Diga-se que um livro apresentado com o seguinte epíteto — “O romance que inspirou o ímpeto revolucionário de Lenine. Fascinado, Marx aprendeu russo para o ler.” — impacta, tornando-se quase numa leitura obrigatória, exatamente pelo que disse no primeiro parágrafo. Daí que as expectativas fossem altas, a ponto de esperar de algum modo encontrar aqui a chave decifradora da governação comunista. Contudo esta frase é acompanhada de uma outra que deve servir para refrear o nosso anseio — “Editado pela primeira vez em Portugal, traduzido do russo, 155 anos depois”. Para uma obra, supostamente tão relevante, nunca antes ter sido traduzida deveria querer dizer-nos algo. Já para o grande historiador da Revolução Russa de 1917, Orlando Figes, este livro foi a bíblia da revolução, tendo conseguido muito mais do que os escritos de Marx ou Engels.
O Autor
Começando pelo autor, Nikolai Tchernichevski. Filho de padre, estudou num seminário onde aprendeu várias línguas e iniciou o seu interesse pela literatura. Ingressou na Universidade de São Petersburgo onde se licenciou com a tese sobre “As Relações Estéticas entre a Arte e a Realidade” (1853), o que apontava já um sentido muito claro do que pretendia fazer com o único romance que viria a escrever, e de que aqui falamos. Começou por dar aulas no ensino secundário, mas foi o seu trabalho enquanto editor da revista social e literária “O Contemporâneo” que o traria para a ribalta, e simultaneamente o conduziria à prisão, na Fortaleza de Pedro e Paulo, por crime político, ou seja por veicular ideias contrárias ao regime monárquico. Foi nos dois anos em que aí esteve preso que escreveu “O Que Fazer?” (1863). O que se sucedeu na sua vida é verdadeiramente rocambolesco, desde o modo como conseguiu publicar o livro furando a censura, ao facto de ter sido condenado a “execução civil” — uma execução pública mas como farsa! — tendo sido depois enviado para a Sibéria por mais 20 anos. Para saber mais, aconselho o capítulo quatro de “O Dom” de Nabokov (1938), no qual é apresentada uma biografia de Tchernichevski, embora num tom completamente satírico.
Nikolai Tchernichevski (1828-1889)
A Literatura e o Contar de Histórias
E porque já falei de Nabokov, começo a análise do livro enquanto literatura. Apesar da tese realizada como projeto de fim de curso, acima identificada, apesar do seu enorme interesse pela literatura, apesar de ter escrito, ao longo de anos, resenhas sobre literatura para a sua revista O Contemporâneo, nada disso parece ter servido de muito. A escrita de Tchernichevski é atroz, e por isso não admira o capítulo satírico que Nabokov lhe dedicou. Fica o aviso, a leitura é penosa porque o autor é incapaz de criar ritmo, incapaz de criar a teia do contar de histórias que nos mantém focados, já que tudo em “O que Fazer?” vai surgindo mais como descrição do que narração. Ou seja, Tchernichevski vai descrevendo o que acontece, onde, como e quando, mas é incapaz de estabelecer os porquês, as causas e os efeitos de modo a mover a nossa atenção, de modo a criar expressividade no texto escrito. No fundo, tudo na sua escrita é igualmente relevante, porque tudo assenta numa tentativa objetiva de descrição da realidade, faltando-lhe a essência da arte, que é o olhar pessoal, a perspectiva humana, sobre essa realidade.
Por outro lado, e dado o imenso conhecimento que Tchernichevski detinha sobre literatura, o livro acaba por apresentar uma estrutura coesa e progressiva. Ou seja, temos uma estrutura bastante concreta que se desenvolve em três atos, com personagens ainda que sem vida, perfeitamente identificados, e temos também muitos pequenos artifícios de escrita, que Tchernichevski aprendeu a usar de tanto desconstruir os textos dos outros, e que vão servindo para nos manter na leitura. Ainda assim não fosse o valor histórico e não seria suportável tal leitura. Apesar de as metáforas literárias serem muito básicas, e estarem bastante ausentes no livro, dada a sua tendência meramente descritiva, a meio do livro e para qualificar um outro livro, Tchernichevski apresenta o que devemos saber sobre a experiência da leitura deste livro — “qualquer outra pessoa consideraria esse livro tão saboroso quanto comer areia ou serragem” (p.255). Metaforizando bem o que sentimos lendo Tchernichevski, ainda assim não podemos desprezar a inteligência de ter optado por escrever um romance para fazer passar as suas ideias de dentro da prisão para a sociedade.
