o lugar em que se subverte a estrutura da língua porque ela não tem preparação própria suficiente para se arriscar nessa aventura. As regras são como os sinais de trânsito numa estrada. Estão ali para orientar e dar segurança ao condutor. Claro que é possível viajar por uma rodovia onde não haja sinais de trânsito, mas para isso é indispensável ser um bom condutor. Aí está a diferença. ” José Saramago (2003)
Neste sentido também, Davidson recorre a uma outra afirmação muito conhecida de Toffler, "learn, unlearn and relearn" que quando retirada de contexto pode assumir contornos totalmente despropositados. O que Toffler realmente quer dizer é apenas e só, que o estudante do futuro tem de Aprender a Aprender. Isto é completamente diferente de assumir que as mudanças constantes na nossa sociedade levarão a que estejamos constantemente a apagar o passado. E menos ainda, isto quer dizer que não precisamos de aprender a classificar, categorizar e hierarquizar como Davidson procura afirmar.

Mais grave ainda acontece quando nos diz que a mudança constante que a sociedade vive, nos deve conduzir a deixar de preocupar com as tarefas repetitivas, porque essas serão feitas pelas máquinas, ou serão fruto de outsourcing!!! (quando a China se tornar um país desenvolvido, vamos começar a realizar outsourcing para Marte?). E se assim é, como é que eu explico a alguém que quer ser pianista, que quer ser animador 3d, que quer escrever, filmar, pintar, no fundo que quer criar, que só o poderá fazer se repetir milhares de vezes a mesma ação, e se o fizer ao longo de 10 mil horas?

A grande questão é que pessoas como Cathy Davidson seguem estas correntes de pensamento, de ideias feitas no mundo do discurso de sound bytes, porque é com elas que ganham atenção. Constroem ideias em cima de castelos de cartas, e quem os quiser seguir, dando-se mal, problema seu. Davidson não é propriamente imparcial nestas suas acusações contra a escola. Disléxica, viveu num tempo em que não se compreendiam os seus problemas, e por isso teve de se esforçar muito mais do que todos os outros para chegar onde chegou. Mas na realidade se ela chegou até aqui, é exatamente porque se esforçou dessa forma, porque conseguiu construir os modelos de pensamento na sua cabeça capazes de a ajudar a compreender o mundo que a rodeia. Não deveria agora, simplesmente querer atirar tudo para o lixo, condicionando o futuro daqueles que estão a crescer.

Porque todo este discurso anti-escola já cansa, nomeadamente nos discursos nas áreas da criatividade e de fusão entre arte e ciência, tanta “arrogância tecnológica”. Só em 2013 saíram dois livros que consideram a escola perniciosa, e apresentam caminhos alternativos baseados nos seus percursos pessoais, "Hacking Your Education: Ditch the Lectures, Save Tens of Thousands, and Learn More Than Your Peers Ever Will" de Dale J. Stephens e “Don’t Go Back to School” de Kio Starck que a Maria Popova fez questão de logo idolatrar no seu BrainPickings. Não é um discurso novo, os discursos anti-escola já vêm de trás, um dos mais emblemáticos é o "Deschooling Society" (1971) de Ivan Illich.

Eu não acredito que todos tenham de comer e gostar da mesma sopa, por isso defendo escolas técnico-profissionais. Estes caminhos alternativos podem até representar uma saída de excelência para algumas mentes brilhantes, mas não para a generalidade das pessoas, e é por isso que idolatrar este tipo de discursos é no mínimo perigoso. Porque se a escola é assim tão maléfica, destruidora das mentes das nossas crianças, castradora de todo o seu potencial criativo, como é que se explica que os países com maiores níveis de escolaridade (ex. Suécia e Finlândia) sejam mais criativos e mais felizes que os que têm menores níveis de escolaridade (ex. Portugal e Grécia)?

Julgo que é tempo de parar com tanto discurso feito, tanto fascínio tecnológico, e fazer um reset discursivo, de volta aos básicos. Um pouco como nos disse a semana passada Gonzalo Frasca, mais importante que os videojogos em sala, é aquilo que um professor consegue fazer em termos de atividades e exercícios de jogos com as crianças, usando o comum papel e cartão.


