Perder um filho deve ser das situações mais desesperantes que um ser humano pode atravessar. É simplesmente contra-natura, temos filhos, de um ponto de vista biológico, para nos suceder, e quando isso não acontece, o corte é profundo, a dor surge por todos os poros, psicológicos e físicos. Acredito ainda que isto é tanto mais intenso, numa sociedade que elegeu ter apenas um, ou dois filhos no máximo. “Rosalie Lightning: A Graphic Memoir” fala-nos da dor, da vida após a perda, do luto.
Não esperava mais, mas esperava diferente, talvez mais pungente, quando na verdade o período de luto, que acaba por ficar imensamente bem retratado, apesar de intenso, acaba por sair algo desfocado, um conjunto de tentativas erráticas com sentido de fuga, abandono, liberação. Mas não será assim mesmo, sei bem que procuramos chegar perto, sentir a emoção à superfície da pele dos atingidos, mas o luto não é só emoção, é antes pelo contrário, na maior parte do tempo, anti-emoção.
Na verdade, o facto de não ter passado pela provação, e que dói apenas imaginar, torna difícil compreender como seria connosco. A empatia não é fácil, porque estamos muito longe de poder compreender o que seria de nós naquela situação. Comparo com o videojogo recente, “That Dragon, Cancer” (2016), e vejo muitas pontes, mas também vejo muitas distâncias, mas também sei que o sofrimento, sendo humano, é particular, específico de cada um.
Estas obras são fundamentais para os seus criadores, contributos para um luto mais efetivo, não apenas pelo que se expressa, verbaliza, externaliza, mas essencialmente pelo que se cria. O processo criativo pelo seu efeito sobre a realização pessoal e autoestima, é um dos processos mais relevantes na terapia dos modos depressivos. Por outro lado, serve ao mesmo tempo um outro processo, comunitário, de partilha de experiências que é também fundamental na manutenção de sanidade, para quem passa por situações similares. Dito isto, “Rosalie Lightning”, sendo arte, é talvez ante disso, terapia.
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