Não foi o primeiro, o que é a Bíblia se não o uso de histórias para condicionar e promover ideias. Temos muita dificuldade em lidar com números, estatísticas, conceitos e descrições e não deixamos de ter mesmo quando solidamente suportados por provas, factos e evidências. O nosso cérebro não racionaliza bem elementos soltos, o nosso cérebro exige histórias que agreguem todos esses elementos, oferecendo-lhes um sentido que una as partes num todo. Isto tem sido amplamente estudado e demonstrado através das mais recentes tecnologias promovidas pelas neurociências. Um artigo do mês passado, de Ella Saltmarshe para o Stanford Social Innovation Review, traz um excelente resumo das capacidades das histórias para transformar o social, apresentando os seus três grandes atributos: as histórias como luz; as histórias como cola, e as histórias como teia. Aconselho vivamente a sua leitura.
Disto isto, fica uma das principais lições de “O Que Fazer?”, que por mais fraca que seja a escrita, o simples uso da estrutura narrativa pode contribuir para catapultar as ideias presentes no texto, já que a narrativa é, tal como definido por Walter Fischer (1985), o meio de comunicação, por excelência, entre humanos. Se dúvidas houver, pense-se num trabalho realizado um século depois, “A Revolta de Atlas” (1957) de Ayn Rand, que baseada em ideias próximas de Tchernichevski daria origem ao movimento, aparentemente contrário, ao comunismo moderno, ou seja o neoliberalismo. Aliás, sobre a fraca qualidade de ambos os textos, as origens comuns das ideias, e a sua capacidade de ativação social vale a pena o livro “How Bad Writing Destroyed the World” (2016) de Adam Weiner, ou o seu texto-sumário “The Most Politically Dangerous Book You’ve Never Heard Of” (2016) que o próprio Weiner escreveu para o Politico.
“How Bad Writing Destroyed the World” (2016) de Adam Weiner
Génese e Teias Literárias
Para compreendermos o livro de Tchernichevski, temos de compreender a Rússia do século XIX e como se chega a uma revolução. A melhor forma de o fazer passa pela leitura dos seus clássicos, que se tornaram clássicos globais, nomeadamente “Guerra e Paz” (1867) e “Anna Karenina” (1877) de Lev Tolstói, assim como “Almas Mortas” (1842) de Nikolai Gógol e “Pais e Filhos” (1862) de Ivan Turgueniev, ou mais recentemente “Doutor Jivago” (1957) de Boris Pasternak para dar um pano de fundo aos efeitos da Revolução. A elevação de Tolstói a herói nacional não surge por acaso, os seus romances, ainda que anteriores à sua grande crise moral, dão bem conta da sociedade russa dividida em castas, em cidadãos de primeira, segunda, terceira, e até sem direito a qualquer classe. O chamado tempo dos Czares, um tempo no qual o pensar politicamente diferente já dava direito a estadias prolongadas na Sibéria, como viria acontecer com Dostoiévski, e com o próprio Tchernichevski. As condições criadas e que marcavam a diferença de vida entre a monarquia e o povo não eram muito diferentes daquelas que tinham despoletado cem anos antes a Revolução Francesa, com episódios como o de Marie Antoinette, que à afirmação de faltar pão ao povo terá dito: “Qu'ils mangent de la brioche”.
E debate existia na Rússia, não faltavam exemplos, desde logo os escritos da Revolução Francesa, como Rousseau, entre outros. Mas é muito mais fácil falar e escrever do que fazer, e a fazer “o que fazer”? Tchernichevski lança-se neste senda quase como resposta direta a Turgueniev e ao niilismo apresentado em “Pais e Filhos”, que tinha procurado tudo relativizar esvaziando o sentido de qualquer ação. Daí que o título não pudesse ser outro, objetiva claramente a responder à pergunta que todos faziam, sabendo que tudo estava mal, “o que fazer?”. O autor não inventará nada neste livro, tudo já tido sido escrito por ele anos antes em vários textos, nomeadamente em “The Anthropological Principle in Philosophy” (1860), com base em pensadores do campo da economia, como Charles Fourier e Adam Smith, e pelo lado da religião, Hegel e Ludwig Feuerbach.
