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maio 23, 2011

Mestrado em Media Interativos


Abrem hoje as candidaturas para a primeira edição do Mestrado em Media Interativos da Universidade do Minho, e estarão abertas até ao dia 14 de Junho 2011. Devo informar que este novo mestrado abrirá apenas de dois em dois anos, prevendo-se assim que a segunda edição aconteça apenas no ano de 2013/2014. A razão prende-se com a necessidade de garantir um acompanhamento de proximidade aos alunos durante o segundo ano do seu mestrado no qual farão o seu projeto e a sua dissertação.

Com esta nova proposta em Media Interativos a Universidade do Minho pretende contribuir para o desenvolvimento de competências de análise, crítica e criação de artefactos interativos com capacidade para comunicar e envolver eficazmente os experienciadores.

A área dos media interactivos requer dos seus mestres um olhar atento e constante do meio industrial, dos seus processos e problemas. Os especialistas necessitam de bases de sustentação próprias para a auto-motivação, apresentar uma atitude de grande empreendedorismo e uma vontade determinada em continuar a aprender. Necessitam ainda de possuir uma visão alargada sobre os processos de criação para os media interactivos e apresentar motivação para cruzar disciplinas e funções no seio das equipas.

O mestre em Media Interativos tem de apreciar as questões tecnológicas assim como as necessidades do mercado, as questões estéticas, os processos criativos e acima de tudo compreender as necessidades dos utilizadores finais dos seus produtos.

Tudo resumido, um mestre em Media Interativos será alguém que percebe o mundo de modo interativo, que busca na arte novas formas para inovar, mas que acima de tudo não abandona nunca o elemento base da criatividade e interatividade que é o brincar.

Mais informações podem ser encontradas na página do mestrado.

dezembro 18, 2012

Entrevista com Artur Leão - Senior VFX Artist

Finalmente! Esta entrevista vem desde o ano passado. Primeiro demorei eu meses a escrever as perguntas e a enviá-las ao Artur, depois demorou ele porque o apanhei em mudanças. Enviei as perguntas quando ele ainda trabalhava na Ingreme em Lisboa, hoje as respostas chegaram-me de Reykjavik, onde o Artur trabalha como Senior VFX Artist na CCP Games, a empresa por detrás de EVE Online.


O Artur Leão nasceu no Porto há 31 anos, e é um dos artistas 3D mais conhecidos na cena nacional. Para além de ter passado por várias empresas nacionais, entre as quais a Dreamlab de que aqui falei há uns meses, a sua actividade online tanto nos tempos do IRC (aka Kameleon) como mais tarde criando o fórum Dimensão3 tornou o seu trabalho amplamente conhecido em Portugal. O mais interessante não é ele ter-se tornado conhecido por estes meios, é antes ter utilizado estes meios como o seu centro de aprendizagem. O Artur é um auto-didacta autêntico, não realizou qualquer curso na área, aprendeu através da pura experimentação e através da continuada discussão com os pares.

A leitura desta entrevista é profundamente esclarecedora deste modelo de aprendizagem, e não é caso único. O Artur faz parte de uma geração como o Tiago Sousa (Crytek) ou o Bruno Ribeiro (Sony Europe), entre outros, que começaram a aprender com o online no final dos anos 1990 com a massificação da internet. Pessoas que andaram a estudar mas nunca acabaram os seus cursos, porque estes não lhes ofereciam o conhecimento de que precisavam e pelo qual ansiavam. Descrever isto desta forma pode dar a entender que este deveria ser o caminho a seguir por todos, mas longe disso. Estes casos que cito, como o Artur, são pessoas excepcionais, com uma motivação intrínseca desmedida, uma sede de aprender acima do comum e só isso explica que tenham conseguido "sozinhos" chegar onde chegaram. Aliás o próprio título do sítio pessoal do Artur é um bom indicador desta motivação - You can do it! VFX - mas vejam o seu Showreel e leiam a entrevista para perceber melhor tudo isto a partir das suas palavras e dos seus trabalhos.

