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maio 07, 2012

o Prazer de ler

Acabo de descobrir uma obra de grande valor, Como um Romance (1992) de Daniel Pennac (edição ASA). Foi-me recomendada pelo João Cardoso, um aluno meu de mestrado, não pelo conteúdo, mas pela forma. O livro desenvolve-se em pequenos capítulos de 2 a 3 páginas, criando no leitor um amplo sentimento de progressão, que facilita per se o acto de leitura.


Mas o que descobri no seu conteúdo deixou-me ainda mais encantado. Neste livro de 1992 Pennac já diz muito daquilo que hoje discutimos em redor das palestras de Ken Robinson. Neste ensaio defende o valor da leitura, não pela sua necessidade mas antes pelo seu prazer. Critica fortemente as práticas pedagógicas que fazem da leitura uma tortura e com isso retiram o prazer de ler às crianças.

Autor desconhecido

Pelo meio apercebi-me de algo que comentei aqui sobre o livro The Shallows: What the Internet Is Doing to Our Brains (2010), é que esta coisa de os alunos e as pessoas não gostarem de ler não tem nada que ver com a Internet. Este ensaio é de 1992, tem 20 anos, e aponta exactamente os mesmos dramas no incentivo à leitura nos liceus franceses. Por isso hoje quando nos dizem que as crianças têm muitas outras atracções, é verdade, mas não é por causa disso que não lêem. Cabe-nos a nós descobrir a forma de os ajudar, e não apenas resignar-nos. Este livro de Pennac é um excelente ponto de partida para encontrar formas de o fazer.


Pennac relembra os pais de que mais importante do que compreender as histórias que lhes leram, é que as crianças tenham prazer com esses momentos. Não posso concordar mais, assim como tenho de concordar com a sua ideia de exame final de liceu em Português, que deveria passar não por exigir a análise de um texto, mas antes por contar sobre os livros que leu.

Ao longo do livro Pennac demonstra com vários exemplos como a análise vem pouco a pouco, à medida que se vai lendo mais e mais, e que não se aprende apenas porque é ensinada de modo obrigatório. Pennac faz do objecto um prazer, e não uma tortura, dessacralizando a leitura e elevando o amor à leitura. Trabalha a arte da leitura como algo que nos deve tocar profundamente o coração, em vez de nos colocar a debitar respostas. E para isso fecha o livro com os fantásticos 10 direitos do leitor:
1. O Direito de Não Ler
2. O Direito de Saltar Páginas
3. O Direito de Não Acabar Um Livro
4. O Direito de Reler
5. O Direito de Ler Não Importa o Quê
6. O Direito de Amar os «Heróis» dos Romances
7. O Direito de Ler Não Importa Onde
8. O Direito de Saltar de Livro em Livro
9. O Direito de Ler em Voz Alta
10. O Direito de Não Falar do Que se Leu
Com um discurso bem disposto e convincente, quase que me consegue fazer sentir culpado. Culpado por ter deixado de ler romances. Uma decisão consciente que tomei há alguns anos. Porque não é possível dedicarmo-nos a todos os prazeres, deixei o lado do romance para o cinema. Mas por vezes, nomeadamente nas paragens mais longas do verão, ainda volto aos seus prazeres por breves passagens.


fevereiro 18, 2012

O fim da Universidade, ou a simples arrogância tecnológica

Vou deixar aqui algumas ideias sobre o assunto da aprendizagem à distância, de que se fala desde há muito. O e-learning é algo recente, mas o ensino à distância existe desde muito antes disso, fazendo uso de canais como o correio ou a televisão. Impressiona ver como as pessoas passam por cima das experiências do passado e seguem debitando ideias sem parar para pensar realmente naquilo que estão a dizer. Sobre a ideia de ter um professor a leccionar para milhões no planeta inteiro, só posso dizer que é das coisas mais insanas que alguma vez ouvi. Muitas destas ideias, seguem apenas o buzz do momento, e limitam-se a meras conjunturas pensadas sobre o joelho, ou utopias baseadas em ficção-científica.

À L'École, representação da visão da escola para o ano 2000, vista a partir de 1910

Muito se tem falado das aulas do MIT e Yale que já se podem encontrar gratuitamente online, mas foi agora com a recente decisão do MIT de começar a oferecer certificação online gratuita que os discursos se inflamaram. Para alguns, isto é o sinal do fim das Universidades estatais americanas, e de milhares de universidades espalhadas pelo globo. Alguns referem como exemplo para o futuro da escola, as famosas aulas vídeo da Khan Academy, outros referem que os alunos aprendem directamente a partir da Wikipedia e do Facebook. Nomes conceituados das TIC como Bill Gates, afinam pelo mesmo diapasão, afirmando que as Universidades são uma espécie em vias de extinção. Outros escrevem sobre um futuro em que a cultura disponível no mundo online e uma abordagem DIY (Do-it-Yourself) criará as condições para que as Universidades se tornem obsoletas. Tudo isto ideias, que de algum modo parecem assentar no velho mito do self-made man.


Mas mais interessante, é que todos estes discursos são proferidos, não pela sociedade em geral, mas tudo por pessoas oriundas dos sistemas de ensino mais elitistas do planeta. O defensor da auto-formação via Wikipedia/Facebook doutorou-se em Yale, a autora do texto apocalíptico sobre a Universidade pós-elearning tem um MBA da Universidade de Chicago, o fundador da Khan Academy, possui 3 licenciaturas do MIT e um MBA, assim como o atual presidente da Khan Academy possui 4 licenciaturas do MIT. Bill Gates esteve na Universidade de Harvard alguns anos, apesar de não ter terminado a licenciatura, não por não querer, mas por se ter envolvido na criação da Microsoft. A autora do movimento DIY-U é formada em Yale. E isto deve-nos fazer questionar sobre o que seria cada uma destas pessoas, sem estes sistemas de ensino por detrás, teriam chegado todos até aqui?