O livro teve enorme impacto junto de Marx, precedendo a sua escrita do “O Capital” (1867), que dizia "de todos os economistas contemporâneos Tchernichévski é a única mente original; os outros são apenas compiladores comuns" (Lopatin, 1922). No caso de Lenine, quase meio-século depois iria dedicar-lhe um livro-panfleto, com uma designação próxima, “What Is To Be Done? Burning Questions of Our Movement” (1902). Mas nem por isso faltaram alertas à saída do livro, tendo Dostoiévski escrito a resposta mais direta com “Memórias do Subterrâneo” logo em 1864, e Tolstói, depois de ter assumido mais seriamente o seu ativismo, dedicado também um livro, mas de não-ficção, tal como Lenine — “What Then Must We Do?” (1886), e por fim a já mencionada biografia satírica de Nabokov em 1938. Assim, e se Marx tinha já escrito antes o seu "Manifesto Comunista" (1848), fazendo sentido o seu interesse académico pelo trabalho de Tchernichevski, o caso de Lenine é um pouco mais estranho, porque muito pouco académico, motivado mais por sede de vingança, repare-se o que leva Lenine a ler Tchernichevski:
“O romance de Tchernichévski é demasiado complicado, muito cheio de ideias para ser entendido e avaliado numa idade precoce... Mas depois da execução do meu irmão, sabendo que o romance de Tchernichévski era um de seus livros favoritos, comecei a lê-lo de outra forma e fiquei a refletir sobre ele não apenas alguns dias, mas semanas inteiras. Foi só então que entendi a sua profundidade. É uma coisa que pode fazer disparar as energias duma pessoa para toda a vida.” Vladimir Lenine, in The Russian Revolutionary Novel, (1985, p.24)
Vladimir Lenine (1870-1924)
As Ideias
Para Tchernichevski fazer passar as suas ideias, através da natural censura que existia à saída de qualquer escrito da prisão, não bastou usar a forma do romance, teve de recorrer a vários artifícios, alguns bastante evidentes para nós hoje, outros apenas entendíveis à luz dos múltiplos estudos académicos que foram sendo produzidos ao longo dos anos. Assim, o artifício mais evidente usado por Tchernichevski joga-se na história que aparentemente parece fundear-se na emancipação da mulher, fazendo jus a alguns movimentos pré-feministas do século XIX. Ou seja, trabalhando a libertação da mulher, trabalhando a igualdade entre sexos, Tchernichevski estava no fundo a trabalhar a libertação das classes, e acima de tudo a promover um discurso de total igualdade de direitos entre todos. Visto a partir das concepções morais e científicas da altura, era facilmente categorizado como tonto, e logo inócuo.
Tendo então o problema das classes resolvido, faltava resolver o problema do como motivar as pessoas para a ação e ao mesmo tempo como convence-las de que o pós-revolução serita sustentável. Assim o discurso de Tchernichevski vai seguir uma abordagem paralela, por um lado explicando o que deveria ser feito à saída do estado atual, como se deveria organizar a sociedade e funcionar para subsistir economicamente, por outro lado lançando uma abordagem filosófica capaz de substituir a crença moral, e a chamada melancolia russa que promovia a apatia, para assim dar força e motivação suficientes às pessoas para se demoverem.
Assim, temos a componente de ciência económica, fundamental no discurso comunista moderno, e em que Tchernichevski constrói a base com dois grandes autores do século anterior — Fourier e Smith —, o primeiro para lançar estruturas económicas cooperativas — no livro, as empresas de costura de Vera — em que todos trabalham juntos para um mesmo fim, sendo recompensados igualmente pelos lucros obtidos enquanto partes vitais de um todo. Já seguindo Smith, e a ideia de um mercado auto-regulado, Tchernichevski apresenta a ideia de cooperativas a funcionar em autogestão, sem necessidade patrões ou chefes, em que todos são igualmente responsáveis, relevantes e merecedores. Sem a costureira, ou a contabilista, ou a gestora, não se venderiam o mesmo número de vestidos, cada uma na sua função foi vital para o sucesso, por isso todas deviam receber a mesma parte dos lucros.