Artur Leão Showreel 2012


1 - Como entraste no mundo do 3d? Qual foi o teu primeiro software?
:: Um bocado por engano. Um dia um colega emprestou-me um CD do Red Hat Linux 5 e, por acréscimo, vinha lá um CD que trazia o 3D Studio R4 para MS-DOS. Curioso, instalei e fui ver o que era. Lá mexi e carreguei nos botões, e tal, e lembro-me perfeitamente que fiquei fascinado quando descobri o material editor com os "sample slots", ou seja, as esferas com o material a aplicar. Tinha ouro, prata, latão, cobre, e só esses samples deixaram-me maravilhado! Confesso que ficava a olhar para aquilo durante uns segundinhos, a apreciar. No entanto, nunca fiz nada de jeito nessa versão do 3D Studio.
Uns tempos depois, e como estive sempre mais ligado à área da programação, fui aprendendo umas coisas muito interessantes (o famoso modo 13h...) através de uma revista chamada PC Mania (revista espanhola com bastantes tutoriais em Pascal/Assembly). Como fazer objectos em 3d e representá-los numa tela a 2d, modos de shading, muitas dessas coisas relacionadas com a demoscene, que na altura já tinha algum impacto em Espanha (ainda me lembro de tentar organizar a Demoparty 99 no Porto, mas sem sucesso).
Depois de uma aprendizagem regular de gráficos e interfaces em Pascal, a revista trouxe também o POV-Ray, que misturava de forma bem clara as duas coisas a que eu estava mais atento nessa altura: programação e 3D. Li imenso, fiz muitas esferas e planos com checkerboards, e lembro-me de uma animação de uma bola a saltar que demorou uma semana a renderizar!

3D Studio R4 para MS-DOS

2 - Como é que realizaste o teu percurso de aprendizagem?
:: Vem um pouco na continuação do que disse anteriormente, em que tudo aconteceu muito cedo na minha vida. Comecei aos 11 anos a aprender algoritmia e Pascal na antiga Microcamp e tive, felizmente, um professor fantástico que me passou dados valiosos e uma forma de pensar que me acompanha até aos dias de hoje. Por isso, obrigado Professor Eusébio Dobrões, pelos 6 meses de algoritmia antes de sequer tocar num teclado para programar.
Depois desta fase, passei pela tal revista PCMania, até que arranjei o meu primeiro trabalho... em programação, claro, nada de 3D, nem de longe nem de perto. Pouco tempo depois, tive a oportunidade de trabalhar em Autocad como desenhador/projectista de moldes para plástico e fundição injectada, a ganhar melhor e com melhores condições, e nem hesitei.
Passado algum tempo, e graças à minha vontade de querer sempre mais, comecei a explorar softwares que permitiam saltar a fase de desenhar os moldes primeiro em 2D para depois voltar a desenhá-los em 3D. Descobri assim o SolidWorks, onde fazia tudo de raiz em 3D e os desenhos 2D eram praticamente obtidos de "borla". Nesta fase, comecei a sentir o “bichinho”, ou seja, já não fazia só os moldes em 3D, fazia as peças, depois já não fazia as peças só no SW, já as exportava para o Max e tentava fazer renders hiper-realistas..... Eram horríveis, mas era sempre mais espetacular para o cliente ver um objecto rendido no Max com um material cromado e o "Lakerem2.jpg" a reflectir no environment do que uma peça em Phong shading!... E assim começou.

