De qualquer modo continua a passar a ideia que distingue o hack de software do hack de hardware. O hack de software continua a ser visto como algo invisível, complexo e incompreensível por isso é dado a uma visão mais esotérica, conotada com coisas menos positivas. Por outro lado o hack de hardware por ser visível e mais acessível em termos conceptuais, é aceite como algo positivo, porque se pode ver o processo e o fruto da criação. A pessoa é reconhecida por ter criado algo, algo tangível. O hacker de hardware é respeitado, é um fazedor, um criador. Já o hacker de software continua a ser rotulado como um salteador, alguém que não se mostra nem se identifica, que invade e se aproveita daquilo que é dos outros. Diga-se que toda a paranoia gerada em redor dos Anonymous nada tem contribuído para dissipar este rotulo.
março 29, 2013
Off Book: "Can Hackers Be Heroes?"
Excelente documento da série OffBook que nos fala de algo que sabíamos, mas que os media se encarregaram de distorcer ao longo dos anos 1980 e 1990 ao ponto de termos deixado de acreditar no significado do conceito "Hack". Por outro lado nos anos 2000 com a evolução do DIY no campo da electrónica o conceito ressurgiu para re-significar aquilo que sempre tinha significado. Hoje podemos encontrar a palavra "hack" associada a todo o tipo de remix ou reconstrução de estruturas, como é por exemplo o caso dos Ikea Hackers.
De qualquer modo continua a passar a ideia que distingue o hack de software do hack de hardware. O hack de software continua a ser visto como algo invisível, complexo e incompreensível por isso é dado a uma visão mais esotérica, conotada com coisas menos positivas. Por outro lado o hack de hardware por ser visível e mais acessível em termos conceptuais, é aceite como algo positivo, porque se pode ver o processo e o fruto da criação. A pessoa é reconhecida por ter criado algo, algo tangível. O hacker de hardware é respeitado, é um fazedor, um criador. Já o hacker de software continua a ser rotulado como um salteador, alguém que não se mostra nem se identifica, que invade e se aproveita daquilo que é dos outros. Diga-se que toda a paranoia gerada em redor dos Anonymous nada tem contribuído para dissipar este rotulo.
De qualquer modo continua a passar a ideia que distingue o hack de software do hack de hardware. O hack de software continua a ser visto como algo invisível, complexo e incompreensível por isso é dado a uma visão mais esotérica, conotada com coisas menos positivas. Por outro lado o hack de hardware por ser visível e mais acessível em termos conceptuais, é aceite como algo positivo, porque se pode ver o processo e o fruto da criação. A pessoa é reconhecida por ter criado algo, algo tangível. O hacker de hardware é respeitado, é um fazedor, um criador. Já o hacker de software continua a ser rotulado como um salteador, alguém que não se mostra nem se identifica, que invade e se aproveita daquilo que é dos outros. Diga-se que toda a paranoia gerada em redor dos Anonymous nada tem contribuído para dissipar este rotulo.
março 28, 2013
Unfinished Swan, conceito e superprodução
Leigh Alexander esteve à conversa com Ian Dallas o criador de The Unfinished Swan (2012) esta semana na GDC e obteve algumas informações interessantes sobre a germinação da ideia e o desenvolvimento do jogo. O que mais chamou a minha atenção foi a discussão sobre o balanceamento entre especialização e cruzamento de saberes, que é um desafio permanente por parte de qualquer criativo digital. Por outro lado torna-se inevitável refletir sobre as questões da originalidade e singularidade dos conceitos de jogo tendo em conta o cenário atual de superprodução.
Sobre o conceito em si, Dallas refere que "At the time, I was interested in how people move around space". O conceito surgiu como um simples jogo de estudante. Foi depois mostrado em vídeo, e seria esse vídeo que a Sony acabaria por ver e reconhecer, garantindo um contrato de publicação. Foi com esse contrato que se tornou possível então passar de uma mera ideia conceptual, a um jogo distribuído internacionalmente para a PS3.
Muito do desenvolvimento de um jogo é mesmo isto, garantir uma ideia, um conceito. Ter algo que os outros querem experienciar. Que os outros querem tocar, sentir e mexer. Sem isso, teremos apenas mais um jogo, jogado na lotaria dos milhares de novos jogos que saem todos os meses na internet e nas App Stores. A quantidade de jogos produzidos independentemente atingiu um tal ponto, que neste momento muitos dos sites que fazem crítica aos pequenos jogos, só o fazem mediante pagamento. Por um lado temos o problema do excesso de produção, por outro lado temos também todas estas revistas online que vivem dias maus no que toca a receitas de publicidade, e veem nisto uma hipótese de negócio. Sobre esta estratégia diga-se que é perigosa, porque corre o risco de desacreditar todo o jornalismo na área, e desse modo afundar o pouco que resta deste. Por outro lado a quantidade excessiva de produção de pequenos jogos pode levar-nos a um crash, algo anunciado há muito por vários especialistas.
Não acredito muito nesta ideia de crash, apesar de já o termos vivido em 1983. Mas hoje as condições são completamente diferentes e o público está também muito mais diversificado. Por outro lado as ferramentas para criar jogos estão hoje ao alcance de qualquer um, já não temos uma indústria que se baseia no conhecimento tecnológico para existir. A grande lição de The Unfinished Swan é o reconhecimento de que chegou o momento em que deixamos de criar jogos pela sua inovação tecnológica, e passamos a criar jogos pela sua inovação conceptual. Os videojogos deixam assim o primado da engenharia, para se dedicar ao primado da arte.
Declaração de interesses: Joguei uma cópia deste videojogo adquirida pelos meus próprios meios. Não tenho qualquer relação comercial com os autores e editores.
"Knowing how the tools work... allows you to pivot and solve the problems that come up. That's where you get into the really interesting territory... You spend a lot of time just tuning, and figuring out how to make things just slightly better, and being really fluent in the tools gives you a better insight into how they work... the more you know, the better"Dallas começa por referir a necessidade de saber mais sobre as ferramentas com que se trabalha, desde o Maya ao Microsoft Visual Studio. Por outro lado refere também que o facto de ter realizado a sua formação na USC, onde se mistura muito de perto o Cinema e os Media Interactivos, lhe abriu a possibilidade para compreender melhor outro terrenos adjacentes ao mundo dos jogos.
Sobre o conceito em si, Dallas refere que "At the time, I was interested in how people move around space". O conceito surgiu como um simples jogo de estudante. Foi depois mostrado em vídeo, e seria esse vídeo que a Sony acabaria por ver e reconhecer, garantindo um contrato de publicação. Foi com esse contrato que se tornou possível então passar de uma mera ideia conceptual, a um jogo distribuído internacionalmente para a PS3.
Muito do desenvolvimento de um jogo é mesmo isto, garantir uma ideia, um conceito. Ter algo que os outros querem experienciar. Que os outros querem tocar, sentir e mexer. Sem isso, teremos apenas mais um jogo, jogado na lotaria dos milhares de novos jogos que saem todos os meses na internet e nas App Stores. A quantidade de jogos produzidos independentemente atingiu um tal ponto, que neste momento muitos dos sites que fazem crítica aos pequenos jogos, só o fazem mediante pagamento. Por um lado temos o problema do excesso de produção, por outro lado temos também todas estas revistas online que vivem dias maus no que toca a receitas de publicidade, e veem nisto uma hipótese de negócio. Sobre esta estratégia diga-se que é perigosa, porque corre o risco de desacreditar todo o jornalismo na área, e desse modo afundar o pouco que resta deste. Por outro lado a quantidade excessiva de produção de pequenos jogos pode levar-nos a um crash, algo anunciado há muito por vários especialistas.
Não acredito muito nesta ideia de crash, apesar de já o termos vivido em 1983. Mas hoje as condições são completamente diferentes e o público está também muito mais diversificado. Por outro lado as ferramentas para criar jogos estão hoje ao alcance de qualquer um, já não temos uma indústria que se baseia no conhecimento tecnológico para existir. A grande lição de The Unfinished Swan é o reconhecimento de que chegou o momento em que deixamos de criar jogos pela sua inovação tecnológica, e passamos a criar jogos pela sua inovação conceptual. Os videojogos deixam assim o primado da engenharia, para se dedicar ao primado da arte.
