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maio 17, 2014

O longo jogo do génio

Trago uma nova série de filmes web criada por Adam Westbrook, relativamente conhecido pelo seu trabalho à volta do storytelling digital. Neste seu novo projecto, Delve Video Essays, Westbrook faz uma abordagem assente no formato de ensaio audiovisual, o que é por si só motivo de análise e exploração.



Para avançar com este projecto Westbrook escreveu um manifesto que me parece relevante ser lido, vindo de alguém que tem refletido bastante sobre o storytelling e a publicação online. Retiro do mesmo quatro pontos que levaram Westbrook a avançar com Delve.
1 - “serendipity is magical and it's something the Internet can't replicate so easily. All the knowledge is there - but it's built to be easily found if you know what you're looking for.”

2 - “The knowledge is all there, accumulated over 13,000 years of civilisation but it feels locked away somehow, as if it's out of reach. It's trapped behind glass etched with the dreaded word "boring".”

3 - “’people get the mind and quality of brain that they deserve through their actions in life’ (Robert Greene)… If you choose to use your free time to play Candy Crush Saga, watch Friends re-runs and read Buzzfeed, you will get the mind that comes from that. But if you choose to push your brain, to make it work hard, to keep learning new things, to read difficult books, to consider challenging ideas then, like the muscles on your body, it grows stronger and more connective… But it's much more rewarding to read Buzzfeed.”

4 - “I'd like you to meet delve - it's a web video channel I'm building for people who want to take their learning seriously. It's not a course, or a qualification, and it's not for people who want to study something particular. It's for people who love learning for the sake of learning, who want to feed their mind the most beautiful and unexpected feasts.”
Apresentado o Delve vejamos o que nos trazem os dois primeiros trabalhos, que formam apenas um em duas partes, “The Long Game” (2014). O tema de fundo não passa ao lado de todos aqueles que se interessam pelos processos criativos, pela mestria, um tema que se tornou mais relevante nos últimos anos com a discussão em redor das comunidades e indústrias criativas.

"The Long Game Part 1" (2014) Adam Westbrook

Assim o substrato diz respeito ao processo demorado da criação do génio. Westbrook explora o exemplo de Leonardo Da Vinci, considerado um dos mais relevantes criativos da nossa história, desmontando o seu surgimento, génio e talento. Todos sabemos que o processo de transformação de um criativo é um processo lento, mas saber que Leonardo levou 16 anos a conseguir atingir o seu auge, ajuda-nos a questionar muitas das ideias feitas que temos sobre os iluminados, os chamados “outliers”. Essencialmente este dois curtos ensaios audiovisuais servem para nos alertar para um discurso de facilitismo surgido no século XX e que procurou vender a juventude, com todas as suas propriedades, como a essência da vida e do talento, quando apenas o tempo e a experiência podem conduzir à qualidade, ao génio.

"The Long Game Part 2" (2014) Adam Westbrook


Links de interesse
Talento é Sobrestimado, in Virtual Illusion
Processo criativo, dos 2 aos 25 anos, in Virtual Illusion
Outliers de Malcom Gladwell, in Virtual Illusion

janeiro 13, 2014

o tempo e a nossa condição...

Raras vezes temos oportunidade para experienciar como o tempo passa ao nosso redor. Por vezes somos impelidos por um qualquer motivo - fotografia, música, ou data - a parar para reflectir sobre anos passados sobre a nossa própria vida. Mas raramente temos a oportunidade de constatar visualmente como o mundo à nossa volta se altera. Acompanhando-o parece seguir ao nosso ritmo, nós como este vamos mudando, mas acreditamos viver sempre no mesmo presente.

1927  -  2013


Tudo isto a propósito de dois pequenos filmes ingleses recém criados, um da BBC, "London to Brighton Train Journey: 1953 - 2013" outro de Simon Smith com imagens do BFI, "London in 1927 & 2013". O primero dá conta da passagem de 60 anos numa linha férrea popular de Inglaterra. O segundo mostra como centro de Londres se modificou em 86 anos.

"London to Brighton Train Journey: 1953 - 2013" (2013) da BBC

Dois filmes que mais parecem Máquinas do Tempo. E o que nos dão a ver, a experienciar realmente?

