A semana que acabou ficou marcada pelo furor online criado em volta de duas aplicações interactivas,
Missão Cavaco e
FaceTuga, criadas por dois alunos da Universidade do Minho. Uma delas conseguiu inclusive saltar para os media tradicionais. Interessante porque estes não foram os únicos trabalhos partilhados por alunos da UM online nesta semana, o que evidencia claramente a particularidade dos mesmos. A principal razão do buzz criado, é para mim bastante evidente, prende-se com o tópico escolhido por ambos os criadores, a actualidade política nacional.
O primeiro trabalho,
Missão Cavaco foi criado por Pedro Nogueira no âmbito da disciplina de Programação Interactiva do professor Pedro Branco, no 1º ano do
Mestrado em Media Interactivos da UM. Foi a aplicação mais badalada no Facebook com vários milhares de "likes", assim como no
Newgrounds e
Kongregate conta, até ao momento, mais de 60 mil visualizações. Nos media tradicionais a notícia atingiu os milhares de visitas por onde passou, chegando aos 10 mais lidos da semana nos jornais
JN,
Visão,
Expresso.
O jogo foi ainda motivo de reportagem no
telejornal da TVI. De forma a tentar perceber melhor o que está por detrás do projecto fiz algumas perguntas ao Pedro Nogueira que teve a amabilidade de me responder em detalhe
A inspiração
Estava-me a sentir apertado porque a data de entrega do trabalho estava a aproximar-se e eu não fazia a mínima ideia do que ia fazer. Tinha-me decidido fazer um Jogo da Forca sobre música. Não queria fazer nada de muito desenvolvido, por se tratar de Actionscript 3.0, mas foi então que vi as declarações do Cavaco Silva, pus-me a pensar se haveria alguma possibilidade de adaptar aquilo para um jogo. Não sabia de que forma o iria fazer, mas algo me dizia que poderia surgir dali um jogo engraçado, tal como aconteceu com os jogos do sapato do Bush ou da mosca do Obama (nunca imaginei foi que isto viesse a atingir estas proporções). Depois de umas quantas horas a ver tutoriais, vi um que se chamava Chicken and Eggs e decidi fazer algo do género. O jogo consistia em apanhar ovos com uma cesta e então decidi adaptá-lo e pôr o Cavaco a apanhar dinheiro.
As Mecânicas: notas, moedas, bónus, e condições de vitória
Como em todos os jogos, têm de existir formas de o jogador perder ou se atrasar na tentativa de alcançar um objectivo. Primeiro pensei em pôr pedras e tomates a cair e todo o dinheiro (quer fossem moedas ou notas) que se apanhasse acumulava no Score. Depois achei que não fazia muito sentido acumular moedas de cêntimos, quando existia também notas de 500 € (haveria uma grande disparidade de valores). Como tal, optei por separar as moedas das notas. Só não sabia é de que forma iria fazer com que o jogador perdesse. Fui fazendo várias experiências e o que me pareceu mais indicado foi colocar da forma como está, ou seja, sempre que toca numa moeda, o jogador terá que esperar 3 segundos para poder voltar a recolher notas.
Relativamente aos bónus, acho que todos os jogos têm de ter algo, para além do objectivo final, que entusiasme os jogadores. Pus, portanto, três tipos de bónus diferentes. Relógios que aumentam o tempo em 5 segundos; anéis que estão avaliados em 1800 €; e carteiras que geram um valor aleatório entre 0 e 1000 €. Isto permite que o objectivo final se torne mais acessível.
Quanto às mensagens que aparecem no final, o que pretendia apenas era motivar os jogadores a ultrapassarem uma meta. Achei que mostrar apenas o montante total seria pouco recompensador para o esforço do jogador. Como tal, por tudo o que tem circulado na imprensa, defini os 10,000€ como o valor que separa os jogadores que conseguem ajudar o Cavaco Silva e os que não conseguem.
O segundo trabalho,
FaceTuga, foi criado por Paulo Dias, no âmbito da disciplina de Atelier de Audiovisual e Multimédia II do professor Leonardo Pereira, no 3º ano da
Licenciatura em Ciências da Comunicação.
Não conseguiu saltar para os media tradicionais, mas não deixou de gerar um forte impacto na rede com milhares de visualizações e centenas de comentários. Para ficarmos a saber um pouco mais sobre o FaceTuga falei com o Paulo Dias e questionei-o sobre o trabalho desenvolvido.
Objectivos
O objetivo era fazer uma animação flash com uma narrativa que envolvesse escolhas interativas por parte dos utilizadores. A inspiração foi mesmo a atualidade e os problemas das nossas políticas. Como na altura em que o fiz ainda estava a decorrer a casa dos segredos, também apimentei o trabalho com um pouco de dois célebres personagens
Tecnologias
Foi tudo feito em Flash em AS2. Aproveitei os conhecimentos que tenho de HTML e PHP para manipular a página do Facebook e claro recorri também ao Photoshop para tornar o trabalho mais fluente e menos 'pesado' para a web.
Inspiração
Em relação à ideia, a nossa política não está nos melhores dias e estou atento à atualidade. A primeira notícia que aparece na narrativa foi o que despoletou a ideia em si de fazer uma espécie de crítica ao que por cá se faz. Depois, foi pensar numa forma de o fazer em género narrativo. Sou utilizador bastante regular do Facebook e por isso não demorou muito para pensar em usar esta plataforma como metáfora para a transmissão da mensagem. Depois foi pensar nos intervenientes. O PM é o personagem principal e a ideia de poder invadir a sua privacidade parecia-me algo que pudesse atrair curiosidades. Depois como a casa dos segredos estava bastante presente, inseri a Cátia e a Teresa para ironizar ainda mais a situação. Os restantes foi mesmo pela ligação à política. Verdade é também que só os mais atentos percebem todos os pormenores, que muitas vezes e até propositadamente não têm destaque.
Apesar de os trabalhos partilharem uma mesma base de partida, a sátira politica interactiva, existem algumas diferenças entre eles. No caso da
Missão Cavaco estamos perante um claro objecto de jogo, que faz uso das lógicas de persuasão que procuram manter o interesse do jogador através da sensação de progressão, neste caso a quantidade de dinheiro arrecadado. Por outro lado em
FaceTuga o objecto assenta declaradamente na narrativa. O relevante é contar algo, levar o receptor a querer saber o que vai acontecer a seguir, envolver e criar a expectativa pelo final da história. Sendo uma narrativa interactiva, isto é feito socorrendo-se da participação do receptor, introduzindo o mesmo na experiência, através da sua responsabilização no desenrolar da narrativa. No final da experiência, depois de termos descoberto a explicação para o buraco da Madeira, dá-se um fechamento da obra e não precisamos de voltar mais a ela. Ou seja desenvolve a sua persuasão de forma mais concentrada e dirigida à descoberta de uma ideia, ao descortinar de uma "verdade" ou "lição".
Julgo que a diferença de impacto dos dois, esteve essencialmente no
timing, que foi crucial no sucesso mediático de
Missão Cavaco. A sociedade regula-se por fluxos informativos, e o jogo acabou por ser sugado por esse fluxo. No caso do FaceTuga, o fluxo do "buraco da Madeira" já tinha passado.
Mais
Primeiros jogos do Mestrado em Media Interativos, 03.02.2012