julho 29, 2010

Versões, Media e Hiper-realidade


Registo aqui um ensaio audiovisual de Oliver Laric sobre as questões de reprodução, apropriação e cópia da representação. Versions (2010) toca sobre várias pontos fulcrais numa cultura suportada pela imagem, suportada pela exteriorização do pensamento sobre o próprio pensamento, aonde cada vez mais o real deixa de se mostrar.

"The theory that they were made using a pointing machine invented in the 18th century for making mechanic exact copies has been discredited."

O real é agora a nossa construção do mesmo, e é sobre ela, a representação, que nos baseamos, e é sobre ela que nos sedimentamos. A realidade deixou de nos chegar como estimulante, e precisamos antes de nos alimentar das suas construções e reconstruções. As convenções e as formatações dão lugar à realidade que por sua vez progridem e se transformam ao sabor dos ventos, enquanto a realidade vai ficando velha, porque imutável, porque fiel...

"There is more work in interpreting interpretations than in interpreting things... and more books about books than any other subject."


A quem interessar o assunto e pretenda ir mais fundo na interpretação, da interpretação da interpretação ficam duas referências seminais:

Simulacra and Simulation, (1985) de Jean Baudrillard, editado em Portugal pela Relógio d'Água

The Work of Art in the Age of Mechanical Reproduction, (1936) de Walter Benjamin, editado em Portugal como capítulo do livro "Sobre Arte, Técnica, Linguagem e Política", (p.93-114), pela Relógio d'Água


Sugestão vídeo enviada por João Martinho.

julho 24, 2010

Doutoramento em Interactividade e Audiovisual

Doutoramento na U. Minho com especialidades em
Media Interactivos e Comunicação Audiovisual

Abrem dia 26 Julho 2010 as candidaturas à segunda edição do curso de doutoramento em Ciências da Comunicação da Universidade do Minho, que tem como áreas de especialidade os Media Interactivos e a Comunicação Audiovisual

A este concurso poderão concorrer, até 7 de Setembro, todos os candidatos interessados que reúnam os requisitos constantes do Edital. No caso de as vagas não terem sido preenchidas, haverá uma nova fase que irá de 27 de Setembro a 1 de Outubro. As condições de acesso e o modo de proceder podem ser consultados AQUI.

Para mais informações: secposgrag@ics.uminho.pt | (+351) 253 604 696.

julho 22, 2010

Cinematografia por Fernando Martins

O meu post sobre a eleição das melhores cinematografias da década 1998-2008 gerou alguns comentários e discussões de e-mail muito interessantes a propósito do meu comentário sobre o segundo classificado da lista, Children of Men (2006), ver trailer abaixo.


Como tal e tendo pedido autorização ao autor, transcrevo aqui parte do que foi dito entre comentários e e-mail pelo Fernando Martins (aka VirtualFM) que me parece interessante e relevante para tudo o que venho colocando e discutindo neste blog.

Quero no entanto alertar para quem ainda não viu o filme e o pretenda ver que o texto que se segue contém spoilers (divulgação de factos centrais da narrativa) tanto em forma de texto como nos vídeos e imagens apresentadas.

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Cinematografia de Children of Men
, Fernando Martins

"Cinematografia" não se refere apenas a lentes, cores, profundidade de campo e outras coisas que mais se confundem com "Fotografia", mas sendo de Cinema que se trata (e por isso se chamar "Cinematografia" e não "Fotografia") tem de ser ter em consideração, e muita, a movimentação de câmara e a forma como os acontecimentos se vão desenrolando na tela, criando emoções no espectador, sejam elas suspense, surpresa, medo ou alegria.

O "Children of Men" ficou-me gravado na memória precisamente devido a umas quantas cenas ÚNICAS, sendo a maior parte delas gravadas numa única sequência sem cortes. Há pelo menos 4 assim, e uma delas demora à volta de 7 minutos, que inclui entrar e sair de veículos e de edifícios, com tiros, explosões e muita acção a decorrer [ver cena completa no YouTube]. Segundo consta, para se filmar esta sequência foram necessários 14 dias de preparação e ensaios, e cada vez que se tentava re-filmar a cena demorava 5 horas de preparativos. Essa foi a que, na altura em que estava a ver o filme, me chamou mais a atenção porque se “sentia” que se estava a fazer parte da acção, como se fosse um documentário e seguíssemos os protagonista em todos os seus passos, sem cortes.