Salman Khan

As pessoas esquecem que a escola sempre existiu, o que nasceu no século XVIII não foi a escola, mas o modelo de escola moderno que hoje temos. A escola existe desde que iniciámos a caminhada neste planeta enquanto espécie gregária, enquanto espécie social, que depende do grupo para sobreviver. No grupo, os mais velhos sempre tiveram o papel obrigatório e fundamental de ensinar os mais novos, para que estes pudessem evitar perigos conhecidos, através do conhecimento empírico legado pelas gerações anteriores. Com o passar de milénios fomos criando formas de registo externas, sendo as primeiras formas, as próprias ferramentas de pedra e madeira esculpidas há um par de milhões de anos. Mas tivemos de esperar que o nosso sistema de linguagem evoluísse para que ideias mais complexas se criassem, e isso criasse em nós a necessidade de dar corpo material a essas mesmas ideias.

A escola representada em pinturas do antigo Egipto

Assim a linguagem apareceu apenas há cerca de 50 mil anos, e os primeiros registos externos vieram em forma de pintura há 40 mil anos espalhados por algumas cavernas do centro-sul da Europa. A linguagem e a pintura levariam à criação dos primeiros sistemas de partilha de informação codificada, criando assim os primeiros sistemas de escrita há uns meros 4 mil anos atrás. Tudo o que criámos depois disto, são mesclas conceptuais permitidas pela evolução tecnológica e artística. Registos como a fotografia e o vídeo que descendem directamente da pintura, ou os videojogos que descendem directamente da escultura.

Pinturas nas cavernas de Lascaux, datadas de 40 mil anos

Todas estas formas de registo, aliviaram os nossos constrangimentos de memória, libertando a nossa mente para se dedicar mais e mais à inovação. Mas os mais velhos nunca deixaram de ser importantes, na transmissão do conhecimento, porque aquilo que verdadeiramente se transmite de geração em geração não se pode definir num punhado de dados discretos, mas reflecte-se antes num conjunto de experiências que se ramificam e inter-conectam com lugares, pessoas, e momentos no tempo.

Ruínas da Universidade de Nalanda, criada em 400 A.C.

E as Universidades não foram criadas no século XVIII, a primeira Universidade, com 10 mil alunos de que temos registos, data de 400 A.C. na India, a Universidade de Nalanda. A ocidente na Europa, teríamos de esperar até ao início do segundo milénio D.C. para ver nascer a Universidade de Bolonha. Mas o que aconteceu então no século XVIII? Foi criado o modelo industrial de escola. Um modelo estruturado no tempo e com métodos de avaliação e classificação, que requerem muito da componente de memorização, assim como raciocínio humano, mas que acima de tudo ignora o estilo individual de aprendizagem e busca um padrão que sirva a massificação do ensino. E é esta a ideia de escola que criticamos. No entanto depois de tanta discussão em redor deste problema, que parece ter sido compreendido por uma grande parte da sociedade, através do magnífico trabalho de pessoas como Ken Robinson ou Howard Gardner, tudo parece ter sido esquecido.

Universidade de Bolonha, criada em 1088

De repente parece já não ter importância, ter massas de pessoas a aprender de forma igual, e a aprender o mesmo, mas queremos mais do que isso, queremos um sistema universal, que chegue aos milhões de pessoas. Queremos que um único professor debite a sua perspectiva subjectiva, e formate todo o planeta como um só. Dizem-nos que as Universidades vão desaparecer, e vão apenas restar as grandes Universidades, as que possuem uma Marca, capaz de imprimir diplomas importantes!!! Mas?! Alguém se questionou porque é que o canudo do MIT é importante, não será o facto de esta ser altamente exclusiva, que faz dela uma marca de "qualidade"? A regra básica da persuasão social, diz-nos que a raridade dos elementos, torna-os apetecíveis, o seu contrário torna-os desprezíveis. Mas mais do que as regras de marketing, fará sentido recorrer a uma visão única do conhecimento para a resolução de problemas singulares, com particularidades próprias das zonas geográficas aonde se encontram, com as particularidades sociais e culturais das comunidades em questão, e acima de tudo com as especificidades psicológicas, emocionais e motivacionais de cada indivíduo?!

Voltando ao discurso dos senhores da elite universitária, que agora adivinham o fim do sistema. Estes só demonstram que quem usa massivamente as tecnologias para criar e inovar, não são os autodidatas que não foram à universidade, mas são aqueles que frequentaram as universidades. Ou seja para poder usar as tecnologias, construir, criar algo, não é preciso aprender a usar as tecnologias, que cada vez tornamos mais fáceis no seu uso. É preciso antes aprender a pensar, aprender a aprender, aprender a ser autónomo, proactivo, empreendedor, e é preciso construir uma forte bagagem cultural. Tudo isto não se aprende com um simples acesso à web, depende antes de uma interação forte com professores e alunos. O e-learning ajudará, mas de forma alguma conseguirá substituir-se ao ensino presencial, porque o que está em causa é a forte interação humana.

A Telescola portuguesa

Apesar de ser um grande defensor das tecnologias interactivas, dos videojogos na educação, não tenho qualquer dúvida sobre of facto de estes não poderem servir o fim do ensino de modo exclusivo. A Telescola não o fez, e não será agora por termos mais informação e a possibilidade de desenvolver tecnologias interactivas, que isso vai acontecer. A razão principal para eu ver isto deste modo, é só uma, o processo de socialização humano. Mais do que os conteúdos na especificidade, a escola é um dos principais pilares no processo de construção do Eu, desde a Infantil à Universidade. Deste processo que se constrói lentamente ao longo de anos, fazem parte duas questões essenciais ao humano, a mímica e a empatia, que por sua vez se tornam responsáveis pelo desenvolvimento de competências para a construção de novos comportamentos, novas visões, e claro novos horizontes. Voltando à primeira imagem deste texto, aprender não é meramente absorver o que está escrito num livro.

junho 24, 2011

Drive (2010) de Daniel Pink


Daniel Pink é uma espécie de estrela americana da literatura não ficcional que trabalha temas como as alterações introduzidas pelas tecnologias da informação nos comportamentos sociais, nomeadamente as novas abordagens e as novas motivações. É um autor que anda na mesma órbita de Malcolm Gladwell, Chris Anderson, ou Stephen Dubner.

