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março 03, 2011

Entrevista de JP Gee: o ensino e os videojogos

James Paul Gee é um dos mais reconhecidos autores na investigação dos videojogos, seus processos de aprendizagem, e impactos para o ensino. Está longe de ser o tipico professor universitário defensor do campo, uma vez que já tem mais de 50 anos. O seu amor aos videojogos apareceu quando começou a presenciar o seu neto de 6 anos a jogar, e começou a tentar acompanhá-lo, percebendo a quantidade de informação e raciocínios que estavam em causam para se conseguir jogar um jogo de modo efectivo. O seu livro What Video Games Have to Teach Us About Learning and Literacy (2003) é uma referência internacional na área, e dezenas de publicações suas podem ser descarregadas directamente do seu site.
Nesta entrevista podemos ver Gee em discurso director falar sobre as suas crenças no uso dos métodos e design dos videojogos para re-criar os modelos de ensino. Não muito distante de Ken Robinson, vem colocar o dedo sobre os problemas da educação actual no que toca à sua incapacidade para gerar espíritos empreendedores e inovadores. Fala-nos sobre as capacidades motivacionais e de formação clara potenciáveis pelos videojogos. No final deixa ainda um alerta relativo aos novos públicos, que serão cada vez mais exigentes, porque têm à sua disposição online, informação capaz de transformar um autodidacta num expert.


"Se queremos ensinar a inovar, temos de mudar os testes, temos de mudar o modo como fazemos avaliação no ensino. O nosso ensino actual baseia-se no facto de que qualquer conteúdo é ensinado ao longo de 12 semanas, e no final fazemos um exame para avaliar se a pessoa aprendeu tudo o que foi ensinado."

"Agora pensem, porque não testamos uma pessoa que jogou Halo e chegou ao final para saber se esta sabe jogar, mas testamos alguém que andou 12 semanas a aprender Álgebra?"

"A resposta é que no caso de Halo não é preciso, porque assumimos que se se conseguiu chegar ao final do jogo é porque aprendeu, de outro modo não teria conseguido lá chegar. Assim o que estamos a dizer é que acreditamos mais no design e aprendizagem de Halo do que no design e aprendizagem da cadeira de álgebra!"

janeiro 08, 2011

"Outliers" de Malcolm Gladwell


Outliers (2008) é um livro interessante que deve ser lido enquanto um livro fruto de investigação jornalística, e não de investigação científica. Outliers como os dois livros anteriores, The Tipping Point (2000) e Blink (2005) de Glawell, está escrito numa prosa muito fluida, estruturalmente progressiva, que nos conduz momento a momento sem espaços vazios. O constante atirar de exemplos, números e estudos de professores universitários, credibiliza e mantém o leitor engajado.

Outliers pretende servir como explicação das pessoas fenómenos de sucesso como Bill Gates ou Mozart, dizendo aquilo que todos já sabemos, que o talento não chega mas que o trabalho duro, o timing e a sorte são essenciais.

O melhor e o pior do livro é a fundamentação que Gladwell cria para explicar o sucesso quase exclusivamente assente sobre a ideia de "trabalho duro". Se por um lado a teoria faz sentido e ajuda a perceber melhor quem eram as pessoas por detrás do fenómeno, por outro lado tenta passar uma ideia de um ideal "comunista". Todos podemos fazer o mesmo, todos podemos ser os melhores, desde que nos esforcemos, desde que trabalhemos muito poderemos fazer o que quisermos. Aliás em certa media, o discurso chega a raiar uma espécie de O Segredo (2006) mas agora com um tom, digamos, realista.