Para mim, a coisa mais notável que podemos extrair destes filmes, é que o mundo não precisa de nós para continuar a mover-se. Fá-lo lentamente, à sua vontade, e não à nossa. Os edifícios e pontes ali estão como que a olhar para nós imóveis e inalterados, enquanto nós seres humanos vamos nascendo e morrendo. Cheios de fome de viver, ansiamos por fazer, queremos sempre mais e mais. O mundo está aí, e nós para aqui sem nos resignarmos continuamos a lutar todos os dias, acreditando que vamos mudar e transformar tudo aquilo que encontrarmos pela frente.

Em certa medida, estes filmes dão-me alguma paz, ajudam-me a conceber o mundo de um modo verdadeiramente mais tranquilo...

"London in 1927 & 2013" (2013) de Simon Smtih

outubro 17, 2013

emoções por detrás das últimas imagens de um filme

A minha respiração está muito mais rápida, sinto o meu coração a palpitar... Acabei de experienciar, durante cinco minutos seguidos, as últimas cenas de setenta grandes filmes dos últimos cinquenta anos. Para ser honesto, estou em pleno choque emocional. Falo do efeito deixado por The Last Thing You See: A Final Shot Montage (2013) da Plot Point Productions, baseado no magnífico trabalho levado a cabo pelo blog The Final Image.



Em certa medida isto parece-se quase com o que acontece quando entramos numa perfumaria e experimentamos vários perfumes, a uma determinada altura são tantas as emoções que já não conseguimos experienciar mais nada através do olfacto. Aqui aconteceu-me o mesmo. Sinto-me agitado visceralmente, mas não me consigo focar, para já, em nada em concreto de tudo aquilo que acabei de ver.

Em termos mais técnicos diga-se que estamos perante um filme que é um ensaio académico sobre cinema, ainda que seja apresentado na forma audiovisual, com um investimento de algumas centenas de horas no seu processo de criação. Porque primeiro foi necessário ver os filmes, depois foi necessário obter todos em HD, depois foi necessário extrair os últimos segundos de todos, e só a seguir é que começou o verdadeiro trabalho que aqui podemos ver. Ou seja, o trabalho de análise e categorização das sequências, não em função dos filmes, mas em função do que é representado em cada cena.

  • PART I: Awakening/Creation
  • PART II: The Natural World
  • PART III: Youth
  • PART IV: Love
  • PART V: The Journey
  • PART VI: Triumph
  • PART VII: Celebration
  • PART VIII: Transcendence

Como se pode ver, aqui acima, a categorização foi ordenada de forma a construir um arco narrativo perfeito, em que temos um prólogo, uma introdução, um desenvolvimento, um fechamento e ainda um epílogo. Desmontado desta forma percebe-se muito melhor porque é que o impacto emocional é tão forte. É natural que o impacto emocional se faça sentir mais em quem viu todos aqueles filmes, mas a forma como foi feita a construção narrativa, permite-nos enquanto espectadores ir entrando, e assimilando o que se nos vai apresentando, e as emoções vão subindo em redor de cada novo mundo ficcional que nos é apresentado.

A juntar a tudo isto, note-se o imenso cuidado na sincronização entre a narrativa visual e a narrativa musical, suportada por uma música apenas, "Gathering Storm" dos Godpseed You Black Emperor. Posso dizer que temos aqui uma sincronia perfeita, com os decrescendos e os crescendos a serem verdadeiramente aproveitados pela sucessão de imagens. O todo impregna-se em nós, não nos deixando escapar nem por um segundo.

Para fechar, deixar uma palavra sobre o tema em si, as últimas imagens de um filme. É evidente que estas imagens carregam consigo toda uma enorme carga emocional, porque sintetizam em si mesmo, uma multiplicidade de variantes emocionais. O simples vislumbre de cada uma trás à tona da nossa consciência emocionalidades experienciadas ao longo de cada um desses filmes. Não é por acaso que comecei por dizer que sentia uma espécie de esgotamento emocional, é que cada imagem não se representa apenas a si própria, mas ao todo de cada filme. Ou seja, assistir a estes cinco minutos, é um pouco como viajar por uma montanha russa, mas sem protecção, porque as imagens apanham-nos desprevenidos a cada mudança...