O primeiro trabalho que li dele foi A Whole New Mind (2006), um livro muito interessante sobre as alterações introduzidas pela globalização nas necessidades dos novos empregos na Europa e EUA. Uma discussão muito atual que discute como necessidade básica da nossa sociedade atual a inovação e a criatividade. Entretanto Daniel Pink lançou em 2010 Drive: The Surprising Truth About What Motivates Us um livro completamente focado sobre o modo como funcionamos em termos de estímulos, sobre a motivação no trabalho e alguns dos seus mitos.

Em Drive, Daniel Pink vai tocar alguns aspetos que já discuti a propósito de The Element (2009) de Ken Robinson, nomeadamente a questão de que quando as pessoas são levadas a trabalhar em algo que é fruto da sua própria escolha, elas produzem muito mais, do que quando lhes chega como um pedido externo. Neste sentido Pink vai discutir o que motiva as pessoas no mundo atual, nomeadamente a diferença entre o pagamento de serviços e a cumplicidade ou reconhecimento. Vou aproveitar para deixar aqui alguns dos exemplos trabalhados por Pink e que encerram em si o foco do livro.

Num dos estudos apresentados, sobre a motivação de crianças para desenhar, criaram-se três grupos,

1 - A quem se prometeu um certificado para que desenhassem.
2 - A quem não se prometeu, mas se deu um certificado por terem desenhado.
3 - Um grupo a quem não se prometeu nada, nem se deu nada.

O primeiro grupo, assim que se retirou a variável do certificado deixou de achar piada a desenhar, e aos poucos acabou por deixar de desenhar. Por outro lado os outros dois grupos, continuaram a desenhar. O que aconteceu foi que se transformou aquela atividade auto-motivada, numa atividade de trabalho. O pior impacto disto, foi que se destruiu a autonomia das crianças do primeiro grupo, porque passaram a ficar dependentes de alguém lhes dizer o que fazer e quando fazer. A motivação intrínseca, ou auto-motivada, foi exteriorizada, ou substituída por um estimulo externo. 
“Try to encourage a kid to learn math by paying her for each workbook page she completes—and she’ll almost certainly become more diligent in the short term and lose interest in math in the long term.”
Assim Pink diz-nos que no curto termo, podemos levar as pessoas a alterar os seus comportamentos. Mas no longo termo isto conduzirá à destruição da autonomia das pessoas, ou seja à destruição da motivação auto-motivada. O grande problema é que para produzirmos grandes obras, para trabalharmos sobre o nosso elemento, descobrimos aquilo que nos move, temos de possuir esta funcionalidade intacta, se esta for corrompida, podemos estar a comprometer o futuro destas crianças.


Segundo Pink as recompensas extrínsecas funcionam para o ser humano como objetivos a atingir, e estes são do pior que pode existir para um trabalho ético. Os objetivos atravessam-se na frente, e levam a que os atletas se dopem, que os alunos façam cábulas, que os economistas façam trafulha nas contas, que uma empresa em função de um deadline descure critérios de qualidade. Os objetivos são geradores de atalhos para atingir os fins. As coisas deixam de ser intrinsecamente motivadas, e passam a estar motivadas por algo externo, sendo então esse algo externo (objetivo) que é preciso atingir a todo o custo.

Deste modo Pink apresenta-nos as recompensas como viciantes em termos de psicologia humana. Dar um caramelo a um filho para levar o lixo, fará com este da próxima vez exija o mesmo caramelo para voltar a levar o lixo. A pessoa passa a assumir aquela tarefa como desprovida de valor, e que precisa de ser recompensada para ser realizada. Com o passar do tempo, e à semelhança de qualquer adição, será preciso pagar cada vez mais, dar mais recompensa para que a pessoa faça a mesma coisa.


Estas são algumas das essências discutidas no livro, fundamentadas com vários estudos. Para abrir o apetite fica uma palestra que Daniel Pink fez na RSA, dessa palestra foi criado um pequeno vídeo de ilustração das principais ideias. Este vídeo tornou-se entretanto no vídeo mais visto da coleção de vídeos ilustrados da RSA, com quase 6 milhões de visualizações.

junho 17, 2011

"The Element" de Ken Robinson

Conheci o trabalho de Ken Robinson através da sua primeira Ted Talk, "Do schools kill creativity?" (2006) que deixou uma impressão profunda só superada pela talk depois ilustrada pela RSA "Changing Education Paradigms" (2010) que vai neste momento com cerca de 4,5 milhões de visualizações. Assistir a estas duas palestras e depois ler, The Element: How Finding Your Passion Changes Everything (2009), é do mais enriquecedor que podemos fazer enquanto tentativa de auto-compreensão.


Deste modo atrevo-me a dizer que The Element é um livro obrigatório para qualquer pessoa, com especial enfâse para os adolescentes que se interrogam sobre quem são, o que fazem aqui, o que devem escolher para o seu futuro. Mas deve ser um livro de cabeceira para todos os professores, os que lidam com estes adolescentes no dia-à-dia, e mesmo os que lidam com eles já na fase adulta (Universidade). E em último lugar, todos os pais, porque saber ajudar não é inato. The Element põe o dedo sobre a questão essencial do ser humano em sociedade, que é, "porque faço aquilo que faço?" Saber a resposta a isto é meio caminho andado para que a vida se possa tornar mais fácil, e simples.


