dezembro 22, 2012

uma experiência íntima em videojogo

dys4ia (2012) é mais um videojogo brilhante na demonstração do potencial expressivo do medium. dys4ia apresenta-se como uma espécie de diário de Anna Anthropy que relata o momento da sua vida em que resolveu avançar com o tratamento hormonal, toma de estrogénio, para realizar a troca de género.


Em termos de gameplay temos uma espécie de história interactiva entrecortada por mini-jogos bem desenhados e completamente incorporados pelo jogo como um todo. Apesar de se aproximar em parte da história interactiva, este requer do jogador uma constante ação e ligação ao que se vai passando no ecrã. O ritmo e a duração da experiência são outros pontos de excelência, e em que Anna Anthropy consegue focar a nossa atenção, não nos deixando por um segundo vaguear para fora do tema. A narrativa por sua vez faz o resto, com um arco perfeito, com uma introdução que apresenta o problema, um desenvolvimento carregado de conflito, e um dénouement de dever concretizado e pura satisfação com a experiência, é brilhante.

dys4ia is the story of the last six months of my life: when i made the decision to start hormone replacement therapy and began taking estrogen. i wanted to catalog all the frustrations of the experience and maybe create an “it gets better” for other trans women. when i started working on the game, though, i didn’t know whether it did get better. i was in the middle of the shit detailed in level 3 of the game, and at the time i had no idea what the ending would be; it was hard to envision a happy ending.

O jogo é uma obra fortemente emotiva, em parte porque sabemos que aquilo que se relata funciona como uma espécie de confissão de alguém real. Não assistimos a uma ideia ficcional dos efeitos hormonais, mas antes somos levados a participar nesses efeitos por meio da interactividade o que nos envolve mais ainda com o sentir daquela pessoa.



dys4ia coloca em total evidência o poder artístico dos jogos. Se dúvidas houvesse sobre a capacidade destes servirem a expressão pessoal, e íntima, de ideias e sentires ficam aqui totalmente desfeitas.

Jogar no Newsgrounds.

dezembro 19, 2012

Gameplay como parte de um todo

Thomas Was Alone (2012) parece à primeira vista um jogo Flash básico, feito em pouco tempo e com poucos recursos, nomeadamente por recorrer a figuras geométricas para representar personagens de uma narrativa completa, mas é bem mais do que isso. O primeiro protótipo do jogo foi feito em Flash e colocado no Kongregate em 2010, tendo sido retirado pouco depois para através do Unity ser transformado num jogo completo com quase 100 níveis, tendo sido lançado em Junho de 2012.



Os ingredientes que mais se destacam são sem dúvida a narração, a música, e a luz, assim como a personalidade imprimida no movimento de cada figura geométrica que em sintonia com a narração contribuiu fortemente para nos ligar e criar empatia com cada um dos personagens da história. Poderá parecer estranho não ter nomeado o gameplay, mas não é, porque o gameplay aqui cumpre o seu trabalho, tal como a câmara, os efeitos sonoros, entre outros elementos do artefacto. Não se destaca, nem precisa, é parte de um todo que gera a experiência. É claro que são os puzzles de plataforma que nos obrigam a mover no jogo, mas é também a vontade de fazer mover cada um daqueles personagens, de lhes sentir a personalidade enquanto saltamos, caímos e viajamos por entre a iluminação de cada nível que nos leva a querer interagir.

Sistema procedural de música [link]

Por outro lado esta interação é completamente envolvida pela música soberba de David Housden. E aqui o soberbo não está apenas na beleza sonora, mas também na técnica procedural definida para mesmo quando estamos mais tempo do que o necessário em cada nível não sintamos a sensação de repetição, mesmo que percebamos que a música continua a ser mesma. Está muito bem conseguido e a técnica está bem explicada na imagem acima.

Arco narrativo de Thomas Was Alone [link]

Finalmente temos a narração enfática de Danny Wallace que cria toda uma paisagem de doçura para os nossos personagens, que nos envolve no sentir de cada um deles - Thomas, Chris, John, Sara e outros - e vai construindo a progressão de uma amizade que se cria e emerge a partir da cooperação contínua entre os personagens, mais ainda porque cabe-nos a nós mover cada um deles, e realizar acções de uns para com os outros. É um triunfo do storytelling porque socorrendo-se de um gameplay simples, e de formas visuais tão básicas consegue engendrar na nossa mente todo um mundo de ideias e associações de pensamentos que nos permitem inferir muito mais do que aquilo que é mostrado (ver imagem acima do arco narrativo).