Declaração de interesses: Joguei uma cópia deste videojogo adquirida pelos meus próprios meios. Não tenho qualquer relação comercial com os autores e editores.
março 27, 2013
What if you had a vision of the future?
Chegou ao fim o concurso da BBC, "What if you had a vision of the future?", com dois vencedores, um de imagem dinâmica, e outro de imagem estática. O prémio da imagem dinâmica foi para a Bulgária, para Marina Koleva, e o da imagem estática veio para Portugal para Leonel David Mendes. Apesar de ser um concurso internacional, ambos os prémios ficaram na Europa. De entre 800 submissões, vale acima de tudo pelo enorme reconhecimento internacional, já que o prémio se fica por um computador até 2500 libras.
Os premiados foram escolhidos com base nos seguintes critérios: "a) Creativity: b) Visual impact; c) Original concept and theme; d) Emotional power; e) Strength of the vision conveyed through visual medium". Assim sendo, se devesse existir um premiado final entre os dois trabalhos, não tenho qualquer dúvida em afirmar que o trabalho do Leonel ganharia. Pela originalidade, visão, metáfora e alcance da imagem que construiu. É aparentemente algo bastante simples e minimal, mas é no minimal que enquanto receptores podemos construir mais significado daquilo que vemos. O nome dado à imagem, "Richard Dawkins was here", ajuda a focar a dispersão de ideias potenciais que a imagem desenvolve, mas não minora o potencial de leitura da mesma. Um dos elementos do júri, Steve Harding-Hill, disse o seguinte sobre a imagem,
A imagem do Leonel tem tantas leituras possíveis, mas sinto que duas se sobrepõem e se cruzam mesmo, por um lado o evolucionismo, por outro lado o mundo mediado. No caso do evolucionismo, e daí a relação com Dawkins, fá-lo de um modo límpido, sem "nuvens negras", deixando a cada um a tendência da interpretação. Aliás essa é uma das razões pela qual a imagem se torna tão poderosa, porque é capaz de nos mostrar, ou de nos fazer questionar, sobre o bom e o mau de algo que sentimos aproximar-se a cada dia que passa. Por outro lado o mundo mediado surge como um efeito evolucionário da espécie, no sentido em que nascemos como bebés de carne e osso, mas crescemos e nos transformamos num conjunto de bits e bytes, transportados por cabos. Estamos a transformar-nos em representações digitais.
Richard Dawkins was here de Leonel David Mendes, imagem vencedora do concurso da BBC, "What if you had a vision of the future?"
Os premiados foram escolhidos com base nos seguintes critérios: "a) Creativity: b) Visual impact; c) Original concept and theme; d) Emotional power; e) Strength of the vision conveyed through visual medium". Assim sendo, se devesse existir um premiado final entre os dois trabalhos, não tenho qualquer dúvida em afirmar que o trabalho do Leonel ganharia. Pela originalidade, visão, metáfora e alcance da imagem que construiu. É aparentemente algo bastante simples e minimal, mas é no minimal que enquanto receptores podemos construir mais significado daquilo que vemos. O nome dado à imagem, "Richard Dawkins was here", ajuda a focar a dispersão de ideias potenciais que a imagem desenvolve, mas não minora o potencial de leitura da mesma. Um dos elementos do júri, Steve Harding-Hill, disse o seguinte sobre a imagem,
"The reason why I picked this drawing is that I thought it is a stunning, simple, thought-provoking image. The idea of our children being led and blinded by technology. It is a very bleak view of the future and the role of technology in it. I thought it was cold, horrific, powerful, but also it was like satire it is almost like it has already come true."Concordo, a única coisa que me incomoda neste discurso, e que está em total consonância com o discurso vigente na escolha da melhor animação, que é o pessimismo quanto ao futuro. Apesar de perceber que podemos ver isso na imagem do Leonel, considero que a imagem pode ser muito mais do que isso. Aliás, este é o motivo que mais me afasta da animação de Marina Koleva. Que me parece totalmente subjugada a ideia de um futuro negro, distópico, mas pior que isso é o facto de ser uma ideia muito pouco original. Quantas vezes não vimos já esta ideia explorada pela ficção científica, já perdi a conta ao número de mundos distópicos inabitáveis, desolados, e destruídos pela industrialização selvagem. É verdade que ela juntou um argumento novo, a questão do brincar ao ar livre, versus brincar com os media, e os seus efeitos sobre as nossas crianças. Eu até gosto da animação, que é capaz de nos tocar, mas tenho muitas dúvidas na sua escolha. Aliás, as animações ali apresentadas, são todas de inferior qualidade às ilustrações. Poderia ser a necessidade de obedecer aos 50 segundos, ainda assim tenho visto imensa criatividade em concursos, até de 5 segundos.
A vision of the future from Bulgaria de Marina Koleva, animação vencedora do concurso da BBC, "What if you had a vision of the future?"
A imagem do Leonel tem tantas leituras possíveis, mas sinto que duas se sobrepõem e se cruzam mesmo, por um lado o evolucionismo, por outro lado o mundo mediado. No caso do evolucionismo, e daí a relação com Dawkins, fá-lo de um modo límpido, sem "nuvens negras", deixando a cada um a tendência da interpretação. Aliás essa é uma das razões pela qual a imagem se torna tão poderosa, porque é capaz de nos mostrar, ou de nos fazer questionar, sobre o bom e o mau de algo que sentimos aproximar-se a cada dia que passa. Por outro lado o mundo mediado surge como um efeito evolucionário da espécie, no sentido em que nascemos como bebés de carne e osso, mas crescemos e nos transformamos num conjunto de bits e bytes, transportados por cabos. Estamos a transformar-nos em representações digitais.
"Uma Baleia no Quarto", e o processo de ilustração
Ontem foi dia de leitura do livro Uma Baleia no Quarto (2012) de João Miguel Tavares e Ricardo Cabral, e posso dizer que a reação do público alvo cá de casa, 4 e 7 anos, foi muitíssimo boa. A narrativa e a ilustração conseguiram desencadear genuína supresa e curiosidade, e ainda muita empatia para com a personagem principal. É um livro conservador, no sentido em que se encaixa nas linhas narrativas mais facilmente reconhecidas, e a própria ilustração, nomeadamente no campo do desenho dos personagens, serve-nos com um realismo muito tradicional, no campo infantil.
Apesar do conservadorismo, posso dizer que me surpreendeu pela positiva (por ser um livro de uma personalidade pública, pensei que se trataria de mais um daqueles favores das editoras). A história é muito bem introduzida, e desenvolve-se de uma forma que mantém as crianças interessadas do início ao fim. Sente-se toda a progressão, e o crescendo, até que surge aquele animal enorme no meio do quarto, e então tudo pára. É uma história com conteúdo, capaz de despertar ideias e imaginários nas crianças.
Por outro lado a ilustração brilha em todo o esplendor. Ricardo Cabral não se limitou a desenhar as cenas, antes de o fazer modelou cada uma destas fisicamente, para as poder iluminar e assim conseguir um trabalho mais realista em termos de luz (ver abaixo Making of). Diga-se que se sente esse esforço na forma como ele usa os brilhos e o posicionamento da luz em cada cena. E apesar de ter gostado bastante da ilustração, não fiquei fã da coloração. Nomeadamente a tonalidade contrastante e muito constante em todo livro, entre o azul escuro e o vermelho. Não gostei, e acabou por me afastar inicialmente da compra. A primeira vez que vi a capa senti uma reação estranha, e só agora percebi que provinha desta mistura que não funcionou para mim. Apesar deste detalhe, tenho a dizer que é uma ilustração enormemente cuidada e detalhada, sente-se um nivel de profundidade nas imagens, pouco usual na ilustração 2d. Nesse sentido é responsável por grande parte do impacto que o livro causa junto das crianças mais pequenas. Por isso mesmo disse que o livro era do escritor e do ilustrador, pois este livro com outro ilustrador criaria todo um outro universo de storytelling.