Do lado dos fenómenos, Gladwell vai encontrar várias evidências que parecem demonstrar que o sucesso de pessoas como – Bill Gates, Mozart, Bill Joy, entre outros – assentam na oportunidade que tiveram ao longo da vida para investir "10 mil horas" do seu tempo a realizar uma actividade. E depois usa mesmo vários estudos que suportam esta ideia do número de horas, sendo por vezes referenciado também como "10 anos" de experiência.
"In study after study, of composers, basketball players, fiction writers, ice skaters, concert pianists, chess players, mas­ ter criminals, and what have you, this number comes up again and again. Of course, this doesn't address why some people get more out of their practice sessions than others do. But no one has yet found a case in which true world-class expertise was accomplished in less time. It seems that it takes the brain this long to assimilate all that it needs to know to achieve true mastery." [1]
Contudo isto não explica tudo, existem muitíssimas outras variáveis que não estão a ser levadas em conta e que suportam a razão das 10 mil horas. É isso que eu vejo no gráfico retirado do artigo [2] que suporta as teorias de Gladwell
Aos 8 anos começa a divergência entre o grupo de amadores e profissionais de piano. E era sobre isso que precisávamos de nos interrogar. Perceber qualitativamente porquê. E não apenas olhar para o gráfico, somar as horas e atirar uma conclusão. O que eu aqui vejo é que aos 8 anos, os miúdos já perceberam, sentiram a sua queda, motivação ou se quisermos ser mais espirituais o seu chamamento.


A obsessão de Gladwell é de tal modo que vai ao ponto de levar o estudo à formação das sociedades e comparar os modelos de agricultura medieval da Ásia com a Europa. E referindo sempre como comparação entre os dois mundos, os testes internacionais de matemática, nos quais os alunos asiáticos possuem melhores desempenhos. Para Gladwell, isto está relacionado com o provérbio,
"No one who can rise before dawn three hundred sixty days a year fails to make his family rich"
Foto de samsayer88

Um provérbio de incentivo e motivação que claramente procura aliviar a dureza do trabalho nos campos de arroz, mas que está bem longe da realidade. E mesmo será que ser um bom matemático se restringe a ter bons desempenhos em testes internacionais durante o secundário. E depois desde quando é que ter uma nação de crianças com melhores notas a matemática, lhe confere o título de melhores seres humanos? Gladwell chega mesmo a comparar o número de dias que as crianças americanas (180) passam nas escolas versus as crianças Japoneses (244) e referindo estudos que suportam que as férias grandes não fazem mais que perturbar o regular ensino! Que as férias grandes aparecem, como imitação do descanso dado às terras em pastoreio na Europa, ao contrário dos Asiáticos em que o arroz é plantado em 2 ou 3 sementeiras anuais!

Ou seja, o ideal seria então trabalhar, mais, mais e mais. Mas afinal qual é a definição de pessoa e vida para Gladwell? Viver é trabalhar? Viver é sobreviver? E onde fica a felicidade, será que isso importa para Gladwell.

Por exemplo no caso dado sobre as Escolas americanas e do programa KIPP "Knowledge Is Power Program", dá o exemplo das crianças de 12 anos de Brooklyn, que se levantam às 5h da manhã e passam o dia a trabalhar na escola, deitando-se depois às 23h para acordar no dia seguinte. Tudo isto para poder chegar a obter o mesmo que obtém as crianças com um ambiente "chamado saudável". Isto faz sentido? Faz sentido que uma criança seja "escravizada" em função dos estudos. Para conseguir ir para o liceu, ou possivelmente para a Universidade. Será que aquela criança está talhada para isso. Não poderia aquela criança investir em qualquer outra coisa, que lhe desse tempo para brincar e existir?

Vejamos o caso de Ronaldo, foi para a Universidade? Quantos livros leu? Mas por outro lado investiu muito mais que todos os seus colegas, no número de horas a treinar a prática do futebol, aliás ainda hoje o faz, é visível em todos os documentários que têm sido feitos sobre ele.

Ou seja isto vem comprovar a teoria das 10,000 horas de Gladwell, em que é preciso investir esse tempo para se tornar o Melhor Jogador de Futebol do Mundo de 2009. Mas será que isto nos diz, que se qualquer garoto da Madeira, ou dos Açores, ou e porque não do mundo, treinasse tantas horas como ele conseguiria chegar a ser como ele? Não sei.

Mas talvez se percebermos porque é que o Ronaldo continuava a treinar depois de todos os outros já terem ido para casa jantar, talvez possamos perceber, porque é que todos os outros miúdos não poderiam ser o Melhor Jogador do Mundo. Vejamos então porque é que o Ronaldo treinava mais.

Para percebermos a lógicas da motivação humana, nada melhor que utilizarmos os principios do Game Design, que utilizamos para desenhar um jogo de modo a torná-lo interessante para os jogadores. O que procuramos quando desenhamos um jogo, é criar uma Mecânica de jogo tal, que o jogador não se consiga desligar da mesma. Envolver e persuadir mentalmente o jogador. E todos conhecem essa sensação, de que mesmo quando paramos de jogar, o jogo é de tal modo forte, que continuamos a jogar mentalmente. Assalta-nos o pensamento como uma urgência quase vital, voltar ao jogo, e terminar, acabar com ele.