Se isto parecia tudo fazer sentido, a verdade é que nunca tinha sido tentado antes na prática. Deste modo Tchernichevski apresenta no livro casos aplicados de como tudo funcionaria. Ainda assim, o livro sai em 1862, baseado em ideias do século XVIII, mas só em 1917 é que iríamos ver a Rússia a aplicar estas ideias, tornando-se assim na primeira nação a fazê-lo. Na verdade, e como já se disse acima, muito mais fácil era falar e escrever, do que fazer. Levar a prática algo deste calibre requeria não apenas a vontade de governos, grupos ou um povo, mas mais importante que isso, requeria aquilo que Tchernichevski define na edição russa em subtítulo — “Histórias sobre o Povo Novo” —, um “Povo Novo”. E é a esse povo novo que Tchernichevski dedica o livro, oferecendo-lhes uma nova moral, um conjunto de princípios capazes de sustentar a nova vida livre e igual. Essa nova moral, segundo Tchernichevski, que abandonava a religião e abraçava Feuerbach, revestia-se por um conjunto de princípios básicos mas fundamentais na sustentação desse novo mundo. Assim, Tchernichevski vai defender, por meio das ações e diálogos dos seus personagens, uma abordagem materialista e utilitarista do mundo. Para Tchernichevski, tudo o que é útil é bom, tudo que nos magoa é mau, logo as pessoas boas definem-se pela capacidade de fazer algo que lhes dê prazer mas ao mesmo tempo sejam úteis aos outros.
Para elucidar esta abordagem Tchernichevski cria um herói — Rakhmétov, uma espécie de santo excêntrico, herdeiro de fortuna que nunca revela, mantendo fachada humilde, capaz de tudo fazer pelos outros sem que estes o descubram, desprezador de luxos, preferindo dormir no chão a uma cama —, que tem uma participação fugaz mas de tal forma impactante que se torna no personagem que Lenine praticamente procura emular na sua vida, e muitos dos seguidores do romance. Mas Tchernichevski não se fica por esse personagem, cria uma situação concreta conhecida de todos os leitores para dar conta da conduta a seguir, uma triangulação amorosa, fazendo dessa o cerne da ação do livro, com os personagens a servir de prova, obrigando-os a ponderar o que é bom para si e mau para os outros, e como poderiam sair da situação tornando-se úteis aos outros, sentindo com essa ação ainda mais prazer. Podemos dizer, e não aferindo da qualidade da filosofia nem do romance, que isto é talvez o mais bem conseguido de todo o livro. O triângulo amoroso funciona como uma metáfora literária perfeita, sendo mesmo habilmente usada por Tchernichevski para abrir o livro in media res, com um suspense que agarra o leitor.
Esta abordagem filosófica ficaria conhecida como “Egoísmo Racional”, e esteve na base do que moveu Lenine para a Revolução de 1917, transformando assim a Rússia num país inteiramente Comunista. Tchernichevski vende bem a ideia, nomeadamente com um outro conceito que ficaria conhecido como o “Palácio de Cristal”, apresentado como sonho futurista de Vera, o qual parece conseguir dar a sociedade uma nova forma de estar na vida, em que todos sentem prazer com o trabalho que fazem, trabalhando apenas o necessário mas retirando imenso prazer dessa vida com todos os outros, numa nova comunidade movida por padrões ocidentais (a ideia do edifício em vidro e alumínio provinha dos edifícios arrojados construídos para as exposições de Londres).