The Last Thing You See: A Final Shot Montage (2013) da Plot Point Productions

Posso dizer que de todos os supercuts que vi na rede, nos últimos anos, este é sem dúvida o mais trabalhoso, mais estruturado, e mais impactante que já vi. Podem ver a listagem de todos os filmes aqui presentes na informação deixada pelos criadores no Vimeo.

junho 04, 2013

Powers of Ten, uma visão cósmica

Powers of Ten (1977) é uma das mais respeitadas curtas no mundo do design gráfico. A razão para tal não se prende apenas com o facto de ter sido criada pelos designers Charles e Ray Eames para a IBM, mas antes por ser um artefacto exímio na visualização de informação complexa em movimento. Powers of Ten traduz informação altamente complexa através de uma simples regra de visualização, as potências de 10.


O filme começa com um casal deitado num relvado de Chigado, filmado a partir de cima num enquadramento que oferece a visão sobre 1 metro de espaço. A partir desse ponto na Terra, começa um afastamento da câmara para cima, ampliando a visão que temos do espaço, em potências de 10 a cada 10 segundos (101=10m; 102=100m; 103=1000m; 104=10000m). Visualmente percepcionamos o espaço real que estamos a ver a partir de um quadrado que se vai sobrepondo sobre as imagens em afastamento e que nos permite, através da afixação lateral das potências de 10 e dos metros, ganhar uma compreensão completa do que estamos a ver. Chegados ao limite da ampliação de 1024 a câmara retrocede em alta velocidade, até atingir de novo o casal, e depois faz o caminho inverso no sentido do infinitamente pequeno.


O título completo do filme reflecte exactamente isto, Powers of Ten: A Film Dealing with the Relative Size of Things in the Universe and the Effect of Adding Another Zero. A ideia base foi baseada no livro Cosmic View: The Universe in 40 Jumps (1957). O livro está esgotado há muitos anos, mas tem sido preservado online por vários académicos, podem ver a versão preservada por Mitchell Charity.


Em menos de 10 minutos o espectador ganha uma consciência singular do mundo e do seu posicionamento neste. O filme é reconhecido pelo modo como graficamente nos ajuda a compreender o espaço, mas a sua importância está longe de se fechar no reino do design, o que estamos aqui a falar é de humanidade. Por isso este devia ser um filme obrigatório nas nossas escolas. Ganhar noção do espaço que ocupamos neste universo é fundamental para compreendermos o alcance do universo, e do que somos "nós" perante este.



Tecnicamente o filme não foi fácil de criar, estamos em 1977, e a primeira versão do mesmo surgiu em 1968. Nos dias de hoje, este filme seria executado muito facilmente com as tecnologias de imagens geradas por computador, algo que não existia em 1977. Uma versão apenas pictórica do filme pode ser vista no sítio que a IBM mantém sobre o filme, e com imagens em HD. A versão do filme aqui abaixo, que está no YouTube, é autorizada pela IBM e pelos Eames Office.

Powers of Ten (1977) de Charles e Ray Eames

maio 24, 2013

"Performance philosopher", o novo Carl Sagan

Jason Silva licenciou-se em Cinema e Filosofia na Universidade de Miami. Com essa formação de base resolveu criar algo que ainda ninguém tinha conseguido criar, pequenos filmes sobre conceitos filosóficos que ele denominou de "philosophical shots of espresso". Não são meras apresentações para uma câmara, mas obras audiovisuais, carregadas de som, imagens e conceitos, ao qual junta todo o seu poder de comunicador. A TED já o definiu como  “performance philosopher” enquanto o The Atlantic o define como uma espécie de "Timothy Leary of the Viral Video Age". Para mim, a magia comunicativa de Jason Silva aproxima-se de uma pessoa que todos conhecemos já no passado, Carl Sagan.


"We have a responsability to awe"

Jason Silva está neste momento a terminar as gravações da série BrainGames do National Geographic, mas é antes sobre um seu projecto mais pequeno, Shots of Awe,  desenhado para o TestTube, a rede de vídeos do Discovery Channel, que quero aqui falar. Saiu agora o primeiro episódio Awe que podem ver aqui abaixo, que em termos de audiovisual é totalmente inspirado no trabalho que nos tinha apresentado no TED Global 2012, Radical Openess.