Por outro lado a ilustração brilha em todo o esplendor. Ricardo Cabral não se limitou a desenhar as cenas, antes de o fazer modelou cada uma destas fisicamente, para as poder iluminar e assim conseguir um trabalho mais realista em termos de luz (ver abaixo Making of). Diga-se que se sente esse esforço na forma como ele usa os brilhos e o posicionamento da luz em cada cena. E apesar de ter gostado bastante da ilustração, não fiquei fã da coloração. Nomeadamente a tonalidade contrastante e muito constante em todo livro, entre o azul escuro e o vermelho. Não gostei, e acabou por me afastar inicialmente da compra. A primeira vez que vi a capa senti uma reação estranha, e só agora percebi que provinha desta mistura que não funcionou para mim. Apesar deste detalhe, tenho a dizer que é uma ilustração enormemente cuidada e detalhada, sente-se um nivel de profundidade nas imagens, pouco usual na ilustração 2d. Nesse sentido é responsável por grande parte do impacto que o livro causa junto das crianças mais pequenas. Por isso mesmo disse que o livro era do escritor e do ilustrador, pois este livro com outro ilustrador criaria todo um outro universo de storytelling.
Making of
março 26, 2013
o poder do óleo na animação
Nightingales in December (2012) é a mais recente animação de Theodore Ushev, que já passou pelo Cinanima e pela Monstra do ano passado. Nightingales in December baseia a sua estética numa espécie de "expressionismo alemão" animado, suportado pela força expressiva da pintura a óleo. Theodore Ushev é ilustrador, designer gráfico, artista multimédia e cineasta, nasceu na Bulgária, e está radicado no Canada desde 1999, onde trabalha desde então para o NFB e onde criou alguns dos seus trabalhos de cinema de animação mais premiados.
Esta técnica de criar a animação a partir do movimento de pinturas rápidas, sobrescurecidas e que por vezes se assemelha a algum rotoscoping, é algo que já vem de trás, do seu filme anterior Lipsett Diaries (2010), um filme que ganhou também imensos prémios, e que pode ser visto no site da NFB, mediante pagamento. Sobre esta técnica Ushev diz-nos em entrevista,
Esta técnica de criar a animação a partir do movimento de pinturas rápidas, sobrescurecidas e que por vezes se assemelha a algum rotoscoping, é algo que já vem de trás, do seu filme anterior Lipsett Diaries (2010), um filme que ganhou também imensos prémios, e que pode ser visto no site da NFB, mediante pagamento. Sobre esta técnica Ushev diz-nos em entrevista,
"a razão pela qual fiz o meu filme com pintura, foi porque envolvendo cada frame num expressionismo estrito, seria a melhor forma de expressar as suas emoções." [fonte]E é exactamente isso que podemos sentir neste Nightingales in December (2012), uma força emocional tremenda emanada das imagens que se sucedem, que se movem e entrecortam ao ritmo da música de Spencer Krug e seguem no desvelamento da sinopse escrita pelo autor,
"This metaphorical surrealist tale is an allusion. Nightingales in December is a trip into the memories, and the fields of the current realities. What if the Nightingales were working, instead of singing and going south? Is the innocence the only savior of birds songs? There are no Nightingales in December... What is left, is only the history of our beginning, and our end."
Nightingales in December (2012) de Theodore Ushev
3d sob uma camada artesanal
O 3d definitivamente está a dar um novo salto estético em termos visuais. Já me tinha dado conta disto no filme Fat (2013), mas agora Folksongs & Ballads, da Supinfocom, que já é de 2011 mas só agora chegou à rede, faz-me acreditar ainda mais nesta convicção. Aliás faz mesmo parecer a técnica de Paperman quase desnecessária. Sabemos que isto é 3d, mas toda a ilustração, texturização e renderização faz esquecer esse facto através da beleza que emana.
Existe neste filme quase que uma obssessão na fuga à simetria, tão típica do filme 3d, originária da produção matemática pelo software. Podemos ver como quase todos os objectos se apresentam carregados de distorção na forma, conferindo-lhe uma marca de autenticidade do artesanal. As próprias texturas, as mais relevantes, são pintadas à mão e depois aplicadas sobre os modelos. Todo o filme respira a artesanto, a tradicionalidade, o que entra em total sintonia com o tema do próprio filme. E é algo que torna impossível não nos impressionar, no sentido de compreendermos do que é capaz o 3d.
É um filme de estudante, criado por Mathieu Vernerie, Pauline Defachelles e Rémy Paul, e nesse sentido aceita-se que algumas, muito poucas, das imagens tenham escapado em parte a este processo de tornar mais artesanal. Existem alguns objectos descuidados aqui e ali, mas isso não invalida nem menoriza em nada a excelência do trabalho desta equipa de estudantes.
A qualidade da curta não se limita aos aspectos técnicos visuais, o filme é em si uma pequena pérola pela forma como obedece a um ritmo lento em consonância com o tema, criando toda uma atmosfera que nos ajuda a transportar para o universo representado em cena. O design dos personagens não é o melhor do filme, ainda assim o personagem principal é uma delícia, convincente e capaz de nos fazer sentir que vive ali, naquele mundo desolado.
Existe neste filme quase que uma obssessão na fuga à simetria, tão típica do filme 3d, originária da produção matemática pelo software. Podemos ver como quase todos os objectos se apresentam carregados de distorção na forma, conferindo-lhe uma marca de autenticidade do artesanal. As próprias texturas, as mais relevantes, são pintadas à mão e depois aplicadas sobre os modelos. Todo o filme respira a artesanto, a tradicionalidade, o que entra em total sintonia com o tema do próprio filme. E é algo que torna impossível não nos impressionar, no sentido de compreendermos do que é capaz o 3d.
É um filme de estudante, criado por Mathieu Vernerie, Pauline Defachelles e Rémy Paul, e nesse sentido aceita-se que algumas, muito poucas, das imagens tenham escapado em parte a este processo de tornar mais artesanal. Existem alguns objectos descuidados aqui e ali, mas isso não invalida nem menoriza em nada a excelência do trabalho desta equipa de estudantes.
A qualidade da curta não se limita aos aspectos técnicos visuais, o filme é em si uma pequena pérola pela forma como obedece a um ritmo lento em consonância com o tema, criando toda uma atmosfera que nos ajuda a transportar para o universo representado em cena. O design dos personagens não é o melhor do filme, ainda assim o personagem principal é uma delícia, convincente e capaz de nos fazer sentir que vive ali, naquele mundo desolado.
Folksongs & Ballads (2011) Mathieu Vernerie, Pauline Defachelles, Rémy Paul
março 25, 2013
Curso de Criação Hipermedia
Este ano, em Julho, irei fazer um pequeno curso de especialização em Criação Hipermedia. Será uma espécie de Escola de Verão focada no campo do Design de Interacção. O repto para criar este curso veio da parte do colega Paulo Ranieri da Universidade Mackenzie, São Paulo. A especialização irá ter creditação de ECTS por parte da Universidade do Minho.
O curso que preparei para este efeito, fará um abordagem ao design de interacção a partir de uma perspectiva bipartida assente na Narrativa e no Jogo. A minha intenção é preparar as pessoas para abordarem a interacção de uma perspectiva afectiva, capaz de desenvolver fluxos empáticos e consequentes. Ou seja, o que procuraremos aqui será ir além da mera interação orientada à tarefa, e assim dar corpo e autonomia à interactividade, para que esta ganhe sentidos próprios.
Mais informação sobre o conteúdo do curso e inscrição, pode ser vista em http://hipermedia.engagelab.org.
Diagrama do Design de Interacção de Bill Verplank
O curso que preparei para este efeito, fará um abordagem ao design de interacção a partir de uma perspectiva bipartida assente na Narrativa e no Jogo. A minha intenção é preparar as pessoas para abordarem a interacção de uma perspectiva afectiva, capaz de desenvolver fluxos empáticos e consequentes. Ou seja, o que procuraremos aqui será ir além da mera interação orientada à tarefa, e assim dar corpo e autonomia à interactividade, para que esta ganhe sentidos próprios.