Lakerem2, material muito utilizado para efeitos de reflexão nos objectos

2 - Porque criaste um forum de discussão, Dimensão 3? Quais eram os objectivos iniciais, e em que se transformou?
:: Muito simples. Há muito tempo atrás, eu era operador no #3dsmax da PTnet e passava horas a teclar, a falar de 3D, a aprender, a tirar dúvidas, etc, até que um dia virei-me para o Hugo Adão, na altura também operador do canal, e disse-lhe que devíamos ter um sítio onde pudéssemos guardar a informação com perguntas que eram ali esclarecidas. Era um desperdício isso desaparecer nos confins do IRC. O pessoal estava a começar a migrar do IRC para os fóruns, por isso pareceu-nos lógico e, na altura, era o mais próximo de algo "social". Assim nasceu a Dimensão3, que era suposto ser mais do que um fórum, mas até hoje nunca foi mais do que isso. Acho que durante um bom tempo, transformou-se num hub importante para os artistas de 3D em Portugal, onde muita gente se conheceu, aprendeu, partilhou, se uniu, onde se fez umas coisas divertidas, como concursos, entrevistas, etc. Custa-me dizer isto, mas a D3 nesta fase da minha vida, está de facto em total e completo stand-by.
Gostava de dizer ainda que antes da Dimensão3 existiu o CGPortugal, que foi de facto o primeiro sítio onde se falou de 3D em português e onde, pela primeira vez, se reuniram pessoas apaixonadas pelo 3D. Essa ideia partiu inicialmente do Paulo Ricca, e eu e o Hugo Adão também fizemos parte.

Fórum Dimensão3

4 - Quantas horas investias por dia no início, e quantas horas investes hoje num dia normal?
:: Ao início, sinceramente, não via mais nada à frente. Posso dizer que investia praticamente todo o meu tempo sentado em frente ao computador, à parte do dormir, comer, ir às aulas. Hoje em dia, e porque gosto do que faço, estou no mínimo 5 horas por dia no computador. Não quer dizer que esteja necessariamente a aprender ou a ser produtivo, mas com o tempo também aprendi uma coisa que é: ser bom nesta área não implica apenas fazer coisas em frente ao computador, por isso tenho tentado dedicar mais tempo a coisas que aconteçam “fora do computador”. Ouvir música, ir ao cinema, teatro, concertos, exposições, excursões, são tudo coisas que me dão experiências e adicionam conhecimento que mais tarde posso vir a utilizar na minha área de trabalho.


5 - O que te dá mais gozo fazer no mundo 3d? No teu reel destaca-se o shading, lighting e Render, por necessidade ou porque é o que mais gostas? Podes explicar um melhor em que consistem estas especializações do 3d?
:: Sinceramente, gosto de tanta coisa… Sei o que não gosto, e mesmo assim tenho dúvidas, que é animar personagens. De facto, as áreas em que me desenvolvi mais foram as de lighting/shading e rendering. Quando trabalhava em archviz via os renders espectaculares no fórum do Evermotion e queria sempre “fazer como eles” e, pronto, passava horas a dissecar a informação lá contida. Penso que essa foi a minha primeira fonte de verdadeiro conhecimento relativamente ao 3dsmax. Veio um pouco por necessidade, mas o bichinho ficou lá e, pelos vistos, até tinha jeito, porque foi graças a isso que consegui um emprego na área da publicidade.
De uma forma muito geral, lighting/shading refere-se à iluminação das cenas, como no teatro ou nos sets de cinema/publicidade em que existe alguém que tem de colocar as luzes e dar um ambiente àquilo que está no cenário. O shading especificamente consiste na criação dos materiais que constituem todas as coisas que vês em 3D, como por exemplo definir se a toalha de mesa é de pano ou plástico e colocar os parâmetros correctos para que o pano pareça pano e o plástico pareça plástico.
Quanto ao rendering, apesar de haver uma posição que se chama “render wrangler”, que consiste em monitorizar os renders e certificar que sai tudo como era suposto, eu sempre estive mais ligado a outra coisa, o “scene assembly”. Hoje em dia, o “scene assembly” vê-se cada vez mais, até porque as cenas vão aumentado de complexidade e tem de haver alguém ou uma equipa que reúna e componha tudo o que as outras pessoas/equipas estiveram a fazer para que saia algo de útil para passar para a composição.


