Uma frase vai ficar marcada para mim depois de ver esta palestra “The moment kids start to lie is the moment storytelling begins.”. Se nada mais fosse dito de relevo, esta frase teria sido suficiente para justificar o tempo que investi a ver a comunicação. É algo pelo qual já passei em casa, e já me interroguei, não neste sentido, mas nas razões do seu surgimento. Esta explicação apresentada por Kim Young-ha diz muito, se não tudo, sobre aquilo que somos e porque a arte é tão importante, mesmo quando sabemos, e como ele defende no final, respondendo à questão, “Para que serve a arte?”, “But art is not for anything. Art is the ultimate goal. It saves our souls and makes us live happily. It helps us express ourselves…". Isto porque criar arte é acima de tudo um acto que nos permite depurar aquilo que somos, porque o fazemos pela espontaneidade do nosso devir, emergindo do largar das amarras do dever, envolvido por actos de puro brincar. Como diz Young-ha, "just for the fun of it. Sorry for having fun without you”.
julho 06, 2014
Torna-te artista, agora!
Kim Young-ha (1968) é um dos escritores mais respeitados da Coreia do Sul. Depois de vários anos como professor na Korean National University of Arts resolveu deixar tudo para trás, ir morar para NY e viver apenas da escrita. Nesta TED, “Be an artist, right now!” dada em Seoul em 2010, Kim Young-ha fala sobre os dilemas que nos impedem de nos tornarmos artistas, as amarras que nos prendem, e aquilo que podemos fazer para as quebrar.
Uma frase vai ficar marcada para mim depois de ver esta palestra “The moment kids start to lie is the moment storytelling begins.”. Se nada mais fosse dito de relevo, esta frase teria sido suficiente para justificar o tempo que investi a ver a comunicação. É algo pelo qual já passei em casa, e já me interroguei, não neste sentido, mas nas razões do seu surgimento. Esta explicação apresentada por Kim Young-ha diz muito, se não tudo, sobre aquilo que somos e porque a arte é tão importante, mesmo quando sabemos, e como ele defende no final, respondendo à questão, “Para que serve a arte?”, “But art is not for anything. Art is the ultimate goal. It saves our souls and makes us live happily. It helps us express ourselves…". Isto porque criar arte é acima de tudo um acto que nos permite depurar aquilo que somos, porque o fazemos pela espontaneidade do nosso devir, emergindo do largar das amarras do dever, envolvido por actos de puro brincar. Como diz Young-ha, "just for the fun of it. Sorry for having fun without you”.
Uma frase vai ficar marcada para mim depois de ver esta palestra “The moment kids start to lie is the moment storytelling begins.”. Se nada mais fosse dito de relevo, esta frase teria sido suficiente para justificar o tempo que investi a ver a comunicação. É algo pelo qual já passei em casa, e já me interroguei, não neste sentido, mas nas razões do seu surgimento. Esta explicação apresentada por Kim Young-ha diz muito, se não tudo, sobre aquilo que somos e porque a arte é tão importante, mesmo quando sabemos, e como ele defende no final, respondendo à questão, “Para que serve a arte?”, “But art is not for anything. Art is the ultimate goal. It saves our souls and makes us live happily. It helps us express ourselves…". Isto porque criar arte é acima de tudo um acto que nos permite depurar aquilo que somos, porque o fazemos pela espontaneidade do nosso devir, emergindo do largar das amarras do dever, envolvido por actos de puro brincar. Como diz Young-ha, "just for the fun of it. Sorry for having fun without you”.
julho 05, 2014
Asghar Farhadi e os dilemas
Asghar Farhadi iniciou-se nas longa-metragens em 2003 e desde então realizou seis filmes. Hoje acabei de ver a sua filmografia, e se a procurei ver foi porque considero Asghar Farhadi o mais relevante realizador da atualidade. Farhadi não é apenas realizador das suas obras, é também o escritor destas, ainda que por vezes em parceria. Tal como com outros grandes realizadores, o facto de se escrever o texto de suporte à obra audiovisual faz diferença, no momento em que se procura dizer algo, em que se procura dar forma audiovisual a um sentir, a expressividade ganha com a fusão entre a mensagem e a forma. Farhadi fez a sua licenciatura e mestrado em cinema na Escola de Artes Dramáticas da Universidade de Teerão, Irão.
Em 2003 realizou a sua primeira longa-metragem, “Raghs dar ghobar” (Dancing in the Dust), que tive o prazer de visionar na semana passada. É um primeiro filme, nota-se que existe ali algo pronto a emergir, mas isso nunca chega verdadeiramente a acontecer na tela. É uma obra inicial em que Farhadi está claramente mais preocupado em ser capaz de dar conta da história em termos audiovisuais, do que propriamente em inovar ou aprofundar o meio. Apesar de tudo, o filme indicia desde logo os temas de fundo que movem a escrita de Farhadi, o amor e as divisões sociais, os sacrifícios que este impõe e o modo como a cultura islâmica o aprisiona.
O cerne do trabalho de Farhadi está centrado sobre a moral, essencialmente sobre os seus dilemas, capazes de levar os seus personagens ao extremo de si próprios, colocando-os à prova e obrigando-os a reagir. Neste sentido Asghar Farhadi aproxima-se bastante de Krzysztof Kieslowski, sendo que aquilo que os diferencia é apenas a camisa moral que vestem, uma de fundo cristã, a outra de fundo islâmica.
Se em 2003 Farhadi procurava apenas pôr-se à prova enquanto realizador, em 2004 a sua segunda longa-metragem, “Shah-re Ziba” (Beautiful City), surge já com toda a força da sua veia narrativa e exposição audiovisual. “Shah-re Ziba” põe em cena personagens que começam por parecer tão simples, discretos e fáceis de compreender, mas à medida que progridem com a narrativa vão-se densificando, enfrentando questões que parecem abrir-se para outras ainda mais complexas. Os personagens vão-se abrindo, como camadas de uma cebola em direcção centro, sentimos com o evoluir da história que estamos cada vez mais próximos dos seus âmagos, até que deixam de ser meros personagens e passam a ser pessoas de carne e osso na nossa frente, com as quais não conseguimos deixar de empatizar.
Isto acaba resumindo o modo de trabalho de Farhadi que se propaga através de todas as suas obras seguintes, "Fireworks Wednesday" (2006), "About Elly" (2009), "A Separation" (2011) e "Le Passé" (2013). Sobre este último e como já tinha dito antes, acredito que o facto de ter sido a primeira experiência de Farhadi fora do Irão, não tenha resultado tão instigante. Aliás basta ler as suas entrevistas para compreender o quanto do que está nos seus filmes está ligado à cultura do local que habita. Em certa medida, nota-se, tal como se notou na sua primeira longa “Raghs dar ghobar”, alguma preocupação maior em fazer bem e perfeito, e com isso acaba-se perdendo alguma arte e mestria. Mas estas duas obras denotam ainda mais toda a sua qualidade enquanto artista, como alguém que precisa primeiro de respirar o mundo que quer verbalizar, de o sentir na sua essência para então dar conta dele em imagens, sons e textos. Farhadi está assim bem distante do mero realizador de serviço, do técnico que marcha em função do predeterminado.