Ken Robinson conta-nos muitas histórias de gente que atingiu o elemento e que à partida nada parecia evidenciar que a isso estariam destinadas, pessoas por vezes incompreendidas pela família, pela escola - Gillian Lynne, Albert Einstein, Matt Groening, Paul McCartney, Nadia Comaneci, Richard Feynman, Ridley Scott, Paulo Coelho, Vidal Sassoon, Richard Branson - mas também muitas pessoas que simplesmente tomaram determinadas decisões na vida e que com isso conseguiram alcançar o desejado elemento. São pessoas que,
"have identified the sweet spot for themselves. They have discovered their Element — the place where the things you love to do and the things that you are good at come together. The Element is a different way of defining our potential. It manifests itself differently in every person, but the components of the Element are universal."
Podemos pensar, pois mas estes são os poucos nascidos para o sucesso, Robinson diz-nos
"Being in our Element depends on finding our own distinctive talents and passions. Why haven’t most people found this? One of the most important reasons is that most people have a very limited conception of their own natural capacities."
O livro pretende dar uma ajuda nesta busca, mas claramente que não é um livro de auto-ajuda, com os passos ou receitas para chegar lá, no essencial Robinson não deixa de dizer,
"Being in your Element often means being connected with other people who share the same passions and have a common sense of commitment. In practice, this means actively seeking opportunities to explore your aptitude in different fields."

Para demonstrar que estar envolvido e engajado é algo sem idade, Robinson fala-nos de uma experiência desenvolvida nos EUA entre uma escola primária e um retiro de idosos. Não resisto a transcrever um grande bocado para aqui, porque foi um dos momentos no livro em que quase me vieram as lágrimas aos olhos. O programa recebeu o nome de Book Buddies e consistia em,
“pair a member of the retirement home with one of the children. The adults listen to the children read, and they read to them... The program has had some remarkable results.
One is that the majority of the children at the Grace Living Center are outperforming other children in the district on the state’s standardized reading tests...
As they sit with their book buddies, the kids have rich conversations with the adults about a wide variety of subjects, and especially about the elders’ memories of their childhoods growing up in Oklahoma. The children ask things about how big iPods were when the adults were growing up, and the adults explain that their lives really weren’t like the lives that kids have now. This leads to stories about how they lived and played seventy, eighty, or even ninety years ago. The children are getting a wonderfully textured social history of their home-towns from people who have seen the town evolve over the decades...
Something else has been going on at the Grace Living Center, though: medication levels there are plummeting. Many of the residents on the program have stopped or cut back on their drugs.
Why is this happening? Because the adult participants in the program have come back to life. Instead of whiling away their days waiting for the inevitable, they have a reason to get up in the morning and a renewed excitement about what the day might bring. Because they are reconnecting with their creative energies, they are literally living longer.
There’s something else the children learn. Every now and then, the teachers have to tell them that one of their book buddies won’t be coming any more; that this person has passed. So the children come to appreciate at a tender age that life has its rhythms and cycles, and that even the people they become close to are part of that cycle.
In a way, the Grace Living Center has restored an ancient, traditional relationship between the generations. The very young and the very old have always had an almost mystical connection.”
Robinson fala-nos muito da educação e do sistema educativo e refere que o futuro da educação não está na estandardização mas sim na personalização. A educação não pode ser vista como um processo ISO de atribuição de qualidade, mas tem antes de ser vista como um processo personalizado, em que cada ser tem um potencial único que precisa de ser descoberto.

Como nota final é importante colocar este livro ao lado de Outliers de Malcolm Gladwell, e perceber quão diferentes são os discursos. De um lado a defesa do trabalho duro e penoso, Gladwell usa os exemplos do trabalho duro nos campos de arroz da Ásia, algo ainda recentemente também defendido por uma professora de Yale num polémico livro lançado nos EUA. A educação rígida, sem espaço para brincar, jogar, ou simplesmente ser. Compare-se isto com o discurso de Ken Robinson, são dois opostos. As pessoas funcionam quando a paixão é tremenda, quando a dedicação é total, quando adoram, quando se apaixonam, quando aquilo que fazem é aquilo que querem fazer em todas as horas do seu dia.


Nota: o livro está já publicado em Portugal pela Porto Editora. 

março 03, 2011

Entrevista de JP Gee: o ensino e os videojogos

James Paul Gee é um dos mais reconhecidos autores na investigação dos videojogos, seus processos de aprendizagem, e impactos para o ensino. Está longe de ser o tipico professor universitário defensor do campo, uma vez que já tem mais de 50 anos. O seu amor aos videojogos apareceu quando começou a presenciar o seu neto de 6 anos a jogar, e começou a tentar acompanhá-lo, percebendo a quantidade de informação e raciocínios que estavam em causam para se conseguir jogar um jogo de modo efectivo. O seu livro What Video Games Have to Teach Us About Learning and Literacy (2003) é uma referência internacional na área, e dezenas de publicações suas podem ser descarregadas directamente do seu site.
Nesta entrevista podemos ver Gee em discurso director falar sobre as suas crenças no uso dos métodos e design dos videojogos para re-criar os modelos de ensino. Não muito distante de Ken Robinson, vem colocar o dedo sobre os problemas da educação actual no que toca à sua incapacidade para gerar espíritos empreendedores e inovadores. Fala-nos sobre as capacidades motivacionais e de formação clara potenciáveis pelos videojogos. No final deixa ainda um alerta relativo aos novos públicos, que serão cada vez mais exigentes, porque têm à sua disposição online, informação capaz de transformar um autodidacta num expert.


"Se queremos ensinar a inovar, temos de mudar os testes, temos de mudar o modo como fazemos avaliação no ensino. O nosso ensino actual baseia-se no facto de que qualquer conteúdo é ensinado ao longo de 12 semanas, e no final fazemos um exame para avaliar se a pessoa aprendeu tudo o que foi ensinado."

"Agora pensem, porque não testamos uma pessoa que jogou Halo e chegou ao final para saber se esta sabe jogar, mas testamos alguém que andou 12 semanas a aprender Álgebra?"