6 - Porque é que tão difícil aprender 3d? Falta de sensibilidade artística, falta de destreza visual, falta de vontade e motivação para trabalhar o tempo suficiente, ou outra?
 :: Não acho que seja difícil aprender 3D. Hoje em dia, existe muita informação, quer gratuitamente quer por parte de empresas que se dedicam exclusivamente à criação de material de ensino. O que poderá existir são pessoas que pensam que fazer 3D, ou “coisas-como-o-Senhor-dos-Anéis”, implica saber apenas os menus dos programas. Como é óbvio, não implica apenas isso, daí que tal como disse há pouco, ache cada vez mais importante aprender coisas de outras áreas. Ao longo do meu percurso, posso dizer que as pessoas que faziam 3D com formação em Artes eram normalmente melhores do que as que vinham de outras áreas. Tinham uma maior sensibilidade para certas coisas. Por isso, é sempre bom saber mais do que os menus e há medida que evoluis vais sentindo essa necessidade, caso contrário, estagnas.


7 - Para trabalhar nesta área basta escolher um pacote 3D e trabalhar 100% nele ou é preciso aprender outras coisas do tipo After Effects, Nuke, Maxscript, etc? Porquê, é uma questão de ser generalista, ou é mais do que isso, uma vontade de possuir alguma polivalência?
:: É óbvio que acabas sempre por ter uma ferramenta de eleição, mas isso não significa que não precises de outras para fazer o teu trabalho. Provavelmente toda a gente que faz 3D precisa de saber fazer algo no Photoshop, por exemplo, ou noutra ferramenta qualquer de edição de imagens/video. A questão de ser generalista prende-se mais com o facto de não existir muito espaço em Portugal para pessoas que façam só uma determinada tarefa, logo tens de ser polivalente/generalista para sobreviveres no mercado.


8 - Qual o teu melhor trabalho de sempre? E qual o que te consumiu mais tempo  a desenvolver?
:: Pode parecer cliché, mas realmente é difícil eleger apenas um. Há, no entanto, um anúncio da Vodafone que me marcou. Foi o primeiro em que tive oportunidade de trabalhar e, ainda por cima, sozinho. No final, correu tudo bem, mas a responsabilidade que senti foi enorme e acabou por abrir caminho para continuar a trabalhar noutros anúncios. Também tenho muito carinho pelos que foram feitos para a marca Chipicao, porque foram resultado de um grande trabalho de equipa, e gostei sempre do resultado final. Há outros trabalhos que me deram gozo a fazer, como o Arad, uma curta-metragem de um realizador iraniano que trabalha na Sony, o video de apresentação do novo estádio do Atlético de Madrid.
O que me deu mais trabalho.... Todos!... Mas talvez possa salientar um trabalho feito para a Nissan que foi uma dor de cabeça por várias razões, mas mais uma vez tudo se resolveu bem, e é isso que interessa no final do dia.


9 - Tendo em conta que trabalhas há mais de uma década com animação e modelação 3d, como é que te viraste para a programação e para o desenvolvimento de aplicações para iPhone? Faz sentido na tua carreira?
:: Como disse há pouco [nas primeiras respostas], estive ligado à programação desde o início do meu percurso, por isso é natural que tente usar isso como uma vantagem, seja para mim ou para equipa com que trabalho. O desenvolvimento de aplicações para iPhone surgiu invariavelmente da minha curiosidade em experimentar e testar coisas novas. Essa curiosidade leva-me a escrever centenas de scripts e/ou programas que guardo no meu disco ao longo do tempo. No entanto, o intuito foi mais comercial quando comecei a desenvolver para iOS, e daí resultou a minha primeira app, o iDevCam. Isso faz sentido na minha carreira, porque gosto de estar ligado às novas tecnologias, e mesmo que não seja eu a desenvolver as futuras versões da minha app, quero continuar relacionado com isso.