2. Internet e multitasking

Neste campo Davidson segue a mesma lógica que antes, mas aqui não se agarra apenas ao discurso do senso comum. E se percebo que Davidson está em grande parte a reagir à negatividade que a sociedade tem tentado atirar para cima da internet, das tecnologias de comunicação e dos videojogos, não aceito que o faça desta forma tão leviana. Não basta pegar em meia-dúzia de teorias da psicologia, das neurociências, do estudo do cérebro e atirar para a frente. Como diz Mark Changizi na sua análise do livro para o WSJ,
"In general, I'm receptive to knock-down-the-pillars theses, but Ms. Davidson's book is ultimately a disappointment, mostly because of the way it treats "the science"—in particular, my own specialty, brain science. Ms. Davidson writes as if the human mind's functions are almost totally elastic…
Ms. Davidson goes on to discuss a much wider variety of science. She touches on hot topics such as mirror neurons and cross-cultural studies of how children learn categorization. But they often seem cherry-picked, as if she began with a suite of optimistic ideas regarding how we can adjust to changing technology and then shopped for justifications at the mall of brain science." (
Changizi, 2011)
Este seu livro configura-se assim no género que já podemos denominar de Gladwelliano, ou seja a exposição de ideias suportadas por apenas partes de estudos científicos, depois simplificados ao ponto de qualquer leigo perceber, para garantir a veracidade da teoria que se pretende afirmar, ofuscando na generalidade o que os estudos realmente demonstram. Leia-se o artigo de Benjamin Bratton a propósito deste género de divulgação de ciência que tem sido amplamente propalado pelas TED talks.

E não é que Davidson apenas utilize uma ou outra teoria para suportar algumas ideias, se assim fosse, quem de nós já não o fez? O problema emerge do cerne que suporta toda a argumentação deste livro, incluindo capa e título. Davidson aposta tudo na teoria “inattentional blindness” de Daniel Simons e Christopher Chabris para lançar as amarras que sustentam todo o seu discurso. Esta teoria, mais conhecida por “gorila invisível”, demonstra que quando estamos muito focados em algo, somos incapazes de nos dar conta das coisas mais flagrantes que se passam à nossa volta (ver o vídeo abaixo). Davidson pegando na sua dislexia, conclui que cada um de nós está destinado a perder alguma coisa quando demasiado focado. Davidson assume assim que será muito mais vantajoso se agirmos colaborativamente, porque poderemos colmatar as falhas uns dos outros, colectivamente compreenderemos melhor a realidade. Partindo desta ideia, Davidson afirma que no caso do multitasking apenas temos de usar a mesma estratégia, trabalhar colaborativamente para colmatar as falhas de cada um de nós.

Selective Attention Test (Simons e Chabris, 1999). As pessoas focadas na contagem do número de passes dados com a bola, não conseguem ver o gorila que atravessa o espaço (+ info).

Ora não sou eu a dizer que Davidson é quem não vê a realidade, são os próprios autores da teoria. Chabris diz no NYT,
“she provides little but anecdotal support for a central argument of the book... Like many authors who embrace new ideas rather than build on what has come before, Davidson sets out to destroy the old beliefs, as if burning down a forest in order to plant new crops." 
“Indeed, Davidson is such a good storyteller, and her characters are so well drawn, it’s easy to overlook the lack of hard evidence in favor of the intriguing ideas she advocates...
Davidson correctly notes that there is no data showing that the Internet hurts our brains, though she errs in implying that no evidence of an effect means evidence that there is no effect. She also thinks multitasking has gotten a bad rap. Switching rapidly from one task to another actually helps us see connections between ideas and be more creative than we would if we held ourselves to a regimen of completing one task before we start another, she suggests. “Mind-wandering,” she writes, “might turn out to be exactly what we need to encourage more of in order to accomplish the best work in a global, multimedia digital age.” But this speculation is up against facts Davidson omits: the results of experiments showing that for all but perhaps an elite 2 to 3 percent of subjects, doing things in sequence leads to better performance than trying to do them simultaneously.” (Chabris, 2011)
Como diz Chabris são muitos os estudos que demonstram que o multitasking é um mito, que se quisermos fazer trabalho de excelência, teremos de o fazer em série, e não em paralelo. Aliás ainda há pouco tempo aqui falei do trabalho de Nicholas Carr. Mas esta abordagem ao multitasking de Davidson está no fundo intimamente ligado às ideias que propala sobre a Escola, ideias de que a escola parou no tempo e não prepara os jovens para o futuro. Para Davidson no tempo da internet e dos videojogos, já não faz sentido ensinar uma profissão, interessa apenas aprender um pouco de tudo, e desse modo o multitasking é a melhor solução. Davidson e muitos dos arautos destes mitos deveriam ler "Focus: The Hidden Driver of Excellence Hardcover" (2013) de Daniel Goleman, que saiu há poucos meses.

A realidade, e quem trabalha criativamente sabe bem disso por experiência no terreno, só podemos criar textos de longo alcance, com novas ideias, novas interpretações, quando desligamos do mundo, quando deixamos a nossa mente focar, aprofundar, e ver o mundo de múltiplas perspectivas abstractas. A concentração sobre um tópico para encontrar o não visível à superfície é fundamental. E não existe trabalho colaborativo que substitua este trabalho subterrâneo mental.