Julgo que aquilo que esta sua forma de trabalhar - viver, escrever e realizar - permite-lhe chegar a níveis que dificilmente se poderiam atingir de outra forma. O que podemos sentir nas suas obras é algo extremamente impregnado no todo, numa narrativa sempre densa com personagens sempre bastante complexos, tudo envolvido por uma realização muito próxima das questões, preocupada em transmitir os dilemas, secundarizando totalmente o acessório, encaminhando o espectador para o interior das suas personagens. Farhadi cria em cada uma das suas obras, momentos de profunda análise do que é ser-se humano, do que é viver-se com o outro, depender-se do outro, formar um todo com o outro.
Cada um dos seus filmes tem sido bastante fértil em prémios nos vários festivais internacionais de topo - Cannes, Veneza, Berlin - incluindo o primeiro oscar para o Irão em 2011. Fico agora ansiosamente a aguardar pelo seu próximo trabalho.
Asghar Farhadi (1972)
Em 2003 realizou a sua primeira longa-metragem, “Raghs dar ghobar” (Dancing in the Dust), que tive o prazer de visionar na semana passada. É um primeiro filme, nota-se que existe ali algo pronto a emergir, mas isso nunca chega verdadeiramente a acontecer na tela. É uma obra inicial em que Farhadi está claramente mais preocupado em ser capaz de dar conta da história em termos audiovisuais, do que propriamente em inovar ou aprofundar o meio. Apesar de tudo, o filme indicia desde logo os temas de fundo que movem a escrita de Farhadi, o amor e as divisões sociais, os sacrifícios que este impõe e o modo como a cultura islâmica o aprisiona.
“Raghs dar ghobar” (Dancing in the Dust) (2003)
O cerne do trabalho de Farhadi está centrado sobre a moral, essencialmente sobre os seus dilemas, capazes de levar os seus personagens ao extremo de si próprios, colocando-os à prova e obrigando-os a reagir. Neste sentido Asghar Farhadi aproxima-se bastante de Krzysztof Kieslowski, sendo que aquilo que os diferencia é apenas a camisa moral que vestem, uma de fundo cristã, a outra de fundo islâmica.
"Shah-re Ziba" (Beautiful City) (2004)
Se em 2003 Farhadi procurava apenas pôr-se à prova enquanto realizador, em 2004 a sua segunda longa-metragem, “Shah-re Ziba” (Beautiful City), surge já com toda a força da sua veia narrativa e exposição audiovisual. “Shah-re Ziba” põe em cena personagens que começam por parecer tão simples, discretos e fáceis de compreender, mas à medida que progridem com a narrativa vão-se densificando, enfrentando questões que parecem abrir-se para outras ainda mais complexas. Os personagens vão-se abrindo, como camadas de uma cebola em direcção centro, sentimos com o evoluir da história que estamos cada vez mais próximos dos seus âmagos, até que deixam de ser meros personagens e passam a ser pessoas de carne e osso na nossa frente, com as quais não conseguimos deixar de empatizar.
Isto acaba resumindo o modo de trabalho de Farhadi que se propaga através de todas as suas obras seguintes, "Fireworks Wednesday" (2006), "About Elly" (2009), "A Separation" (2011) e "Le Passé" (2013). Sobre este último e como já tinha dito antes, acredito que o facto de ter sido a primeira experiência de Farhadi fora do Irão, não tenha resultado tão instigante. Aliás basta ler as suas entrevistas para compreender o quanto do que está nos seus filmes está ligado à cultura do local que habita. Em certa medida, nota-se, tal como se notou na sua primeira longa “Raghs dar ghobar”, alguma preocupação maior em fazer bem e perfeito, e com isso acaba-se perdendo alguma arte e mestria. Mas estas duas obras denotam ainda mais toda a sua qualidade enquanto artista, como alguém que precisa primeiro de respirar o mundo que quer verbalizar, de o sentir na sua essência para então dar conta dele em imagens, sons e textos. Farhadi está assim bem distante do mero realizador de serviço, do técnico que marcha em função do predeterminado.
Julgo que aquilo que esta sua forma de trabalhar - viver, escrever e realizar - permite-lhe chegar a níveis que dificilmente se poderiam atingir de outra forma. O que podemos sentir nas suas obras é algo extremamente impregnado no todo, numa narrativa sempre densa com personagens sempre bastante complexos, tudo envolvido por uma realização muito próxima das questões, preocupada em transmitir os dilemas, secundarizando totalmente o acessório, encaminhando o espectador para o interior das suas personagens. Farhadi cria em cada uma das suas obras, momentos de profunda análise do que é ser-se humano, do que é viver-se com o outro, depender-se do outro, formar um todo com o outro.
Cada um dos seus filmes tem sido bastante fértil em prémios nos vários festivais internacionais de topo - Cannes, Veneza, Berlin - incluindo o primeiro oscar para o Irão em 2011. Fico agora ansiosamente a aguardar pelo seu próximo trabalho.
julho 04, 2014
Filmes e jogos de Junho 2014
Em junho tive oportunidade ver mais uma obra-prima do cinema francês, assim como assistir ao derradeiro trabalho de Miyazaki, tendo conseguido ainda ver o primeiro filme realizado por Farhadi que não me surpreendeu, embora para primeiro filme funcione bastante bem. Algo que não foi desilusão, mas antes surpresa, dado o excesso de violência foi "300 Rise of an Empire", para quem como eu se tem sentido chocado com a ultraviolência nos videojogos, "300..." vai muito além do que se tem visto por aí, e no entanto a classificação em vários países situa-se nos 16 anos.
xxxxx Blue Is the Warmest Color 2013 Abdellatif Kechiche France [Análise]
xxxx The Wind Rises 2013 Hayao Miyazaki Japan
xxxx Enemy 2013 Denis Villeneuve USA
xxxx The Quatermass Xperiment 1955 Val Guest UK
xxx Non-Stop 2014 Jaume Collet-Serra USA
xxx Layer Cake 2004 Matthew Vaughn UK
xxx Dancing in the Dust 2002 Asghar Farhadi Iran
xx 300 Rise of an Empire 2014 Noam Murro USA
xx The Monuments Men 2014 George Clooney USA
No mundo dos videojogos não consegui tempo para ir além de terminar a trilogia de Mass Effect. Tenho vários jogos abertos, mas não tenho conseguido sentar-me e dedicar-lhes tempo.
xxxx Mass Effect 3 2012 BioWare Action USA [análise brevemente]
xxxxx Blue Is the Warmest Color 2013 Abdellatif Kechiche France [Análise]
xxxx The Wind Rises 2013 Hayao Miyazaki Japan
xxxx Enemy 2013 Denis Villeneuve USA
xxxx The Quatermass Xperiment 1955 Val Guest UK
xxx Non-Stop 2014 Jaume Collet-Serra USA
xxx Layer Cake 2004 Matthew Vaughn UK
xxx Dancing in the Dust 2002 Asghar Farhadi Iran
xx 300 Rise of an Empire 2014 Noam Murro USA
xx The Monuments Men 2014 George Clooney USA
No mundo dos videojogos não consegui tempo para ir além de terminar a trilogia de Mass Effect. Tenho vários jogos abertos, mas não tenho conseguido sentar-me e dedicar-lhes tempo.
xxxx Mass Effect 3 2012 BioWare Action USA [análise brevemente]
julho 03, 2014
Problemas do marketing digital
Hoffman é autor de "101 Contrarian Ideas About Advertising" (2011) e do blog Ad Contrarian, é ainda CEO da agência americana Hoffman/Lewis, tendo desenvolvido campanhas para a McDonald's, Toyota, Shell, Nestle, etc. Com formação de base em ciências e sendo assistente especial da California Academy of Sciences, parte do seu discurso move-se no sentido da obtenção de fundamento e evidência científica. E é por isso que esta palestra dada em Março na Advertising Week Europe 2014, intitulada, “The Golden Age of Bullshit” é extremamente interessante.