iDevCam Promo 1

10 - Olhando para o teu percurso pareces encaixar-te naquelas pessoas insaciáveis, sempre com vontade de aprender mais e mais? Como é que podemos estimular isso noutras pessoas?
:: Sim, gosto sempre de saber mais sobre tudo o que esteja relacionado com as novas tecnologias. Desde pequeno que sempre tive a ânsia de querer “chegar ao futuro". Lembro-me de ter 14 anos e pensar como seriam as coisas no ano X.
Tenho alguma dificuldade em responder sobre como estimular isso, mas posso dizer que nunca fui nem sou uma pessoa muito ligada à leitura, por exemplo. A vontade de querer aprender nem sempre tem de parecer aborrecida ou estar ligada a “marrar em livros”. Gosto de aprender pela experiência e talvez isso seja um bom caminho para as próximas gerações. Dar-lhes a oportunidade de interagir com as coisas, de as aprender a fazer desde tenra idade. Talvez essa possa ser uma solução, quanto mais não seja para aprender o que não gostam.


11 - Que dica darias a um jovem que visse hoje o Toy Story 3 e saísse da sala a pensar que queria fazer daquilo a sua vida?
:: Dir-lhe-ia que será precisa muita dedicação, paixão pelo que se faz e muita determinação, porque realmente não é um mundo fácil, principalmente para quem está a começar, sobretudo em Portugal. Uma coisa é certa: muita gente consegue fazer disto a sua vida e é feliz. Pixar, Dreamworks, Bluesky, etc, é possível :)

outubro 10, 2015

Alquimia da autoajuda

Há 20 anos que este título e o seu autor me perseguem, com, por um lado os seus defensores a louvarem as suas qualidades e efeitos transformativos, e por outro os seus detractores a qualificarem a obra e o autor como corpos estranhos ao mundo da literatura. Entre os dois grupos, por vezes extremistas, acabei por decidir não dedicar tempo ao livro, apesar de muitas vezes o ter encontrado em prateleiras de pessoas amigas, livrarias e bibliotecas. Então porque decidi lê-lo agora? Essencialmente porque encontrei uma lista de livros, dizendo respeito, com alguma ironia, aos 50 Livros que Não Devemos Ler Antes de Morrer, que fazia menção ao "O Alquimista", atacando-o por não passar de um livro de autoajuda disfarçado de romance. Nada de novo, mas talvez por ter sentido a força da crítica resolvi pegar no ebook e ler, para tentar compreender finalmente o que movia tantos ódios e paixões. Comecei, mas ao fim de 20% dei por terminada a leitura.


São várias as razões que me levaram a pousar o livro, mas analisemos um pouco daquilo que o constitui,

A escrita. Tendo lido antes outros leitores procurarem qualificar a escrita de Paulo Coelho como simples e ausente de presunções, numa tentativa de o demarcar de preocupações estéticas, tenho de discordar. Nesta obra em particular, o que temos é uma escrita pobre, que é bem diferente de ser simples. Temos um texto que apresenta um vocabulário imensamente reduzido, com estruturas gramaticais muito pouco estruturadas, formando um todo incapaz de desenvolver uma coerência em termos estilísticos, atirando o registo escrito para o nível do discurso oral e impessoal.

A narrativa. Sofre dos mesmos problemas da escrita, sendo praticamente incapaz de se deslocar da história, de assumir uma estrutura e discurso autónomos. O enredo praticamente não existe fora da linha cronológica, tal como os personagens que se limitam a servir o debitar das informações relativas a cada evento.

A mensagem. Podíamos até aceitar os problemas estéticos acima enunciados, se tudo isso tivesse como propósito suportar um conteúdo válido e relevante, contudo isso não acontece. São precisas poucas páginas para compreender ao que vem Paulo Coelho, para perceber o que está a tentar fazer, tendo de suportar desde bastante cedo a sua vontade para nos guiar, e impedir de sair do seu universo. “O Alquimista” é um livro de autoajuda, o que não é propriamente novidade, o que me perturbou foi verificar que a sua base é ausente de conhecimento científico, e completamente fundamentada no esoterismo. A abordagem dada ao texto procura de certo modo mascarar esse fundamento com a ideia do romance, apelando à sua tradição ficcional para nos subjugar e assim converter, mas o misticismo subjacente é tão intenso, que só mesmo com muita boa-vontade se torna tolerável.