"A resposta é que no caso de Halo não é preciso, porque assumimos que se se conseguiu chegar ao final do jogo é porque aprendeu, de outro modo não teria conseguido lá chegar. Assim o que estamos a dizer é que acreditamos mais no design e aprendizagem de Halo do que no design e aprendizagem da cadeira de álgebra!"

janeiro 08, 2011

"Outliers" de Malcolm Gladwell


Outliers (2008) é um livro interessante que deve ser lido enquanto um livro fruto de investigação jornalística, e não de investigação científica. Outliers como os dois livros anteriores, The Tipping Point (2000) e Blink (2005) de Glawell, está escrito numa prosa muito fluida, estruturalmente progressiva, que nos conduz momento a momento sem espaços vazios. O constante atirar de exemplos, números e estudos de professores universitários, credibiliza e mantém o leitor engajado.

Outliers pretende servir como explicação das pessoas fenómenos de sucesso como Bill Gates ou Mozart, dizendo aquilo que todos já sabemos, que o talento não chega mas que o trabalho duro, o timing e a sorte são essenciais.

O melhor e o pior do livro é a fundamentação que Gladwell cria para explicar o sucesso quase exclusivamente assente sobre a ideia de "trabalho duro". Se por um lado a teoria faz sentido e ajuda a perceber melhor quem eram as pessoas por detrás do fenómeno, por outro lado tenta passar uma ideia de um ideal "comunista". Todos podemos fazer o mesmo, todos podemos ser os melhores, desde que nos esforcemos, desde que trabalhemos muito poderemos fazer o que quisermos. Aliás em certa media, o discurso chega a raiar uma espécie de O Segredo (2006) mas agora com um tom, digamos, realista.

Do lado dos fenómenos, Gladwell vai encontrar várias evidências que parecem demonstrar que o sucesso de pessoas como – Bill Gates, Mozart, Bill Joy, entre outros – assentam na oportunidade que tiveram ao longo da vida para investir "10 mil horas" do seu tempo a realizar uma actividade. E depois usa mesmo vários estudos que suportam esta ideia do número de horas, sendo por vezes referenciado também como "10 anos" de experiência.
"In study after study, of composers, basketball players, fiction writers, ice skaters, concert pianists, chess players, mas­ ter criminals, and what have you, this number comes up again and again. Of course, this doesn't address why some people get more out of their practice sessions than others do. But no one has yet found a case in which true world-class expertise was accomplished in less time. It seems that it takes the brain this long to assimilate all that it needs to know to achieve true mastery." [1]
Contudo isto não explica tudo, existem muitíssimas outras variáveis que não estão a ser levadas em conta e que suportam a razão das 10 mil horas. É isso que eu vejo no gráfico retirado do artigo [2] que suporta as teorias de Gladwell
Aos 8 anos começa a divergência entre o grupo de amadores e profissionais de piano. E era sobre isso que precisávamos de nos interrogar. Perceber qualitativamente porquê. E não apenas olhar para o gráfico, somar as horas e atirar uma conclusão. O que eu aqui vejo é que aos 8 anos, os miúdos já perceberam, sentiram a sua queda, motivação ou se quisermos ser mais espirituais o seu chamamento.


A obsessão de Gladwell é de tal modo que vai ao ponto de levar o estudo à formação das sociedades e comparar os modelos de agricultura medieval da Ásia com a Europa. E referindo sempre como comparação entre os dois mundos, os testes internacionais de matemática, nos quais os alunos asiáticos possuem melhores desempenhos. Para Gladwell, isto está relacionado com o provérbio,
"No one who can rise before dawn three hundred sixty days a year fails to make his family rich"
Foto de samsayer88

Um provérbio de incentivo e motivação que claramente procura aliviar a dureza do trabalho nos campos de arroz, mas que está bem longe da realidade. E mesmo será que ser um bom matemático se restringe a ter bons desempenhos em testes internacionais durante o secundário. E depois desde quando é que ter uma nação de crianças com melhores notas a matemática, lhe confere o título de melhores seres humanos? Gladwell chega mesmo a comparar o número de dias que as crianças americanas (180) passam nas escolas versus as crianças Japoneses (244) e referindo estudos que suportam que as férias grandes não fazem mais que perturbar o regular ensino! Que as férias grandes aparecem, como imitação do descanso dado às terras em pastoreio na Europa, ao contrário dos Asiáticos em que o arroz é plantado em 2 ou 3 sementeiras anuais!

Ou seja, o ideal seria então trabalhar, mais, mais e mais. Mas afinal qual é a definição de pessoa e vida para Gladwell? Viver é trabalhar? Viver é sobreviver? E onde fica a felicidade, será que isso importa para Gladwell.

Por exemplo no caso dado sobre as Escolas americanas e do programa KIPP "Knowledge Is Power Program", dá o exemplo das crianças de 12 anos de Brooklyn, que se levantam às 5h da manhã e passam o dia a trabalhar na escola, deitando-se depois às 23h para acordar no dia seguinte. Tudo isto para poder chegar a obter o mesmo que obtém as crianças com um ambiente "chamado saudável". Isto faz sentido? Faz sentido que uma criança seja "escravizada" em função dos estudos. Para conseguir ir para o liceu, ou possivelmente para a Universidade. Será que aquela criança está talhada para isso. Não poderia aquela criança investir em qualquer outra coisa, que lhe desse tempo para brincar e existir?

Vejamos o caso de Ronaldo, foi para a Universidade? Quantos livros leu? Mas por outro lado investiu muito mais que todos os seus colegas, no número de horas a treinar a prática do futebol, aliás ainda hoje o faz, é visível em todos os documentários que têm sido feitos sobre ele.

Ou seja isto vem comprovar a teoria das 10,000 horas de Gladwell, em que é preciso investir esse tempo para se tornar o Melhor Jogador de Futebol do Mundo de 2009. Mas será que isto nos diz, que se qualquer garoto da Madeira, ou dos Açores, ou e porque não do mundo, treinasse tantas horas como ele conseguiria chegar a ser como ele? Não sei.