Bob Hoffman procura ao longo de uma hora de palestra desmontar alguns mitos do mundo da publicidade e do marketing digital, com base num estudo comparado entre aquilo que os Marketeers e Publicitários foram dizendo ao longo dos anos e aquilo que verdadeiramente foi acontecendo no mundo real. Um dos maiores criadores desses mitos tem sido Seth Godin, um dos grandes gurus dos novos paradigmas de marketing, e em quem eu tenho vindo a confiar cada vez menos, nomeadamente desde que resolveu começar a aplicar as suas ideias sobre marketing, como grande martelo para tudo, como é o caso do livro autopublicado “Stop Stealing Dreams: What is School For?”. Esta crença nos gurus não acontece por acaso, mas porque como diz Hoffman no final da palestra, e citando Daniel Kahneman, "People don't believe in facts, they believe in experts."
Assim algo concreto de que tenho desconfiado no marketing contemporâneo, é o hype em redor do storytelling e dos videojogos. Ideias que têm sido vendidas como uma necessidade para criar relações com os consumidores. Ora, se é verdade que estas duas formas de construir experiências trabalham sob o desígnio do engajamento e envolvimento, ligando as pessoas às obras, não é claro que isso seja facilmente trespassável para o mundo do marketing ou branding. Mais, se tem sido imensamente difícil passar estas abordagens para o mundo da educação, porque é que haveria de ser tudo fácil no mundo do consumo? Deste modo Hoffman abre a palestra dizendo, o seguinte,
Isto não quer dizer que o marketing não está a mudar, que o digital não lhe serve. Serve sim, mas serve essencialmente para compreender melhor para quem se fala, e como se deve falar. O Facebook é muito útil para conseguirem compreender melhor o que move as pessoas, e conseguirem assim criar e desenhar para as suas verdadeiras necessidades. Mas não esperem que porque têm um discurso mais próximo, até mais humano, as pessoas desatem a envolver-se com as marcas, ou como diz o Hoffman, “amem as marcas”, isso não vai acontecer.
Bob Hoffman
Bob Hoffman procura ao longo de uma hora de palestra desmontar alguns mitos do mundo da publicidade e do marketing digital, com base num estudo comparado entre aquilo que os Marketeers e Publicitários foram dizendo ao longo dos anos e aquilo que verdadeiramente foi acontecendo no mundo real. Um dos maiores criadores desses mitos tem sido Seth Godin, um dos grandes gurus dos novos paradigmas de marketing, e em quem eu tenho vindo a confiar cada vez menos, nomeadamente desde que resolveu começar a aplicar as suas ideias sobre marketing, como grande martelo para tudo, como é o caso do livro autopublicado “Stop Stealing Dreams: What is School For?”. Esta crença nos gurus não acontece por acaso, mas porque como diz Hoffman no final da palestra, e citando Daniel Kahneman, "People don't believe in facts, they believe in experts."
Assim algo concreto de que tenho desconfiado no marketing contemporâneo, é o hype em redor do storytelling e dos videojogos. Ideias que têm sido vendidas como uma necessidade para criar relações com os consumidores. Ora, se é verdade que estas duas formas de construir experiências trabalham sob o desígnio do engajamento e envolvimento, ligando as pessoas às obras, não é claro que isso seja facilmente trespassável para o mundo do marketing ou branding. Mais, se tem sido imensamente difícil passar estas abordagens para o mundo da educação, porque é que haveria de ser tudo fácil no mundo do consumo? Deste modo Hoffman abre a palestra dizendo, o seguinte,
“We’re so drunk on this stuff that we’re starting to believe our own bullshit.Esta é a dura realidade que o marketing digital ainda não quis encarar de frente. Ninguém online fala das marcas, nem sequer está importado com as páginas das marcas, a não ser quando elas fazem asneira, tendo assim uma espécie de canal directo para lançar algum fel. As pessoas procuram outros seres humanos, não procuram objectos, artefactos, e menos ainda marcas. Quem tem página online de uma empresa, associação ou blog de certeza que já percebeu a diferença entre publicar algo no facebook sob o nome da página ou sob nome individual. As pessoas clicam mais quando a partilha é feita por uma pessoa, do que por uma marca, uma identidade abstracta desprovida de sentir. As pessoas querem a garantia que do outro lado está alguém capaz de interpretar aquele clique, aquele like. Clicar num like não é uma mera acção abstracta, é um acto de comunicação, é um acto de aceitação do outro.
There are people in our business who believe that consumers are in love with brands! They believe consumers want to have relationships with brands. They want to have brand experiences and be personally engaged with brands. This people actually believe in this. You go to their Twitter profiles,
- “I’m passionate about brands”
- “You’re what? Dude get a fucking girlfriend”
There are people in our business who believe that consumers are going on Facebook and Twitter and having conversations with each other about brands. All you have to do is going to your Facebook page, and if you can read, you can see that people are having conversations about everything in the universe, except brands.
And yet the bullshit we tell ourselves is apparently so powerful that it supersedes the evidence of our own eyes.”
Bob Hoffman, "The Golden Age of Bullshit" na Advertising Week Europe 2014
Isto não quer dizer que o marketing não está a mudar, que o digital não lhe serve. Serve sim, mas serve essencialmente para compreender melhor para quem se fala, e como se deve falar. O Facebook é muito útil para conseguirem compreender melhor o que move as pessoas, e conseguirem assim criar e desenhar para as suas verdadeiras necessidades. Mas não esperem que porque têm um discurso mais próximo, até mais humano, as pessoas desatem a envolver-se com as marcas, ou como diz o Hoffman, “amem as marcas”, isso não vai acontecer.
Plágio Castello
Esta semana estalou a polémica em redor de uma campanha da Agua Castello, tendo na altura escrito sobre o assunto no facebook, aproveito apenas para colocar o texto aqui sem alterações, como forma de registo. O artigo do Dinheiro Vivo saiu no dia 30 Junho, por volta do meio-dia, eu publiquei o meu texto no facebook com o título "Não é Strat. É Charles Burns" por volta das 14h00, no final desse mesmo dia, por volta das 19h00, a Água Castello retirava a campanha. Apesar disso a Fantagraphics tinha exposto a campanha três dias antes, a 27 de Junho.
