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Dreamlab é uma empresa de desenvolvimento multimédia, com destaque para as áreas da composição digital, 3d e marketing digital. Está localizada em Aveiro onde foi fundada há 11 anos, e conta com 15 pessoas neste momento. Estive à conversa com um dos seus fundadores, o Diogo Valente, que é o director criativo da empresa.
O Diogo, atualmente com 34 anos, veio de Sta. Maria da Feira para Aveiro fazer a licenciatura em Novas Tecnologias da Comunicação na Universidade de Aveiro, onde acabou por fundar a Dreamlab no seio da Incubadora. Hoje, para além do trabalho na empresa, realiza diversos projectos pessoais na área de vídeo, e trabalha como consultor e formador nas áreas de 3D, vídeo e animação.
Show Reel de trabalhos de 2010
1 - Criaste a Dreamlab assim que acabaste o curso em 2001 porquê? O que te motivou a criar a tua empresa e a não procurares emprego?
:: Olhando para trás considero que a decisão foi um pouco ingénua. Apesar da empresa ter dado frutos, se fosse hoje, julgo que teria feito outro percurso. Gostava de ter tido mais experiência fora de Portugal. Gostava de ter passado por algumas empresas de multimédia e VFX mais consolidadas, para entender melhor a realidade desses mercados a nível internacional. Isso provavelmente teria ajudado a não cometer tantos erros no início da empresa.
Eramos 3 recém graduados a acabar uma bolsa de investigação na Universidade de Aveiro. Começámos a questionar-nos sobre o que iríamos fazer a seguir à bolsa e as condições proporcionaram-se. Na altura, alguns colegas ofereceram ajuda para criar a empresa porque de burocracia e gestão percebíamos pouco. A 4ª sócia surgiu para colmatar essa lacuna, a Clara Moreira era a única dos 3 com experiência empresarial.
A Dreamlab acabou por ser uma aventura que durou mais tempo do que aquilo que eu estava à espera. Começámos a aperceber-nos de que o mercado em nosso redor sofria de lacunas profundas em termos de conteúdos de comunicação e promoção. Foi fácil vender os nossos serviços. Principalmente para o mercado industrial que começava a dar os primeiros passos ao nível de promoção digital e internacionalização. O mesmo acontecia com as PMEs que apareciam como cogumelos. Todas elas precisavam de branding, websites, vídeos etc... e nós aparecíamos com uma atitude fresca e com propostas acessíveis em termos de valores.
Vimos imenso potencial à nossa volta ao nível do mercado regional e que as grandes agências de comunicação viravam a cara porque os valores envolvidos muitas vezes não lhes interessavam. Estávamos cheios de trabalho.
Campanha TEDx Youth@Aveiro (2010)
2 - Eram diferentes os tempos de há uma década atrás? O que é que para ti mais se modificou nesta indústria em Portugal?
:: Sinceramente não sei se lhe podemos chamar indústria! Sinto que a área está a crescer mas ainda vejo pouca produção, vejo pouca quantidade e pouca aposta. Há 10 anos atrás, existiam empresas multimédia com dezenas ou centenas de funcionários. Hoje acho difícil isso acontecer em Portugal. Existem mais empresas e mais freelancers no mercado. São empresas de poucas pessoas que subcontratam serviços especializados quando precisam. Este é o modelo de negócio hoje, e potencialmente, é o que resulta melhor.
A ultima década serviu essencialmente o processo de evangelização. Foi preciso ver para querer. As empresas começaram aperceber-se de que investir em comunicação e marketing digital era necessário. O acesso a novos mercados, o acesso a ferramentas de troca de informação em tempo real, a aposta em marcas próprias e a aposta em estratégias de comunicação mais inovadoras foram o resultado. Hoje já existe um maior cuidado em termos de investimento.
No ensino também temos muitos cursos mas, sinceramente, se as pessoas que os dão não tiverem experiência na área a coisa torna-se rapidamente muito teórica. Precisamos de professores que tenham posto (ou que ainda ponham!) a "mão na massa". Existem alguns cursos nestas áreas, mas julgo que estão demasiado adaptados à realidade da “indústria” em Portugal, ou seja, podemos chamar-lhes cursos de iniciação.
Campanha Cool Haven (Dezembro 2011)
3 - Em que áreas trabalha a Dreamlab? Porquê esta diversidade, e não uma especialização?
:: Durante os primeiros anos da Dreamlab eu fazia um pouco de tudo. Fazia angariação, criava propostas de orçamento e a proposta criativa, negociava valores e acabava por desenvolver o projecto (principalmente se fosse relacionado com 3D ou vídeo). Apesar de ser uma abordagem errada, de certa forma, essa experiência foi algo que me enriqueceu, principalmente em termos de gestão de projecto e na relação com os clientes.