Mais informação sobre o conteúdo do curso e inscrição, pode ser vista em http://hipermedia.engagelab.org.
a emocionalidade de Elizabeth (BioShock Infinite)
Creating Elizabeth: The Women That Brought Her To Life (2013) é um documento importante acabado de publicar pela Irrational Games, uma espécie de making of da personagem Elizabeth para o jogo BioShock Infinite (2013). Ao longo dos 7 minutos ficamos a compreender como foi criada a personagem, quantas mulheres foram necessárias para lhe dar vida. Mais interessante para mim ainda é a discussão em redor da importância do personagem para a emocionalidade do jogo, discutida pelo próprio Ken Levine.
Para a criação da personagem foram necessárias 4 mulheres. Courtnee Draper para a voz. Heather Gordon para a dramatização da linguagem corporal. Amanda Jeffrey responsável pelo desenho das componentes sociais e psicológicas. E finalmente para dar a cara em todo o merchandising foram buscar a cosplayer russa, Anna Moleva. Ao longo do filme é dado a compreender como foram integradas as facetas de cada uma destas mulheres para criar uma única mulher virtual. Fiquei desejoso de jogar para poder interagir com aquele que parece ser um dos personagens virtuais mais completos num jogo.
O que mais despertou o meu interesse foi logo na abertura Ken Levine a assumir a necessidade de fazer do jogador um participante do mundo de Bioshock. E a assumir que para que isso pudesse acontecer era necessário fazer de Elizabeth o centro emocional do jogo. O que é verdade. Há muitos anos que falo disto, os FPS são muito fracos em termos de expressividade emocional, porque não existe corpo do personagem com quem empatizar (ver o ponto 1.4.2 Perspectiva Personalizada na tese A Convergência entre o Cinema e a Realidade Virtual, 2007). A Valve percebeu isso em 2004 criando Alyx, e Ken Levine percebeu agora também que se queria ter um FPS, em que o jogador é o protagonista mas sem corpo, precisava de ter outra forma de ajudar o jogador a projectar a sua empatia.
Elizabeth é assim a companheira, mas é muito mais do que isso, ela é um verdadeiro Espelho Emocional do nosso personagem. Por isso ela é tão importante, e por isso não tiveram qualquer problema em ir buscar 4 mulheres para lhe dar corpo, o esforço será recompensado.
Para a criação da personagem foram necessárias 4 mulheres. Courtnee Draper para a voz. Heather Gordon para a dramatização da linguagem corporal. Amanda Jeffrey responsável pelo desenho das componentes sociais e psicológicas. E finalmente para dar a cara em todo o merchandising foram buscar a cosplayer russa, Anna Moleva. Ao longo do filme é dado a compreender como foram integradas as facetas de cada uma destas mulheres para criar uma única mulher virtual. Fiquei desejoso de jogar para poder interagir com aquele que parece ser um dos personagens virtuais mais completos num jogo.
O que mais despertou o meu interesse foi logo na abertura Ken Levine a assumir a necessidade de fazer do jogador um participante do mundo de Bioshock. E a assumir que para que isso pudesse acontecer era necessário fazer de Elizabeth o centro emocional do jogo. O que é verdade. Há muitos anos que falo disto, os FPS são muito fracos em termos de expressividade emocional, porque não existe corpo do personagem com quem empatizar (ver o ponto 1.4.2 Perspectiva Personalizada na tese A Convergência entre o Cinema e a Realidade Virtual, 2007). A Valve percebeu isso em 2004 criando Alyx, e Ken Levine percebeu agora também que se queria ter um FPS, em que o jogador é o protagonista mas sem corpo, precisava de ter outra forma de ajudar o jogador a projectar a sua empatia.
Elizabeth é assim a companheira, mas é muito mais do que isso, ela é um verdadeiro Espelho Emocional do nosso personagem. Por isso ela é tão importante, e por isso não tiveram qualquer problema em ir buscar 4 mulheres para lhe dar corpo, o esforço será recompensado.
março 22, 2013
tecnologias da cor no cinema
A cada ano que passa a arqueologia das tecnologias apresenta mais evidências do facto de que raramente existe apenas uma data ou um sujeito a ser apresentado como o criador original. Quase tudo, é inventado de tecnologia em tecnologia, melhoramento em melhoramento. Neste sentido não me canso de citar Kevin Kelly dizer, que não existem invenções originais, o criadas do nada, antes são fruto "de uma inevitabilidade tecnológica". O caso do cinema é já um enorme clássico neste sentido como já tive oportunidade de discutir no texto Nascimento da Tecnologia do Cinema. O que trago agora diz respeito à criação do primeiro filme a cores.
Até agora acreditava-se que o primeiro processo de colorização, aparte os filmes pintados à mão, teria sido apresentado em Inglaterra em 1906. O Kinemacolor era apenas um processo de colorização a duas cores. O primeiro processo a três cores, como hoje o conhecemos, o Technicolor teria surgido apenas em 1932. Foram precisos 110 anos para descobrirmos que antes destes dois processos, existiu um outro, a três cores patenteado em 1899 - BP6202 Means for Taking and Exhibition Cinematographic Pictures -, por Frederick Marshall Lee e Edward Raymond Turner. Mas Lee e Turner teriam de esperar até 1901 para que Alfred Darling fizesse a primeira câmara com o processo criado por estes, e 1902 para que Darling criasse o primeiro projector. Os primeiros filmes seriam rodados entre 1902 e 1903, e em 1903 Ed Turner morria. Com ele acaba o projeto. George Albert Smith é encarregue de continuar o seu desenvolvimento, mas acaba por se dedicar ao desenvolvimento de uma técnica mais simples, que viria a dar origem ao conhecido Kinemacolor.
Em 1937 estes filmes foram entregues ao Museu de Ciência em Inglaterra, mas foi preciso esperar até 2012 para podermos descobrir toda esta história. A razão pela qual foram precisos esperar 110 anos é ridiculamente simples. No início do cinema não existiam ainda standards de película. Desse modo a película utilizada por Lee e Turner tinha 38mm, enquanto o standard das máquinas que existiam em 1937 e depois disso se baseavam todas nos 35mm. Deste modo as fitas acabaram por ficar nas caixas até 2012.
Todo o processo de construção da cor a partir de três cores está explicado no excelente vídeo realizado pelo National Museum, que podem ver aqui abaixo, e no qual se pode também ver os vários excertos dos filmes a cores encontrados.
Até agora acreditava-se que o primeiro processo de colorização, aparte os filmes pintados à mão, teria sido apresentado em Inglaterra em 1906. O Kinemacolor era apenas um processo de colorização a duas cores. O primeiro processo a três cores, como hoje o conhecemos, o Technicolor teria surgido apenas em 1932. Foram precisos 110 anos para descobrirmos que antes destes dois processos, existiu um outro, a três cores patenteado em 1899 - BP6202 Means for Taking and Exhibition Cinematographic Pictures -, por Frederick Marshall Lee e Edward Raymond Turner. Mas Lee e Turner teriam de esperar até 1901 para que Alfred Darling fizesse a primeira câmara com o processo criado por estes, e 1902 para que Darling criasse o primeiro projector. Os primeiros filmes seriam rodados entre 1902 e 1903, e em 1903 Ed Turner morria. Com ele acaba o projeto. George Albert Smith é encarregue de continuar o seu desenvolvimento, mas acaba por se dedicar ao desenvolvimento de uma técnica mais simples, que viria a dar origem ao conhecido Kinemacolor.
Two Clowns (1906) a duas cores, em Kinemacolor
Em 1937 estes filmes foram entregues ao Museu de Ciência em Inglaterra, mas foi preciso esperar até 2012 para podermos descobrir toda esta história. A razão pela qual foram precisos esperar 110 anos é ridiculamente simples. No início do cinema não existiam ainda standards de película. Desse modo a película utilizada por Lee e Turner tinha 38mm, enquanto o standard das máquinas que existiam em 1937 e depois disso se baseavam todas nos 35mm. Deste modo as fitas acabaram por ficar nas caixas até 2012.