A Água Castello portuguesa foi exposta internacionalmente à vergonha do plágio. A culpa não é sua, mas da agência que contratou para criar a nova campanha baseada em quadros de banda desenhada. Quem acusa é a Fantagraphics editora do trabalho de Charles Burns, autor dos alegados desenhos originais.
Inicialmente tive dúvidas, mesmo depois de ver algumas imagens da editora, principalmente porque não gosto de embandeirar com ataques de plágio no mundo das artes visuais já que tenho visto demasiado trabalho ser atacado injustamente. Mas vista a composição de desmontagem visual realizada pela Fantagraphics (imagem acima) as minhas dúvidas desvaneceram-se por completo (a cara do topo da garrafa é composta a partir da parte inferior da cara de um desenho, e da parte superior da cara de outro desenho). Estamos perante um trabalho de remix muito bem feito, o que para mim não teria nenhum problema caso fosse para ser usado sem fins lucrativos. Mas a ser usado deste modo, é mau, é muito mau.
Da análise do trabalho da Strat, a agência que criou a campanha, verifico que são muito bons em manipulação de fotografia. Ora é isso que temos nas garrafas da Castello, quadros de desenhos de Charles Burns manipulados (redimensionar ou rodar imagens, adicionar traços ou pontos, sobreposição de diferentes imagens para formar outras, etc.). Por isso vir dizer que meramente se “serviram de referências” é altamente abusivo, pois não estão cá referências, mas antes o trabalho em concreto de outro autor.
Sei bem porque a Strat diz isto, porque à partida não existe cobertura legal para que a Strat possa ser processada, uma vez que a manipulação deste tipo é muito usada exactamente para fugir aos direitos de autor. Ou seja em vez de pagar os direitos, alteram-se os trabalhos originais para ficarem ligeiramente diferentes, e assim passarem no crivo.
Mas se isto pode ser “aceitável” na faculdade ou em trabalhos sem componente comercial, desde que citadas as fontes, não é, nem pode ser, tolerado a uma empresa que quer trabalhar a este nível. Porque o que vemos aqui é simplesmente o cortar de custos. Não se contrata um ilustrador, nem se quer pagar quem desenhou o que se encontra online, mas pretende-se receber por um trabalho não realizado.
A Água Castello deve mandar retirar a campanha sem demoras, realizar um pedido de desculpas a Charles Burns, e pedir a total devolução da verba paga à Strat.
Fica a mensagem da Água Castello, deixada no Facebook, e que não me satisfaz, no sentido em que não realiza um claro pedido de desculpas ao autor e de certa forma quase protege a agência responsável pela campanha:
A Água Castello portuguesa foi exposta internacionalmente à vergonha do plágio. A culpa não é sua, mas da agência que contratou para criar a nova campanha baseada em quadros de banda desenhada. Quem acusa é a Fantagraphics editora do trabalho de Charles Burns, autor dos alegados desenhos originais.
Inicialmente tive dúvidas, mesmo depois de ver algumas imagens da editora, principalmente porque não gosto de embandeirar com ataques de plágio no mundo das artes visuais já que tenho visto demasiado trabalho ser atacado injustamente. Mas vista a composição de desmontagem visual realizada pela Fantagraphics (imagem acima) as minhas dúvidas desvaneceram-se por completo (a cara do topo da garrafa é composta a partir da parte inferior da cara de um desenho, e da parte superior da cara de outro desenho). Estamos perante um trabalho de remix muito bem feito, o que para mim não teria nenhum problema caso fosse para ser usado sem fins lucrativos. Mas a ser usado deste modo, é mau, é muito mau.
Da análise do trabalho da Strat, a agência que criou a campanha, verifico que são muito bons em manipulação de fotografia. Ora é isso que temos nas garrafas da Castello, quadros de desenhos de Charles Burns manipulados (redimensionar ou rodar imagens, adicionar traços ou pontos, sobreposição de diferentes imagens para formar outras, etc.). Por isso vir dizer que meramente se “serviram de referências” é altamente abusivo, pois não estão cá referências, mas antes o trabalho em concreto de outro autor.
Sei bem porque a Strat diz isto, porque à partida não existe cobertura legal para que a Strat possa ser processada, uma vez que a manipulação deste tipo é muito usada exactamente para fugir aos direitos de autor. Ou seja em vez de pagar os direitos, alteram-se os trabalhos originais para ficarem ligeiramente diferentes, e assim passarem no crivo.
Mas se isto pode ser “aceitável” na faculdade ou em trabalhos sem componente comercial, desde que citadas as fontes, não é, nem pode ser, tolerado a uma empresa que quer trabalhar a este nível. Porque o que vemos aqui é simplesmente o cortar de custos. Não se contrata um ilustrador, nem se quer pagar quem desenhou o que se encontra online, mas pretende-se receber por um trabalho não realizado.
A Água Castello deve mandar retirar a campanha sem demoras, realizar um pedido de desculpas a Charles Burns, e pedir a total devolução da verba paga à Strat.
Fica a mensagem da Água Castello, deixada no Facebook, e que não me satisfaz, no sentido em que não realiza um claro pedido de desculpas ao autor e de certa forma quase protege a agência responsável pela campanha:
Declaração: A Água Castello enquanto marca portuguesa sempre se guiou por valores de responsabilidade, qualidade e transparência o que lhe grangeou a admiração e o respeito dos seus inúmeros consumidores.
A Água Castello quer acreditar que a Agência de Publicidade que desenvolveu a campanha “Não é Água. É Castello” se pautou pelos mesmos princípios como tem reiterado.
No entanto, para que nenhuma dúvida subsista e como prova de boa fé, a Água Castello vai dar por terminada esta campanha. A Água Castello quer continuar a merecer o respeito dos seus consumidores, dos criadores e de todos os que amam a verdade.
Água Castello
julho 01, 2014
Corrida contra a automação da informação
Erik Brynjolfsson e Andrew McAfee são dois académicos de economia do MIT que procuram perceber os impactos e efeitos das tecnologias de informação sobre o trabalho e a produtividade. “The Second Machine Age: Work, Progress, and Prosperity in a Time of Brilliant Technologies” (2014) é o resultado de vários anos de investigação, e uma espécie de edição definitiva do livro que ambos auto-publicaram em 2011, “Race Against The Machine”.
O cerne da teorização apresentada assenta sobre a ideia de que a Primeira Era das Máquinas (revolução industrial) tratou da automação do trabalho manual, enquanto a Segunda Era das Máquinas trata da automação do trabalho com informação. Esta segunda era é motivada pela quantidade de informação acessível em tempo-real e os algoritmos de tratamento da mesma, sendo um dos grandes exemplos apontado pelos autores, o carro sem condutor da Google, algo que foi apenas possível graças ao manuseamento de massas de dados existentes combinados de forma contínua com a captura em tempo real de dados no carro.