Jesse Schell, numa conferência sobre os Jogos Sociais e a Gameficiation, vem dizer-nos que os jogos providenciam determinados elementos de interesse para o jogador. Ora esses elementos, não são mais, da minha análise, que os Factores de Motivação do ser Humano.

. Feedback claro
. Sensação de Progresso

. Possibilidade de Sucesso

. Exercitar Fisica e Mentalmente

. Satisfação de Curiosidade

. Hipotese de Resolver um Problema

. Sentimento de Liberdade

Podemos pensar então agora nos treinos de Ronaldo ou nos treinos dos pianistas e pensar: O "feedback" é a condição base de toda e qualquer acção humana sobre o meio, porque é a reacção à nossa acção. Mas o mais interessante, é a "Sensação de Progresso". As pessoas continuam a jogar, apenas e só se sentirem que estão a progredir no jogo. Ora é exactamente isto que acontece com os pianistas e com o Ronaldo. Estes aumentam o investimento de tempo, porque sentem que a sua performance está a progredir. Mais, sentem que existe “Possibilidade Sucesso”, tanto nos objectivos que se autopropõem como nos objectivos impostos pela sociedade (ser eleito pela FIFA).

As actividades que nos permitem "exercitar física ou mentalmente", funcionam como desafios às nossas capacidades, e como tal servem por si de motivadores. Por sua vez o atingir dos objectivos, a resolução dos exercícios mentais ou físicos contribuem com resolução, ou seja "satisfazem a curiosidade" e ao mesmo tempo podem "permitir resolver problemas" que até aí tenham sido dificieis para o jogador, ou mais, que se saiba que são muito difíceis em geral. Saber se consigo marcar um golo de 40 metros de distância com barreira, ou saber se consigo tocar o Rach 3.

Finalmente a satisfação de todas as condições anteriores confere um claro "sentimento de liberdade", porque o domínio, da arte, estas ou outras, permite que a pessoa sinta que tudo pode fazer naquele campo, que é livre, que não está aprisionada nas limitações das suas capacidades mentais ou físicas.

Ou seja, não é apenas trabalhar mais, mas ter uma Vontade maior. Mas como é que se cria essa Vontade? A explicação está para mim em Ken Robinson que ao contrário de Gladwell acredita mais no indivíduo e menos na igualdade das massas. Acredita que todos nós podemos e devemos encontrar a arte em que podemos ser os melhores. Se o que faço quando toco um piano não me motiva, começo a desistir, e deixo de investir horas. Isto não tem nada que ver com ser preguiçoso. Isto tem que ver com capacidades, talentos e modelações dos nossos cérebros. E por isso acredito mais em Ken Robinson do que em Gladwell. Como nos vem dizer Steven Pinker, um dos maiores defensores da teoria de que não nascemos como tábuas rasas para a vida [4], o problema de Gladwell é que
“when a writer’s education on a topic consists in interviewing an expert, he is apt to offer generalizations that are banal, obtuse or flat wrong (...) the problem with Gladwell’s generalizations about prediction is that he never zeroes in on the essence of a statistical problem and instead overinterprets some of its trappings.” [3]


[1] Daniel J. Levitin, This Is Your Brain on Music: The Science of a Human Obsession, NewYork, Dutton, 2006, p.197.
[2] K. Anders Ericsson, Ralf Th. Krampe, and Clemens Tesch-Rômer,
The Role of Deliberate Practice in the Acquisition of Expert Performance, Psychological Review 1 0 0 , no. 3 (1993): 363-406.
[3] Steven Pinker, (2009),
Eclectic Detective, in New York Times, November 7, 2009 http://www.nytimes.com/2009/11/15/books/review/Pinker-t.html
[4] Steven Pinker, (2002),
The Blank Slate: The Modern Denial of Human Nature, Penguin

janeiro 03, 2011

Criatividade e Storytelling

Imagem de Christine

Para começar bem o ano aqui ficam três palestras sobre o assunto que mais vai ocupar o meu ano de 2011, a Criatividade e o Storytelling. Depois de muito termos ouvido Ken Robinson falar sobre a criatividade e a educação, vale a pena escutar dois designers consagrados - John Maeda e Stefan Sagmeister - e um verdadeiro storyteller - Jay O'Callahan. Os três estiveram na conferência 99% de 2010 organizada pela Behance Network, uma rede dedicada a quem trabalho nas áreas criativas. O lema da conferência é nem mais,