O que temos aqui é o brilhantismo de alguém que domina na perfeição três áreas que raramente se movem juntas: audiovisual, performance e filosofia. É muito complexo integrar as três componentes, porque requer cada uma muito investimento, muito trabalho e muito tempo. Mas o que posso dizer é que no caso de Jason Silva, compensou. O que podemos experienciar neste seus pequenos "shots de filosofia" é indescritível. O poder de comunicação da sua voz e da sua linguagem não verbal é contagiante, os conceitos fluem através das imagens de arquivo, e encontram em nós sentidos altamente diversos e associativos. A música faz o resto, coordena o nosso ímpeto e deixa-nos colados ao ecrã.

Posso dizer que já vi Awe mais de 5 vezes, e continuo a sentir sensações novas, a ver detalhes novos, a imaginar ideias novas. Vejam, sintam, e preparem-se para passar a seguir a série e o trabalho de Jason Silva.

Awe (2013) de Jason Silva, primeiro episódio da série Shots of Awe

"Psychologist Nicholas Humphrey has proposed that our ability to awe was biologically selected for by evolution because it imbues our lives with sense of cosmic significance that has resulted in a species that works harder not just to survive but to flourish and thrive."

janeiro 14, 2013

Toy Story em imagem real

Foi lançado na rede um remake completo de Toy Story (1995) em imagem real criado através dos bonecos de merchandising, fios de pesca, arames, stop-motion, chroma-keying, e muita, muita dedicação. O filme foi criado por Jonason Pauley de 21 anos e Jesse Perrotta de 19, ambos do Arizona, EUA. O remake é quase perfeito, plano a plano, durante 1h20m, impressionante.


Live Action Toy Story (2013) demorou dois anos a criar, o que só por si demonstra todo o empenho depositado por estes dois rapazes. Existe quem fale em obsessão ou fanatismo. Eu vejo para além disso, e encontro aqui algo excepcionalmente bom. Ao fazerem isto, estes dois rapazes criaram algo que é uma obra deles, ainda que sendo um remake completo do filme, está carregado do seu empenho e motivação pessoal. Mas além disso, o trabalho que tiveram durante dois anos está longe de ter sido em vão. Para o fazer tiveram de aprender muito, mas mesmo muito sobre a linguagem cinematográfica, sobre animação, sobre visualização de ideias, sobre a criação de cenários, etc. etc. e o mais interessante é que o fizeram sem se terem dado conta disso. Através de um simples projecto tiveram a oportunidade de aprender mais do que se tivessem apenas escolhido fazer uma cadeira semestral teórico-prática de cinema.

Live Action Toy Story (2013) de Jonason Pauley e Jesse Perrotta

O filme foi lançado ontem no YouTube e já conta com mais de 1 Milhão de visualizações. Mas antes de o fazerem resolveram ir à Pixar mostrar o filme e receber uma espécie de aprovação do estúdio, para evitar que pudessem ser atacados em termos de direitos de autor.

Sobre o potencial criativo do merchandising, e especialmente o do Toy Story já aqui tinha falado anteriormente. Aproveito no entanto para deixar algumas imagens cá de casa, como homenagem à dedicação colocada na construção deste filme.




dezembro 31, 2012

emoção em estado puro

Girls first Ski Jump (2012) é um pequeno vídeo online, sem montagem nem interpretação, pura realidade e emoção, captada com uma pequena câmara (Countour), montada no capacete de uma menina de 10 anos. Kevin B. Lee num ensaio vídeo sobre os melhores vídeos online de 2012 diz apenas,

these two minutes capture the transformative drama of sport more profoundly than any Olympic highlight
O vídeo é emoção em estado bruto, consegue em dois minutos completar um arco narrativo completo, gerando não apenas a emoção do salto, mas dando a ver todo o sentir da primeira experiência de um salto de ski. É belíssima a abertura com o sussurrar, com o diálogo estabelecido com quem incentiva, é quase pornográfico em termos emocionais audiovisuais, porque é estar dentro do sentir emocional humano, sem máscaras, sem arte, no estado puro, até que finalmente arranca e se sente a adrenalina converter o medo em alegria. Chegando ao final, aquilo que era apenas o lamento humano, transforma-se por via da arte de uma sombra numa rotunda vitória, digno do melhor cinema.