A primeira parte do livro centra-se sobre as alterações na paisagem tecnológica, sustentando-as com exemplos e demonstrações do que está acontecer no mundo em que nos movemos. Os autores trabalham sobre a exponenciação da capacidade tecnológica baseando-se no princípio de Moore, trabalham questões sobre a digitalização de cultura, sobre a inovação e os efeitos benéficos destas alterações. Nesta fase do livro o discurso é bastante optimista, o futuro será melhor e mais fácil graças ao desenvolvimento tecnológico, e essencialmente ao avanço das tecnologias de informação e de aprendizagem por parte das máquinas. É aqui que se introduz um dos conceitos chave do livro, BOUNTY (recompensa), que dá conta dos ganhos que a sociedade viveu nas últimas décadas graças ao avanço da computação. O facto de podermos aceder a cada vez mais e melhor tecnologia, e consequente conforto, pagando cada vez menos para tal, assim como o facto de termos cada vez mais tempo livre que nos permite gerar toda uma nova economia social.
No entanto o livro não se fica pelos ganhos, nem pelo avanço tecnológico, os autores especialistas em economia, passam a segunda metade do livro a trabalhar o assunto do ponto de vista das pessoas, dos seres humanos que se relacionam com a tecnologia, e os impactos que esta teve e terá sobre as suas vidas. Nesta segunda parte é introduzida o segundo conceito chave do livro SPREAD (distanciamento) que dá conta do aumento do fosso entre aqueles que conseguem aproveitar o que as tecnologias oferecem, e aqueles que por várias razões não as conseguem dominar, ou sequer aceder. Os impactos estão à vista com a mais recente crise de 2008 como se pode ver na obra “Capital” (2014) de Thomas Piketty, que se estende num conglomerado de problemáticas, algumas bem evidenciadas por Lanier em ”Who Owns the Future?” (2013). Como é dito a certa altura,
. Trabalhar com as máquinas, não contra elas
. As áreas em que ainda fazemos a diferença
. A escola no meio de tudo isto
Para que estas competências se desenvolvam precisamos de uma escola diferente, capaz de estimular a autonomia, a automotivação e o envolvimento. Mas tudo isto não pode ser desligado de uma profunda capacidade de análise crítica da realidade, algo que tem vindo a ser descurado, essencialmente no ensino superior, fase em que esta competência deveria ser profundamente estimulada.
Deste modo Erik Brynjolfsson e Andrew McAfee acabam por concluir que apesar das máquinas estarem a automatizar e a tornar tudo mais fácil em nosso redor, nem por isso o mundo à nossa volta será mais fácil para a grande classe média. Conseguir emprego será cada vez mais difícil, e para se precaver só existe um caminho,
Por fim quero apenas deixar um ponto abordado a determinada altura no livro, e que tem que ver com a investigação que realizamos nos nossos laboratórios todos os dias. Nós que trabalhamos com tecnologias de informação e comunicação estamos constantemente preocupados em desenvolver novos sistemas que automatizem as atividades humanas. O que os autores dizem é, e se não fosse assim? E se em vez de procurarmos automatizar as tarefas, procurássemos antes novas formas de criar actividades, de tornar as pessoas, os seres humanos, mais ativos, mais criativos? (Isto é em parte algo que tenho vindo a trabalhar mais recentemente sob a designação de Tecnologias Criativas). No final, nenhum de nós procura verdadeiramente parar de trabalhar, o trabalho é essencial ao ser-humano por estranho que possa parecer! Esse é um ponto aqui defendido, e com o qual concordo particularmente,
“The Second Machine Age" é um livro carregado de ideias, questões, dúvidas, hipóteses e imensa reflexão sobre algo que nos preocupa a todos. De tudo isso dei aqui conta apenas de uma brevíssima síntese sobre algumas dessas ideias, o resto fica para lerem no próprio livro. Entretanto se quiserem saber mais, vale a pena ver as duas TED talks dos autores.
O cerne da teorização apresentada assenta sobre a ideia de que a Primeira Era das Máquinas (revolução industrial) tratou da automação do trabalho manual, enquanto a Segunda Era das Máquinas trata da automação do trabalho com informação. Esta segunda era é motivada pela quantidade de informação acessível em tempo-real e os algoritmos de tratamento da mesma, sendo um dos grandes exemplos apontado pelos autores, o carro sem condutor da Google, algo que foi apenas possível graças ao manuseamento de massas de dados existentes combinados de forma contínua com a captura em tempo real de dados no carro.
Lexus da Google sem condutor
A primeira parte do livro centra-se sobre as alterações na paisagem tecnológica, sustentando-as com exemplos e demonstrações do que está acontecer no mundo em que nos movemos. Os autores trabalham sobre a exponenciação da capacidade tecnológica baseando-se no princípio de Moore, trabalham questões sobre a digitalização de cultura, sobre a inovação e os efeitos benéficos destas alterações. Nesta fase do livro o discurso é bastante optimista, o futuro será melhor e mais fácil graças ao desenvolvimento tecnológico, e essencialmente ao avanço das tecnologias de informação e de aprendizagem por parte das máquinas. É aqui que se introduz um dos conceitos chave do livro, BOUNTY (recompensa), que dá conta dos ganhos que a sociedade viveu nas últimas décadas graças ao avanço da computação. O facto de podermos aceder a cada vez mais e melhor tecnologia, e consequente conforto, pagando cada vez menos para tal, assim como o facto de termos cada vez mais tempo livre que nos permite gerar toda uma nova economia social.
No entanto o livro não se fica pelos ganhos, nem pelo avanço tecnológico, os autores especialistas em economia, passam a segunda metade do livro a trabalhar o assunto do ponto de vista das pessoas, dos seres humanos que se relacionam com a tecnologia, e os impactos que esta teve e terá sobre as suas vidas. Nesta segunda parte é introduzida o segundo conceito chave do livro SPREAD (distanciamento) que dá conta do aumento do fosso entre aqueles que conseguem aproveitar o que as tecnologias oferecem, e aqueles que por várias razões não as conseguem dominar, ou sequer aceder. Os impactos estão à vista com a mais recente crise de 2008 como se pode ver na obra “Capital” (2014) de Thomas Piketty, que se estende num conglomerado de problemáticas, algumas bem evidenciadas por Lanier em ”Who Owns the Future?” (2013). Como é dito a certa altura,
“Eventually, the economy will find a new equilibrium and full employment will be restored as entrepreneurs invent new businesses and the workforce adapts its human capital.Neste sentido o livro fecha as duas partes - Bounty e Spread - apresentando um conjunto de soluções para se atuar primeiro a um nível individual, e em seguida a um nível político. Deste modo podemos dizer que estamos perante um trabalho bastante abrangente, que procura identificar o bom e o mau da revolução de informação que vivemos no momento, refletindo e apresentando soluções plausíveis e exequíveis. É sobre essa parte que me irei deter um pouco mais aqui, não que o resto do livro não seja muito interessante também, mas porque é aquilo que me parece mais relevante discutir. Julgo que depende de todos nós, e cada um pode à sua maneira, e no limite das suas possibilidades procurar a mudança. Assim deixo alguns dos pontos que me parecem mais relevantes.
But what if this process takes a decade? And what if, by then, technology has changed again? This is the possibility that Wassily Leontief had in mind his 1983 article when he speculated that many workers could end up permanently unemployed, like horses unable to adjust to the invention of the tractors. Once one concedes that it takes time for workers and organizations to adjust to technical change, then it becomes apparent that accelerating technical change can lead to widening gaps and increasing possibilities for technological unemployment. Faster technological progress may ultimately bring greater wealth and longer lifespans, but it also requires faster adjustments by both people and institutions.”
