O último texto de Bogost na The Atlantic enferma das principais razões que me afastaram dos discursos desenvolvidos pelos colegas das humanidades. Centrados no objecto em análise, afundam, catalogam, categorizam, parametrizam, concluem, tudo isto sem nunca se questionar sobre aquilo de que são feitos homens e mulheres que criaram esses objectos, homens e mulheres que consomem esses objectos, e homens e mulheres que analisam e criticam esses objectos.
As humanidades têm sofrido um declínio na academia que se acentuou muito nos últimos tempos. Costumamos atribuir as culpas dessa perda de interesse a ideias feitas como as tecnologias ou a sociedade de consumo imediato, o que em parte é até verdade. Mas não podemos esquecer a não atualização das abordagens humanistas. Algo que se sente logo quando começamos a olhar para autores citados e datas citadas. Não tenho nada contra citar autores antigos, gosto de citar Platão e Aristóteles, mas gosto de o fazer para contextualizar, não para me suportar neles.
As razões para tal são simples, nos últimos 50 anos a ciência mudou muito, nomeadamente nos campos da Comunicação e Psicologia. Nos últimos 20 anos mudou ainda mais com os avanços na Biologia e Neurociência. Contudo alguns colegas das Humanidades continuam a fazer de conta que nada disto aconteceu, que o mundo continua a rodar sobre si próprio, e isto é suficiente para continuar a teorizar sobre algo, a partir de teorização que se fazia há 100 anos. Não é arrogância minha, nem sou, de todo, o primeiro a fazer esta constatação, leia-se Steven Pinker ou o brilhante trabalho de “The Art Instinct” (2009) de Denis Dutton, para se perceber que existe quem procura fazer avançar o discurso das humanidades.
Neste texto Bogost interroga-se porque é que precisamos de personagens nos videojogos. Utiliza como objecto de análise o "Simcity" (1989), e desconstrói a velha dicotomia Narratologia/Ludologia por outras palavras. O erro crucial de toda esta argumentação é aquele que apontei acima, o de ignorar de que somos feitos enquanto seres humanos, que processos cognitivos utilizamos para compreender o mundo que nos rodeia. Ignorando isto, torna-se fácil teorizar sobre hipóteses alternativas de construção do discurso humano. O texto não deixa de ser interessante porque estimula a reflexão, mas ao falhar em algo tão essencial, peca por induzir em erro quem não detém conhecimento para filtrar o que é dito pelo que não é dito.
Passo a constatação, não quero repetir argumentos em defesa do storytelling e da empatia, deixo abaixo alguns links para outros textos nos quais esses elementos são trabalhados em detalhe:
Empatia, colaboração e cooperação, in Virtual Illusion
A empatia e a moral estão inscritas na nossa biologia, in Virtual Illusion
A emocionalidade de Elizabeth (BioShock Infinite), in Virtual Illusion
Sem comentários:
Enviar um comentário