novembro 13, 2012

Vídeo, Alemanha e Educação

Trabalhando há décadas em audiovisual não posso deixar de falar sobre o vídeo, Ich Bin Ein Berliner (2012), que acendeu os corações de muitos, contra e a favor, em Portugal, na Alemanha e noutros países. Deste modo resolvi fazer uma análise em três dimensões distintas: Forma, Conteúdo, e Racionalidade.

Ich Bin Ein Berliner (2012)

FORMA
O problema não está na forma, que tem coisas más, mas também tem coisas boas.

Bom: a ideia de um plano corrido e em sequência dá força à ideia central que se quer passar, constrói o argumento e solidifica-o, porque nunca o deixa sair de plano. Além de que constrói um sentido base muito importante na mensagem do vídeo, a ideia de grupo, comunidade, colectivo e união.

Mau: A incapacidade de comunicar com as imagens, ou seja de as tornar expressivas. O vídeo vive do texto, não do que mostra, é pobre na capacidade para induzir pensamento através da sua componente visual e sonora. E quando assim é, devemos usar outras formas de comunicação que não o vídeo, é isto que ensinamos todos os dias nas aulas de linguagem audiovisual. Aquilo que aqui temos é um texto escrito por Marcelo Rebelo de Sousa , que foi adaptado à pressa e sem recursos para vídeo, resultando inevitavelmente num artefacto bem instruído textualmente mas totalmente deficiente na sua componente audiovisual. (Actualização: parece que o texto não terá sido escrito por MRS, este terá apenas sugerido a ideia)

CONTEÚDO
Se fosse apenas isto, diríamos, assim seja, o objectivo é político, e até pode passar uma certa ideia de autenticidade por via da ingenuidade da forma.  Mas o próprio guião apresenta problemas, e nesse sentido temos também coisas boas, e coisas más.

Bom: Dizer que nós fizemos muitas coisas nos últimos 50 anos é bom. Dizer que sempre defendemos a União e nunca reclamámos quando os outros procuraram melhorar o seu estado à custa dessa união, é também muito bom.

Mau: Dizer apenas parte da realidade, é manipulação. E este vídeo é altamente manipulativo. Fala em Plano Marschal mas não fala nos vários planos comunitários em que recebemos financiamento, muito dele vindo da Alemanha, ao longo dos últimos quase 30 anos!

Para quem ainda não viu, vejam antes de ler o que se segue.

RACIONALIDADE
Aqui é que para mim surgem os verdadeiros problemas do filme, ao suportar a sua essência argumentativa na base da culpabilização dos alemães, por estes nos terem vendido, aquilo que fomos nós próprios incapazes de produzir: carros, redes elétricas, submarinos, e muita outra coisa que aqui não aparece. E é aqui que mexe comigo o filme, porque passados mais de 40 anos depois de Salazar continuamos a não perceber a essência do problema português. Continuamos a desprezar a razão pela qual temos uma produtividade tão baixa. As razões são múltiplas, mas deixemo-nos de lirismos, quando é que vamos perceber que temos um problema de Educação nacional?