Thomas Was Alone tells the story of the world's first sentient AIs, and how they worked together to, well, not escape: Escape is a strong word. 'Emerge' might be better. 'Emerge' has an air of importance about it, while keeping the myriad plot twists and superhero origin stories you'll discover under wraps. We didn't even mention the bouncing. That'd be overkill.

OffBook: "Bad Behavior Online: Bullying, Trolling & Free Speech"

Depois de já ter tratado do Twitter no Jornalismo, a série OffBook entra agora adentro das questões éticas do online, para falar do cyberbullying, do trolling e da liberdade de expressão. É um episódio que interessa particularmente aos estudiosos das ciências da comunicação, mas não só. Este episódio não fala daquilo que estamos habituados a rotular como criação artística ou criativa, mas não deixa de falar de um modo de expressão. Este modo tem a particularidade de ir contra aquilo que normalmente designamos de criativo, no sentido em que não se apresenta para construir, para inovar, para melhorar, mas tão só e apenas para destruir.



O mais importante de tudo o que é dito neste episódio é a literacia. Saber de que é feita a comunicação online, compreender o seu alcance e os seus modos, só isso nos permite estar prevenidos para assimilar e reagir melhor a cada uma destas possibilidades. Coloca-se aqui o dedo nas feridas, e relembra-se o quão importante é a discussão continuada sobre a ética e os limites da expressão. Não existe uma lei que possa terminar estas perturbações, e por isso se fala aqui também das liberdades de expressão. Por outro lado acredito que uma parte significativa destas perturbações são provocadas por pessoas que estão na sua fase de adolescência, em idade própria ou tardia, realizando puros atos de rebeldia contra o instituído, numa clara busca por afirmação. Mas a linha entre a afirmação rebelde e a legalidade ou moralidade das relações humanas, pode ser muito rapidamente ultrapassada.


The internet is a powerful tool for communication, but it can sometimes be a double-edged sword. As most of us have seen or experienced, the internet can bring out the worst behavior in people, highlighting some of the cruelest and most hurtful aspects of humanity. Issues such as bullying online and trolling have garnered a lot of attention recently, prompting questions about who does, and should, regulate the internet, and what free speech means online.

dezembro 18, 2012

Entrevista com Artur Leão - Senior VFX Artist

Finalmente! Esta entrevista vem desde o ano passado. Primeiro demorei eu meses a escrever as perguntas e a enviá-las ao Artur, depois demorou ele porque o apanhei em mudanças. Enviei as perguntas quando ele ainda trabalhava na Ingreme em Lisboa, hoje as respostas chegaram-me de Reykjavik, onde o Artur trabalha como Senior VFX Artist na CCP Games, a empresa por detrás de EVE Online.


O Artur Leão nasceu no Porto há 31 anos, e é um dos artistas 3D mais conhecidos na cena nacional. Para além de ter passado por várias empresas nacionais, entre as quais a Dreamlab de que aqui falei há uns meses, a sua actividade online tanto nos tempos do IRC (aka Kameleon) como mais tarde criando o fórum Dimensão3 tornou o seu trabalho amplamente conhecido em Portugal. O mais interessante não é ele ter-se tornado conhecido por estes meios, é antes ter utilizado estes meios como o seu centro de aprendizagem. O Artur é um auto-didacta autêntico, não realizou qualquer curso na área, aprendeu através da pura experimentação e através da continuada discussão com os pares.

A leitura desta entrevista é profundamente esclarecedora deste modelo de aprendizagem, e não é caso único. O Artur faz parte de uma geração como o Tiago Sousa (Crytek) ou o Bruno Ribeiro (Sony Europe), entre outros, que começaram a aprender com o online no final dos anos 1990 com a massificação da internet. Pessoas que andaram a estudar mas nunca acabaram os seus cursos, porque estes não lhes ofereciam o conhecimento de que precisavam e pelo qual ansiavam. Descrever isto desta forma pode dar a entender que este deveria ser o caminho a seguir por todos, mas longe disso. Estes casos que cito, como o Artur, são pessoas excepcionais, com uma motivação intrínseca desmedida, uma sede de aprender acima do comum e só isso explica que tenham conseguido "sozinhos" chegar onde chegaram. Aliás o próprio título do sítio pessoal do Artur é um bom indicador desta motivação - You can do it! VFX - mas vejam o seu Showreel e leiam a entrevista para perceber melhor tudo isto a partir das suas palavras e dos seus trabalhos.