Aliás, são os próprios exemplos anedóticos dados por Davidson que nos dizem isto mesmo. Quando Davidson pergunta a Aza Raskin, o designer da interface do Firefox, como é que ele lida com a distração originada pelo multitasking, a resposta é muito clara: usa 3 computadores distintos. Um para o seu trabalho principal, um segundo mais perto para o e-mail, e um terceiro mais longe para a internet em geral, redes sociais, etc. Ou seja quando quer aceder ao e-mail tem de se levantar e ir ao segundo computador, quando quer aceder à net, tem de se levantar e caminhar ainda mais para chegar ao mesmo. É deste modo que Raskin consegue manter-se concentrado nas atividades principais em que está a trabalhar. Ou seja, ele assume claramente que precisa de erradicar tudo o resto, para se concentrar no código que quer escrever, ou nos artigos que quer produzir. Para Davidson, isto é apenas uma técnica para lidar com a distracção, para mim é a assunção de que o multitasking não existe.

Porque apesar disto Davidson passa o livro a insistir que o nosso cérebro está desenhado para o multitasking, esquecendo que apesar de funcionarmos em pensamento associativo a um nível não consciente, o nosso nível consciente tem uma capacidade bastante limitada para filtrar a múltipla informação que nos chega do exterior. Aliás, para quem tem dúvidas, basta tentar escrever um SMS enquanto conduz um carro, e verá como NÃO é dotado de qualquer super-poder de multitasking.

Não quero dizer que Davidson não tenha alguma razão quando se refere aos processos criativos. O trabalho colaborativo serve-nos, a interacção com as pessoas à nossa volta é vital para nos ajudar a despoletar novas ideias, são poderosos gatilhos que acionam as nossas ligações neuronais, e nos ajudam a proceder a fusões e misturas de ideias. Leia-se sobre os processos criativos na Pixar. Mesmo o multitasking pode também servir no despoletar destes gatilhos criativos. Mas é preciso ter em atenção que eles servem apenas para exactamente despoletar ou desencadear algo dentro de nós. Desencadeadas as ligações, precisamos do foco, do aprofundamento para chegar a compreender onde aqueles gatilhos nos podem realmente levar.

Esta ideia do multitasking como modus operandi regular ou de normalidade, é tão desprovida de senso, que Davidson assume a sua dificuldade, mas colmata-a então com o cooperativo e colaborativo, entrando assim adentro dum reino de idealismo ingénuo como nos diz Christine Wenderoth no Journal of the American Theological Library Association,
“She is not right in saying that we will all work together happily towards a common goal unaffected by interruptions and multiple demands on our time and attention. Her anthropology is incredibly naive. Decentralized and distributed work life? Sure we can do that. Self-control and self-regulation? Maybe we can manage that. But loss of ego and suspicion, innate ability to multitask, placing the common good over the personal? No. Trust is not an automatic thing. We may need to reexamine how we work, but some of her idealism is just plain, well, idealistic.” (Wenderoth, 2011)
No final o que mais me incomoda é que o livro até tem boas ideias a apresentar. A forma como Davidson procura trazer as ideias de mecânicas de jogo para escola, baseando-se no trabalho Jane McGonigal, não difere do que Gonzalo Frasca advoga. Ou seja, agilizar as atividades com mecânicas de jogo, preocupando-se menos com o facto de ser ou não digital. Desenvolver estratégias de avaliação baseadas em atividades lúdico-projetuais. Porque aquilo que importa é a relação que o professor constrói com o aluno, olhos nos olhos, e não através da tecnologia. Neste sentido também tenho de dizer que estou imensamente de acordo com todo ataque que Cathy Davidson desfere contra a obsessão pelos exames, testes, e standards classificatórios ao longo do livro. Por como ela própria diz, não servem a ninguém diretamente relacionado,
"I would stop, immediately, the compulsory end-of-grade exams for every child in an American public school. The tests are not relevant enough to the actual learning kids need, they offer little in the way of helpful feedback to either students or their teachers, and there are too many dire institutional consequences from failure resting on our children’s shoulders. The end-of-grade exam has become a ritual obligation, like paying taxes, and no one wants our kids to grow up thinking life’s inevitabilities are death, taxes, and school exams. That’s a disincentive to learning if ever there was one. " Cathy Davidson (2011:218) 
No fundo aquilo que sempre importou e continuará a importar, baseia-se na capacidade que o professor tem para desenvolver nos alunos empatia pelo que tem para partilhar com eles. A base da aprendizagem continua a ser a teoria da mente, ou seja a imitação, e enquanto não tivermos tecnologias capazes de simular seres humanos, estas continuarão sempre muito longe de poder substituir o ensino por via do semelhante. Tentar mudar toda a base biológica e cognitiva da aprendizagem devido ao surgimento de brinquedos tecnológicos externos parece-me no mínimo irracional. As tecnologias servem a educação como complementos, a internet e os videojogos nada mais fizeram do que aumentar e diversificar o acesso ao conhecimento que o livro possuía.

Podemos e devemos evoluir a escola que temos, com as tecnologias, com a personalização da aprendizagem, com a substituição dos exames pelas abordagens projetuais, etc., mas não esperem que simplesmente porque temos uma nova tecnologia, a internet ou outra que venha a seguir, os nossos cérebros, a nossa biologia e cognição, se transformem da noite para o dia.

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