Para além da parte de gestão e supervisão de projectos eu também coloco as mãos na massa. Trabalho maioritariamente em composição de vídeo e motion graphics. Comecei por trabalhar em 3D mas à medida que fomos contratando pessoas para ajudar nessa área eu fui-me dedicando mais à parte de composição, motion design e vídeo (realização/filmagem/edição).
Diria que 40% do meu tempo é dedicado a gestão e 60% é produção... sendo que a percentagem de gestão está todos os anos “assustadoramente” a subir mais... eu bem tento equilibrar as coisas, nem que seja produzindo alguns projectos pessoais. A minha luta diária é esta, entre o meu "eu" gestor vs o meu "eu" criador.
A questão da diversidade da empresa ao nível de projectos tem a ver com o facto de que cada vez mais a linha entre disciplinas, dentro da produção multimédia, se estar a dissipar. Hoje se virmos um site com 3D ou vídeo é algo normal. A área de programação pode servir para web como para mobile e o design tem de estar preparado para conseguir criar e adaptar soluções para esses diferentes outputs.
Eu julgo que é bom termos uma equipa base com esta diversidade de know how, de maneira a conseguir dar resposta. Mesmo que no final tenhamos que subcontratar alguém tecnicamente mais especializado para executar determinada situação. Eu gosto do controlo em tempo real. Testar coisas. Julgo que não seria possível se a equipa não estivesse disponível ou fosse menos polivalente.
Vídeo Institucional PLM (2011)
5 - Como é que uma empresa no campo criativo, consegue trabalhar com o vosso ritmo estando fora das duas grandes cidades?
:: Cada vez mais o local onde a empresa se localiza é irrelevante para o seu sucesso. O que conta é o seu trabalho, é o seu portfólio e se é eficaz ao nível da sua promoção. Felizmente já temos um leque de projectos interessantes que ajudam a dar credibilidade e a fazer com que muitas empresas venham ter connosco. E isso foi algo interessante de ver acontecer; quando os clientes nos começaram a procurar. Normalmente estavamos habituados ao contrário.
A nossa tentativa de fazer trabalhos acima da média, o tentar fazer algo que se diferenciasse, a constante aprendizagem e a aposta em testar novas técnicas, (aplicando-as nos projectos dos nossos clientes)... tudo isso compensou e marcou a diferença em termos do nosso sucesso.
Não vou dizer que tudo correu bem porque seria mentira. Investimos muito nos primeiros anos da empresa para construir um bom portfólio. Sem ele nunca seriamos credíveis para o outro tipo de clientes que nos interessava... as agências de comunicação e clientes de maior estatura.
Também acho que o nível de vida é mais caro nos grandes centros urbanos como Porto e Lisboa e isso implica que os salários tem de ser mais elevados, aumentando os custos para as empresas. Para nós isso é uma vantagem porque em Aveiro temos uma qualidade de vida excelente e com custos relativamente mais baixos. Isso reflete-se nas facturas dos clientes o que faz com que a procura aumente e comece a sair dos grandes centros.
Campanha Hotel Moliceiro (2011)
6 - O que é que falta em Portugal, para avançarmos mais nesta área em termos de indústria? Financiamento do estado, elevação da cultura de exigência de qualidade dos trabalhos criativos?
:: Em minha opinião, se se pudesse minimizar o impacto do estado em Portugal e nas empresas em particular, acho que isso iria resolver muitos problemas. Sinceramente acho que a dependência do estado é um dos grandes problemas do nosso país. Torna as empresas preguiçosas e a consequência é a degradação da qualidade dos seus serviços. Se existissem apoios acho que deveriam ocorrer em moldes diferentes dos que existem agora, que acho que são demasiado burocráticos e lentos. Por vezes isso pode matar uma empresa ou projecto.
Por outro lado, na realidade, desde que esta história da crise começou, eu tenho sentido um acréscimo ao nível da qualidade de trabalhos na nossa área. As empresas estão a esforçar-se mais e a tentar agarrar os clientes a todo o custo. Acho que os clientes já não compram qualquer coisa.
Julgo que o processo de evangelização ainda não acabou. Simplesmente está a passar por uma nova fase. A fase de linguagem de iniciação já passou, agora temos de passar para uma linguagem mais profissional e consequentemente, internacional. Esta situação talvez seja mais evidente na área de VFX e 3D. Julgo que ao nível de multimédia para web, marketing digital, publicidade e até no cinema tradicional, estamos muito bem. No caso do cinema acho que só falta mais apoio financeiro. Existem bons “storytellers” em Portugal.
Campanha Granorte (2011)
7 - A indústria na área em Portugal é unida? As empresas conhecem-se, comunicam, dialogam sobre os problemas que enfrentam, partilham abordagens, ideias ou nem por isso?
