outubro 29, 2022

O foco desfocado

Cheguei a "Stolen Focus: Why You Can't Pay Attention- and How to Think Deeply Again" (2022) por meio de um excerto do mesmo que discutia as questões do multitasking, tendo logo ganho o meu interesse pelos resultados dos estudos que citava. Quando procurei mais pelo autor, percebi que vinha atrelado a acusações de plágio e consequente despedimento de um jornal britânico. Acreditando que as pessoas têm direito a reabilitação, decidi avançar para a leitura do livro, ainda que munido de algumas cautelas extra. A experiência final não foi das melhores, mas ainda me interrogo se foi por causa do seu passado, ou pela sua incapacidade de manter o foco, exatamente aquilo que no título diz pretender explicar a quem o lê. 

Quando acabei de ler o livro escrevi no GoodReads "tem alguns capítulos interessantes, mas existe aqui uma atitude excessivamente dogmática sobre o que está a acontecer e porquê...". Com isto quis dizer que Hari trabalha muito bem a desconstrução de conceitos complexos, suportado em estudos e experimentos, mas ao fazê-lo sente-se que se deixa levar pelos argumentos apresentados, perdendo em imparcialidade. Existe no seu discurso uma excessiva ânsia por chegar a verdades explicativas que acaba por ofuscar caminhos e explicações menos evidentes, ou menos atrativas. Hari escreve muito bem e tem um raciocínio bastante ágil, mas sinto que lhe falta método que se denota em mútiplos problemas: desfoque temático; falta de distanciamento da própria condição; e ainda enfatização excessiva dos impactos dos estudos consultados.

Pelo meio do livro, ainda extraí um excerto sobre os chamados 4 custos do multitasking, mas chegado ao final do livro, e tendo feito algumas pesquisas sobre o tema, tenho alguma relutância em convocar esses mesmos factos, pois encontrei apenas estudos fragmentados sobre os mesmos.

No final, se a argumentação de Hari vinha no sentido da necessidade de defender o foco e atenção, o seu livro acaba por ser todo o seu contrário, demonstrando o quão falhado acaba por ser todo o livro. Começa com os problemas do multitasking, passa pelos problemas das redes sociais com um espírito pregador, a seguir passa para o ADHD para debitar o mesmo que lemos em todo o lado, depois fala da pressão para a felicidade, do stress e cansaço, mas também das dietas, e claro do ambiente, e até mesmo das crianças que passam demasiado tempo fechadas em casa. Ou seja, demonstra ser incapaz de construir um argumento sustentado ao longo de todo um livro, ficando-se por capítulos de digressão sobre cada um dos temas escolhidos na esperança de que tudo faça um sentido uno no final.

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