julho 18, 2013

"Reality Is Broken: Why Games Make Us Better and How They Can Change the World" (2011)

O propalado livro de Jane McGonigal, deixou-me estupefacto quanto à sua falta de compreensão sobre o mundo, a vida, e no fundo a realidade que a rodeia. Diz-nos em suma, que "a realidade está partida"!?Para alguém com um PhD esperava mais. Embora perceba que é um discurso profundamente americano, daqueles cheios de números, de milhões que impressionam, e arrastam plateias, que depois de espremidos, sabem a muito pouco, porque na verdade, pouco ou nada se aprofunda sobre tudo aquilo que se diz.


Não digo que tudo esteja errado, até porque muito do que ela diz é interessante, nomeadamente no caso aplicado do design de jogos, nos chamados processos de gamification, ou dos Alternate Reality Games (ARG). Embora mesmo aqui, grande parte do discurso se aplique mais ao domínio dos jogos do que dos videojogos, o que não teria mal nenhum, não estivesse ela a tentar dar a ideia de que o discurso se aplica de igual modo aos videojogos. Mas o meu problema com o seu discurso, está na essência do objectivo do título do livro. E é aí que o livro perde todo o interesse, porque McGonical não faz a mínima ideia do que fala. Porquê?

Simples. McGonigal tenta vender a ideia de que se aplicarmos o design de jogos à vida, à realidade, poderemos transformar o mundo. Isto porque segundo ela, o mundo está quebrado!!! Para McGonigal a vida deveria resumir-se a uma lista pronta de objectivos a atingir, com pontos conseguidos a cada conquista, e com um objectivo final perfeitamente definido, à nossa espera. Pois, infelizmente ou felizmente, nada disso é a vida, porque a vida não é um sistema regulado, linear, rígido, focado, estabilizado, pré-determinado, fechado, etc.

A realidade é orgânica, tal como o simples acto de viver. Não nascemos com um destino marcado à nascença, nem queremos que nos marquem na adolescência. Viver, é enfrentar a inconstância, a incerteza, a descontinuidade. O ser humano mais criativo, mais capaz é exatamente aquele que consegue aprender a lidar com a organicidade do ecossistema que habita.

O que McGonigal nos traz, não é nada mais do que aquilo que a revolução industrial nos trouxe, com as suas tentativas de regulação, por via da harmonização das diferenças. McGonigal apresenta a solução para consertar o mundo e a realidade, que segundo ela está partida. Através do design de jogos, quer delinear os caminhos, categorizar as atividades, motivar por objectivos, ajudar a cumprir o destino. Porque segundo ela, jogar é divertido, por isso se jogarmos a vida, vamos nos divertir imenso!!! Na sua ingenuidade, McGonigal não entende que com isso, não salvará ninguém, contribuirá apenas para aprisionar mais as pessoas. O que é o dinheiro, se não o maior sistema de gamificação das relações humanas alguma vez inventado? Precisamos de mais sistemas deste género?

McGonigal terá de perceber que não basta citar meia-dúzia de estudos de psicologia sobre a emoção para suportar algumas das banalidades que debita ao longo do livro. Não basta suportar alguns pontos do discurso com estudos, é necessário saber situar aquilo que se pretende afirmar com esse suporte, e McGonigal claramente não sabe. A leitura de Thinking, Fast and Slow (2011) de Daniel Kahneman teria ajudado bastante. É uma pena, porque existem vários assuntos tratados por ela, de forma muito interessante.

Em jeito de resposta, deixo o vídeo com as palavras de Ken Robinson, que coloca o dedo na ferida, do modo como vemos a sociedade humana, e o modo como ela realmente funciona: “a educação... a vida humana, e as comunidades humanas... não são mecanismos, mas antes são mais como organismos... o nosso sucesso é sinergético com o nosso ambiente”. Ou seja, o que precisamos, é de construir modelos para a diversidade, não para a conformidade, porque só assim cada um se poderá encontrar a si mesmo, se definir enquanto ser humano, e realizar-se plenamente.

How to Find your Element (2013) palavras de Ken Robinson, ilustração de Molly Crabapple

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