Mas houve outra sequência marcante: uma emboscada a um carro no meio da floresta. Essa sequência, que todos diziam ser impossível de realizar mas que Cuarón insistiu até que lhe arranjassem uma solução. Implicou uma estrutura especial que permitia meter a câmara dentro do carro e ao mesmo tempo roda-la para dentro e para fora (havia tão pouco espaço que os actores tinham de entrar e sair do personagem que representavam naquele curto espaço de tempo, pois quando não estavam a ser filmados tinham de se baixar para deixar passar a câmara).

Imagem do texto Children of Men - Hard Core Seamless vfx da fxguide

A cena é espectacular (além de visceralmente violenta e ser um choque brutal, pois é uma surpresa completa) e filmada desta forma só lhe aumenta a espectacularidade, pois nunca se “sai” da acção [ver cena completa no YouTube]. Há quem considere esta cena como a coisa mais incrível e difícil que já viram em toda a história do Cinema. E se bem que não seja detentor da “sequência mais longa”, é certamente das mais complexas (muito mais que a famosa cena de “Atonement”, por exemplo), senão a mais complexa até agora!

Depois a cena do parto tem também mais de 3 minutos de duração e é uma cena mágica, não só pelo simbolismo e por ser o clímax do filme mas também por estar tão bem executada que no final me doíam os maxilares por ter ficado com a boca tão aberta durante tanto tempo! E se bem que algumas destas cenas tenham tido fortes doses de efeitos por computador, estes não se vêem, e só se sabe que o são porque é impossível ser de outra forma, mas nem se pensa neles enquanto se vê o filme. Por exemplo, a cena do nascimento é incrível porque pela primeira vez num filme vi um recém-nascido que não era um boneco de plástico/silicone (e normalmente nem se vê a cara) nem um bebé que nitidamente tinha pelo menos 3 meses! Nada escondido, num plano que nunca mais acaba, e se o milagre do nascimento já é por si fantástico, nunca tinha visto tal coisa nitidamente no cinema (a não ser que fosse um documentário científico ou médico) de forma tão real.

Digam lá se é possível ser CGI e não um bebé real! Impressionante!

Toda a gente tinha ficado embasbacada e as teorias de como teria sido feito iam desde "o melhor animatronic jamais feito" até à possibilidade de terem filmado um nascimento a sério e depois terem coordenado os movimentos de câmara e feito a composição de forma a poder colocar o bebé real nas mãos do actor Clive Owen. Mas isto parecia tão difícil de concretizar que parecia impossível, e levantava mais questões do que as que resolvia. Quando finalmente surgiu o "making of" foi um choque para muitos, pois nunca se tinha suposto que se pudesse ter chegado àquela perfeição de iluminação/shading/tracking/composição de forma a fazer parecer o CGI tão real.

[Clique sobre a imagem para ver o making-of]

Por isso digo: sim, Children of Men merece sem dúvida um honroso segundo lugar nessa tabela, pois os momentos cinematográficos que proporciona são de uma complexidade inigualável, os quais proporcionam também eles sensações ímpares na história do Cinema.

Making of geral de Children of Man (2006)

julho 19, 2010

mais uma noite de ballet

Espectáculo da Academia de Bailado Clássico, 16 de Julho de 2010

Foi há um ano que aqui deixei referência ao seu primeiro espectáculo na Academia de Bailado Clássico de Aveiro. Fica o registo de um ano de maturidade e aprendizagem de uma das mais belas e exigentes artes.