"It's time to stop dreaming and start doing"


John Maeda: Looking for Superman



Stefan Sagmeister: Don't Take Creativity For Granted


Jay O'Callahan: The Power of Storytelling

outubro 17, 2010

ser criativo, ou ser educado / formatado


Para quem está interessado em perceber em maior profundidade o que é um Sistema Educativo Público ou de Massas. Para quem se interroga porque é que os seus filhos não reagem como "esperado" na escola mesmo quando trabalham e por vezes até são medicados. Para quem acredita que o mundo mudou e não vai parar de mudar. Os elementos (entrevistas, comunicações, animações, artigos, filmes) que vos trago neste texto debatem a base do sistema educativo, o seu aparecimento, objectivos e o modo como isso afectou a sociedade.

Numa entrevista dada aquando da passagem por Portugal Alvin Toffler e a sua mulher expõem por completo o mito da Escola. Por sua vez Sir Ken Robinson partindo desta exposição feita por Toffler explica os problemas graves do sistema e o modo como isso nos afecta. Finalmente um artigo de Peter Gumbel apresenta-nos o caso concreto da França que levou este sistema até ao limite e no qual os problemas são hoje mais do que muitos. Para fechar este texto sugiro a visualização de Entre les Murs (2008), um filme poderoso sobre o que se passa socialmente dentro de uma sala de aulas.

Este vídeo mostra apenas 10 minutos de uma palestra de 55 minutos dada por Ken Robinson em 2008 na Royal Society of Arts aquando recebeu a RSA Benjamin Franklin Medal de 2008. Por outro lado Ken Robinson já tinha sido revolucionário quando em 2006 apresentou a sua primeira TED Talk na qual "afirma que as escolas matam a criatividade". Depois veio a sua segunda Ted Talk em Fevereiro deste ano, "Façamos a revolução da aprendizagem!"

Num artigo publicado este mês na Time, é analisado o estado do sistema educativo Francês, um sistema muito próximo do Português. Destaco algumas das partes mais importantes deste artigo


Andreas Schleicher, head of the OECD's educational division, says France still uses "19th century industrial methods" in the classroom, by which he means teachers are reduced to factory-line workers who must carry out orders rather than be trusted to use their intelligence and training.

In international comparative tests of 15-year-olds, France's overall scores are at best mediocre and have been dropping abruptly in the past decade.

...according to the Organization of Economic Cooperation and Development (OECD), requiring students to repeat a year is a rarity in Asia, Scandinavia and Eastern Europe, and it's no longer all that widespread in the U.S. or Britain. Numerous studies from around the world demonstrate that grade repetition doesn't usually help students perform better and often has the opposite effect, demoralizing and stigmatizing them as failures.

What's sorely missing is any sense of fun. Unlike in the U.S., school in France provides almost no nonacademic activities to compensate for brainy classroom work. Sports, music and art are afterthoughts, with little or no time devoted to them in the national curriculum; if you want to play soccer or the violin, the thinking goes, you can do that on your own time. But without sports teams or school orchestras, there's little that binds adolescents to their schools.

The director of a middle school near Nîmes, Robert tried to bring about a cultural revolution there, including refusing to force students to repeat grades. It backfired: he set off a full-blown teacher revolt and was quickly shifted to another establishment.
Entretanto para quem ainda não tiver visto, aconselha-se vivamente Entre les Murs (2008) de Laurent Cantet, Palma de Ouro em Cannes 2008 e que mostra o dia-a-dia de uma turma de um liceu francês. Veja-se o filme com o espírito aberto e atente-se nas questões daqueles rapazes e raparigas. Mais que tudo perceba-se o impacto da estandardização procurada sobre os seres humanos e a fundamentação para esse propósito.

maio 24, 2010

Educação: a importância de amar o que fazemos

Depois de uma das mais brilhantes TED talks realizada em 2006, Do schools kill creativity? (2006), Ken Robinson traz-nos agora uma espécie de segunda parte dessa palestra, agora com o título Bring on the Learning Revolution! (2010).