Artur Leão Showreel 2012


1 - Como entraste no mundo do 3d? Qual foi o teu primeiro software?
:: Um bocado por engano. Um dia um colega emprestou-me um CD do Red Hat Linux 5 e, por acréscimo, vinha lá um CD que trazia o 3D Studio R4 para MS-DOS. Curioso, instalei e fui ver o que era. Lá mexi e carreguei nos botões, e tal, e lembro-me perfeitamente que fiquei fascinado quando descobri o material editor com os "sample slots", ou seja, as esferas com o material a aplicar. Tinha ouro, prata, latão, cobre, e só esses samples deixaram-me maravilhado! Confesso que ficava a olhar para aquilo durante uns segundinhos, a apreciar. No entanto, nunca fiz nada de jeito nessa versão do 3D Studio.
Uns tempos depois, e como estive sempre mais ligado à área da programação, fui aprendendo umas coisas muito interessantes (o famoso modo 13h...) através de uma revista chamada PC Mania (revista espanhola com bastantes tutoriais em Pascal/Assembly). Como fazer objectos em 3d e representá-los numa tela a 2d, modos de shading, muitas dessas coisas relacionadas com a demoscene, que na altura já tinha algum impacto em Espanha (ainda me lembro de tentar organizar a Demoparty 99 no Porto, mas sem sucesso).
Depois de uma aprendizagem regular de gráficos e interfaces em Pascal, a revista trouxe também o POV-Ray, que misturava de forma bem clara as duas coisas a que eu estava mais atento nessa altura: programação e 3D. Li imenso, fiz muitas esferas e planos com checkerboards, e lembro-me de uma animação de uma bola a saltar que demorou uma semana a renderizar!

3D Studio R4 para MS-DOS

2 - Como é que realizaste o teu percurso de aprendizagem?
:: Vem um pouco na continuação do que disse anteriormente, em que tudo aconteceu muito cedo na minha vida. Comecei aos 11 anos a aprender algoritmia e Pascal na antiga Microcamp e tive, felizmente, um professor fantástico que me passou dados valiosos e uma forma de pensar que me acompanha até aos dias de hoje. Por isso, obrigado Professor Eusébio Dobrões, pelos 6 meses de algoritmia antes de sequer tocar num teclado para programar.
Depois desta fase, passei pela tal revista PCMania, até que arranjei o meu primeiro trabalho... em programação, claro, nada de 3D, nem de longe nem de perto. Pouco tempo depois, tive a oportunidade de trabalhar em Autocad como desenhador/projectista de moldes para plástico e fundição injectada, a ganhar melhor e com melhores condições, e nem hesitei.
Passado algum tempo, e graças à minha vontade de querer sempre mais, comecei a explorar softwares que permitiam saltar a fase de desenhar os moldes primeiro em 2D para depois voltar a desenhá-los em 3D. Descobri assim o SolidWorks, onde fazia tudo de raiz em 3D e os desenhos 2D eram praticamente obtidos de "borla". Nesta fase, comecei a sentir o “bichinho”, ou seja, já não fazia só os moldes em 3D, fazia as peças, depois já não fazia as peças só no SW, já as exportava para o Max e tentava fazer renders hiper-realistas..... Eram horríveis, mas era sempre mais espetacular para o cliente ver um objecto rendido no Max com um material cromado e o "Lakerem2.jpg" a reflectir no environment do que uma peça em Phong shading!... E assim começou.

Lakerem2, material muito utilizado para efeitos de reflexão nos objectos

2 - Porque criaste um forum de discussão, Dimensão 3? Quais eram os objectivos iniciais, e em que se transformou?
:: Muito simples. Há muito tempo atrás, eu era operador no #3dsmax da PTnet e passava horas a teclar, a falar de 3D, a aprender, a tirar dúvidas, etc, até que um dia virei-me para o Hugo Adão, na altura também operador do canal, e disse-lhe que devíamos ter um sítio onde pudéssemos guardar a informação com perguntas que eram ali esclarecidas. Era um desperdício isso desaparecer nos confins do IRC. O pessoal estava a começar a migrar do IRC para os fóruns, por isso pareceu-nos lógico e, na altura, era o mais próximo de algo "social". Assim nasceu a Dimensão3, que era suposto ser mais do que um fórum, mas até hoje nunca foi mais do que isso. Acho que durante um bom tempo, transformou-se num hub importante para os artistas de 3D em Portugal, onde muita gente se conheceu, aprendeu, partilhou, se uniu, onde se fez umas coisas divertidas, como concursos, entrevistas, etc. Custa-me dizer isto, mas a D3 nesta fase da minha vida, está de facto em total e completo stand-by.
Gostava de dizer ainda que antes da Dimensão3 existiu o CGPortugal, que foi de facto o primeiro sítio onde se falou de 3D em português e onde, pela primeira vez, se reuniram pessoas apaixonadas pelo 3D. Essa ideia partiu inicialmente do Paulo Ricca, e eu e o Hugo Adão também fizemos parte.