Apesar de tudo, parece que o Ministro Crato resolveu finalmente acordar. Durante anos em Portugal só se ouviu falar do modelo Finlandês, e finalmente alguém começou a procurar noutras paragens. Acho no entanto irónico que o modelo que agora se procura, seja exatamente o da Alemanha. Mais irónico porque o venho defendendo há décadas, talvez por ter nascido num sistema similar, embora não tenha feito a minha formação depois no sistema e tenha vindo para Portugal. Assim, repesco parte de algo que disse no ano passado, também em Novembro.
“O problema é que para Portugal criar uma marca de eletrónica ou de carros, não chega ter 14% de licenciados, de todo. Mas em cima disso e talvez mais grave, precisávamos de muitas mais pessoas com qualificações ao nível do 12º ano, não chega ter mais outros 14%. De preferência técnicos qualificados em Metalomecânica, em Mecânica, em Eletrónica, em Informática, em Gestão, em Secretariado. De que me adianta ter milhares de miúdos com 18 anos que sabem muito de Português ou Matemática, mas não sabem fazer nada de concreto! Mas pior é mesmo que a grande massa, 72%, não vai além do ensino básico do 9º ano. Com essa escolaridade não servem a nenhuma empresa que precise de competir internacionalmente.”
Este parágrafo resume o essencial daquilo que temos no vídeo. Que se reflete na própria qualidade do vídeo. Somos um país pobre, não em recursos e nem sequer em engenho ou criatividade. Somos um país pobre em Educação técnica e de alto-nível. Por isso precisamos desesperadamente de trabalhar isto. Mas não é apenas injectando dinheiro nas escolas, é preciso mudar mentalidades. Continuamos a ter em Portugal muito quem acredite que a escola não serve para nada. E enquanto assim for, veremos o nosso PIB pelas ruas da amargura. E não me venham falar de EAD ou de MOOCs, que até podem ser modelos interessantes para sociedades com avançada literacia, que está longe de ser o nosso caso (vejam o gráfico na Imagem 1).

E porque é que o Ensino alemão é bom? Escrevi sobre isso ainda há poucos meses, em Agosto, num post no Facebook em conversa com o Prof. Dias Figueiredo e a Prof. Teresa Pombo,
“Eu sou grande defensor das escolas técnico-profissionalizantes. E a ligação com a indústria no secundário é a grande força da indústria alemã, e que já começou nos anos 1950.”
A verdade é que quando comparamos um produto alemão com o de outros países, percebemos muito rapidamente que a qualidade de construção tem pouca concorrência. Diria que alguma produção americana, e a japonesa consegue igualar. Falo aqui de mecânica e electrónica essencialmente, mas isso reflecte-se em muita outra produção. O que acontece, é que os técnicos destas fábricas, andaram na escola, mas não isolados do mundo real. Nas escolas profissionais alemãs, os técnicos das fábricas, vão às escolas dar aulas. E os alunos passam temporadas nas fábricas a aprender. Ou seja o aluno é totalmente envolvido no processo de real aprendizagem desde cedo, e de um modo totalmente orientado e suportado. Algo que conhecemos desde a Idade Média, na figura de mestre e aprendiz, mas fomos abandonando à medida que o ensino se foi massificando, dada a impossibilidade de manter uma relação baixa no rácio professor/aluno.

O que é que acontece neste modelo alemão? Acontece algo que difere muito de uma aprendizagem baseada numa simples sala com quatro paredes, porque vai para além das fronteiras dessas paredes. É um formato que recorre, à Situated Cognition e Embodied Cognition do lado da Psicologia. Ou à User Experience do lado do Design. Ou ainda aos Contextos como defende Prof. Dias Figueiredo no campo da Educação. O formato alemão é aquele que melhor garante, o embodiement, a experiência e o contexto para a aprendizagem. Não se fica pela simulação de contextos com gráficos numa lousa, nem em vídeos ou textos ditados, mas antes se sente, se vive, e se experiencia.

Mas não tenhamos ilusões, não existem modelos definitivos, e 100% perfeitos. A própria Alemanha fez há pouquíssimo tempo uma enorme revolução neste tipo de escolas, nomeadamente nas mais Profissionais (Hauptschule), com pouca componente teórica. Espero que Portugal analise bem essas alterações, e as perceba. Pelo menos numa coisa já fiquei satisfeito ao ouvir o Ministro ontem, é que por cá não faremos disto caminhos de menorização das possibilidade educativas de cada um. Um aluno que faz qualquer caminho de ensino, deve mais tarde poder fazer os exames e seguir a Universidade se assim o desejar. Algo que na Alemanha e França não está previsto. Não gosto, e nem me parece que seja motivador para quem segue outros percursos, sentir que está em percursos secundários, menos relevantes que os seus colegas. E já agora também não gosto da demagogia dos nosso sindicatos, para quem tudo aquilo que um Ministro faça, é mau.

