junho 26, 2012

modos operacionais da Criatividade

John Cleese é conhecido por ter feito parte dos Monty Python, mas é uma pessoa com pensamento próprio, além do humor, capaz de realizar meta-humor e teorizar sobre o acto de que aqui falamos, a criatividade. Trata-se de uma comunicação realizada em 1991, por isso algo datada, mas talvez não tanto como iremos ver.


Cleese começa por dizer-nos que a ciência à volta da Criatividade, não mudou muito nos últimos anos, e de certo modo terá estagnado nos anos 60, o que talvez não seja mentira. A verdade é que ainda hoje em 2012, olhamos para a criatividade como algo misterioso, quando na verdade não existe muito aqui para descobrir ou descortinar. Destaco partes da comunicação directamente aqui para o texto, para que se possa ter uma ideia do que é dito e ao mesmo tempo possa ajudar-nos a criar uma estrutura da comunicação como um todo. Assim Cleese começa por dizer aquilo que a criatividade não é,
“Creativity is not a talent, it is a way of operating…creativity is not an ability that you either have or not have, it is for example and this may surprise you, absolutely unrelated to IQ, provided you’re intelligent above a certain minimal level that is, but McKinnon showed in investigating scientists, architects, engineers and writers that those regarded by their peers as most creative were in no way whatsoever different in IQ from their ‘less creative’ colleagues. So in what way were they different? Well, McKinnon showed that the most creative had simply acquired a facility for getting themselves into a particular mood, a way of operating, which allowed their natural creativity to function…indeed he described the most creative when in this mood as being childlike, that they were able to play with ideas, to explore them, not for any immediate practical purpose but just for enjoyment, play for its own sake.”
Daqui vai passar a definir então que modo é este que algumas pessoas adquiriram e que lhes permite serem de certo modo mais criativas. Cleese descreve este modo como um sistema, com duas posições, aberto e fechado.


Modo Fechado
"I mean the mode that we are in most of the time when at work. We have inside us a feeling that there's lots to be done and we have to get on with it if we're going to get through it all. It's an active (probably slightly anxious) mode, although the anxiety can be exiting and pleasurable. It's a mode which we're probably a little impatient, if only with ourselves.  It has a little tension in it, not much humor.It's a mode in which we're very purposeful, and it's a mode in which we can get very stressed and even a bit manic, but not creative."

Modo Aberto 
"By contrast, the open mode, is relaxed… expansive… less purposeful mode… in which we're probably more contemplative, more inclined to humor (which always accompanies a wider perspective) and, consequently, more playful. It's a mood in which curiosity for its own sake can operate because we're not under pressure to get a specific thing done quickly. We can play, and that is what allows our natural creativity to surface."
Cleese explica que apesar de o modo Aberto ser o que conduz ao momento criativo, não podemos operar sempre nesse modo, pois o momento da implementação precisa de focagem, precisa de fechar para poder proceder à construção e descrição da ideia. Ora o que nos falta é saber como podemos potenciar o Modo Aberto, e sobre isso Cleese descreve um conjunto de 5 factores: Espaço, Tempo, Tempo, Confiança e Humor.