Fórum Dimensão3

4 - Quantas horas investias por dia no início, e quantas horas investes hoje num dia normal?
:: Ao início, sinceramente, não via mais nada à frente. Posso dizer que investia praticamente todo o meu tempo sentado em frente ao computador, à parte do dormir, comer, ir às aulas. Hoje em dia, e porque gosto do que faço, estou no mínimo 5 horas por dia no computador. Não quer dizer que esteja necessariamente a aprender ou a ser produtivo, mas com o tempo também aprendi uma coisa que é: ser bom nesta área não implica apenas fazer coisas em frente ao computador, por isso tenho tentado dedicar mais tempo a coisas que aconteçam “fora do computador”. Ouvir música, ir ao cinema, teatro, concertos, exposições, excursões, são tudo coisas que me dão experiências e adicionam conhecimento que mais tarde posso vir a utilizar na minha área de trabalho.


5 - O que te dá mais gozo fazer no mundo 3d? No teu reel destaca-se o shading, lighting e Render, por necessidade ou porque é o que mais gostas? Podes explicar um melhor em que consistem estas especializações do 3d?
:: Sinceramente, gosto de tanta coisa… Sei o que não gosto, e mesmo assim tenho dúvidas, que é animar personagens. De facto, as áreas em que me desenvolvi mais foram as de lighting/shading e rendering. Quando trabalhava em archviz via os renders espectaculares no fórum do Evermotion e queria sempre “fazer como eles” e, pronto, passava horas a dissecar a informação lá contida. Penso que essa foi a minha primeira fonte de verdadeiro conhecimento relativamente ao 3dsmax. Veio um pouco por necessidade, mas o bichinho ficou lá e, pelos vistos, até tinha jeito, porque foi graças a isso que consegui um emprego na área da publicidade.
De uma forma muito geral, lighting/shading refere-se à iluminação das cenas, como no teatro ou nos sets de cinema/publicidade em que existe alguém que tem de colocar as luzes e dar um ambiente àquilo que está no cenário. O shading especificamente consiste na criação dos materiais que constituem todas as coisas que vês em 3D, como por exemplo definir se a toalha de mesa é de pano ou plástico e colocar os parâmetros correctos para que o pano pareça pano e o plástico pareça plástico.
Quanto ao rendering, apesar de haver uma posição que se chama “render wrangler”, que consiste em monitorizar os renders e certificar que sai tudo como era suposto, eu sempre estive mais ligado a outra coisa, o “scene assembly”. Hoje em dia, o “scene assembly” vê-se cada vez mais, até porque as cenas vão aumentado de complexidade e tem de haver alguém ou uma equipa que reúna e componha tudo o que as outras pessoas/equipas estiveram a fazer para que saia algo de útil para passar para a composição.


6 - Porque é que tão difícil aprender 3d? Falta de sensibilidade artística, falta de destreza visual, falta de vontade e motivação para trabalhar o tempo suficiente, ou outra?
 :: Não acho que seja difícil aprender 3D. Hoje em dia, existe muita informação, quer gratuitamente quer por parte de empresas que se dedicam exclusivamente à criação de material de ensino. O que poderá existir são pessoas que pensam que fazer 3D, ou “coisas-como-o-Senhor-dos-Anéis”, implica saber apenas os menus dos programas. Como é óbvio, não implica apenas isso, daí que tal como disse há pouco, ache cada vez mais importante aprender coisas de outras áreas. Ao longo do meu percurso, posso dizer que as pessoas que faziam 3D com formação em Artes eram normalmente melhores do que as que vinham de outras áreas. Tinham uma maior sensibilidade para certas coisas. Por isso, é sempre bom saber mais do que os menus e há medida que evoluis vais sentindo essa necessidade, caso contrário, estagnas.


7 - Para trabalhar nesta área basta escolher um pacote 3D e trabalhar 100% nele ou é preciso aprender outras coisas do tipo After Effects, Nuke, Maxscript, etc? Porquê, é uma questão de ser generalista, ou é mais do que isso, uma vontade de possuir alguma polivalência?
:: É óbvio que acabas sempre por ter uma ferramenta de eleição, mas isso não significa que não precises de outras para fazer o teu trabalho. Provavelmente toda a gente que faz 3D precisa de saber fazer algo no Photoshop, por exemplo, ou noutra ferramenta qualquer de edição de imagens/video. A questão de ser generalista prende-se mais com o facto de não existir muito espaço em Portugal para pessoas que façam só uma determinada tarefa, logo tens de ser polivalente/generalista para sobreviveres no mercado.