Fotografias de Filipa Silva

julho 18, 2010

Cinematografia 1998-2008

Amélie (2001), foi eleito pelos cinematógrafos convidados pela revista American Cinematographer, o filme mais bem fotografado da década de 1998-2008. A fotografia é de Bruno Delbonnel que disse à AC que,
“This is real honor for me, especially considering the other movies in this list... These are some of the finest cinematographers, and I’m not sure I deserve to be among them, but I am very happy to be. They are all explorers.”
Bruno Delbonnel começa pelo cinema francês com o seu ponto alto em Amélie mas depois disso trabalhou desde o cinema do puro espectáculo de Harry Potter and the Half-Blood Prince (2009) ao cinema poético de Aleksandr Sokurov, Faust (em produção). Clique sobre as imagens para ver em maior resolução.

Ficam aqui os restantes eleitos do Top 10. Tenho a dizer que concordo com praticamente todos à excepção do segundo classificado, Children of Men (2006). Existe um claro trabalho de homogeneização da cor com destaque para os castanhos e cinzas e esse trabalho é muito bem conseguido, contudo restam dúvidas quanto a um lugar tão proeminente numa década cheia de diversidade, ousadia e beleza fotográfica.

Children of Men (2006), Emmanuel Lubezki
Saving Private Ryan (1998), Janusz Kaminski
There Will Be Blood (2007), Robert Elswit
No Country for Old Men (2007), Roger Deakins
Fight Club (1999), Jeff Cronenweth
The Dark Knight (2008), Wally Pfister
Road to Perdition (2002), Conrad L. Hall
Cidade de Deus (2002), César Charlone
American Beauty (1999), Conrad L. Hall


[a partir de Sound+Vision]

julho 16, 2010

Turner no Prado

Appulia searching Appulo, 1814

Mais uma passagem por museus de cultura geral. A exposição temporária que está agora no Prado é do Turner uma exposição que já passou antes pelo Tate e Louvre. Não que seja um grande admirador do artista mas acho que a exposição vale pelo excelente trabalho académico que é apresentado. A exposição chama-se "Turner y los Maestros", o que quer dizer que para as suas obras mais significativas na colecção são apresentadas as influências ao lado, sejam de Rembrandt, Claude Lorrain, Ruisdael, Loutherbourg ou Titian. Por isso mesmo a exposição ganha todo um outro nível de significância porque passamos imenso tempo a realizar comparações técnicas e de traços estilísticos o que nos ajuda a construir uma compreensão muito mais detalhada e aprofundada das características estéticas de Turner.

Snow Storm-Steam-Boat off a Harbour's Mouth, 1842

É um trabalho bastante ambicioso dadas as dificuldades logísticas que estão sempre envolvidas, mas ainda mais pelos riscos contidos na selecção e exposição de perspectivas subjectivas e até contestáveis em alguns casos.

A exposição temporária estará por lá até 19 Setembro 2010.

Apresentação da exposição pelo comissário, Javier Barón Thaidigsmann, Chefe do Departamento de Pintura do Século XIX do Museo Nacional del Prado

julho 14, 2010

Facebook e o acasalamento

Na semana passada dei mais uma entrevista ao Diário Económico para um artigo relativo ao fenómeno do acasalamento via redes sociais que depois surgiu no artigo, "O que o Facebook unir o Facebook pode separar" na edição de 3.7.2010. O artigo, que é da autoria de Angela Marques com ilustração de Gonçalo Viana, começa assim,
"O mundo evoluiu muito: na hora da sedução, passámos do “posso pagar-te uma bebida” para o “posso escrever alguma coisa no teu mural? O “gosto” e “não gosto” do Facebook são os preliminares do século XXI e já ninguém pergunta se nos pode conhecer – passa-se logo para a amizade, para a partilha de fotografias, de vídeos e considerações mais ou menos inteligentes sobre a vida e amoda em geral.
Do meu lado o que dizer sobre estas constatações, entre muitas outras questões que se me levantam, a minha tendência para as perspectivas biológicas sugerem algo mais natural do que à partida possa parecer algo que assenta em princípios básicos de sobrevivência da espécie e como tal,
“A razão disto prende-se com a necessidade fundamental que temos de viver em grupo e de ter companhia. Como tal todas as possibilidades que se abrem à hipótese de construção de relações com o outro são aproveitadas. A parte benéfica das redes sociais é que aqui o contacto social possui uma rede de segurança que é a distância física e o assincronismo.”
Adam and Eve (1528) de Lucas Cranach the Elder