1 - Espaço
"Let's take space first: you can't become playful and therefore creative if you're under your usual pressures, because to cope with them you've got to be in the closed mode.
So you have to create some space for yourself away from those demands. And that means sealing yourself off.
You must make a quiet space for yourself where you will be undisturbed."
2 - Tempo
"It's not enough to create space, you have to create your space for a specific period of time. You have to know that your space will last until exactly (say) 3:30, and that at that moment your normal life will start again.And it's only by having a specific moment when your space starts and an equally specific moment when your space stops that you can seal yourself off from the every day closed mode in which we all habitually operate."
"So combining the first two factors we create an "oasis of quiet" for ourselves by setting the boundaries of space and of time."
3 - Tempo
"Most creative professionals always played with a problem for much longer before they tried to resolve it, because they were prepared to tolerate that slight discomfort and anxiety that we all experience when we haven't solved a problem.You know I mean, if we have a problem and we need to solve it, until we do, we feel (inside us) a kind of internal agitation, a tension, or an uncertainty that makes us just plain uncomfortable. And we want to get rid of that discomfort. So, in order to do so, we take a decision. Not because we're sure it's the best decision, but because taking it will make us feel better.Well, the most creative people have learned to tolerate that discomfort for much longer. And so, just because they put in more pondering time, their solutions are more creative.The third factor that facilitates creativity is time, giving your mind as long as possible to come up with something original."
4 - Confiança
"When you are in your space/time oasis, getting into the open mode, nothing will stop you being creative so effectively as the fear of making a mistake.Now if you think about play, you'll see why. To play is experiment: "What happens if I do this? What would happen if we did that? What if…?"The very essence of playfulness is an openness to anything that may happen. The feeling that whatever happens, it's ok. So you cannot be playful if you're frightened that moving in some direction will be "wrong" -- something you "shouldn't have done.So you've got risk saying things that are silly and illogical and wrong, and the best way to get the confidence to do that is to know that while you're being creative, nothing is wrong. There's no such thing as a mistake, and any drivel may lead to the break-through."
5 - Humor
"Well, I happen to think the main evolutionary significance of humor is that it gets us from the closed mode to the open mode quicker than anything else.I think we all know that laughter brings relaxation, and that humor makes us playful, yet how many times important discussions been held where really original and creative ideas were desperately needed to solve important problems, but where humor was taboo because the subject being discussed was  "so serious"?No, humor is an essential part of spontaneity, an essential part of playfulness, an essential part of the creativity that we need to solve problems, no matter how 'serious' they may be.So when you set up a space/time oasis, giggle all you want."
A conferência tem cerca de 35 minutos, e pode ser vista na íntegra no vídeo abaixo. Aí poderão encontrar muito mais coisas, para além do que aqui resumo a partir das palavras de Cleese, poderão ouvir por exemplo muitas piadas sobre o modo como se Muda uma Lâmpada :)



[O texto da comunicação foi copiado da transcrição online]

a rejeição do dogmatismo

Mais um interessante trabalho que nos surge a partir da Bezalel Academy of Art & Design, Israel. Stairs To No End (2011) é o filme de graduação de Daniella Koffler que nos fala da busca pelo conhecimento, pela verdade, apresentando essa busca sob forma de parábola, numa luta contra um pai dogmático e fundamentalista.

"Stairs to No End” is a children's tale for adults, about the freedom to ask questions and the rejection of dogmatic thought.
É um pequeno filme que vale fortemente pela mensagem, a autora refere mesmo a influência de Richard Dawkins e o seu livro The God Delusion. Em termos artísticos o filme foi criado numa base 3d, mas com uma estética 2d, no entanto o que sobressai é a técnica experimental de uso de caras/olhos de pessoas reais para dar expressividade aos personagens. Não é novidade, mas o efeito conseguido é sui generis, por vezes até um pouco perturbador, mas interessante.

Stairs To No End (2011) de Daniella Koffler

[Via Short of the Week]

nova série do Homem-Aranha é arte nacional

Nuno Plati é o illustrador nacional que assegura a arte da nova série mensal do Homem-Aranha, Marvel Universe - Ultimate Spider-Man. Esta série é baseada na nova animação do herói que passa na televisão americana.


Na excelente entrevista que agora deu a James Harvey do Marvel Animation Age, Nuno Plati dá detalhes sobre o seu background e como atingiu este pico da sua carreira. Formado em Belas Artes na Universidade de Lisboa, começou por criar ilustração para a Elle e Cosmopolitan nacionais. A partir daí lançou-se no normal trabalho freelancer de criação de arte para capas de livros, storyboards, referindo colaborações com o brilhante estúdio de animação Axis Animation. Daí começou a envolver-se cada vez mais com a Marvel fazendo vários trabalhos até chegar aqui.


Leiam a entrevista, admirem o trabalho no DeviantArt e claro comprem os livros, valem a pena. É muito interessante perceber como o Homem-Aranha assume um novo traço, e como isso dá nova vida ao personagem.

junho 25, 2012

filme do universo das marcas

Logorama (2009) ganhou o Oscar de melhor curta-metragem de animação em 2010, entre outros prémios. Não sei como me passou despercebido mas é um filme essencial para todos os que trabalham no campo da comunicação.


O filme representa uma banal perseguição de carros, típica dos cinema de Hollywood, o interessante aparece na forma como a cidade, os personagens, e os elementos foram representados. Todos os elementos do filme fazem parte do universo dos logotipos e marcas de empresas e instituições globais.