8 - Qual o teu melhor trabalho de sempre? E qual o que te consumiu mais tempo  a desenvolver?
:: Pode parecer cliché, mas realmente é difícil eleger apenas um. Há, no entanto, um anúncio da Vodafone que me marcou. Foi o primeiro em que tive oportunidade de trabalhar e, ainda por cima, sozinho. No final, correu tudo bem, mas a responsabilidade que senti foi enorme e acabou por abrir caminho para continuar a trabalhar noutros anúncios. Também tenho muito carinho pelos que foram feitos para a marca Chipicao, porque foram resultado de um grande trabalho de equipa, e gostei sempre do resultado final. Há outros trabalhos que me deram gozo a fazer, como o Arad, uma curta-metragem de um realizador iraniano que trabalha na Sony, o video de apresentação do novo estádio do Atlético de Madrid.
O que me deu mais trabalho.... Todos!... Mas talvez possa salientar um trabalho feito para a Nissan que foi uma dor de cabeça por várias razões, mas mais uma vez tudo se resolveu bem, e é isso que interessa no final do dia.


9 - Tendo em conta que trabalhas há mais de uma década com animação e modelação 3d, como é que te viraste para a programação e para o desenvolvimento de aplicações para iPhone? Faz sentido na tua carreira?
:: Como disse há pouco [nas primeiras respostas], estive ligado à programação desde o início do meu percurso, por isso é natural que tente usar isso como uma vantagem, seja para mim ou para equipa com que trabalho. O desenvolvimento de aplicações para iPhone surgiu invariavelmente da minha curiosidade em experimentar e testar coisas novas. Essa curiosidade leva-me a escrever centenas de scripts e/ou programas que guardo no meu disco ao longo do tempo. No entanto, o intuito foi mais comercial quando comecei a desenvolver para iOS, e daí resultou a minha primeira app, o iDevCam. Isso faz sentido na minha carreira, porque gosto de estar ligado às novas tecnologias, e mesmo que não seja eu a desenvolver as futuras versões da minha app, quero continuar relacionado com isso.

iDevCam Promo 1

10 - Olhando para o teu percurso pareces encaixar-te naquelas pessoas insaciáveis, sempre com vontade de aprender mais e mais? Como é que podemos estimular isso noutras pessoas?
:: Sim, gosto sempre de saber mais sobre tudo o que esteja relacionado com as novas tecnologias. Desde pequeno que sempre tive a ânsia de querer “chegar ao futuro". Lembro-me de ter 14 anos e pensar como seriam as coisas no ano X.
Tenho alguma dificuldade em responder sobre como estimular isso, mas posso dizer que nunca fui nem sou uma pessoa muito ligada à leitura, por exemplo. A vontade de querer aprender nem sempre tem de parecer aborrecida ou estar ligada a “marrar em livros”. Gosto de aprender pela experiência e talvez isso seja um bom caminho para as próximas gerações. Dar-lhes a oportunidade de interagir com as coisas, de as aprender a fazer desde tenra idade. Talvez essa possa ser uma solução, quanto mais não seja para aprender o que não gostam.


11 - Que dica darias a um jovem que visse hoje o Toy Story 3 e saísse da sala a pensar que queria fazer daquilo a sua vida?
:: Dir-lhe-ia que será precisa muita dedicação, paixão pelo que se faz e muita determinação, porque realmente não é um mundo fácil, principalmente para quem está a começar, sobretudo em Portugal. Uma coisa é certa: muita gente consegue fazer disto a sua vida e é feliz. Pixar, Dreamworks, Bluesky, etc, é possível :)

dezembro 17, 2012

Filmography 2012

São 300 filmes numa montagem simplesmente perfeita, tanto no campo técnico como criativo. É a montagem de filmes do ano de Gen Ip (licenciada em Comunicação de Vancouver, Canada) num trabalho que já se tornou tradição no YouTube. Gen Ip não se socorre simplesmente da velocidade para nos prender, nem da componente visual, constrói toda uma narrativa sua através da ligação entre o texto da música e as imagens, assim como através da criação de categorias de ideias coerentes e bem organizadas.