Dito tudo isto, acho que falhámos com os nossos propósitos de procurar apenas e só criar alunos para a Universidade. Com isto fomos incapazes de criar técnicos em número suficiente para alimentar um processo de industrialização de qualidade. Não fomos capazes de criar empresas que pudessem produzir aquilo que os Alemães produziram e nos venderam em todos este anos, e continuam a vender. Temos uma falha enorme nos milhões de pessoas que ficaram pelo caminho no 9º ano. Mas temos uma falha ainda maior nas pessoas que investiram para fazer o 12º ano, tendo perdido literalmente anos de vida, que geraram pouquíssimo retorno, tanto para elas como para o país. Assim que dizer que a culpa da nossa crise é dos alemães que nos venderam aquilo que nós fomos incapazes de aprender a fazer, faz-me apenas pensar no mais elementar que aprendi na Escola Primária, por sinal portuguesa,

“Não deem dinheiro. Deem uma cana de pesca, e ensinem a pescar”

outubro 19, 2012

tecnologias criativas do audiovisual, GoPro

Foi ontem anunciada a câmara digital GoPro Hero 3. É o último modelo da série de enorme sucesso Hero da marca GoPro, e as razões para o sucesso não podiam deixar de ser mais claras e directas:


Preço = abaixo dos 300 dólares,
Peso = abaixo das 100 gramas,
Resolução = 4Kp a 15fps ou Full HD a 60fps
Robustez = resistente ao choque e água

Com estas características o limite só pode ser a massa cinzenta de cada um. Não é mais possível alguém queixar-se de falta de material para criar imagens, sejam complexas, duras ou simplesmente "do outro mundo". É absolutamente impressionante aquilo que foi feito aqui em termos de tecnologia audiovisual. Quanto à qualidade das imagens captadas ficam as provas em dois vídeos, o primeiro para a Hero 2 no ano passado e que atingiu os 15 milhões de visualizações. O segundo, para a Hero 3, saiu apenas ontem e conta neste momento já com 2 milhões de visualizações.

Go Pro Hero 2 (24.10.2011)

Dado o reduzidíssimo tamanho e a enorme robustez da câmara é possível com um sistema muito simples e acessível montar a câmara sobre o próprio corpo ou sobre qualquer sistema e captar momentos que até agora eram simplesmente impossíveis com esta qualidade. Ambos estes vídeos levam-nos através de imagens dessas, impossíveis de tão belas.

Go Pro Hero 3 (17.10.2012)

Isto é apenas o início da revolução das tecnologias do audiovisual, porque nada impedirá qualquer pessoa de sonhar, pensar, desenhar, produzir e criar o seu filme com resolução para cinema. É esta a base das tecnologias criativas, derrubar barreiras, levar as tecnologias expressivas a todos. A inovação faz-se na mente de cada um, e não dependerá mais da tecnologia a que cada um tem acesso.

setembro 19, 2012

Mars Curiosity Descent em Full HD

Acabo de ver Mars Curiosity Descent - Ultra HD 30fps Smooth-Motion em Full HD (1920x1080) num ecrã de 40', e é ainda mais impressionante do que aquilo que já tinha visto no ecrã do meu portátil. O detalhe está lá todo, completamente, é de cortar a respiração. Como se sentíssemos que estamos verdadeiramente a aterrar em Marte. O impacto é maior porque sabemos que são imagens reais captadas de lá, não é um filme de FC.


Mas o filme que podemos ver aqui não é completamente real, é antes uma extrapolação a partir de imagens fotográficas capturadas numa resolução de 1600x1200 pixeis, com 4 frames por segundo (fps). Brad Canning pegou nessas imagens e trabalhou-as para criar um vídeo que dá uma muito maior sensação de realidade aos nossos olhos. Apesar do título falar em Ultra HD, estamos no nivel do Full HD (1920x1080), para o Ultra precisávamos de chegar aos 3840x2160. Para criar este pequeno filme Canning utilizou várias técnicas de pós-produção video:

  • interpolação de movimento, de 4fps para 30fps
  • aumento de resolução de 1600x1200 para 1920x1080
  • pan and scan das imagens para manter o foco na capsula,
  • estabilização das imagens para garantir fluidez do movimento
  • correcção de cores, para aumentar a percepção de detalhe
  • correcção de níveis e contrastes, para aumentar a percepção de detalhe
  • adicionou som, inexistente no vídeo da NASA
  • entre outras técnicas...