Assim o filme reveste-se de um enorme potencial de análise e discussão sobre por exemplo o pós-modernismo (Fredric Jameson), a hiper-realidade (Baudrillard), o mito (Barthes), o simólico (Peirce), o ideológico (Althusser), e muitos mais, sem claro esquecer o manifesto No Logo (1999) de Naomi Klein. Impressiona ver o filme, e reconhecer de forma quase imediata cada um dos personagens, cada símbolo, cada objecto, cada cor. Fica bem evidente o poder e a presença destas marcas na nossa cultura.



Mas o filme do colectivo H5 é enquanto obra audiovisual muito rica em termos criativos, na forma como faz surgir cada uma das marcas, como se socorre de associações de ideias e contextos subjacentes a cada marca para nos questionar. Não se trata simplesmente de criar um mundo feito de logotipos, mas é muito mais do que isso, temos aqui uma narrativa bem entrosada, desenvolvida a partir de centenas, ou talvez milhares, de elementos dispersos da nossa cultura, que no conjunto formam um mundo narrativo credível e fascinante.

Logorama (2009) de François Alaux, Hervé de Crécy e Ludovic Houplainé

junho 24, 2012

EteRNA, jogos ao serviço da ciência

Depois do revolucionário jogo Fold.It que permitiu avançar a investigação no campo do cancro com recurso ao investimento de milhares de jogadores online, temos agora EteRNA. Um projecto desenvolvido conjuntamente pelas Universidades de Stanford e Carnegie Mellon, financiado pela NSF, e disponibilizado em modo Creative Commons. Estes jogos colocam cada vez mais em evidência o verdadeiro espírito da Inteligência Colectiva.


EteRNA usa uma base de jogo muito similar a Fold.It, no qual o jogador é levado a criar novos desenhos de RNA sintética, contribuindo assim para a primeira grande base de dados internacional. O RNA é uma espécie de primo do DNA, referido por vezes por Matéria Negra da Biologia. Constituido por 4 elementos base, temos de construir novas ligações, decifrar puzzles visuais e ajudar a assim a desenvolver possíveis novas abordagens de síntese do RNA que poderão ser úteis no tratamento de doenças como o HIV. Mais detalhe sobre o que está em causa aqui pode ser visto na própria página do jogo.


É muito fácil começar, até o registo está facilitado porque podemos entrar com o login do Facebook. Somos iniciados no processo com um tutorial interactivo, e depois disso é continuar a jogar para ajudar a investigação.

junho 23, 2012

curtas de animação para a escola

O Bristish Film Institute (BFI) é reconhecido, entre outras coisas, pelo seu trabalho em prol da literacia audiovisual. Ao longo dos últimos anos tem criado inúmeros materiais de suporte ao uso do cinema como objecto de aprendizagem. Nesse sentido são bem conhecidas as colectâneas de curtas metragens que têm saído em DVD do BFI: Ciné-minis, Story Shorts, Story Shorts 2, Starting Stories e Starting Stories 2.

La Queue de la Souris (2008) de Benjamin Renner 

A colectânea Ciné-minis: Short French Films for Language Learning and Literacy (2010) é a mais recente, e está particularmente dirigida para a aprendizagem de língua estrangeira, neste caso o francês, mas os filmes têm muito mais para dar às crianças que os virem. O dvd vem acompanhado com guias para uso dos filmes em sala de aula para cada filme.


Interessante porque tive o prazer de conhecer o mentor deste projecto Mark Reid em 2009 quando esteve em Itália no Second Congress on Media Literacy, aonde esteve para receber o prémio Evens Prize for Media Education 2009, em ex-aequo com a minha colega Sara Pereira. O projecto da Sara, trabalhava a ideia de booklets distribuídos com jornais e pode agora ser integralmente visto online. O projecto do Mark trabalhava o uso de curtas metragens na escola, acabando por se concluir neste Ciné-minisDesta colectânea destaco os filmes de animação, que na sua generalidade são filmes adaptados de livros ilustrados, e deixo links para os restantes. Vejam todos, mas particularmente La Queue de la Souris e Le Loup Blanc.