O primeiro processo de colorização cinematográfico. Processo a três cores. Criado em 1901.
Todo o processo de construção da cor a partir de três cores está explicado no excelente vídeo realizado pelo National Museum, que podem ver aqui abaixo, e no qual se pode também ver os vários excertos dos filmes a cores encontrados.
março 21, 2013
"Hitchcock" e Alma Reville
Hitchcock (2012) não foi muito bem recebido pela crítica essencialmente porque todos esperavam o clássico Biopic com dados sobre os feitos e as visões artísticas de Hitchcock. Mas o filme centra-se num momento muito específico da sua carreira, e pior do que isso discute mais a sua humanidade do que a sua arte. Talvez por isso mesmo eu o tenha adorado.
O filme é fascinante porque traz ao conhecimento público uma realidade que já se ia discutindo em termos académicos, a força e a importância de Alma, a sua primeira e única mulher durante 54 anos. Muito do que se sabe foi trazido para o conhecimento público através de um livro da filha de ambos, Pat Hitchcock O'Connell, Alma Hitchcock: The Woman Behind the Man (2004). Na realidade o filme funciona como a verdadeira encarnação do ditado "por detrás de um grande homem está sempre uma grande mulher". Mas é mais do que isso porque Alma não foi apenas um suporte emocional, Alma esteve verdadeiramente presente como colaboradora criativa no trabalho de Hitchcock. Julgo que isso incomodará mais as pessoas, mas como ela diz a uma certa altura no filme, eles conheceram-se no mundo do cinema, e partilhavam a mesma paixão pela arte. Aliás só isso explica que Psycho (1960) tenha sido levado por diante, produzido com as economias do casal.
Muito interessante verificar que a carreira de Alma em termos de registo apareça apenas durante a fase inglesa de Hitchcock. Porque na verdade Hitch e Alma funcionavam como uma verdadeira dupla criativa, ele na visão geral, na escolha das grandes ideias e realização, e ela no detalhe, na afinação de toda a ideia do guião à montagem. Impressiona conhecer os promenores em que ela foi fundamental na criação do cinema de Hitchcock, porque não bastam grandes ideias, a arte é feita nos detalhes. Por acaso Alma foi a sua mulher, mas podia ter sido outra pessoa qualquer, porque no fundo a arte cinematográfica é uma arte profundamente colectiva.
Só é pena que Alma na sua condição de mulher do grande artista, tenha escolhido resignar-se à sua sombra. Embora perceba, e como ela diz a uma determinada altura, "não estou preocupada que todos saibam, só me interessa que quem me importa saiba". Na verdade ela poderá não ter escolhido, porque o apelo de um homem misterioso para os mass media era e continua a ser muito maior, do que o de uma dupla marido e mulher. Isso fica para a história, para a análise do passado, e é o que este filme faz muito bem. Aliás como se pode ver pelo poster, ao fim de décadas, podemos ver uma imagem icónica de Hitch em que este não é apenas uma silhueta do homem isolado, o único criativo.
Quanto à arte de Hitchcock, o filme acaba por se focar sobre o seu poder de controlo dos produtores. Perspicaz e muito inteligente não apenas na manipulação das audiências mas de toda a máquina financeira e censória que circundava o cinema. Hitchcock foi verdadeiramente brilhante não apenas na sua capacidade criativa de escolher e realizar os melhores filmes, mas também na sua capacidade para liderar e levar até ao final os seus projetos. Como disse uma vez Orson Welles, fazer cinema, é passar 98% à procura de dinheiro para o fazer, e 2% do tempo a fazê-lo. Hitch fez-me lembrar Orson Welles, assim como Steve Jobs. Em termos obsessivos e com a uma enorme capacidade para fazer com que todos o seguissem, desde os financiadores às massas.
"Aliás como se pode ver pelo poster, ao fim de décadas, podemos ver uma imagem icónica de Hitch em que este não é apenas uma silhueta do homem isolado, o único criativo."
O filme é fascinante porque traz ao conhecimento público uma realidade que já se ia discutindo em termos académicos, a força e a importância de Alma, a sua primeira e única mulher durante 54 anos. Muito do que se sabe foi trazido para o conhecimento público através de um livro da filha de ambos, Pat Hitchcock O'Connell, Alma Hitchcock: The Woman Behind the Man (2004). Na realidade o filme funciona como a verdadeira encarnação do ditado "por detrás de um grande homem está sempre uma grande mulher". Mas é mais do que isso porque Alma não foi apenas um suporte emocional, Alma esteve verdadeiramente presente como colaboradora criativa no trabalho de Hitchcock. Julgo que isso incomodará mais as pessoas, mas como ela diz a uma certa altura no filme, eles conheceram-se no mundo do cinema, e partilhavam a mesma paixão pela arte. Aliás só isso explica que Psycho (1960) tenha sido levado por diante, produzido com as economias do casal.
Alfred Hitchcock e Alma Reville
Muito interessante verificar que a carreira de Alma em termos de registo apareça apenas durante a fase inglesa de Hitchcock. Porque na verdade Hitch e Alma funcionavam como uma verdadeira dupla criativa, ele na visão geral, na escolha das grandes ideias e realização, e ela no detalhe, na afinação de toda a ideia do guião à montagem. Impressiona conhecer os promenores em que ela foi fundamental na criação do cinema de Hitchcock, porque não bastam grandes ideias, a arte é feita nos detalhes. Por acaso Alma foi a sua mulher, mas podia ter sido outra pessoa qualquer, porque no fundo a arte cinematográfica é uma arte profundamente colectiva.
Alfred Hitchcock e Alma Reville, na fase inicial em Inglaterra
Só é pena que Alma na sua condição de mulher do grande artista, tenha escolhido resignar-se à sua sombra. Embora perceba, e como ela diz a uma determinada altura, "não estou preocupada que todos saibam, só me interessa que quem me importa saiba". Na verdade ela poderá não ter escolhido, porque o apelo de um homem misterioso para os mass media era e continua a ser muito maior, do que o de uma dupla marido e mulher. Isso fica para a história, para a análise do passado, e é o que este filme faz muito bem. Aliás como se pode ver pelo poster, ao fim de décadas, podemos ver uma imagem icónica de Hitch em que este não é apenas uma silhueta do homem isolado, o único criativo.
Helen Mirren como Alma Reville e Anthony Hopkins como Alfred Hitchcock
Quanto à arte de Hitchcock, o filme acaba por se focar sobre o seu poder de controlo dos produtores. Perspicaz e muito inteligente não apenas na manipulação das audiências mas de toda a máquina financeira e censória que circundava o cinema. Hitchcock foi verdadeiramente brilhante não apenas na sua capacidade criativa de escolher e realizar os melhores filmes, mas também na sua capacidade para liderar e levar até ao final os seus projetos. Como disse uma vez Orson Welles, fazer cinema, é passar 98% à procura de dinheiro para o fazer, e 2% do tempo a fazê-lo. Hitch fez-me lembrar Orson Welles, assim como Steve Jobs. Em termos obsessivos e com a uma enorme capacidade para fazer com que todos o seguissem, desde os financiadores às massas.
março 20, 2013
"The Cave", inteligente mas pouco emocional
The Cave (2013) é um jogo de design inteligente que apela muito mais à componente intelectual do que à emocional. Passamos a maior parte do tempo a resolver puzzles e enigmas e demasiado pouco tempo a apreciar os aspectos sociais e psicológicos dos nossos personagens.