É verdade que os livros de autoajuda têm estado sempre debaixo de fogo, muito porque na generalidade não vão além da banha da cobra, para o qual fenómenos como “O Segredo” e este "O Alquimista" muito contribuem. Mas nos últimos anos, nomeadamente com o surgimento da Psicologia Positiva, vimos aparecer toda uma outra abordagem, fundamentada em estudos das ciências sociais e neurociências que conseguiram captar novos leitores, alguns deles bastante informados. Eu próprio tenho-me interessado bastante pelos resultados das investigações da Psicologia Positiva, dado o meu interesse no design de experiências emocionais em ambientes digitais interativos, contudo mesmo os livros de autoajuda baseados em Psicologia Positiva têm permanecido fora da minha esfera de interesses. Deste modo aproveitei a leitura do livro de Paulo Coelho para refletir e tentar compreender um pouco melhor as razões desta minha recusa.

Podemos dizer que a transformação do comportamento humano, que é a essência do que se busca num livro de autoajuda, não acontece apenas através da obtenção de informação. Ou seja, não basta saber o que tenho de fazer para ser feliz, é fundamental agir para que isso possa acontecer. Ora o problema é que deter conhecimento sobre algo que me faz bem ou algo que me faz mal, não é per se suficiente para me fazer agir. Se seguirmos uma das teorias mais estudadas nos últimos anos sobre a motivação, a Teoria da Autodeterminação de Deci e Ryan, podemos compreender melhor como se processa a transformação do comportamento humano, como o sujeito necessita de sentir autonomia, competência e possibilidade de se relacionar com os outros, três princípios que os livros de autoajuda não proporcionam, antes pelo contrário, ao funcionarem em oposição a estes, contribuem sim para a manutenção do estado inicial, não promovendo a transformação dos sujeitos.

Ou seja, os livros de autoajuda ao apontarem o caminho que deve ser seguido pelos indivíduos, descrevendo o que fazer e o que não fazer, estão a exercer um Controlo sobre a vontade dos indivíduos que os lêem, retirando-lhes de imediato a Autonomia de decisão e de desenho do seu processo pessoal de transformação. Por outro lado, a motivação só acontece quando existem competências instaladas que garantam os mínimos para avançar frente ao desconhecido. Ora os livros de autoajuda não contribuem com qualquer competência, já que se limitam a descrever abstracções que possam servir a qualquer tipo de pessoa, ficando a faltar eventos concretos, comparáveis e relevantes de serem assimilados. E é exatamente por isso que se torna tão mais relevante a leitura de romances, porque são estes que são capazes de nos colocar no lugar de situações concretas, e nos conferem ferramentas para lidar com o desconhecido. Por fim, a componente de relacionamento, que naturalmente não se pode conseguir na leitura, já que é algo que só pode advir da experiência do real, do esforço individual na construção do eu no seio da comunidade.

Dito isto, “O Alquimista” tem muito pouco a oferecer em troca do tempo que nos pede, apesar de ser um livro com pouco mais de 150 páginas.


