Comecemos pela história. O que motiva todo o desenvolvimento narrativo no filme, não podia ser mais cliché, ultrapassa mesmo este designativo no sentido de ser o cliché mais básico que se possa utilizar na construção de um discurso. O salvamento da amada que está presa nas garras do mais rico e mauzão de todo o oeste! Isto é mau, é muito mau e Hollywood com este Oscar vem carimbar com um selo de qualidade algo que já deveria ter sido banido do discurso cinematográfico. É um discurso saturado, não apenas por ser básico, mas por estar delineado por um machismo ridículo. Já aqui falei a propósito deste viés do storytelling contemporâneo. A mulher surge no cinema como mero objecto, sem nada para dizer ou afirmar perante o mundo. Cabe ao homem afirmar-se, expressar-se, dominar tudo e todos, e levar o seu prémio no final, a mulher.
Podem dizer que isto pretendia apenas ser um revisitar do Western Spaghetti, do anti-herói representado na figura de Django. E eu aceito, mas relembro que já não estamos nos anos 1960. É tempo de evoluir este pensamento. Aliás Tarantino quis evoluir o discurso, mas só o fez num sentido. Fala e bem dos problemas da escravatura pelo tom da pele, mas esquece todos os problemas da escravatura sexual. E isto merece um Oscar para melhor argumento original!
Quanto ao discurso, ou seja a estrutura narrativa, o que Tarantino traz não podia ser mais básico. Se a história não vai além de Donkey Kong (1981), a estrutura não vai além de Prince of Persia: The Sands of Time (2003). Basicamente o que aqui temos é o desenvolvimento de vários níveis subsequentes de obstáculos até conseguir atingir o objectivo final. Cada um desses obstáculos serve para ir adicionando os elementos da história criando o envolvimento com os personagens e trabalhando a sua progressão. Além disso cada um desses níveis vai trabalhando os problemas da escravatura nos EUA, e dando um ar de preocupação mais profunda, além do mero salvamento da amada.
Para quem gostou da abordagem à escravatura feita por Tarantino, veja por favor Lincoln de Steven Spielberg. Por outro lado se este assunto foi determinante para o Oscar, relembro que na corrida a argumento original estava Zero Dark Thirty de Kathryn Bigelow que fala de algo próximo mas muito mais atual, a tortura levada a cabo pelas agências de inteligência internacionais. Ainda assim provavelmente teria optado pelo argumento de Haneke para Amour, por ser muito mais equilibrado, demonstrando um controlo de ritmo narrativo praticamente perfeito.
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