:: Aquilo que sinto é que a maior parte das empresas se conhecem minimamente. Julgo que as pessoas também se conhecem porque é fácil expor o trabalho e ligar-se a outros profissionais da área. Julgo que o facebook e grupos de discussão e alguns eventos da área facilitam tudo isso. Agora, se me perguntas se são unidas e falam dos problemas da área? Isso não me parece que aconteça. Ou melhor, dos problemas falam, não falam é de soluções.
Julgo que há falta de confiança entre as empresas, medo de se abrirem um pouco mais, medo de perderem clientes e claro Infelizmente também existe muita mediocridade no mercado. Julgo que isto acontece em todas as áreas, só que na nossa, infelizmente, acontece demasiado. Eu costumo dizer que hoje em dia toda a gente é realizador, toda a gente é editor, toda a gente é designer... como é que identificamos o verdadeiro profissional? Se eu tenho uma DSLR topo de gama isso quer dizer que eu faço filmagens profissionais? No final não se lembram de que quem vai sofrer mais com isso, para além do cliente, é a própria indústria que acaba por perder confiança, respeito e força.
Julgo que falta maior diálogo e acordo entre empresas. Julgo que até deveriam de existir algumas directrizes na indústria. Dou um exemplo prático, o das propostas criativas que se preparam para os clientes. Porque é que não se cobram as propostas (pitch)? Às vezes demoramos dias a prepará-las. É trabalho duro! E o cliente por vezes coloca várias empresas a disputar as contas. Para no final dizer que o projecto vai ficar em stand by. Parece-me abusivo e julgo até que é uma falta de respeito por quem trabalha nesta área. Eu julgo que é uma liberdade que o cliente deveria deixar de ter. O meu ponto de vista é que acaba por ser trabalho de consultoria e o cliente vai ser o único a beneficiar destas análises ou propostas... sem custos!
Acho que também faltam mais eventos especializados em Portugal. E no caso de VFX vai existir só em sonhos... como não existe indústria não existem eventos. Temos de mudar isso. Temos de importar know how e exportar este tipo de serviços e projectos. Filmes, séries, curtas... Também acho que deviamos promover uma maior ligação com os estabelecimentos de ensino. O mercado (global) normalmente é quem dita a oferta de ensino. Provavelmente parte destas produções poderia partir de parcerias com universidades e empresas da área.
Campanha Salinas Village (2010)
8 - Ter pessoas em regime de freelance, parece ser uma necessidade imperiosa nesta área, porquê?
:: Julgo que existem freelancers muito talentosos e experientes que podem ser uma ajuda preciosa em determinadas situações. Muitos deles até bastante conhecidos porque têm estilos muito específicos e o cliente quer algo parecido. Alguns deles até tentaram criar a sua própria empresa e alguns meses depois desistiram da aventura alegando que se estavam a perder demasiado na parte de gestão e a focarem-se menos na parte criativa... nessa altura eu só pensava "welcome to my world ".
Manter pipelines de produção complexos é extremamente difícil. E não é só em Portugal. Já é normal ouvirmos notícias de estúdios que abrem filiais na Índia ou no Canadá dispersando as equipas de produção. Ou então parcerias entre estúdios especializados em áreas distintas a trabalharem contas conjuntas. A união é a força! Tem de existir um ponto forte em cada empresa. Por isso é que vemos empresas que são procuradas especificamente pelos seus trabalhos de character animation, ou pelos trabalhos de fluid simulation, ou motion design, ou fotografia... etc.
O conceito de especialização é muito importante mas acho que o de diferenciação ainda é mais. Andam ambos de mão dada. Julgo que esse é o único caminho a seguir. Isto porque não é o facto de sabermos fazer bom character animation, ou bons motion graphics, que nos vai safar, temos de o fazer de forma diferente dos outros... e de preferência melhor!
Memory Status: Infinite (2010), projecto pessoal de Diogo Valente
9 - Em termos genéricos os clientes, procuram vídeos com VFX/3d, ou querem apenas um vídeo que transmita o produto? Ou seja, apresentam requisitos para ideias que são apenas possíveis com VFX, ou isso tem sido mais vocês a fazer o esforço da pedagogia das novas tecnologias?
:: Esse trabalho é mais nosso. A grande percentagem de clientes normalmente não sabe o que quer. Ou melhor, existem aqueles que sabem que precisam de um site, ou de um vídeo mas não sabe como transpor isso para um nível mais estratégico. Depois existem os outros que têm a estratégia mas não sabem como a transpôr de forma visual.
Em ambos os casos esperam que nós apresentemos melhorias ou alternativas. Os VFX/3D são quase sempre sugeridos por nós. Na maior parte dos casos esperamos pelo cliente ou projecto certo para implementarmos ou testarmos determinadas técnicas.