“Diga a todos: eis o futuro e ele é radioso e lindo. Ame-o. Esforce-se por alcançá-lo. Trabalhe para ele. Faça-o ficar mais próximo. Transforme-o em presente tanto quanto possa. A sua vida será tão radiosa e boa, rica de alegrias e deleite, quanto você conseguir trazer-lhe o futuro." in "O Que Fazer" (p.363)Se a Rússia se transformaria numa ditadura pesada, gerida por um dos mais vis chefes-de-estado de sempre — Estaline — a abordagem acabaria por saltar fronteiras e entrar, como um cavalo de Tróia, no ocidente por meio de Ayn Rand, nascida em São Petersburgo. Um século depois, esta apresentava o seu objetivismo — o indivíduo como o fim em si mesmo —, que sustentaria a criação da grande ideologia económica — o Neoliberalismo —profundamente promovida pelo seu discípulo, Alan Greenspan, o arquiteto da recente crise financeira mundial de 2008. É impressionante descobrir que Alan Greenspan, o potenciador do capitalismo selvagem internacional, levou para a sua cerimónia de juramento na sala oval apenas duas pessoas, a sua mãe e Ayn Rand. Não admira que se designasse o séquito de Rand como seita.
Ayn Rand (1905-1982)
Existe ainda um detalhe em todo esta abordagem que muito me tocou, e que tem que ver com o facto de todas estas ideologias serem professadas de um modo distinto daquilo a que nos acostumámos a ver nestes grupos, ou seitas, já que não se trabalha baseado na lavagem cerebral. Tchernichevski coloca todos os seus personagens como licenciados, ou prontos a estudar para poderem elevar o pensamento crítico. E se olharmos aos regimes comunistas, não raros são os que promoveram sociedades com bastantes estudos. Ou seja, existe aqui uma espécie de crença no fator conhecimento como salvador de todos os problemas da humanidade, que é algo em que tendemos todos a crer, daí que todos estejamos de acordo com o enorme investimento que os estados fazem em Educação. Quanto mais sabemos sobre aquilo que somos, quanto mais sabemos sobre o mundo que nos rodeia, maior será a nossa consciência de nós e do outro, consequentemente maior seria a nossa capacidade para agir egoisticamente pela razão. Mais uma vez tudo parece fazer sentido, mas como a realidade insiste em demonstrar, não chega, porque o ser-humano não é mera plasticina moldável.
Fiódor Dostoiévski (1821-1881)
Ou seja, é bastante doloroso viajar no tempo e ler alertas como os de Dostoiévski, de que as ideias de Tchernichevski eram demasiado simplistas no que toca à caracterização do ser humano. E se havia algo em que Dostoiévski era mestre, era exatamente na psicologia humana, sendo que algo que fica bem claro no livro de Tchernichevski é a sua limitação, e desconhecimento, na caracterização psicológica. A sua base objetiva era uma filosofia capaz de sustentar o bem da espécie humana, mas não percebeu que entre o ideal e a prática existia todo um mundo real, e esse não se regula apenas por morais escritas ou convencionadas, regula-se também por experiências e emoções. Mas diga-se, em abono da sua causa, que não estava sozinho, passados mais de 150 anos continuamos a sentir os efeitos destas visões, com crises financeiras capazes de ceifar tudo o que apanham.
Apesar da enorme quantidade de estudos no campo da psicologia e neurociências a demonstrar que a emoção é tão responsável pelo que fazemos como a razão. Apesar de se ter criado uma nova ciência — Economia Comportamental — que já nos deu vários prémios Nobel — Daniel Kahneman em 2002, e ainda no ano passado, um seu colaborador, Richard Thaler — os economistas continuam a acreditar que os seres humanos são apenas movidos pela razão, pela maximização do seu proveito, esquecendo que somos uma espécie mamífera, incapazes de viver sozinhos, sem a companhia, presença e entre-ajuda do outro, e que como tal detemos vários mecanismos cognitivos que alteram a nossa percepção racional da realidade. Por mais educados que sejamos, por mais níveis elevados de razão que possamos atingir, nunca seremos Vulcanos, um Spock, e ainda bem.
Sobre a edição portuguesa pela Guerra & Paz, trata-se de uma tradução original do russo para português do Brasil pelo professor de História da Universidade de São Paulo, Angelo Segrillo, e adaptado para o português europeu por Ana Salgado. Não sendo uma edição perfeita, tendo em conta a qualidade da escrita original, e tendo eu lido também uma parte da tradução inglesa por Michael B. Katz, parece-me ainda assim bastante capaz.
Referências
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