Claramente que aponto aqui apenas os vectores positivos deste novo modelo de propagação da espécie, mas deixo os negativos para outro momento.

da UMinho para o Texas

Chega-nos uma reportagem do Mundo Universitário sobre os estudantes portugueses financiados pela ZON para realizar um curso de Scriptwriting Intensivo nos EUA durante dois meses. Pode ver-se na reportagem como se estão a dar com a experiência e podemos sentir que a escolha das pessoas foi bem conseguida, todas elas respiram cinema e isso é o mais importante. Do lado da Universidade do Minho temos a Susana Neves ex-aluna de Comunicação que aproveitou esta oportunidade para arriscar o que tinha já conseguido desde a concretização do curso. A Susana criou um blog para poder reportar tudo o que se vai passando no Texas e de algum modo aprofundar ideias que vai tendo para a sua curta.

Para quem não teve oportunidade de partir nesta viagem de foro cinematográfico fica a hipótese de participar na produção dos filmes. A Susana Neves disponibilizou já informação aos alunos da Universidade do Minho e alguns aceitaram o repto com entusiasmo. Para quem ainda quiser participar, basta contactar a Susana ou a mim directamente. Os mais interessados têm sido os alunos que este ano terminam o seu curso em Ciências da Comunicação, variante de Audiovisual e Multimédia, nomeadamente vários elementos por detrás de um dos melhores projectos de curta-metragem deste ano, Cliché, o Mais Sexy Banho de Sangue do Ano... (2010). Em breve iremos disponibilizar todos os trabalhos realizados pelos alunos deste ano lectivo no canal YouTube do curso.

julho 13, 2010

um épico sobre Ciência e a Mulher

Agora (2009) de Alejandro Amenabar é um hino à ciência e um alerta contra todos os fundamentalismos religiosos e outros. Não podemos nem devemos ficar indiferentes à sua mensagem que nos aparece tão actual. É interessantíssimo analisarmos o estado das coisas prévio à imposição da religiosidade no que toca ao respeito pela ciência e à igualdade de estatuto entre homem e mulheres. Claramente que não seria o ideal de uma sociedade ainda, a existência da categoria de escravos perturba por completo essa noção. Contudo e mais uma vez percebe-se como a ciência pode ajudar a eliminar essa diferença, como pode ajudar a fazer desaparecer essa desigualdade.

Enquanto filme do género Épico vai contra todos os seus naturais ingredientes - herói masculino, o poder do grande número, a acção bruta e visceral. Aqui o que nos vai tocar é o debate acerca da liberdade do pensamento e o choque de ver essa liberdade professada por uma mulher de um modo completamente natural e aceite pela sociedade de há dois mil anos atrás.

Graças à reconstituição de cenários físicos e com muita pós-produção é-nos dado a ver toda a Biblioteca de Alexandria no seu esplendor, mas o que nos vai tocar é o magnífico trabalho de Amenabar na condução das expectativas, na mestria que possui na gestão da narrativa como nos atrai e nos guia até ao clímax. Tem demonstrado, desde o seu filme de graduação Tesis (1996), que é capaz de controlar na perfeição os tempos de espera para nos fazer chegar a informação necessária à compreensão e criação de emoção necessárias à progressão narrativa. Em Agora e com um orçamento muito diferente do que teve até agora delicia-nos visualmente, e utiliza toda a sua mestria de direcção de cena para criar um espantoso mundo grego, dar-nos a ver pelos olhos dos seus habitantes, sentir o calor daquele local, e experienciar um local nunca antes visto mas apenas imaginado.

Amenabar diz-nos no site do filme que o faz com o sentido de extrair o que de melhor representaria a biblioteca de Alexandria,
"Our goal, with this film, was to apply emotion to what happens in the universe; all the emotion that comes from trying to unravel the mystery of the cosmos"