Ao contrário de outros trabalhos do género, não se limita ao cinema americano, sendo no entanto maioritário, mas é ainda assim abrangente, sendo capaz de espelhar com maior realismo o ano de 2012.


A lista de todos os filmes e músicas utilizadas pode ser vista no Tumblr da Gen Ip.

dezembro 16, 2012

Academia Nacional de Entretenimento Digital Interactivo (Dinamarca)

DADIU consiste numa Academia Nacional de Entretenimento Digital Interactivo formada a partir da colaboração entre cinco universidades e três escolas artísticas da Dinamarca. É claramente uma experiência que devíamos pensar replicar em Portugal. Lendo sobre a criação desta academia, percebe-se que o parto não foi fácil, mas mais interessante que isso, que existiu uma vontade e um relacionamento claro entre a indústria, as universidades e as escolas para conseguir chegar a este modelo. O modelo em si é multifacetado, não tem apenas uma variante de estudos o que torna ainda mais interessante todo o modelo educativo. Mas o mais importante de tudo é a tentativa de desenvolver uma linguagem criativa comum, capaz de solidificar a criação de uma indústria de videojogos na Dinamarca.

The initial point of departure for the Academy was to create a number of educations that would positively influence the Danish computer game industry, like the National Film School of Denmark has benefited the Danish film industry. A joint language should be developed, and through this a joint understanding of what computer games are, and the students from the various educations should meet and together produce a game in a simulated reality. [Vision]

E é isso que têm vindo a fazer, todos os anos são lançados os vários jogos produzidos por esta colaboração inter-universidades. Um exemplo muito interessante desta colaboração acaba de chegar à rede, Cantrip (2012). Como todos os jogos realizados na DADIU, foi feito em Unity, apresentando-se num ambiente 3d peculiar, já que a palete de cores quase se resigna à escala de cinzentos. A narrativa faz lembrar os tradicionais contos infantis dinamarqueses de Hans Christian Andersen, por outro lado o gameplay assente no magnetismo acaba por ser interessante pelo seu lado pedagógico.


Podem jogar directamente no browser, ou descarregar para Win/Mac aqui.

narrativas do indeterminismo

A Separation (2011) ganhou o Oscar para melhor filme estrangeiro deste ano, e o Urso de Ouro em Berlim. Realizado por Asghar Farhadi o realizador iraniano de About Elly de que aqui falei no mês passado. Depois de About Elly era difícil surpreender, ambos os filmes trabalham a dramaturgia das relações humanas a um nível raramente visto no cinema, apesar de neste blog ter falado recentemente de outros dois filmes neste mesmo nível de registo, Amour (2012) de Michael Haneke e Sangue do meu Sangue (2011) de João Canijo.


A Separation obriga-me a questionar a ideia de Amour ser um filme genuinamente Europeu. É verdade que sentimos aqui a religiosidade de uma forma impossível na Europa de Haneke, mas os problemas micro-analisados por Farhadi são tão próximos da realidade Europeia. O divórcio, os filhos, a velhice mostrados a partir de uma geração com níveis altos de educação à prova de qualquer religião e que os aproxima tanto daquilo que pudemos ver em Amour. A vida acelerada, os telefones, os carros, o Alzheimer, o "stalking", é tudo tão ocidental que dá vontade de questionar os media ocidentais sobre a realidade que todos os dias nos mostram do chamado Médio Oriente. Existem alguns dados que seria ainda preciso aferir porque este discurso é cerceado de limitações no campo da crítica social, já que o realizador chegou a ser banido recentemente no Irão por ter defendido alguns dos seus colegas mais radicais, tendo sido obrigado a retirar as declarações para poder filmar A Separation  Deste modo, esta abordagem cultural do Irão é talvez a abordagem possível, é o meio através do qual Farhadi consegue ainda assim fazer passar o seu mundo.


A construção narrativa em A Separation está ao nível de About Elly  do mais perfeito que podemos encontrar, trabalhando elementos em profundidade, extensão e encenado a uma velocidade incrível. Sempre defendemos o Cinema como uma arte singular, distante do Teatro, que o é, mas aquilo que podemos ver no cinema de Farhadi é a magia do Drama como só o teatro tem sabido criar. Farhadi usa toda a técnica cinematográfica, toda a técnica dramática, e cria uma nova forma de expressar e verbalizar as suas ideias. Podemos dizer que temos aqui uma marca de autenticidade do seu trabalho, será difícil voltar a ver um filme seu sem imediatamente o identificar.