. Trabalhar com as máquinas, não contra elas
“The teams of human plus machine dominated even the strongest computers. The chess machine Hydra, which is a chess-specific supercomputer like Deep Blue, was “no match for a strong human player using a relatively weak laptop. Human strategic guidance combined with the tactical acuity of a computer was overwhelming.The surprise came at the conclusion of the event. The winner was revealed to be not a grandmaster with a state-of-the-art PC but a pair of amateur American chess players using three computers at the same time. Their skill at manipulating and “coaching” their computers to look very deeply into positions effectively counteracted the superior chess understanding of their grandmaster opponents and the greater computational power of other participants. Weak human + machine + better process was superior to a strong computer alone and, more remarkably, superior to a strong human + machine + inferior process.” Kasparov citado no livro
. As áreas em que ainda fazemos a diferença
“Picasso’s quote [“But they (computers) are useless. They can only give you answers.”] is just about half right… Computers are not useless, but they’re still machines for generating answers, not posing interesting new questions. That ability still seems to be uniquely human, and still highly valuable. We predict that people who are good at idea creation will continue to have a comparative advantage over digital labor for some time to come, and will find themselves in demand.”Os três conceitos chave em termos de competências humanas para o futuro serão - a ideação (ter ideias), a criatividade (fazer diferente) e a inovação (criar novo). As três abordagens estão ligadas ao pensamento “fora-da-caixa”, algo que os computadores apresentam muita dificuldade em fazer, uma vez que estão limitados ao framework que lhes é dado. Ou seja, os computadores são excelentes a reconhecer padrões, mas muito maus a irem além destes. Uma das razões pelas quais somos bons nisto, tem que ver com o facto de combinarmos os vários sentidos para absorver e analisar a realidade, o que acaba reflectindo-se na forma como depois nos expressamos face à realidade.
“The Spanish clothing company Zara exploits this advantage and uses humans instead of computers to decide which clothes to make. For most apparel retailers, forecasting and sales planning are largely statistical affairs… Zara takes a different approach… To answer the critical question “Which clothes should we make and ship to each store?” Zara relies on its store managers around the world to order exactly, and only, the merchandise that will sell in that location over the next few days. Managers figure this out not by consulting algorithms but instead by walking around the store, observing what shoppers (particularly cool ones) are wearing, talking to them about what they like and what they’re looking for, and generally doing many things at which people excel. Zara store managers do a lot of visual pattern recognition, engage in complex communication with customers, and use all of this information for two purposes: to order existing clothes using a broad frame of inputs, and to engage in ideation by telling headquarters what kinds of new clothes would be popular in their location.”Outra razão em que eu tenho vindo a reflectir bastante nos últimos anos, tem que ver com o facto de como seres humanos errarmos, estarmos autorizados a errar, porque faz parte de nós. Enquanto a máquina não pode errar. Ora acredito que se a máquina não pode errar, não pode sair do caminho predeterminado, então muito dificilmente alguma vez poderá ser verdadeiramente criativa.
. A escola no meio de tudo isto
Para que estas competências se desenvolvam precisamos de uma escola diferente, capaz de estimular a autonomia, a automotivação e o envolvimento. Mas tudo isto não pode ser desligado de uma profunda capacidade de análise crítica da realidade, algo que tem vindo a ser descurado, essencialmente no ensino superior, fase em que esta competência deveria ser profundamente estimulada.
“Arum and Roksa made use of the Collegiate Learning Assessment (CLA), a recently developed test given to college students to assess their abilities in critical thinking, written communication, problem solving, and analytic reasoning. Although the CLA is administered via computer, it requires essays instead of multiple-choice answers. One of its main components is the ‘performance task,’ which presents students with a set of background documents and gives them ninety minutes to write an essay requiring them to extract information from the materials given and develop a point of view or recommendation. In short, the performance task is a good test of ideation, pattern recognition, and complex communication.No fundo não chega querer, menos ainda chega entrar na universidade pretendida, ou no curso pretendido, é preciso trabalhar, e muito, para construir as competências. A universidade e o professor são apenas a ponta do iceberg, os resultados só aparecem com o trabalho em profundidade individual do estudante. Não é por acaso que Bolonha impôs metas para o trabalho individual a realizar pelo aluno fora de aulas. Estudos como, “How College Affects Students: A Third Decade of Research”, de Ernest Pascarella e Patrick Terenzini concluíram que “the impact of college is largely determined by individual effort and involvement in the academic, interpersonal, and extracurricular offerings on a campus”.
Arum, Roksa, and their colleagues tracked more than 2,300 students enrolled full-time in four-year degree programs at a range of American colleges and universities. Their findings are alarming: 45 percent of students demonstrate no significant improvement on the CLA after two years of college, and 36 percent did not improve at all even after four years. The average improvement on the test after four years was quite small. What accounts for these disappointing results? ”
Arum, Roksa, and their colleagues document that college students today spend only 9 percent of their time studying (compared to 51 percent on “socializing, recreating, and other”), much less than in previous decades, and that only 42 percent reported having taken a class the previous semester that required them to read at least forty pages a week and write at least twenty pages total."
Deste modo Erik Brynjolfsson e Andrew McAfee acabam por concluir que apesar das máquinas estarem a automatizar e a tornar tudo mais fácil em nosso redor, nem por isso o mundo à nossa volta será mais fácil para a grande classe média. Conseguir emprego será cada vez mais difícil, e para se precaver só existe um caminho,
“our most fundamental recommendation to students and their parents: study hard, using technology and all other available resources to ‘fill up your toolkit’ and acquire skills and abilities that will be needed in the second machine age.”Esta é uma realidade que por mais que queiramos escamotear nos bate à porta em todas as estatísticas e recomendações, como bem dá conta o relatório publicado no mês passado pela Comissão Europeia sobre o emprego na Europa,
“Low qualified workers encounter increasing difficulties to find a job, face lower job stability and are out-competed by medium-skilled workers even in elementary occupations.”
Por fim quero apenas deixar um ponto abordado a determinada altura no livro, e que tem que ver com a investigação que realizamos nos nossos laboratórios todos os dias. Nós que trabalhamos com tecnologias de informação e comunicação estamos constantemente preocupados em desenvolver novos sistemas que automatizem as atividades humanas. O que os autores dizem é, e se não fosse assim? E se em vez de procurarmos automatizar as tarefas, procurássemos antes novas formas de criar actividades, de tornar as pessoas, os seres humanos, mais ativos, mais criativos? (Isto é em parte algo que tenho vindo a trabalhar mais recentemente sob a designação de Tecnologias Criativas). No final, nenhum de nós procura verdadeiramente parar de trabalhar, o trabalho é essencial ao ser-humano por estranho que possa parecer! Esse é um ponto aqui defendido, e com o qual concordo particularmente,
“It’s tremendously important for people to work not just because that’s how they get their money, but also because it’s one of the principal ways they get many other important things: self-worth, community, engagement, healthy values, structure, and dignity, to name just a few. Whether the focus is on the individual or the community, the conclusion is the same: work is beneficial.”