The Cave é um jogo de género, encaixa no modelo de aventura gráfica, no qual todos os objetos têm um propósito, e em que a combinação de um ou mais objetos nos pode conduzir à satisfação final. Mas perde neste campo por ter pouco para oferecer como história. Temos bastantes personagens (7), podendo jogar com apenas três de cada vez, mas ficamos a saber muito pouco sobre eles, apesar de colecionarmos itens ao longo do jogo que dizem respeito exatamente às suas narrativas. Faltou claramente uma capacidade para interligar todos os elementos e dar vida dramática e emocional aos seus propósitos. A caverna é aqui o narrador e quem conduz, de forma muito pouco ortodoxa diga-se, mas em linha completa com o espírito de Ron Gilbert e Tim Schaffer e os seus jogos anteriores. Aliás é este condimento de uma caverna sem escrúpulos morais que serve para atenuar o nosso sentimento de vazio emocional.
Em termos de design, o jogo é brilhante, no sentido em que temos sete personagens, e podem funcionar todas com todas num sentido de interdependência e colaboratividade. Ao longo do jogo dei por mim imensas vezes a questionar-me sobre a quantidade de interligações intrincadas que existem entre cada uma e que permitem que o jogo funcione. O que só por si deverá ter sido a maior dor de cabeça do desenvolvimento de todo o jogo. Aliás muito provavelmente à custa de desenvolver algo assim complexo para um pequeno jogo, terá acabado por se ficar por isso mesmo, por um virtuosismo de design, deixando a experiência de jogo um pouco ao abandono. Como só podemos jogar com 3 personagens de cada vez, passar por todos os níveis implica realizar o jogo mais do que uma vez, já que alguns dos níveis estão reservados a alguns dos personagens. A razão para isso está no facto de cada um estar dotado de determinadas capacidades, e que só essas permitem atravessar determinados níveis. Fica aqui o mapa de todos os níveis.
Finalmente a arte de todo o jogo é adorável, e em certa medida acaba por em conjunto com o design compensar a nossa experiência. Os personagens são belíssimos, individualizados e autênticos, e os cenários fazem-nos desejar por mais e mais. Apesar do esforço de resolução de cada puzzle, a atmosfera estética criada mantén-nos interessados pelo que se deverá suceder a seguir e até ao final. Cada área é mais detalhada e trabalhada que a anterior. Por outro lado a atmosfera pesada própria de uma caverna entra constantemente em choque com o humor amoral da própria caverna o que contribui para a nossa gratificação e imersividade. Não sendo um jogo de excelência, apresenta enormes atributos técnicos.
Declaração de interesses: Joguei uma cópia deste videojogo adquirida pelos meus próprios meios. Não tenho qualquer relação comercial com os autores e editores.
The Cave é um jogo de género, encaixa no modelo de aventura gráfica, no qual todos os objetos têm um propósito, e em que a combinação de um ou mais objetos nos pode conduzir à satisfação final. Mas perde neste campo por ter pouco para oferecer como história. Temos bastantes personagens (7), podendo jogar com apenas três de cada vez, mas ficamos a saber muito pouco sobre eles, apesar de colecionarmos itens ao longo do jogo que dizem respeito exatamente às suas narrativas. Faltou claramente uma capacidade para interligar todos os elementos e dar vida dramática e emocional aos seus propósitos. A caverna é aqui o narrador e quem conduz, de forma muito pouco ortodoxa diga-se, mas em linha completa com o espírito de Ron Gilbert e Tim Schaffer e os seus jogos anteriores. Aliás é este condimento de uma caverna sem escrúpulos morais que serve para atenuar o nosso sentimento de vazio emocional.
Em termos de design, o jogo é brilhante, no sentido em que temos sete personagens, e podem funcionar todas com todas num sentido de interdependência e colaboratividade. Ao longo do jogo dei por mim imensas vezes a questionar-me sobre a quantidade de interligações intrincadas que existem entre cada uma e que permitem que o jogo funcione. O que só por si deverá ter sido a maior dor de cabeça do desenvolvimento de todo o jogo. Aliás muito provavelmente à custa de desenvolver algo assim complexo para um pequeno jogo, terá acabado por se ficar por isso mesmo, por um virtuosismo de design, deixando a experiência de jogo um pouco ao abandono. Como só podemos jogar com 3 personagens de cada vez, passar por todos os níveis implica realizar o jogo mais do que uma vez, já que alguns dos níveis estão reservados a alguns dos personagens. A razão para isso está no facto de cada um estar dotado de determinadas capacidades, e que só essas permitem atravessar determinados níveis. Fica aqui o mapa de todos os níveis.
Mapa dos níveis de The Cave (2013). A laranja estão os níveis que podem ser visitados apenas se na posse de cada um dos 7 personagens. (Imagem de Games Radar)
Finalmente a arte de todo o jogo é adorável, e em certa medida acaba por em conjunto com o design compensar a nossa experiência. Os personagens são belíssimos, individualizados e autênticos, e os cenários fazem-nos desejar por mais e mais. Apesar do esforço de resolução de cada puzzle, a atmosfera estética criada mantén-nos interessados pelo que se deverá suceder a seguir e até ao final. Cada área é mais detalhada e trabalhada que a anterior. Por outro lado a atmosfera pesada própria de uma caverna entra constantemente em choque com o humor amoral da própria caverna o que contribui para a nossa gratificação e imersividade. Não sendo um jogo de excelência, apresenta enormes atributos técnicos.
Declaração de interesses: Joguei uma cópia deste videojogo adquirida pelos meus próprios meios. Não tenho qualquer relação comercial com os autores e editores.
março 19, 2013
OffBook: "The Rise of Web Comics"
Esta semana a OffBook dedica o seu episódio quinzenal aos webcomics, uma forma de expressão recente potenciada pela internet. É um dos movimentos de nicho cultural e estético mais relevantes no meio web no que toca ao desenvolvimento de novas linguagens gráficas e interactivas, por isso tenho pena que o documentário se tenha ficado por três ou quatro exemplos apenas, e que tenha relegado para segundo plano tanto a componente interactiva como de animação.
Julgo que os editores quiseram claramente realizar uma separação entre os Web Comics, os Motion Comics e os Interactive Comics, mas no final acabamos por ficar com a ideia de que os webcomics, não são mais do que comics tradicionais em formato digital. Do meu ponto de vista isto é errado, porque web comics deveria servir para juntar tudo num mesmo patamar, já que um web comic pode ser qualquer um dos outros formatos. Além de que me parece que o meio se torna muito mais rico, e diria mesmo autónomo face à linguagem dos comics impressos.
O documentário acaba por se focar mais sobre a liberdade de expressão que o suporte web permite face ao suporte papel, à possibilidade de criação de nichos delimitados por gostos estranhos e "fora da caixa". Nesse sentido é muito interessante, e vale a pena investir os sete minutos. Por outro lado ficam de fora projectos excepcionais que mereciam destaque no sentido de serem impulsionados, no sentido de nos trazerem mais do que a mera aplicação em distintos suportes, a geração de novos modos de expressão e comunicação. Deixo-vos um trabalho nessa linha que vale a pena conhecerem depois de verem o documentário: The Random Adventures of Brandon Generator (2012).
Julgo que os editores quiseram claramente realizar uma separação entre os Web Comics, os Motion Comics e os Interactive Comics, mas no final acabamos por ficar com a ideia de que os webcomics, não são mais do que comics tradicionais em formato digital. Do meu ponto de vista isto é errado, porque web comics deveria servir para juntar tudo num mesmo patamar, já que um web comic pode ser qualquer um dos outros formatos. Além de que me parece que o meio se torna muito mais rico, e diria mesmo autónomo face à linguagem dos comics impressos.
O documentário acaba por se focar mais sobre a liberdade de expressão que o suporte web permite face ao suporte papel, à possibilidade de criação de nichos delimitados por gostos estranhos e "fora da caixa". Nesse sentido é muito interessante, e vale a pena investir os sete minutos. Por outro lado ficam de fora projectos excepcionais que mereciam destaque no sentido de serem impulsionados, no sentido de nos trazerem mais do que a mera aplicação em distintos suportes, a geração de novos modos de expressão e comunicação. Deixo-vos um trabalho nessa linha que vale a pena conhecerem depois de verem o documentário: The Random Adventures of Brandon Generator (2012).