Na história impressiona-nos todos aqueles personagens que como nós procuram apenas viver as suas vidas, trabalhar de forma séria para conseguir o melhor para os seus, mas o acaso, o orgânico das relações sociais, a vida em si, vai-se encarregando de os provocar. Como em About Elly, Farhadi trabalha sobre o fio do mais puro indeterminismo, ninguém quer o mal de ninguém, mas o mais puro acaso, a coincidência de factores sem causa aparente, desenvolve-se e é aqui que Farhadi brilha em todo o seu esplendor narrativo. A matriz narrativa clássica não existe sem causalidade, e Farhadi consegue desenvolver por debaixo dessa causalidade, toda uma rede de não-causalidade, é simplesmente brilhante.

dezembro 15, 2012

Amour, o talento da realização de Haneke

Amour vai aparecer em muitas listas como o filme do ano de 2012, além de vários prémios Haneke levou mais uma Palma de Ouro. Amour é um filme de essência Europeia, não apenas na forma mas também no conteúdo. Trata o assunto do momento, os últimos anos, com uma abordagem cultural claramente nossa. Haneke não é propriamente minimalista, em parte porque não tem pejo em mostrar a decadência da idade para com ela construir a essência do título do seu filme. Por outro lado ao não construir a típica estrutura de causalidade no ecrã deixa no ar muitas interrogações. Se lhe pedirmos para explicar, a resposta é,

"you are asking me to interpret, and I will not. Every meaning is fine, all interpretations are OK. I do not choose between them, because I dislike explanations (..) When I am asked this kind of thing, I usually say I don't know the answer because I don't have such a good relationship with the author."[1]
Haneke foge porque o autor, escritor e o realizador, é ele próprio. Mas se Haneke reage assim é por uma razão muito simples,
"I give the spectator the possibility of participating, the audience completes the film by thinking about it; those who watch must not be just consumers ingesting spoon-fed images. A film cannot stop at the screen. Cinema is a dialogue." [1]
E esta forma de criar sentido audiovisualmente tem os seus frutos. É por demais evidente ler as críticas a Amour e perceber o quão diferentes são as análises de crítico para crítico. Apesar de haver unanimidade sobre a qualidade da obra, encontrei muito pouca unanimidade em redor daquilo que nos é apresentado. Haneke faz-nos o favor de dar um título fortemente sugestivo, que de certo modo tolda a nossa compreensão da obra. Mas é apenas e só isso, nada mais, tudo o resto está à nossa responsabilidade. E cada um verá, sentirá, consoante a sua própria bagagem cultural. A forma como Haneke trabalha obriga a que cada um de nós traga para obra o seu próprio mundo, as suas relações pessoais, os seus mais próximos, porque são esses que servem de suporte à construção de empatia necessária para entrar adentro o filme. Porque o filme claramente também não surge do vazio, o historial de Haneke, tanto cinematográfico como pessoal trouxe-o até aqui. É inevitável pensar em The Seventh Continent, é necessário saber que Haneke foi criado por uma tia que aos 90 anos lhe pediu para a ajudar a morrer, e que este lhe terá dito não o poder fazer por ser seu herdeiro, o que não evitou que esta o tivesse feito por si. Será um filme complicado para jovens, por lhes faltar esse referencial cultural, é-lhes difícil compreender o que está ali a acontecer, ler nas entrelinhas do tempo, não apenas do tempo do filme, mas do tempo daquelas vidas, da vida em si.


Conhecendo o trabalho de Haneke esperamos um determinado finale, pré-anunciado na própria abertura do filme, mas o climax do filme surpreende-nos, incomoda-nos, provoca-nos. Um misto de raiva e tristeza que se apodera de nós, consoante aquilo em que acreditemos. Percebo, mas é muito súbito, é forte, é inevitável ao mesmo tempo que é inaceitável. E o filme ainda assim tudo faz para o anunciar. Aliás Haneke conjuntamente com Trintignant e Riva fazem um trabalho magistral que nos conduz ali. O filme começa calmamente num ambiente culturalmente rico e cheio de possibilidades, que depois inicia um crescendo desvelador do amor incondicional, totalmente carregado nas costas daqueles dois actores. A meio do filme aqueles dois personagens, são dois seres reais de tão impressionantes que são ambos no ecrã, poderiam ser nossos familiares, e é isso que tanto custa. A empatia criada, é feita à custa da total imersão do espectador, do facto deste contribuir para o desenrolar interpretativo daquilo que se passa no ecrã, obrigado a trazer para o centro do filme os seus entes mais queridos, e a colocá-los ali. Dependente da fase da vida em que se veja o filme, teremos um acesso diferente à obra. No meu caso é inevitável ver-me como a pessoa de fora que assiste sem poder, à semelhança de Huppert, a filha que "quer ver", que quer transformar o estado das coisas mas se sente incapaz, que quer falar de "coisas sérias" como se essas pudessem resolver alguma coisa. E é em resposta a essas "coisas sérias" que Haneke puxa para título, o resumo do sentido de tudo aquilo a que assistimos.