Mas talvez se percebermos porque é que o Ronaldo continuava a treinar depois de todos os outros já terem ido para casa jantar, talvez possamos perceber, porque é que todos os outros miúdos não poderiam ser o Melhor Jogador do Mundo. Vejamos então porque é que o Ronaldo treinava mais.

Para percebermos a lógicas da motivação humana, nada melhor que utilizarmos os principios do Game Design, que utilizamos para desenhar um jogo de modo a torná-lo interessante para os jogadores. O que procuramos quando desenhamos um jogo, é criar uma Mecânica de jogo tal, que o jogador não se consiga desligar da mesma. Envolver e persuadir mentalmente o jogador. E todos conhecem essa sensação, de que mesmo quando paramos de jogar, o jogo é de tal modo forte, que continuamos a jogar mentalmente. Assalta-nos o pensamento como uma urgência quase vital, voltar ao jogo, e terminar, acabar com ele.

Jesse Schell, numa conferência sobre os Jogos Sociais e a Gameficiation, vem dizer-nos que os jogos providenciam determinados elementos de interesse para o jogador. Ora esses elementos, não são mais, da minha análise, que os Factores de Motivação do ser Humano.

. Feedback claro
. Sensação de Progresso

. Possibilidade de Sucesso

. Exercitar Fisica e Mentalmente

. Satisfação de Curiosidade

. Hipotese de Resolver um Problema

. Sentimento de Liberdade

Podemos pensar então agora nos treinos de Ronaldo ou nos treinos dos pianistas e pensar: O "feedback" é a condição base de toda e qualquer acção humana sobre o meio, porque é a reacção à nossa acção. Mas o mais interessante, é a "Sensação de Progresso". As pessoas continuam a jogar, apenas e só se sentirem que estão a progredir no jogo. Ora é exactamente isto que acontece com os pianistas e com o Ronaldo. Estes aumentam o investimento de tempo, porque sentem que a sua performance está a progredir. Mais, sentem que existe “Possibilidade Sucesso”, tanto nos objectivos que se autopropõem como nos objectivos impostos pela sociedade (ser eleito pela FIFA).

As actividades que nos permitem "exercitar física ou mentalmente", funcionam como desafios às nossas capacidades, e como tal servem por si de motivadores. Por sua vez o atingir dos objectivos, a resolução dos exercícios mentais ou físicos contribuem com resolução, ou seja "satisfazem a curiosidade" e ao mesmo tempo podem "permitir resolver problemas" que até aí tenham sido dificieis para o jogador, ou mais, que se saiba que são muito difíceis em geral. Saber se consigo marcar um golo de 40 metros de distância com barreira, ou saber se consigo tocar o Rach 3.

Finalmente a satisfação de todas as condições anteriores confere um claro "sentimento de liberdade", porque o domínio, da arte, estas ou outras, permite que a pessoa sinta que tudo pode fazer naquele campo, que é livre, que não está aprisionada nas limitações das suas capacidades mentais ou físicas.

Ou seja, não é apenas trabalhar mais, mas ter uma Vontade maior. Mas como é que se cria essa Vontade? A explicação está para mim em Ken Robinson que ao contrário de Gladwell acredita mais no indivíduo e menos na igualdade das massas. Acredita que todos nós podemos e devemos encontrar a arte em que podemos ser os melhores. Se o que faço quando toco um piano não me motiva, começo a desistir, e deixo de investir horas. Isto não tem nada que ver com ser preguiçoso. Isto tem que ver com capacidades, talentos e modelações dos nossos cérebros. E por isso acredito mais em Ken Robinson do que em Gladwell. Como nos vem dizer Steven Pinker, um dos maiores defensores da teoria de que não nascemos como tábuas rasas para a vida [4], o problema de Gladwell é que
“when a writer’s education on a topic consists in interviewing an expert, he is apt to offer generalizations that are banal, obtuse or flat wrong (...) the problem with Gladwell’s generalizations about prediction is that he never zeroes in on the essence of a statistical problem and instead overinterprets some of its trappings.” [3]


[1] Daniel J. Levitin, This Is Your Brain on Music: The Science of a Human Obsession, NewYork, Dutton, 2006, p.197.
[2] K. Anders Ericsson, Ralf Th. Krampe, and Clemens Tesch-Rômer,
The Role of Deliberate Practice in the Acquisition of Expert Performance, Psychological Review 1 0 0 , no. 3 (1993): 363-406.
[3] Steven Pinker, (2009),
Eclectic Detective, in New York Times, November 7, 2009 http://www.nytimes.com/2009/11/15/books/review/Pinker-t.html
[4] Steven Pinker, (2002),
The Blank Slate: The Modern Denial of Human Nature, Penguin

janeiro 03, 2011

Criatividade e Storytelling

Imagem de Christine

Para começar bem o ano aqui ficam três palestras sobre o assunto que mais vai ocupar o meu ano de 2011, a Criatividade e o Storytelling. Depois de muito termos ouvido Ken Robinson falar sobre a criatividade e a educação, vale a pena escutar dois designers consagrados - John Maeda e Stefan Sagmeister - e um verdadeiro storyteller - Jay O'Callahan. Os três estiveram na conferência 99% de 2010 organizada pela Behance Network, uma rede dedicada a quem trabalho nas áreas criativas. O lema da conferência é nem mais,

"It's time to stop dreaming and start doing"


John Maeda: Looking for Superman



Stefan Sagmeister: Don't Take Creativity For Granted


Jay O'Callahan: The Power of Storytelling

outubro 17, 2010

ser criativo, ou ser educado / formatado


Para quem está interessado em perceber em maior profundidade o que é um Sistema Educativo Público ou de Massas. Para quem se interroga porque é que os seus filhos não reagem como "esperado" na escola mesmo quando trabalham e por vezes até são medicados. Para quem acredita que o mundo mudou e não vai parar de mudar. Os elementos (entrevistas, comunicações, animações, artigos, filmes) que vos trago neste texto debatem a base do sistema educativo, o seu aparecimento, objectivos e o modo como isso afectou a sociedade.