Coreografia e velocidade na primeira-pessoa
Insane Office Escape 2 (2013) de Ilya Naishuller é simplesmente uma das melhores curtas de ação realizadas para a rede. Temos essencialmente muita velocidade, muitos VFX, muito parkour, e tudo filmado em câmara subjectiva, ou seja primeira-pessoa. Só um aviso, o filme é extremamente violento, por isso não aconselhado a menores, nem a pessoas mais sensíveis.
Como se pode ver pelo título este é o segundo filme realizado por esta equipa, com o mesmo tema e a mesma forma. O primeiro Insane Office Escape (2011) surgiu há dois anos e conseguiu mais de 2.5 milhões de visualizações no YouTube, acredito que este vá superar, porque a qualidade técnica subiu muitíssimo. Não é apenas a velocidade, mas os efeitos são dignos de qualquer filme de Hollywood. O que mais impressiona em tudo isto é mesmo a vertigem da velocidade imprimida pela montagem inteligente e pela força da câmara subjetiva. Insane Office Escape 2 estimula sensações perceptivas a que só estamos habituados quando andamos nas atrações dos parques de diversões, tal é a intensidade imprimida. Além da componente perceptiva da forma, impressionou-me muito toda a componente coreográfica do filme, é de elevada qualidade no que toca a criação de realismo nas cenas de ação, funcionando ainda numa sincronização perfeita com os efeitos especiais. Ficamos agora à espera do making of.
A narrativa é básica, mas interessante, porque não temos violência pela violência apenas, existe um propósito concreto, um objetivo, e temos até um fechamento. Neste filme Ilya Naishuller conseguiu juntar o melhor da forma da ação gráfica com ideias da ficção-científica. Diria que temos aqui o exemplo perfeito da mistura entre as linguagens cinematográfica e dos videojogos.
Como se pode ver pelo título este é o segundo filme realizado por esta equipa, com o mesmo tema e a mesma forma. O primeiro Insane Office Escape (2011) surgiu há dois anos e conseguiu mais de 2.5 milhões de visualizações no YouTube, acredito que este vá superar, porque a qualidade técnica subiu muitíssimo. Não é apenas a velocidade, mas os efeitos são dignos de qualquer filme de Hollywood. O que mais impressiona em tudo isto é mesmo a vertigem da velocidade imprimida pela montagem inteligente e pela força da câmara subjetiva. Insane Office Escape 2 estimula sensações perceptivas a que só estamos habituados quando andamos nas atrações dos parques de diversões, tal é a intensidade imprimida. Além da componente perceptiva da forma, impressionou-me muito toda a componente coreográfica do filme, é de elevada qualidade no que toca a criação de realismo nas cenas de ação, funcionando ainda numa sincronização perfeita com os efeitos especiais. Ficamos agora à espera do making of.
A narrativa é básica, mas interessante, porque não temos violência pela violência apenas, existe um propósito concreto, um objetivo, e temos até um fechamento. Neste filme Ilya Naishuller conseguiu juntar o melhor da forma da ação gráfica com ideias da ficção-científica. Diria que temos aqui o exemplo perfeito da mistura entre as linguagens cinematográfica e dos videojogos.
Insane Office Escape 2 (2013) de Ilya Naishuller
Pelo que percebi ambas as curtas funcionam como videoclips de músicas da banda russa Biting Elbows. E realmente revendo o primeiro filme, parece mais videoclip que curta, já o segundo filme é bastante mais autónomo, principalmente porque o filme não prescinde de toda a sonorização de efeitos sonoros.
março 18, 2013
"Out of Nowhere", da escola Bezalel
Out of Nowhere (2012) é o filme de graduação de Maayan Tzuriel e Isca Mayo e é mais uma animação excepcional a surgir da escola Bezalel, Israel. Fiquei impressionado com a iluminação, mas mais ainda com o controlo narrativo e a criação de atmosfera emocional.
No campo visual a animação é soberba, e totalmente dentro da linha daquilo que a Bezalel nos tem habituado, que passa por importar para o visual 3d os tons pastel, pouco regulares neste tipo de tecnologia. A lógica pastel não é muito vista essencialmente porque está no oposto do 3d em termos de brilho difuso, se existe coisa em que o 3d se singulariza é na sua capacidade de atribuir brilho plastificado. Ora seguir uma corrente estética que está no oposto dessa capacidade torna-se de algum modo anti-natura. Mas é exactamente esse o caminho que a Bezalel tem seguido nos vários projectos que vêm sendo apresentados, servindo isso para singularizar as suas criações de todas as outras.
Mas este filme não se fica pelo trabalho estético, temos aqui ao contrário de outros trabalhos que eram mais abstractos no campo narrativo, um caminho muito bem definido, uma personagem com um sentir, e uma progressão e crescimento desse mesmo personagem. Mais ainda é que toda a atmosfera é construída em função deste personagem, o seu sentir espalha-se pela imagem e som. Toda a forma nomeadamente a planificação, evolui para dar sentimento à progressão do sentir do nosso personagem, De certo modo Tzuriel e Mayo conseguiram, neste pequeno filme, projectar completamente as emoções do seu personagem sobre toda a palete formal do filme.
Finalmente no campo da história é brilhante e extremamente atual. Mas sobre isso deixo apenas a ideia subjacente ao filme que os autores escreveram,
Mas este filme não se fica pelo trabalho estético, temos aqui ao contrário de outros trabalhos que eram mais abstractos no campo narrativo, um caminho muito bem definido, uma personagem com um sentir, e uma progressão e crescimento desse mesmo personagem. Mais ainda é que toda a atmosfera é construída em função deste personagem, o seu sentir espalha-se pela imagem e som. Toda a forma nomeadamente a planificação, evolui para dar sentimento à progressão do sentir do nosso personagem, De certo modo Tzuriel e Mayo conseguiram, neste pequeno filme, projectar completamente as emoções do seu personagem sobre toda a palete formal do filme.
Finalmente no campo da história é brilhante e extremamente atual. Mas sobre isso deixo apenas a ideia subjacente ao filme que os autores escreveram,
How do we face an existence in which one is no longer relevant? How can we continue to live in an illusion?
Two seemingly opposite characters meet in a peculiar situation. When their similarities are revealed, the protagonist is forced to reexamine his life and choose between living a life of sterile existence or stepping outside of his world to discover new horizons.
Out of Nowhere (2012) de Maayan Tzuriel e Isca Mayo
março 15, 2013
"Proteus", viagens irrepetíveis
Proteus (2013) é uma experiência interactiva de grande qualidade estética. Criado por duas pessoas, Ed Key na programação e arte e David Kanaga na música. Apesar de desenhado a 8bits apenas, rapidamente esquecemos a baixa resolução e nos deixamos escapar e imergir totalmente pelo mundo de Proteus. O mais interessante acaba por surgir a partir do seu lado procedimental, ou seja do facto de não se tratar de um mundo pré-desenhado, mas antes de um algoritmo. O mundo e a paisagem sonora em que entramos são geradas a cada re-início de jogo, e nesse sentido, cada jogo é sempre uma experiência única e irrepetível.
Podemos avançar a ideia de que Proteus nao é um jogo por falta de objectivos claros, mas isso é aquilo que se percebe apenas à superfície, porque na verdade Proteus apresenta um início e um fim, assim como uma progressão perfeitamente delineada. A chegada ao final, é no fundo o objectivo último, e depende da nossa acção sobre o mundo para acontecer. Cada experiência completa leva-nos a atravessar as quatro estações, fazendo-nos sentir o frio e o calor de cada uma. A experiência é visualmente muito conseguida principalmente na selecção de cores, é aquilo que nos faz esquecer os 8 bits, de tão harmoniosas e em sintonia com o espírito de cada estação. No entanto acredito que a componente musical acaba por ser aquilo que contribui com maior singularidade para o jogo. Os nossos movimentos, aproximações e distanciamentos de determinados elementos e locais cria faixas musicais próprias, que podemos fazer variar com a nossa acção no espaço. Por vezes damos por nós a parar, ou a voltar atrás, apenas para poder apreciar o som que se produziu à nossa volta.