“The Second Machine Age" é um livro carregado de ideias, questões, dúvidas, hipóteses e imensa reflexão sobre algo que nos preocupa a todos. De tudo isso dei aqui conta apenas de uma brevíssima síntese sobre algumas dessas ideias, o resto fica para lerem no próprio livro. Entretanto se quiserem saber mais, vale a pena ver as duas TED talks dos autores.
junho 26, 2014
As escolhas que nos definem
A filósofa Ruth Chang realizou uma TED sobre “How to make hard choices” apresentando toda uma nova forma de nos posicionarmos face às escolhas difíceis. Todos nós já passámos por escolhas complexas, escolhas que tivemos de enfrentar - terminar ou manter uma relação; escolher um curso ou outro; escolher abrir uma empresa ou procurar um emprego - e para as quais não encontrámos respostas concretas. Quando chegados a um destes dilemas entramos em desespero porque ficamos ansiosos. É assim que funcionam as nossas emoções, quando não existe um efeito conhecido e concreto, a ansiedade toma conta de nós para nos obrigar a focar no problema e a resolvê-lo. O que Chang vem dizer é que podemos olhar para as escolhas difíceis como algo mais do que uma escolha entre o melhor e o pior.
Antes de avançar com a sua proposta Chang realiza um enquadramento sobre a racionalidade científica que domina o pensamento da sociedade atual na qual tudo precisa de ser quantificável, tudo precisa de ser medível, e tudo precisa de ser comparável com precisão. Nesse sentido, a racionalidade empurrou-nos para um precipício no qual conseguimos apenas racionalizar o mundo segundo três vectores: menor “<“; igual “=“; ou maior “>”.
Antes de avançar com a sua proposta Chang realiza um enquadramento sobre a racionalidade científica que domina o pensamento da sociedade atual na qual tudo precisa de ser quantificável, tudo precisa de ser medível, e tudo precisa de ser comparável com precisão. Nesse sentido, a racionalidade empurrou-nos para um precipício no qual conseguimos apenas racionalizar o mundo segundo três vectores: menor “<“; igual “=“; ou maior “>”.
"As post-Enlightenment creatures, we tend to assume that scientific thinking holds the key to everything of importance in our world, but the world of value is different from the world of science. The stuff of the one world can be quantified by real numbers. The stuff of the other world can't. We shouldn't assume that the world of is, of lengths and weights, has the same structure as the world of ought, of what we should do."Deste modo Chang propõe que se deixe de pensar as escolhas como tendo de existir uma melhor que a outra. A ideia é passar a refletir sobre estas como nenhuma delas sendo melhor ou pior, assumindo antes que estão a par. Ou seja, a escolha será importante mas nenhuma é melhor que a outra. Desta forma o que Chang nos propõe é que sejamos então nós a decidir o que queremos para nós. Estando as opções a par, cabe-nos a nós, e só a nós, criar razões para escolher uma das opções. Ao fazê-lo estamos a definir aquilo em que acreditamos, aquilo que queremos ser em vez daquilo que os outros querem que nós sejamos. Tomamos a vida nas nossas mãos e tornamo-nos autores dela.
“When we choose between options that are on a par, we can do something really rather remarkable. We can put our very selves behind an option. Here's where I stand. Here's who I am. I am for banking. I am for chocolate donuts. This response in hard choices is a rational response, but it's not dictated by reasons given to us. Rather, it's supported by reasons created by us. When we create reasons for ourselves to become this kind of person rather than that, we wholeheartedly become the people that we are. You might say that we become the authors of our own lives.
So when we face hard choices, we shouldn't beat our head against a wall trying to figure out which alternative is better. There is no best alternative. Instead of looking for reasons out there, we should be looking for reasons in here: Who am I to be?”
junho 24, 2014
Expressividades do papel
Nos últimos dois anos tenho colecionado links de trabalhos realizados com recurso a materiais em papel. Desde animações a videojogos, passando por simples ilustrações, vários têm sido os meios expressivos que têm recorrido ao papel para plastificar a sua forma. Na verdade quando comecei a coleccionar estes objectos tinha intenção de aprofundar as potenciais razões estéticas por detrás do uso desse meio, objectivo para o qual nunca consegui tempo. Por isso, e em virtude de ter hoje visto mais um desses belíssimos objectos, resolvi listar os mesmos num pequeno apontamento, e assim deixar fluir as ideias.
O papel é algo muito comum em nosso redor, mas é-o normalmente sob a forma de mero envelope, ou seja de suporte, de transporte de ideias que se socorrem de outras formas para se expressar seja o texto, o gráfico ou simplesmente a cor. E é em parte por isso que quando alguém usa o papel como elemento expressivo nos soa estranho, ou exótico. O papel está em todo o lado, mas raramente o vemos, menos ainda lhe damos importância. Quando ele serve directamente a expressão é um pouco como se de repente ganhasse vida, fosse além daquilo a que estava confinado.
Não é a primeira vez que aqui trato obras criadas sobre papel, exemplos como as animações "Train of Thought" (2010) ou "Much Better Now" (2011), os videojogos "And Yet it Moves" (2010) "Lume" (2011) são apenas alguns dos que me têm fascinado ao longo dos anos. Pelo meio tenho encontrado artistas que se dedicam apenas a trabalhar com papel como Ingrid Siliakus ou Zim and Zou, ou Apps como "The Paper Fox" (2013) de Jeremy Kool, ou ainda um colectivo online que se dedica à construção de brinquedos em papel. Deixo então abaixo vários que fui coleccionando.
"11 Paper Place" (2014) de Daniel Houghton
Não é a primeira vez que aqui trato obras criadas sobre papel, exemplos como as animações "Train of Thought" (2010) ou "Much Better Now" (2011), os videojogos "And Yet it Moves" (2010) "Lume" (2011) são apenas alguns dos que me têm fascinado ao longo dos anos. Pelo meio tenho encontrado artistas que se dedicam apenas a trabalhar com papel como Ingrid Siliakus ou Zim and Zou, ou Apps como "The Paper Fox" (2013) de Jeremy Kool, ou ainda um colectivo online que se dedica à construção de brinquedos em papel. Deixo então abaixo vários que fui coleccionando.
"11 Paper Place" (2014) de Daniel Houghton
"The Wolf I Used To Be..." (2012) dos Nearly Normal
"Curriculum Vitae" (2011) de weareflink
"Moleskine Mini Planners" (2011) de Rogier Wieland
"Star Wars in Paper" (2010) de Eric Power. Do mesmo autor, Zelda on Paper e Mario on Paper.
"Cardboard Warfare" (2010) de Clinton Jones
"Cardboard Tron Lightcycles" (2008) de Miké e Vinz
junho 22, 2014
“Blue Is the Warmest Colour”
O poder do cinema na comunicação de emoção é absolutamente impressionante, “Blue Is the Warmest Colour” (2013) é capaz de transmitir emoções humanas a um nível de vivacidade que só estamos habituados a experienciar no contacto direto entre humanos. Desde o surgimento da arte cinematográfica, o movimento primeiro, a montagem depois, e por fim a adição de som e música foram determinantes na criação daquela que continua no século XXI a ser a arte das emoções. Mas “Blue Is the Warmest Colour” não é apenas emoção, é também mensagem, é uma obra que expressa essências sobre o que nos define enquanto humanos. Para tornar isto possível foram necessários três ingredientes essenciais, ou melhor, três pessoas: Adèle Exarchopoulos (actriz principal), Abdellatif Kechiche (realizador) e Julie Maroh (história).