Numa entrevista dada aquando da passagem por Portugal Alvin Toffler e a sua mulher expõem por completo o mito da Escola. Por sua vez Sir Ken Robinson partindo desta exposição feita por Toffler explica os problemas graves do sistema e o modo como isso nos afecta. Finalmente um artigo de Peter Gumbel apresenta-nos o caso concreto da França que levou este sistema até ao limite e no qual os problemas são hoje mais do que muitos. Para fechar este texto sugiro a visualização de Entre les Murs (2008), um filme poderoso sobre o que se passa socialmente dentro de uma sala de aulas.

Este vídeo mostra apenas 10 minutos de uma palestra de 55 minutos dada por Ken Robinson em 2008 na Royal Society of Arts aquando recebeu a RSA Benjamin Franklin Medal de 2008. Por outro lado Ken Robinson já tinha sido revolucionário quando em 2006 apresentou a sua primeira TED Talk na qual "afirma que as escolas matam a criatividade". Depois veio a sua segunda Ted Talk em Fevereiro deste ano, "Façamos a revolução da aprendizagem!"

Num artigo publicado este mês na Time, é analisado o estado do sistema educativo Francês, um sistema muito próximo do Português. Destaco algumas das partes mais importantes deste artigo


Andreas Schleicher, head of the OECD's educational division, says France still uses "19th century industrial methods" in the classroom, by which he means teachers are reduced to factory-line workers who must carry out orders rather than be trusted to use their intelligence and training.

In international comparative tests of 15-year-olds, France's overall scores are at best mediocre and have been dropping abruptly in the past decade.

...according to the Organization of Economic Cooperation and Development (OECD), requiring students to repeat a year is a rarity in Asia, Scandinavia and Eastern Europe, and it's no longer all that widespread in the U.S. or Britain. Numerous studies from around the world demonstrate that grade repetition doesn't usually help students perform better and often has the opposite effect, demoralizing and stigmatizing them as failures.

What's sorely missing is any sense of fun. Unlike in the U.S., school in France provides almost no nonacademic activities to compensate for brainy classroom work. Sports, music and art are afterthoughts, with little or no time devoted to them in the national curriculum; if you want to play soccer or the violin, the thinking goes, you can do that on your own time. But without sports teams or school orchestras, there's little that binds adolescents to their schools.

The director of a middle school near Nîmes, Robert tried to bring about a cultural revolution there, including refusing to force students to repeat grades. It backfired: he set off a full-blown teacher revolt and was quickly shifted to another establishment.
Entretanto para quem ainda não tiver visto, aconselha-se vivamente Entre les Murs (2008) de Laurent Cantet, Palma de Ouro em Cannes 2008 e que mostra o dia-a-dia de uma turma de um liceu francês. Veja-se o filme com o espírito aberto e atente-se nas questões daqueles rapazes e raparigas. Mais que tudo perceba-se o impacto da estandardização procurada sobre os seres humanos e a fundamentação para esse propósito.

maio 24, 2010

Educação: a importância de amar o que fazemos

Depois de uma das mais brilhantes TED talks realizada em 2006, Do schools kill creativity? (2006), Ken Robinson traz-nos agora uma espécie de segunda parte dessa palestra, agora com o título Bring on the Learning Revolution! (2010).



Não é tão brilhante como a primeira, o que não admira, mas toca em pontos novos e sobre os quais vamos precisar de começar a reflectir muito em breve no que toca à educação e a todo do sistema educativo. Aliás esta e a outra, são palestras que os conservadores portugueses auto-denominados de intelectuais "anti-eduquês" deveriam ouvir e encarar com muita atenção.

Robinson começa por dividir o mundo em dois tipos de perfis:

"- as pessoas que não gostam do que fazem, que aguentam apenas fazer o que fazem à espera que chegue o fim de semana.
- e as pessoas que adoram o que fazem, e são incapazes de fazer qualquer outra coisa durante todos os seus minutos."

Uma divisão que vai justificar o seu pensamento mais à frente quando nos dirá que não precisamos de ir todos para a Universidade, que podemos ser excelentes pessoas, realizadas e com sucesso fazendo muitas outras coisas. Aqui ela vai tocar na questão da "tirania do Senso Comum" como aquilo que nos impele a fazer o mesmo que todos os outros porque é a única maneira, destruindo pela raiz a fonte da Inovação. E daqui vai até às questões conservadoras de "LINEARIDADE" em que tudo no mundo precisa de uma ordem lógica em que o orgânico é difícil e pior que isso, como algo incorrecto por não ser facilmente compreensível pelo senso comum. Com isto diz-nos algo muito importante:

"as comunidades humanas dependem de uma grande diversidade de talentos, e não de uma concepção singular da habilidade"

"a razão pela qual muita gente sai da escola é porque esta não preenche o seu espírito, não preenche a sua energia, a sua paixão... precisamos de deixar para traz este modelo industrializado da escola que conduz as pessoas apenas através da linearidade e do conformismo... precisamos de transformar a escola de um modelo de indústria num modelo de agricultura, onde se criem condições para que os talentos naturais das crianças possam florescer"

outubro 13, 2007

Arte, inteligência e a natureza

Profunda, tocante e ao mesmo tempo marcando uma diferença através do alto valor de entretenimento que o orador lhe confere. Segundo a TED "If you have not yet seen Sir Ken Robinson's TED talk, please stop whatever you're doing and watch it now."


Ken Robinson vem ligar as teorias da criatividade já aqui citadas em parte aquando do lançamento português do livro de Bruno Munari, Fantasia, com as teorias sobre o modelo das inteligências múltiplas, defendendo que não podemos ser todos orientados para a profissão de professor universitário.