Este trabalho foi feito ao longo de 29 dias. Sobre o trabalho desenvolvido vale a pena ler o seu post no reddit, e ver o os vídeos, making of e comparativo com o filme original da NASA.

junho 03, 2012

Filmar a adrenalina, com Seb Montaz

Ao longo do último ano vi vários pequenos filmes de grande qualidade sobre práticas de montanhismo chegarem à net. Inicialmente admirei-me com a qualidade, o fulgor das imagens surpreendentes e nunca vistas de desportos em altura. Entretanto hoje ao analisar o último filme, Summits of My Life - Trailer, reparei que estes filmes tinham todos um mesmo autor, Seb Montaz, e por isso resolvi procurar saber melhor quem era.

Sebastien Montaz-Rosset

Seb Montaz nasceu e vive em Chamonix, França ou seja no coração do famoso Mont-Blanc nos Alpes. Isto torna imediatamente clara a razão dos seus filmes se passarem quase sempre em zonas de montanha. Montaz é ele próprio praticante de várias das modalidades de desportos radicais de montanha. Até aqui nada de surpreendente, o que é mais interessante é o facto de este ser um auto-didacta no que toca à imagem em movimento.



Summer Feelings (2011)



Winter Feelings (2011)

Trabalhando como guia nos Alpes começou por brincadeira a filmar os lugares aonde levava as pessoas, daqui passou a fazer pequenos filmes semanais sobre a montanha para uma televisão local, Montagne TV. Não fez nenhum curso, porque como ele diz na sua área não existem cursos de cinema, e ele não se poderia dar ao luxo de sair dali durante 3 anos para aprender, por isso teve de aprender sozinho. Contudo analisando o seu trabalho ao longo dos últimos dois anos podemos ver como teve uma evolução surpreendente, veja-se um filme seu com 2 anos, e compare-se com os que aqui coloco como referência. A grande parte se não todos estes filmes foram criados com recurso a máquinas do tipo Canon 5D e 7D, depois editados num MacBook com o Final Cut.



Send it sistah ! (2011)

O seu trabalho ainda não lhe permite viver disto apenas, mas os convites para fazer comerciais ou participar em documentários têm vindo a aumentar. Todos os seus documentários até ao momento foram pagos por si. Para os rentabilizar o que faz é lançar os magníficos trailers na net, que criam nas pessoas a vontade de ver o filme completo. Para aceder aos filmes, é depois preciso pagar um pequeno valor online. Digamos que é uma espécie de sistema Freemium para audiovisual. Porque Montaz vai disponibilizando pequenas partes dos documentários no Vimeo, gerando cada vez mais interesse nas pessoas em ver o filme completo.



SKYLINERS - A Documentary (2010)

O seu documentário I Believe I can Fly é sem dúvida o mais conhecido e o que mais nome lhe tem trazido, tendo sido premiado em vários festivais. Podem encontrar no Vimeo vários bocados do filme em acesso livre, behind the scenes, e ainda tutoriais explicativos das técnicas utilizadas para a captura de imagens. É impressionante como Montaz nos consegue fazer sentir quase ali, eu próprio sinto vertigens a ver o seu documentário, recolho-me por vezes, nem quero olhar! Mas os seus filmes são mais do que meras sensações brutas, existe um espírito ou filosofia que subjaz sob aquelas imagens e que advém de uma enorme vontade de sentir a vida, de a absorver na sua plenitude. Como ele próprio diz,
It is an incredible sensation of freedom but also very destabilizing! (..) The documentary is not about action sports, so much as about fear, doubts, laughs, failures and how you can find the strength to live your dreams. [fonte]


I Believe I Can Fly (2011), trailer

O seu trabalho mais recente, Summits of My Life, parece ser um projecto documental para vários anos, seguindo Killian Jornet por vários picos clássicos. Podem ver toda a info no site dedicado à expedição/documentário e ver desde já o fantástico trailer. A banda sonora é original de Zikali.



Summits of My Life (2012), trailer