Vejam o filme e depois vejam o making-of (abaixo), vale a pena para perceberem como foi conseguido o trabalho do ponto-de-vista, que nos impressiona tanto. Em poucos segundos o filme agarra-nos, e não mais nos deixa até que surgem os créditos finais, tal é o ritmo imposto, não apenas visual mas sonoro e narrativo.
Em certa medida sinto que esta forma de trabalhar a apresentação da acção, como se tivéssemos uma câmara em cima do personagem, colada a ele, com tremuras, imitando a atenção de um soldado em cenário de guerra, ou seja com movimentos rápidos, sacadas e saltos, é central para nos transportar para o interior do soldado. Em certa medida esta animação faz-me pensar, em termos de linguagem audiovisual, que mais eficaz do que a câmara subjectiva, ou em primeira-pessoa, é a câmara que imita os personagens, aliás algo que se tem vindo a tornar norma, se pensarmos que nos anos recentes os planos estáticos praticamente desapareceram, temos quase sempre câmara ao ombro em movimento constante. Por outro lado a câmara subjectiva nunca funcionou muito bem, como continua a não funcionar nos videojogos. Aqui temos uma câmara como se fosse um personagem, mas temos o nosso personagem sempre em cena, empatizamos com ele, mas empatizamos através de uma mímica visual que parece servir de intensificador da expressividade desse personagem.
“Confusion Through Sand” (2014) de Danny Madden (Ornana)
Nos momentos de maior tensão, ajuda imenso o minimalismo visual, e a ocupação do ecrã pelo indefinido, que gera confusão em nós, e impacto na tensão, isto é algo que a animação faz muito bem, porque o seu material plástico se presta muito bem a tal. Ainda assim mesmo aqui, o facto do ponto-de-vista nunca parar e entrar em círculo, imita mais uma vez muito bem o que se está a passar com a visão do nosso personagem, e nós que só vemos através da câmara, vemos o que ele vê, e como ele vê, que é pouco ou nada, com a confusão a enfatizar toda a tensão do momento.
Todo este trabalho fez-me agora recordar o magnífico plano sequência da série "True Detective". Interessante como aí me liguei mais aos problemas logísticos, e menos estéticos. Talvez porque sendo uma câmara real, filmado em tão pouco tempo, apesar de seguir os personagens e forçar a tal perspectiva mimica de que falo aqui acima, sente-se menos que aqui. Aí a câmara parece mais limitar-se a seguir os personagens, falta-lhe raio de acção, falta manobra, para nos transportar para dentro de Matthew McConaughey. Ainda assim é um claro movimento da linguagem audiovisual neste sentido da mimica, menos do que no sentido do cinema clássico, como dei a entender nesse texto que fiz.
É muito bom ver como a linguagem vai evoluindo, e como continuamos a conseguir surpreender-nos com uma arte que tem mais de um século.
Making-of
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