Não é tão brilhante como a primeira, o que não admira, mas toca em pontos novos e sobre os quais vamos precisar de começar a reflectir muito em breve no que toca à educação e a todo do sistema educativo. Aliás esta e a outra, são palestras que os conservadores portugueses auto-denominados de intelectuais "anti-eduquês" deveriam ouvir e encarar com muita atenção.

Robinson começa por dividir o mundo em dois tipos de perfis:

"- as pessoas que não gostam do que fazem, que aguentam apenas fazer o que fazem à espera que chegue o fim de semana.
- e as pessoas que adoram o que fazem, e são incapazes de fazer qualquer outra coisa durante todos os seus minutos."

Uma divisão que vai justificar o seu pensamento mais à frente quando nos dirá que não precisamos de ir todos para a Universidade, que podemos ser excelentes pessoas, realizadas e com sucesso fazendo muitas outras coisas. Aqui ela vai tocar na questão da "tirania do Senso Comum" como aquilo que nos impele a fazer o mesmo que todos os outros porque é a única maneira, destruindo pela raiz a fonte da Inovação. E daqui vai até às questões conservadoras de "LINEARIDADE" em que tudo no mundo precisa de uma ordem lógica em que o orgânico é difícil e pior que isso, como algo incorrecto por não ser facilmente compreensível pelo senso comum. Com isto diz-nos algo muito importante:

"as comunidades humanas dependem de uma grande diversidade de talentos, e não de uma concepção singular da habilidade"

"a razão pela qual muita gente sai da escola é porque esta não preenche o seu espírito, não preenche a sua energia, a sua paixão... precisamos de deixar para traz este modelo industrializado da escola que conduz as pessoas apenas através da linearidade e do conformismo... precisamos de transformar a escola de um modelo de indústria num modelo de agricultura, onde se criem condições para que os talentos naturais das crianças possam florescer"

outubro 13, 2007

Arte, inteligência e a natureza

Profunda, tocante e ao mesmo tempo marcando uma diferença através do alto valor de entretenimento que o orador lhe confere. Segundo a TED "If you have not yet seen Sir Ken Robinson's TED talk, please stop whatever you're doing and watch it now."


Ken Robinson vem ligar as teorias da criatividade já aqui citadas em parte aquando do lançamento português do livro de Bruno Munari, Fantasia, com as teorias sobre o modelo das inteligências múltiplas, defendendo que não podemos ser todos orientados para a profissão de professor universitário.