Não fossem a história e a realização tão boas, diria que o filme é Adèle Exarchopoulos, porque o filme vive totalmente à flor da sua pele, a câmara que a segue por todo o lado, da cama à escola, colada ao seu respirar, ao seu sentir, às suas lágrimas... O filme não é só Adèle, mas ”Blue…” não seria ”Blue…” sem Adèle. Adèle dá-se totalmente à obra, nada mais lhe podia ser aqui pedido, ela encarna o personagem com um brilhantismo raro, seguimos sempre no seu encalce, não conseguimos desligar de si, que transporta todo o sentir, toda a expressividade. Adèle cria uma verdadeira personagem de carne e osso, alguém que poderia ter sido nossa colega de escola, e ao mesmo tempo alguém que tem dúvidas sobre o mundo, sobre a sua existência e essência (Sartre é discutido a meio do filme). Alguém que recria na nossa frente as dúvidas sobre a essência do Amor, sobre a essência do Ser, com quem não conseguimos deixar de empatizar. Adéle é o nosso filme, é absolutamente brilhante.
Claro que para que toda esta transcendência de Adèle pudesse chegar até nós, foi preciso alguém que dirigisse a sua performance e a canalizasse por meio de um enquadramento audiovisual. Esse alguém foi Abdellatif Kechiche reconhecido por trabalhar com um método, pouco ortodoxo para uma arte cara como é o cinema, que assenta numa lógica de improviso, de privilegiar constantemente o momento, buscando captar a autenticidade no seu estado bruto e puro. E é exactamente isso que vemos em toda a obra, Adéle não é apenas Adéle, o que vemos no filme é aquilo que Kechiche capta, preserva e enfatiza. Impressiona como Adéle chora e ruboriza, impressiona como Adéle Exarchopoulos e Léa Seydoux se dão sem reservas à câmara expondo tudo a todo o momento. Se por momentos cheguei a sentir um ultrapassar do risco, em termos de grafismo sexual, não posso deixar de conceder que esses momentos contribuíram para a marca de autenticidade, de emocionalidade captada em estado bruto pela lente de Kechiche.
Por fim, a história sustentada no livro de banda-desenhada homónimo de Julie Maroh é o que abre espaço à discussão do “Ser e o Nada”, alicerçada sobre uma história de amor adolescente homosexual. A mensagem passa com uma força impressionante, dando bem conta de que vivemos no século XXI, e de que a homosexualidade entrou finalmente na paisagem da sociedade europeia. Maroh leva-nos pela mão, fazendo-nos experienciar os sentimentos de Adéle, que são totalmente independentes do género da figura amada, já que o que conta é aquilo que esta sente, e aquilo que sente é simplesmente Amor. “Blue Is the Warmest Colour” é um tratado sobre o Amor, esse sentimento indefinível que faz os seres humanos correrem toda uma vida...
Para fechar, e voltando ao início deste texto, li o livro de Julie Maroh depois de ver o filme, e apesar de me ter tocado, são experiências completamente diferentes, essencialmente pelo que já disse acima. Enquanto o livro nos transporta através da alma de Maroh, o filme cria um universo mais amplo e rico, nomeadamente porque além de Maroh, temos ainda Adèle Exarchopoulos e Abdellatif Kechiche. A viagem é mais profunda, mais emocionante, gerando uma experiência com um grau de autenticidade quase chocante, muito para além daquilo que o livro nos consegue dar.
Não fossem a história e a realização tão boas, diria que o filme é Adèle Exarchopoulos, porque o filme vive totalmente à flor da sua pele, a câmara que a segue por todo o lado, da cama à escola, colada ao seu respirar, ao seu sentir, às suas lágrimas... O filme não é só Adèle, mas ”Blue…” não seria ”Blue…” sem Adèle. Adèle dá-se totalmente à obra, nada mais lhe podia ser aqui pedido, ela encarna o personagem com um brilhantismo raro, seguimos sempre no seu encalce, não conseguimos desligar de si, que transporta todo o sentir, toda a expressividade. Adèle cria uma verdadeira personagem de carne e osso, alguém que poderia ter sido nossa colega de escola, e ao mesmo tempo alguém que tem dúvidas sobre o mundo, sobre a sua existência e essência (Sartre é discutido a meio do filme). Alguém que recria na nossa frente as dúvidas sobre a essência do Amor, sobre a essência do Ser, com quem não conseguimos deixar de empatizar. Adéle é o nosso filme, é absolutamente brilhante.
Claro que para que toda esta transcendência de Adèle pudesse chegar até nós, foi preciso alguém que dirigisse a sua performance e a canalizasse por meio de um enquadramento audiovisual. Esse alguém foi Abdellatif Kechiche reconhecido por trabalhar com um método, pouco ortodoxo para uma arte cara como é o cinema, que assenta numa lógica de improviso, de privilegiar constantemente o momento, buscando captar a autenticidade no seu estado bruto e puro. E é exactamente isso que vemos em toda a obra, Adéle não é apenas Adéle, o que vemos no filme é aquilo que Kechiche capta, preserva e enfatiza. Impressiona como Adéle chora e ruboriza, impressiona como Adéle Exarchopoulos e Léa Seydoux se dão sem reservas à câmara expondo tudo a todo o momento. Se por momentos cheguei a sentir um ultrapassar do risco, em termos de grafismo sexual, não posso deixar de conceder que esses momentos contribuíram para a marca de autenticidade, de emocionalidade captada em estado bruto pela lente de Kechiche.
Por fim, a história sustentada no livro de banda-desenhada homónimo de Julie Maroh é o que abre espaço à discussão do “Ser e o Nada”, alicerçada sobre uma história de amor adolescente homosexual. A mensagem passa com uma força impressionante, dando bem conta de que vivemos no século XXI, e de que a homosexualidade entrou finalmente na paisagem da sociedade europeia. Maroh leva-nos pela mão, fazendo-nos experienciar os sentimentos de Adéle, que são totalmente independentes do género da figura amada, já que o que conta é aquilo que esta sente, e aquilo que sente é simplesmente Amor. “Blue Is the Warmest Colour” é um tratado sobre o Amor, esse sentimento indefinível que faz os seres humanos correrem toda uma vida...
“Blue Is the Warmest Colour” (2010) de Julie Maroh
Para fechar, e voltando ao início deste texto, li o livro de Julie Maroh depois de ver o filme, e apesar de me ter tocado, são experiências completamente diferentes, essencialmente pelo que já disse acima. Enquanto o livro nos transporta através da alma de Maroh, o filme cria um universo mais amplo e rico, nomeadamente porque além de Maroh, temos ainda Adèle Exarchopoulos e Abdellatif Kechiche. A viagem é mais profunda, mais emocionante, gerando uma experiência com um grau de autenticidade quase chocante, muito para além daquilo que o livro nos consegue dar.
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