Nota quantitativa no GoodReads.

setembro 19, 2022

Facebook e a Saúde Mental

O estudo, "Social Media and Mental Health" (2022) (publicado em preprint na SSRN, em breve disponível no American Economic Review) que retrata os efeitos do Facebook na saúde mental dos seus utilizadores foi tornado público por estes dias e os dados são pouco animadores. O estudo foi feito a partir de dados empíricos de: a) momento em que o Facebook foi tornado a acessível em cada universidade americana no ano de 2014, que permitiu perceber o exato momento em que cada aluno começou a aceder à ferramenta; e b) os questionários semi-anuais da National College Health Assessment, que chegam a mais de 430,000 respondentes, inquirindo sobre saúde mental e bem-estar nas universidades americanas. Os resultados: a introdução do Facebook nas universidades levou a um aumento da depressão grave em 7% e do distúrbio da ansiedade em 20%. Para além destes resultados, uma percentagem de estudantes iniciaram tratamento com psicoterapia e/ou antidepressivos. "O efeito negativo do Facebook é comparável, em magnitude, a cerca de 22% do efeito da perda de emprego na saúde mental". Os investigadores apontam como principal razão o facto do Facebook promover "comparações sociais desfavoráveis".

outubro 11, 2009

100 anos de Inspiração

Visual Effects: 100 Years of Inspiration é um pequeno filme criado por bengraphics como forma de introdução às suas aulas de efeitos visuais. Um filme constituído por uma colecção de pequenos clips e making-of de filmes notáveis no domínio dos Efeitos Visuais de entre os anos 1900 a 2008. O autor teve o cuidado de editar os filmes por ordem cronológica e como tal podem ser seguidos pela listagem abaixo.
Falta nesta montagem muita coisa a começar por Méliès, passando por 2001 ou Blade Runner, até por exemplo a Lord of the Rings ou Matrix. Contudo este é um trabalho bem diferente de fazer uma lista, o trabalho aqui apresentado implica muitas horas/dias de trabalho de investimento na procura e selecção das imagens. Como tal bengraphics está de parabéns por ter conseguido realizar 5 minutos representativos dos últimos cem anos de efeitos visuais que são uma verdadeira motivação para todos os que trabalham nestas áreas. Para quem quiser ver uma listagem eleita por peritos veja o o meu post sobre os VES 50 ou ainda o outro post sobre o Top 100 3d.




1900 - The Enchanted Drawing
1903 - The Great Train Robbery
1923 - The Ten Commandments (Silent)
1927 - Sunrise
1933 - King Kong
1939 - The Wizard of Oz
1940 - The Thief of Bagdad
1954 - 20,000 Leagues Under the Sea
1956 - Forbidden Planet
1963 - Jason and the Argonauts
1964 - Mary Poppins
1977 - Star Wars
1982 - Tron
1985 - Back to the Future
1988 - Who Framed Roger Rabbit
1989 - The Abyss
1991 - Terminator 2: Judgement Day
1992 - The Young Indiana Jones Chronicles
1993 - Jurassic Park
2004 - Spider-Man 2
2005 - King Kong
2006 - Pirates of the Caribbean: Dead Man's Chest
2007 - Pirates of the Caribbean: At World's End
2007 - The Golden Compass
2008 - The Spiderwick Chronicles
2008 - The Curious Case of Benjamin Button

(para o caso de estarem curiosos sobre a música de fundo é Rods and Cones do album Audio dos Blue Man Group.)

abril 05, 2013

a criança e o brinquedo

"Nestas idades, todos eles são mais ou menos iguais. Eles querem apenas brincar." É esta a conclusão de Gabriele Galimberti ao fim de 18 meses passados a fotografar crianças junto dos seus brinquedos preferidos. Ainda assim Galimberti diz que se podem notar diferenças no modo como brincam.

Niko - Homer, Alaska
"As crianças mais ricas, eram mais possessivas. No início, não queriam que eu tocasse nos seus brinquedos, e eu precisava de mais tempo até que elas me deixassem brincar com eles. Nos países pobres era muito mais fácil. Mesmo que apenas tivessem dois ou três brinquedos, elas não se importavam. Na África, as crianças brincavam essencialmente com os amigos fora de casa."
Mais interessante, é a conclusão de Galimberti a propósito daquilo que se pode extrair em termos associativos. Ele sentiu no seu trabalho que de algum modo aqueles brinquedos refletiam também as ambições e mundos dos pais de cada criança. A mãe da Letónia que guiava um taxi e enchia o filho de carrinhos. O agricultor italiano cuja filha orgulhosamente exibia ancinhos, enxadas e pás de plástico. Os pais do Médio Oriente e da Ásia que quase empurravam os miúdos para serem fotografados, mesmo aqueles que não estavam muito dispostos a isso. Enquanto os pais da América do Sul estavam muito mais relaxados e diziam que podia fazer o que quisesse, desde que o seu filho não se importasse.

