- "Motores de busca afectam a memória", Sol, 15.07.2011
- "Pesquisas na internet pioram memória", ptjornal.com, 15.07.2011
- "Google torna memória humana mais preguiçosa", IPJornal, 17.07.2011
- "Google Is Destroying Our Memories, Scientists Find", Business Insider, 16 Julho 2011
- "Study Shows Internet Alters Memory", Slatest.com, 15.07.2011
- "Poor memory? Blame Google", Guardian, 15.07.2011
Fiquei incomodado com isto, porque a forma brutal como somos cercados por estas falsidades, cria a impressão de realidade. Isto é um claro discurso luddita ainda que feito de modo totalmente não consciente pelos jornalistas que escrevem. Está impregnado de medos infundados da tecnologia, de que esta se tornará mais inteligente que nós. Porque a tecnologia tomará conta de nós, do nosso pensar, do nosso ser. De que nós seres humanos seremos levados para o inferno por cometer o pecado capital da Preguiça.
Trabalhadores destroem máquinas nas fábricas de têxteis inglesas no início de 1800
Vejamos, o artigo em si, o estudo é uma boa contribuição para os trabalhos sobre a psicologia. Dá-nos conta da evolução, do modo como vamos evoluindo com as tecnologias que vamos criando. Mas não nos apresenta algo de terrivelmente novo, algo que não soubéssemos já, e menos ainda algo que nos esteja a fazer mal. Ora o que este estudo nos diz são duas coisas:
1 - Que muito daquilo que antigamente, decorávamos, mantínhamos na memória, agora não mantemos porque acreditamos que o Google nos pode dar a resposta. "The Internet has become a primary form of external or transactive memory, where information is stored collectively outside ourselves."
2 - Que o modo como recordamos, já não é dirigido ao facto que queremos recordar, mas o modo como o podemos obter. Ou seja "We remember less through knowing information itself than by knowing where the information can be found."
Então vejamos o primeiro resultado. Desde que criámos a linguagem, mas mais ainda com a escrita, que as nossas opções de escolha sobre o que deve ser memorizado se alteraram drasticamente. Foi com a escrita que pudemos dar um salto gigantesco em frente, pudemos começar a dedicar o nosso pensamento a assuntos mais complexos, porque podíamos manter vivas memórias de experiências anteriores. Podíamos manter vivos todos os detalhes recorrendo à escrita dos mesmos durante a experiência, e depois revisitá-los durante as experiências seguintes. Com isso abrimos caminho para a ciência. Sem a escrita nunca teríamos chegado até aqui em termos de evolução da qualidade de vida.
O segundo resultado, é também ele bastante natural. Quando recordamos uma data histórica, como o fazemos? Recordando o livro em que estava escrita, no qual a apreendemos. Ou a aula em que nos foi comunicada, o professor que nos falou dela, ou o amigo que nos passou os apontamentos.
Por outro lado também, temos o conceito de memória transacional, que nos diz que recordamos quem tem a resposta, o nosso filho, o nosso marido/mulher, o nosso chefe, e não a resposta em si.
Nem sempre conseguimos repescar os factos, e por vezes só o conseguimos com recurso a estas lógicas enviesadas, chegar a uma luz da memória do que queremos obter. A grande alteração, é que deixámos de estar dependentes dessas pessoas que nos serviam de auxiliares de memória, ou até mesmo de lembrar várias outras memórias associativas para chegar ao facto. Basta muito mecanicamente digitar a palavra no Google.
Com isto demos mais um passo gigantesco à frente. Por isso é que os conteúdos na Cloud são o futuro, porque não vamos querer mais procurar objetos fisicos, quando um motor de busca poderá fazer isso por nós. Vamos poder dedicar-nos a coisas muito mais complexas, estimulantes, e recompensadoras. Aliás é a própria autora do estudo a dizer "We're remarkably efficient". Nem mais, os nossos recursos intelectuais não são ilimitados, por isso temos de o saber utilizar da forma mais eficiente possível.
Entretanto na minha busca encontrei o texto, Is Google Ruining Your Memory?, do Jonah Lehrer, um dos melhores editores da Wired. Vai no sentido disto, mas aponta ainda o dedo às reconstruções via memórias, e à sua enorme falibilidade.
Update 28.07.2011
Ontem quando escrevi este texto queria ter associado um estudo que tinha lido há uns tempos sobre as diferenças entre o Google e a leitura de um livro, em termos de ativação cerebral, mas não o consegui encontrar online, no tempo que tive para fazer o artigo. Entretanto hoje encontrei o estudo e aproveito para deixar aqui o apontamento.
É um artigo publicado no American Journal of Geriatric Psychiatry em 2009 por Gary W. Small, Teena D. Moody, Prabha Siddarth, e Susan Y. Bookheimer, intitulado "Your Brain on Google: Patterns of Cerebral Activation during Internet Searching". Neste estudo foram realizados testes comparativos entre a leitura e o ato de pesquisar no Google, com dois grupos de pessoas adultas: os utilizadores com pouca literacia tecnológica ou pouco uso do Google, e os utilizadores avançados com muitas horas de uso. Os resultados do estudo são impressionantes, e podem ser resumidos nas neuroimagens abaixo.
As imagens da esquerda representam a ativação cerebral em modo leitura de livro, as da direita a ativação cerebral em modo pesquisa na internet. As de cima representam os iniciados, as de baixo os avançados. Repare-se como a mancha de ativação de funções cerebrais na pesquisa é superior à da leitura. No processamento de leitura são ativadas as regiões de linguagem, leitura, memória e habilidade visual, quando em modo de pesquisa, são ativadas além destas, as áreas de tomada de decisão e o raciocínio complexo.
Mas mais impressionante que isso é comparar as ativações entre os iniciados e os avançados. Ver como uma pessoa que usa frequentemente o Google, se vai apoderando cada vez mais do poder do motor de busca, e vai ativando cada vez mais o processamento complexo. Assim e em total contra-corrente com as informações acima da memória, e da possível perda de poder de associativismo de ideias, o que podemos ver é que o uso do Google aumenta essa funcionalidade e exige ainda mais do nosso cérebro. Isto só vem dar razão ao facto de termos que nos tornar mais eficientes, não perdendo tanto tempo com a memorização, e dedicando antes o nosso processamento cerebral mais ao raciocínio das ideias.
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