Non-Linear Space (2011), projecto pessoal de Diogo Valente
10 - Para ti enquanto Director Criativo da Dreamlab, o que é que te dá mais gozo fazer?
:: É uma pergunta difícil e não devia ser! Como falei acima, eu divido o meu tempo entre gestão e produção. E em ambas as partes existem coisas que gosto de fazer.
Ao nível de gestão gosto da parte criativa. Gosto de me reunir com o cliente e falar com ele, perceber o que ele pretende e principalmente surpreendê-lo. Gosto de resolver os problemas de comunicação e das reuniões criativas com a equipa. É algo que dá muito gozo. Gosto de criar as condições para que a equipa consiga ter ideias. O facto de ser director criativo não significa que só eu é que tenho as ideias. Pelo contrário, existe muito trabalho de equipa.
Ao nível de produção, eu gosto principalmente de trabalhos que envolvem integração de CGI com imagem real. Esse tipo de projectos sempre me atraiu. São projectos que envolvem quase tudo: filmagem, tracking, 3D ou motion design, animação, composição.. etc. E julgo que é isso que me atrai neles, o facto de que para que a cena resulte necessites de conjugar know how de várias disciplinas. É a união de tudo. Até de questões mais estéticas como o design, a forma, a composição. Para mim é o cruzamento perfeito entre o técnico e o artístico.
Vídeo institucional DETI / UA
11 - Qual o trabalho mais complexo que realizaste na Dreamlab, podes dar-nos detalhes da complexidade e do problema?
:: Sinceramente não consigo precisar nenhum em particular, todos tiveram um desafio específico mas julgo que posso destacar o projecto do DETI (Departamento de electrónica da Univ. de Aveiro) foi um dos mais complexos tecnicamente.
Fizemos concept design de robôs, filmagens com "actores" (que eram alunos do DETI, ou seja, não eram actores!) que interagiam com algo virtual, fizemos levantamento fotográfico dos locais, incluindo HDRs para iluminação e reflexão. O número de cenas e a quantidade de robôs envolvidos foi megalómana para uma equipa de 4/5 pessoas. Desde a modelação, tracking 3D, texturização, animação e composição de vídeo... Acho que neste caso só faltou character animation e algum tipo de simulação para ter um pouco de tudo.
Levámos tudo até onde pudemos e julgo que o resultado foi interessante e importante para nós. Percebemos que a nossa pequena equipa conseguia fazer trabalhos de topo ao nível de VFX.
Video clip Always Remember (2011), projecto pessoal do Diogo Valente
12 - Como é que uma pessoa se prepara para dar resposta à inovação tecnológica nas indústrias criativas, chega fazer um curso superior?
:: Na minha opinião o curso superior não chega. Muitos dos meus melhores colaboradores não tinham sequer curso superior. Para dar resposta à inovação tecnológica julgo que simplesmente temos que competir com os melhores. Temos de estar atentos para não sermos ultrapassados e temos de ser mais experimentalistas. A cultura do erro é a chave! Temos de ter margem para errar e aprender com isso. Neste momento a “indústria” em Portugal não tem grande margem para erros, e isso é um problema.
Também acho que aqueles que vão lá para fora deveriam voltar, trazendo novas competências para o país e tentar implementá-las cá.
Campanha Decenio (2011)
13 - O que aconselhas ao pessoal que está a sair das universidades com vontade de trabalhar nestas áreas criativas, devem criar a própria empresa? Devem especializar-se, ou dominar o máximo de tecnologias?
:: Na minha opinião, hoje, se fosse eu a sair da universidade não formava empresa de imediato. Eu preferia ganhar alguma experiência de trabalho primeiro. Acho que isso é que me iria ajudar a perceber se de facto é aquilo que quereria fazer e iria também perceber em que área é que potencialmente seria mais forte e poderia dar mais cartas. Ninguém é bom em tudo.
É vantajoso poder ter uma veia genérica e poder dar uma ajuda em diferentes áreas ou disciplinas mas é importante especializarem-se numa ou duas em particular. Só dessa forma é que se irão conseguir destacar/diferenciar do resto da concorrência.
E atenção, nem sempre a nossa vocação está na parte de produção técnica. A parte de gestão e supervisão é algo muito importante e necessário. Eu acho que até pode ser aquela que mais falta faz ao mercado neste momento. Se têm boas "people skills" e percebem o suficiente da parte técnica podem ter uma vantagem sobre colegas tecnicamente mais bem preparados mas que não conseguem gerir bem projectos ou lidar com pessoas.
Campanha própria, Basta Acreditar (2012)
14 - Quais são as 3 características humanas que mais valorizas numa pessoa quando precisas de contratar alguém?
:: Paixão pelo que faz, empenho e espírito de entre-ajuda, coragem para arriscar, pro-actividade... são mais do que 3 mas estão todas interligadas.