Em termos das quatro estacões, posso dizer que não me entusiasmou particularmente, aqui mais por defeito profissional. Passei vários anos a estudar o desenvolvimento emocional em ambientes virtuais, e o que posso dizer, é que isto apesar de ser limitado em termos de palete emocional, o problema não é propriamente dos designers, mas antes da opção tomada para o desenho de Proteus. Como tenho discutido ao longo do meu trabalho e venho avançando nessas conclusões com doutorandos, a estimulação de emoções a partir de ambientes é bastante limitada. Temos aqui as quatro estações, sentimos que percorremos uma palete diversa de emoções, mas se pararmos para pensar sobre o que se passou, não conseguimos ir além da contemplação, bem-estar, tranquilidade, surpresa e curiosidade. Tudo o resto, tudo aquilo que verdadeiramente nos marca, as emoções combinadas, estruturadas e complexas não estão ao alcance de um mero ambiente. Para chegarmos a este tipo de emoções precisamos de personagens, precisamos de empatia. Sem estes não temos como nos ligar ao artefacto, e senti-lo, porque este é no fundo um artefacto desprovido de vida.
Sei bem que o jogo tem o poder de nos encantar, e de nos fazer escapar do nosso mundo durante os 45 minutos que por lá passamos, mas terminados, ficamos sem saber porquê, nem o que fica. Comparando com Dear Esther que também era mais ambiente do que personagens, tínhamos uma narrativa que nos conduzia, e tínhamos personagens, tínhamos inclusive um narrador que nos guiava, a quem nos "colávamos". Aliás o mesmo se passava em Myst, outro jogo que nos fazia deambular por um mundo deserto, apesar dos puzzles, a força estava nos dois irmãos e o seu pai, na narrativa que se desvelava a cada nova etapa. Em Proteus, cada etapa corresponde a um novo universo visual e sonoro, e ficamos verdadeiramente desejosos de continuar a experienciá-lo, mas no final, é só isso mesmo, nada mais nos resta.
Diria que Proteus funcionaria muito bem como instalação, uma peça de arte digital num museu, com a qual pudéssemos interagir e escapar do espaço circundante, saborear novas planícies, novos horizontes sonoros. É uma obra experimental que se apodera de uma das melhores características dos ambientes tridimensionais, a interacção através da navegação em conjunto com a música adaptativa.
Declaração de interesses: Joguei uma cópia deste videojogo adquirida pelos meus próprios meios. Não tenho qualquer relação comercial com os autores e editores.
Podemos avançar a ideia de que Proteus nao é um jogo por falta de objectivos claros, mas isso é aquilo que se percebe apenas à superfície, porque na verdade Proteus apresenta um início e um fim, assim como uma progressão perfeitamente delineada. A chegada ao final, é no fundo o objectivo último, e depende da nossa acção sobre o mundo para acontecer. Cada experiência completa leva-nos a atravessar as quatro estações, fazendo-nos sentir o frio e o calor de cada uma. A experiência é visualmente muito conseguida principalmente na selecção de cores, é aquilo que nos faz esquecer os 8 bits, de tão harmoniosas e em sintonia com o espírito de cada estação. No entanto acredito que a componente musical acaba por ser aquilo que contribui com maior singularidade para o jogo. Os nossos movimentos, aproximações e distanciamentos de determinados elementos e locais cria faixas musicais próprias, que podemos fazer variar com a nossa acção no espaço. Por vezes damos por nós a parar, ou a voltar atrás, apenas para poder apreciar o som que se produziu à nossa volta.
Sei bem que o jogo tem o poder de nos encantar, e de nos fazer escapar do nosso mundo durante os 45 minutos que por lá passamos, mas terminados, ficamos sem saber porquê, nem o que fica. Comparando com Dear Esther que também era mais ambiente do que personagens, tínhamos uma narrativa que nos conduzia, e tínhamos personagens, tínhamos inclusive um narrador que nos guiava, a quem nos "colávamos". Aliás o mesmo se passava em Myst, outro jogo que nos fazia deambular por um mundo deserto, apesar dos puzzles, a força estava nos dois irmãos e o seu pai, na narrativa que se desvelava a cada nova etapa. Em Proteus, cada etapa corresponde a um novo universo visual e sonoro, e ficamos verdadeiramente desejosos de continuar a experienciá-lo, mas no final, é só isso mesmo, nada mais nos resta.
Diria que Proteus funcionaria muito bem como instalação, uma peça de arte digital num museu, com a qual pudéssemos interagir e escapar do espaço circundante, saborear novas planícies, novos horizontes sonoros. É uma obra experimental que se apodera de uma das melhores características dos ambientes tridimensionais, a interacção através da navegação em conjunto com a música adaptativa.
Declaração de interesses: Joguei uma cópia deste videojogo adquirida pelos meus próprios meios. Não tenho qualquer relação comercial com os autores e editores.
março 14, 2013
Hobbit, tão pequeno e tão longo
The Hobbit: An Unexpected Journey (2012) é longo, muito longo. Como se não chegasse, não consegui extrair absolutamente nada de novo face à trilogia The Lord of the Rings (2001, 2002, 2003) que vimos antes. Mas o que me impressionou verdadeiramente foi o final do filme, quando descobri que estas três horas eram apenas as primeiras de três partes!!! Peço desculpa aos fãs de Tolkien, mas está aqui a acontecer algo inacreditável. Como é que três volumes de 500 páginas cada um, dão 3 filmes de 3 horas, e depois um pequeno livro de 300 páginas dá sozinho, mais 3 filmes de 3 horas?!
Primeiro, é um desrespeito pela obra do autor. Não se espera que eles vão além do que Tolkien deixou escrito, o objectivo de uma adaptação deste género, seguindo o que foi feito antes, não é pôr-se a especular. Mas o desrespeito maior surge porque como dizia alguém na IMDB, isto é uma atitude puramente mercenária. Pegar neste livro e esticá-lo para três filmes, tem apenas e só um objectivo, criar máquinas de fazer dinheiro.
Apesar de tudo, o que mais importa para mim em The Hobbit é a arte visual. Sinto uma sensação estranha ao ver este filme, no qual se mistura claramente a arte da pintura e ilustração com o cinema. Ver Hobbit é como ver uma tela em movimento. Não é animação, nem é filme de imagem real clássica, é um novo meio de expressão. Os mundos e personagens criados em CGI juntos com os atores reais e as paisagens da Nova Zelândia, criam uma espécie de novo universo mágico, mas plausível e crível. Como se tívessemos um meio de expressão intermédio, entre o formato do Livro e do Filme. Um formato que permite representar toda a abstração contida num texto quando esta é impossível de representar em imagens da realidade visível. Não é que tenhamos aqui nada de muito novo, já vimos isto antes, não só na trilogia, como em Avatar entre outros, contudo aqui reforcei esta noção do novo meio de expressão de forma ainda mais clara. Acredito que em breve teremos de criar novos prémios para reconhecer este trabalho, nomeadamente na criação de universos e interpretação de personagens virtuais.
Apesar de tudo, o que mais importa para mim em The Hobbit é a arte visual. Sinto uma sensação estranha ao ver este filme, no qual se mistura claramente a arte da pintura e ilustração com o cinema. Ver Hobbit é como ver uma tela em movimento. Não é animação, nem é filme de imagem real clássica, é um novo meio de expressão. Os mundos e personagens criados em CGI juntos com os atores reais e as paisagens da Nova Zelândia, criam uma espécie de novo universo mágico, mas plausível e crível. Como se tívessemos um meio de expressão intermédio, entre o formato do Livro e do Filme. Um formato que permite representar toda a abstração contida num texto quando esta é impossível de representar em imagens da realidade visível. Não é que tenhamos aqui nada de muito novo, já vimos isto antes, não só na trilogia, como em Avatar entre outros, contudo aqui reforcei esta noção do novo meio de expressão de forma ainda mais clara. Acredito que em breve teremos de criar novos prémios para reconhecer este trabalho, nomeadamente na criação de universos e interpretação de personagens virtuais.
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