Aliás este é um discurso decalcado exactamente das questões levantadas pela teoria das múltiplas inteligências de Howard Gardner e desse modo ambos defendem que o nosso sistema educativo está inteiramente forjado nessa base. No início Gardner, que lançou o seu livro Frames of Mind: The Theory of Multiple Intelligences em 1983, definiu a existência de sete manifestações da nossa inteligência
1. Linguistic intelligence ("word smart")
2. Logical-mathematical intelligence ("number/reasoning smart")
3. Spatial intelligence ("picture smart")
4. Bodily-Kinesthetic intelligence ("body smart")
5. Musical intelligence ("music smart")
6. Interpersonal intelligence ("people smart")
7. Intrapersonal intelligence ("self smart")
Sendo que as primeiras duas são aquelas a que normalmente o modelo tradicional académico atribui valor, as seguintes três são associadas às artes e as últimas duas são as chamadas inteligências pessoais e que estão ligadas a capacidades de gestão ou liderança social. Desta forma a questão que aqui se levanta e que está na raiz de todo este problema é o da "cultura versus biologia". Até onde podemos ir com o pensamento de que todos os seres humanos são iguais a ponto de os poder colocar aos magotes dentro de uma área fechada e "obrigá-los" a reagir de formas semelhantes aos mesmos estímulos?
"In the heyday of the psychometric and behaviorist eras, it was generally believed that intelligence was a single entity that was inherited; and that human beings - initially a blank slate - could be trained to learn anything, provided that it was presented in an appropriate way. Nowadays an increasing number of researchers believe precisely the opposite; that there exists a multitude of intelligences, quite independent of each other; that each intelligence has its own strengths and constraints; that the mind is far from unencumbered at birth; and that it is unexpectedly difficult to teach things that go against early 'naive' theories of that challenge the natural lines of force within an intelligence and its matching domains." (Gardner 1993: xxiii) [1]
Aliás veja-se as mais recentes descobertas da neurociência [2] que vem cavalgando a confirmação das teorias que olham para o ser humano como alguém que nasce à partida condicionado por certas limitações assim como imbuído de certas potencialidades. Potencialidades e limitações, denominadas de wired, ou seja pré-inscritas na nossa rede neural e que são grande parte das vezes explicadas por teorias da biologia evolucionista [3], através das quais as nossas qualidades enquanto seres-humanos são aperfeiçoadas pela hereditariedade ao longo da história ou seja pela selecção natural, pela sobrevivência daqueles que melhor se adaptam às necessidades do ecossistema, o que faz todo o sentido. O normal é então que todas as áreas se conjuguem e que nós humanos possamos viver em harmonia com capacidades e limitações que se equivalam. O que acontece é que por vezes existem desequilíbrios que podem verter para o lado positivo (Sócrates, Jesus ou Einstein) como para o lado negativo (Pizarro, Hitler ou Ceausescu). O mais recente estudo comprova a influência que o mapa genético tem sobre as nossas escolhas de interesse básicas. O estudo centra-se sobre o teste do "ultimatum game" no qual um dos sujeitos faz uma proposta de divisão, a dois, de um valor em dinheiro (que não será os fifty-fifty) e caso o outro sujeito recuse a oferta, ambos perdem o dinheiro. Então o que acontece é que,
"Experimental evidence suggests that many people are willing to deviate from materially maximizing strategies to punish unfair behavior. Even though little is known about the origins of such fairness preferences, it has been suggested that they have deep evolutionary roots and that they are crucial for maintaining and understanding cooperation among non-kin. (..) Employing standard structural equation modeling techniques, we estimate that 40% of the variation in subjects' rejection behavior is explained by additive genetic effects. Our estimates also suggest a very modest role for common environment as a source of phenotypic variation. Based on these findings, we argue that any attempt to explain observed ultimatum bargaining game behavior that ignores this genetic influence is incomplete." [5]
O que vem recolocar em questão o factor cultura e o factor biologia. Posto tudo isto, é interessante pensar na pirâmide que Robinson descreve sobre os valores que a sociedade pós-industrial impôs para as áreas de estudo:
Matemática e Línguas > Ciências Humanas > Artes
Segundo Robinson esta ordem é condicionada pelos trabalhos de utilidade perante a sociedade e capazes de gerar retorno financeiro imediato o que está em completo acordo com a divisão das inteligências feitas por Gardner. As artes e a cultura não têm a capacidade, pelo menos em modelos do imediato, de trazer retornos concretos. E no entanto, analisada a sociedade em que vivemos, vamos ver uma vez mais que este é mais um dos discursos mascarados no sentido de "encarneirar" tudo e todos numa mesma fila e com um mesmo objectivo. Se não vejamos os resultados de um dos maiores estudos encomendados pela EU, The economy of culture in Europe, realizado sobre os efeitos económicos das actividades culturais sobre a sociedade europeia. Para ter uma noção da abrangência de actividades tida em conta neste estudo, deixo aqui um mapa de actividades do estudo publicado no Público.
"The figures supplied by the study confirm that the cultural and creative sector in Europe is outperforming other sectors: while over two million people work directly for the automotive industry – one of Europe's key industrial sectors – creative industries employ close to six million.

The turnover of European cultural industries amounted to EUR 654 billion in 2003, while the car manufacturing industry amounted to EUR 271 billion in 2001; the cultural industries contributed to 2.6% of EU GDP in 2003, while the food, beverage and tobacco manufacturing sector contributed 1.9%; the overall cultural industries growth between 1999 and 2003 is 12.3% higher than the growth of general economy. Cultural industries employed a conservative 5.8 million people, 3.1% of total EU25 population, in 2003." [4]
Afinal parece que apesar de toda pressão genocida sobre o pensamento e actividades ditas não nobres, não tem tido o efeito desejado, e só posso dizer para além de, felizmente, que "nature always finds a way".

[1] http://www.infed.org/thinkers/gardner.htm
[2] Neuroscience
[3] Evolutionary biology
[4] Philippe Kern
[5] Heritability of ultimatum game responder behavior