Os brinquedos são uma parte extremamente importante da cultura humana. Nesta imagem podemos ver um brinquedo grego do Século IV A.C. [Brinquedo em exposição no Museu Arqueológico de Atenas. Fonte]

Do meu lado, o que mais me impressionou neste retrato internacional, foi a obsessão do ser humano pelos conjuntos de peças, de diferentes formas e cores. Como se existisse uma necessidade constante de juntar mais ao que já temos, uma espécie de colecionismo processado ao nível mental. Repare-se na menina da Zambia e os seus óculos de sol, ou no menino do Texas com os seus aviões. Impressiona-me em termos cognitivos, porque se reflete ao longo de toda a nossa vida. Aquilo que buscamos nos brinquedos, de algum modo não se diferencia muito daquilo que vamos procurar mais tarde, na nossa vida. Não me refiro concretamente ao tema dos brinquedos, mas à nossa relação possessiva e coleccionista com estes.

Empatização e Sistematização (Baron-Cohen, 2003: 178)

Sobre os temas, apesar de toda a influência circundante, própria de seres em construção e modelação, o que mais me impressiona é a reiterada clivagem entre meninas e meninas, e uma tão clara afirmação e peso das bonecas para meninas e de carros para meninos. Apesar de podermos encontrar excepções, maioritariamente e independentemente do continente, podemos dizer que universalmente as meninas brinca com bonecas e peluches, enquanto os meninos brincam com carros, comboios e aviões. Sei bem que se levantam muitos contra esta diferença, afirmando que é meramente criada pela sociedade. Do meu lado o que vejo aqui, é aquilo que venho falando, baseado nos trabalhos de Baron-Cohen (ver imagem acima). As meninas recorrem às bonecas porque elas estimulam a imaginação no campo da empatia e do relacionamento social. Já os rapazes recorrem aos carros porque estes evocam a sua motivação para compreender como é que os sistemas funcionam. Isto não quer dizer que não existam homens mais empáticos, e mulheres mais orientadas aos sistemas, mas como podemos ver nesta série fotográfica são mais excepção do que regra.

Allenah - El Nido, Philippines

Abel - Nopaltepec, Mexico

Bethsaida – Port au Prince, Haiti

Chiwa – Mchinji, Malawi

Cun Zi Yi – Chongqing, China

Davide - La Valletta, Malta

Elene - Tblisi, Georgia

Farida - Cairo, Egypt

Arafa e Aisha – Bububu, Zanzibar

Jaqueline - Manila, Philippines

Julia – Tirana, Albania

Kalesi - Viseisei, Fiji Islands

Li Yi Chen - Shenyang, China

Keynor – Cahuita, Costa Rica

Lucas - Sydney, Australia

Maudy - Kalulushi, Zambia

Naya - Managua, Nicaragua

Noel - Dallas, Texas

Norden – Massa, Morocco

Orly - Brownsville,Texas

Pavel – Kiev, Ukraine

Puput - Bali, Indonesia

Shaira – Mumbai, India

Ragnar - Reykjavik, Iceland

Ralf - Riga, Latvia

Reanya - Sepang, Malaysia

Ryan - Johannesburg, South Africa

Stella – Montecchio, Italy

Taha - Beirut, Lebanon

Talia - Timimoun, Algeria

Tangawizi – Keekorok, Kenya

Tyra - Stockholm, Sweden

Alessia – Castiglion Fiorentino, Italy

Botlhe – Maun, Botswana

Enea - Boulder, Colorado