Aliás este é um discurso decalcado exactamente das questões levantadas pela teoria das múltiplas inteligências de Howard Gardner e desse modo ambos defendem que o nosso sistema educativo está inteiramente forjado nessa base. No início Gardner, que lançou o seu livro Frames of Mind: The Theory of Multiple Intelligences em 1983, definiu a existência de sete manifestações da nossa inteligência
1. Linguistic intelligence ("word smart")
2. Logical-mathematical intelligence ("number/reasoning smart")
3. Spatial intelligence ("picture smart")
4. Bodily-Kinesthetic intelligence ("body smart")
5. Musical intelligence ("music smart")
6. Interpersonal intelligence ("people smart")
7. Intrapersonal intelligence ("self smart")
Sendo que as primeiras duas são aquelas a que normalmente o modelo tradicional académico atribui valor, as seguintes três são associadas às artes e as últimas duas são as chamadas inteligências pessoais e que estão ligadas a capacidades de gestão ou liderança social. Desta forma a questão que aqui se levanta e que está na raiz de todo este problema é o da "cultura versus biologia". Até onde podemos ir com o pensamento de que todos os seres humanos são iguais a ponto de os poder colocar aos magotes dentro de uma área fechada e "obrigá-los" a reagir de formas semelhantes aos mesmos estímulos?
"In the heyday of the psychometric and behaviorist eras, it was generally believed that intelligence was a single entity that was inherited; and that human beings - initially a blank slate - could be trained to learn anything, provided that it was presented in an appropriate way. Nowadays an increasing number of researchers believe precisely the opposite; that there exists a multitude of intelligences, quite independent of each other; that each intelligence has its own strengths and constraints; that the mind is far from unencumbered at birth; and that it is unexpectedly difficult to teach things that go against early 'naive' theories of that challenge the natural lines of force within an intelligence and its matching domains." (Gardner 1993: xxiii) [1]
Aliás veja-se as mais recentes descobertas da neurociência [2] que vem cavalgando a confirmação das teorias que olham para o ser humano como alguém que nasce à partida condicionado por certas limitações assim como imbuído de certas potencialidades. Potencialidades e limitações, denominadas de wired, ou seja pré-inscritas na nossa rede neural e que são grande parte das vezes explicadas por teorias da biologia evolucionista [3], através das quais as nossas qualidades enquanto seres-humanos são aperfeiçoadas pela hereditariedade ao longo da história ou seja pela selecção natural, pela sobrevivência daqueles que melhor se adaptam às necessidades do ecossistema, o que faz todo o sentido. O normal é então que todas as áreas se conjuguem e que nós humanos possamos viver em harmonia com capacidades e limitações que se equivalam. O que acontece é que por vezes existem desequilíbrios que podem verter para o lado positivo (Sócrates, Jesus ou Einstein) como para o lado negativo (Pizarro, Hitler ou Ceausescu). O mais recente estudo comprova a influência que o mapa genético tem sobre as nossas escolhas de interesse básicas. O estudo centra-se sobre o teste do "ultimatum game" no qual um dos sujeitos faz uma proposta de divisão, a dois, de um valor em dinheiro (que não será os fifty-fifty) e caso o outro sujeito recuse a oferta, ambos perdem o dinheiro. Então o que acontece é que,
"Experimental evidence suggests that many people are willing to deviate from materially maximizing strategies to punish unfair behavior. Even though little is known about the origins of such fairness preferences, it has been suggested that they have deep evolutionary roots and that they are crucial for maintaining and understanding cooperation among non-kin. (..) Employing standard structural equation modeling techniques, we estimate that 40% of the variation in subjects' rejection behavior is explained by additive genetic effects. Our estimates also suggest a very modest role for common environment as a source of phenotypic variation. Based on these findings, we argue that any attempt to explain observed ultimatum bargaining game behavior that ignores this genetic influence is incomplete." [5]
O que vem recolocar em questão o factor cultura e o factor biologia. Posto tudo isto, é interessante pensar na pirâmide que Robinson descreve sobre os valores que a sociedade pós-industrial impôs para as áreas de estudo:
Matemática e Línguas > Ciências Humanas > Artes
Segundo Robinson esta ordem é condicionada pelos trabalhos de utilidade perante a sociedade e capazes de gerar retorno financeiro imediato o que está em completo acordo com a divisão das inteligências feitas por Gardner. As artes e a cultura não têm a capacidade, pelo menos em modelos do imediato, de trazer retornos concretos. E no entanto, analisada a sociedade em que vivemos, vamos ver uma vez mais que este é mais um dos discursos mascarados no sentido de "encarneirar" tudo e todos numa mesma fila e com um mesmo objectivo. Se não vejamos os resultados de um dos maiores estudos encomendados pela EU, The economy of culture in Europe, realizado sobre os efeitos económicos das actividades culturais sobre a sociedade europeia. Para ter uma noção da abrangência de actividades tida em conta neste estudo, deixo aqui um mapa de actividades do estudo publicado no Público.
"The figures supplied by the study confirm that the cultural and creative sector in Europe is outperforming other sectors: while over two million people work directly for the automotive industry – one of Europe's key industrial sectors – creative industries employ close to six million.

The turnover of European cultural industries amounted to EUR 654 billion in 2003, while the car manufacturing industry amounted to EUR 271 billion in 2001; the cultural industries contributed to 2.6% of EU GDP in 2003, while the food, beverage and tobacco manufacturing sector contributed 1.9%; the overall cultural industries growth between 1999 and 2003 is 12.3% higher than the growth of general economy. Cultural industries employed a conservative 5.8 million people, 3.1% of total EU25 population, in 2003." [4]
Afinal parece que apesar de toda pressão genocida sobre o pensamento e actividades ditas não nobres, não tem tido o efeito desejado, e só posso dizer para além de, felizmente, que "nature always finds a way".

[1] http://www.infed.org/thinkers/gardner.htm
[2] Neuroscience
[3] Evolutionary biology
[4] Philippe Kern
[5] Heritability of ultimatum game responder behavior