Contra algumas ideias que tenho vindo a defender, Haneke demonstra aqui porque apesar de a imagem mostrar em vez de descrever, consegue ainda assim conter tanto poder expressivo como o texto. Haneke obriga o espectador a participar, a envolver-se com a obra, sem o envolvimento o filme não se abre, entende-se, mas não se sente. E julgo que é aqui que reside o talento, muito acima da média, da sua direcção, ser capaz de manter uma obra compreensível, não descendo ao incompreensível pelo minimalismo ou meramente simbólico, mas esculpindo na obra os sucalcos que precisam de ser preenchidos pelo espectador, os sucalcos da empatia e da emocionalidade.


[1] Michael Haneke: There's no easy way to say this…, The Guardian, 4 de Novembro 2012

OffBook: "The Impact of Twitter on Journalism"

A série OffBook resolveu abrir a abrangência da série, deixar de se focar tão rigidamente nos movimentos artísticos para se focar sobre os movimentos criativos em geral. E é nesse sentido que surge este episódio dedicado a The Impact of Twitter on Journalism.



Nem sempre se pensa o jornalismo como uma atividade criativa, provavelmente pela sua relação com o sério, o factual, o objectivo, pouco dado ao lúdico e à experimentação. Mas na realidade o jornalismo é uma actividade que vive da verbalização de ideias que emitem necessariamente uma certa dose de subjectivadade. Nesse sentido o formato jornalísitco também evolui, também se transforma, e também experimenta. Os jornalista são criativos no campo do texto e da imagem com propósitos claros e muito funcionais, em certa medida o carácter da forma jornalística está para criatividade, como o design está para a arte.

dezembro 13, 2012

Cutscenes, "modo de usar"

No passado cheguei a pensar, por pouco tempo, que as cutscenes não deveriam existir na arte dos videojogos. A razão para ter sido apenas breve esta ideia foi porque tal como é dito neste Extra Credits, as cutscenes são uma ferramenta de comunicação como outra qualquer nos videojogos, como tal um criador não se deve autolimitar por mero fundamentalismo. Isto não invalida que não procuremos inovar a linguagem da interactividade, mas esta não pode realizar-se através da mera castração de uma ferramenta de storytelling.


Tal como no Cinema em que continuamos a usar actores em palcos que dramatizam cenas, seguindo aquilo que se faz no Teatro, nos videojogos também podemos utilizar cutscenes que utilizam os princípios cinematográficos. Aquilo que precisamos de perceber é a melhor forma de utilizar essas cutscenes, tal como o cinema fez com o palco, em que deixou de o apresentar filmado em plano geral e passou a colocar a câmara dentro do próprio palco. Ou seja a indústria precisa de compreender quando a cutscene deixa de ser uma ferramenta ao serviço do jogo, e passa a ser um elemento autónomo.


Neste sentido gosto deste Extra Credits do James Portnow, porque procura responder à questão académica, sobre qual será um possível bom uso das cutscenes. São apresentadas duas possibilidades, não sei se são as únicas, mas concordo com ambas:
"1 - The powerlessness of the player"
"2 - Context"
Apesar de Portnow defender que a primeira é menos importante, eu leio o contrário. E dou o exemplo da sequência de abertura do primeiro Max Payne. O facto de me ser retirado o controlo da acção na cena por via das cutscenes, é o que torna tão dramático e brilhante as mortes da família do meu personagem. Nesse sentido, estamos a fazer um uso muito específico e delimitado da cutscene, mas é para mim sem dúvida, uma das suas virtudes mais poderosas, o momento em que nos é retirado o controlo do mundo.

Cena de abertura de Max Payne (2001), vejam a partir de 3m14s. Embora só se possa compreender completamente, jogando o momento.

Quanto ao contexto, é natural que concordo, embora não sinta que seja uma necessidade absoluta. Concordo mais no sentido de as cutscenes não passarem dessa linha de contextualização. Ou seja, criarem o espaço contextual e atmosférico para a narrativa poder acontecer durante a interactividade, mas não irem além disso, correndo o risco de se autonomizarem do próprio jogo.

Extra Credits: Cutscenes