La Queue de la Souris (2008) Benjamin Renner


Le Loup Blanc (2006) Pierre Luc Granjon [filme integral]


Le génie de la boîte de raviolis (2006) Claude Barras


Bouts en Train (2006) Emilie Sengelin


Le Bon Numéro (2005) Aurélie Charbonnier

Os restantes filmes, são em imagem real e podem ser encontrados online à excepção de Tarif Unique (2004) de Alexandre Coffre. StrictEternum (2005), Didier Fontan; Un bisou pour le monde (2007), Cyril Paris; Les Crayons (2005), Didier Barcelo; Regards libres (2005), Romain Delange; Le Baiser (2005), Stefan Le Lay, 00H17 (2005) Xavier De Choudens.

junho 22, 2012

destruído por dentro

Um filme curto, mas poderoso, vale a pena guardar 5 minutos em privado, e em silêncio. Apreciem a beleza da natureza e da cinematografia, e envolvam-se com a capacidade do espírito humano para encontrar motivação dentro de si, e continuar. A síntese está nesta última frase,

“I’ve shared a rope with 19 people who are now dead”


junho 21, 2012

Porque Criamos?

Poucas vezes pensamos na razão pela qual criamos. Why Man Creates (1968) é um dos poucos filmes realizados por Saul Bass, reconhecido designer de genéricos cinematográficos, e é um filme que coloca a questão de modo directo, indagando sobre as possíveis respostas.


Why Man Creates (1968) ganhou o Oscar para melhor documentário curto em 1968, e depois disso foi durante mais de uma década utilizado como referência nas escolas básicas americanas. É um filme com forte valor educacional, mas para além disso no campo estético é um artefacto de excelência. Podemos encontrar vários momentos de expressão audiovisual que ainda hoje contém um carácter perfeitamente atual e diria mesmo ainda capaz de surpreender. Claramente que se sente um ritmo mais clássico, ou seja pausado e lento, estamos nos anos 1960, mas nem por isso enfadonho para a nossa época. O que me leva defender a continuidade da sua recomendação para uso nas escolas.




O filme desenvolve-se em oito partes: O Edifício, Deambulação, O Processo, Juízo, A Parábola, Divagação, A Busca, e A Marca. Sendo que a última parte, da Marca, serve de síntese e conclusão sobre as possíveis resposta à questão de partida. Uma conclusão que é muito clara e bastante evidente, e acredito que para muitos custe até a aceitar, que tudo se resuma a apenas isto, a Expressão Humana. Mas é verdade que quanto mais os anos passam, e mais trabalho neste campo, mais certezas tenho de que a resposta está mesmo à nossa frente.
"Man has struggled against tie, decay, destruction, against death. 
Some have cried out in torment and agony.
Some have fought with arrogance and fiery pride.
Some challenge the Gods, matching power with power.

Some have celebrated life.
Some have burned with faith.
Some have spoken in voices we no longer understand.

Some have spoken eloquently.

Some have spoken inarticulately, some haltingly.

Some have been almost mute.
 
Yet among all the variety of human expression, a thread of connection, a common mark can be seen. That urge to look into oneself and out at the world and say: 
This is what I am. I am unique. I am here. I am."

Why Man Creates (1968) de Saul Bass

Pensar criando com as mãos

Muito bom este pequeno documentário Power of Making criado pelo museu britânico de arte e design Victoria & Albert. Quatro criadores são entrevistados enquanto criam e produzem, com as próprias mãos. Falam-nos dos seus processos de criação, de como chegam à originalidade, de como raciocinam e criam.


Um documentário que põe em evidência o facto do raciocínio abstracto não ser o único importante, nem único capaz de gerar bem-estar, ou se quiserem riqueza. Aliás esta deformação do pensamento da sociedade está bem patente no final do filme quando o criador de componentes anatómicas para implantes hospitalares diz o seguinte,
"I remember one time, when some kids came to the studio, and they informed us that they thought we were very poor, because we were working with our hands."
É isto que se ensina às crianças nas escolas clássicas, é isto que elas percepcionam quando o que está em causa em todo o processo de aprendizagem é apenas responder de forma correcta a meia dúzia de questões num exame escrito. O que elas não sabem, é que aquilo que estão a conceber como mundo, vai servir-lhes apenas se continuarem no mundo académico. No dia em que saírem da redoma de vidro protegida pelos muros das escolas, vão perceber o quão diferente é o mundo.


E é isto que é preciso que as pessoas compreendam. Que nem todos podem fazer o mesmo, porque simplesmente não são capazes. Uma designer de sapatos poderá ter dificuldade em interpretar os Lusíadas, assim como um matemático brilhante dificilmente conseguirá desenhar os componentes anatómicos necessários à reconstrução de corpos desfigurados todos os dias nas estradas nacionais.


Dizer que quem pensa abstractamente bem é mais importante do que quem constrói com as mãos, não é apenas um erro, é discriminatório e segregacionista.