agosto 23, 2007

PSP nas Universidades

A Sony vai disponibilizar um kit de desenvolvimento de videojogos para a plataforma PSP para fins educacionais. Anunciado por Sarah Lemarié durante a conferência Games:Edu - Games Education Conference 2007. Para já este anúncio diz respeito às zonas da Europa e Austrália e vem no rasto do acordo que existia sobre desenvolvimentos em ambientes Linux para a PS2.

Julgo que está aqui uma óptima oportunidade para poder colocar os alunos a desenvolver projectos com grande motivação. Uma vez desenvolvido o jogo, este pode ser jogado numa plataforma de videojogos proprietária de grande alcance demográfico. Aos interessados no desenvolvimento de um possível programa de ensino, em cooperação em Portugal ou estrangeiro, tendo por base esta nova tecnologia agora disponibilizada, enviem-me um e-mail (nzagalo[at]ics[dot]uminho[dot]pt).

agosto 22, 2007

Steiner, os livros e a escrita


O Silêncio e os Livros. Curto ensaio publicado na revista Esprit sob o título La haine du livre e agora lançado no formato livro e em português pela Gradiva. Steiner sintetiza a História do livro, dos seus defensores e detractores. Apresenta um discurso em defesa do conhecimento oral. Contudo, julgo que o Livro não é apenas um apanágio da ficção ou filosofia e aqui a abordagem de Steiner perde alguma coisa. É verdade que, o conhecer de "cor(ação)" um livro, eleva o valor do conteúdo e enriquece-nos, mas a verdade é que Steiner parece falar-nos de um romantismo próprio do século XIX, muito longe da realidade tecnológica do século XXI. Não pela evolução da internet ou televisão, que ele até refere, mas porque sem o livro, sem a escrita, sem a permanência do que se escreve, não existiria ciência, no seu sentido cartesiano. Como replicar uma experiência que se conhece de cor mas que cada vez que se transmite oralmente sofre, ainda que ligeiras, alterações. O método científico, pai de toda a tecnologia moderna, só foi possível graças ao aparecimento da escrita que permitiu que se depositasse a informação num suporte inalterável passível de ser facilmente transmitido e interpretado. Passível de ser "absorvido" como base para novos estudos que fizessem progredir o state-of-the-art das pesquisas em curso. Avançar, ir além, desenvolver e implementar novas tecnologias só foi possível graças ao aparecimento da escrita que contribuiu de forma inexorável para aquilo que a sociedade é hoje. Podemos pensar e estabelecer um paralelo entre aquilo que foram as civilizações tecnologicamente avançadas do passado como os Maias ou os Egípcios e ver que só o foram, porque em parte se socorreram da escrita.
“(a) escrita debilita o poder da memória (..) aquilo que fica escrito e que, portanto, pode ser armazenado, já não precisa de ser confiado à memória” (Steiner, 2005:15)
Pois é. Numa primeira leitura, apelará facilmente ao romantismo, mas a verdade é que o que acontece é exactamente o contrário. A escrita permitiu expandir a memória e ao funcionar como prolongamento dessa mesma memória - as extensões de McLuhan - permitiu libertar-nos para a criação de muito mais mundo, mais ficção e mais tecnologia.

Aliás neste mesmo sentido, uma das coisas que sempre me incomodou e deixou bastante triste com a humanidade foi a destruição da Biblioteca de Alexandria. Seria o nosso mundo como é em 2007 se esta destruição de memória não tivesse ocorrido? A sociedade dessa altura poderia ter evoluído em poucas centenas de anos para niveis provavelmente próximos dos de hoje sem necessitarmos de atravessar um deserto de quase 2000 anos. A escrita, mas fundamentalmente o livro, são os responsáveis máximos por estes últimos 150 anos de evolução tecnológica, sempre assentes nas descobertas científicas. Claramente tivemos Galileu, Descartes, Newton mas tiveram de lutar contra uma sociedade que vivia num mundo de poucos conhecimentos e onde o pouco que havia era controlado por uma igreja assente sobre dogmas e parábolas. Foi o livro que permitiu que o conhecimento se espalhasse e se expandisse para lá das fronteiras da religião. Mas é mesmo o próprio Steiner quem vem dar razão a todo este modo estruturante da nossa sociedade, quando afirma
"...a nossa herança intelectual e ética, bem como a leitura que fazemos da nossa identidade e da morte, vêm-nos directamente de Sócrates e Jesus de Nazaré. Nenhum deles, contudo, fez questão de ser autor e muito menos de ser publicado" (Steiner, 2005:9)
É verdade que nenhum deles foi autor, mas também é verdade que nenhum deles representaria hoje o que representam se não tivesse existido Platão ou Paulo. É verdade que Sócrates e Jesus nos iluminaram o caminho partindo de um quase vazio e apresentando todo um pensamento de uma extrema fertilidade capaz de subjugar as mentes mais inteligentes socorrendo-se do discurso directo, oral, que potenciavam na forma da sua linguagem corporal e na acção.

agosto 19, 2007

pela estabilidade do abstracto

O artigo de Boaventura Sousa Santos publicado na Visão de 02.08.2007 evidencia através de uma simples frase o processo do que está por detrás da importação do modelo de Flexisegurança, da Dinamarca, apresentado como a grande solução para todos os problemas.
Vivemos um tempo em que a estabilidade da economia só é possível à custa da instabilidade dos trabalhadores, em que a sustentabilidade das políticas sociais exige a vulnerabilidade crescente dos cidadãos em caso de acidente, doença ou desemprego. Esta discrepância entre as necessidades do “sistema” e a vida das pessoas nunca foi tão disfarçada por conceitos que ora desprezam o que os cidadãos sempre prezaram ou ora prezam o que a grande maioria dos cidadãos não tem condições de prezar.
Tão simples e directo. Nem sempre tenho estado de acordo com algum discurso mais radical de Boaventura Sousa Santos mas aqui não poderia estar mais de acordo com a síntese do seu pensamento sobre o assunto. Realmente para aqui caminhamos, para o reino da obediência à abstracção numérica em desfavor da rede social e da condição humana. Neste artigo BSS desmonta ainda a ideia lírica de uma sociedade construída na base da "autonomia individual" . Se à primeira vista poderíamos pensar que esta é uma capacidade própria para quadros superiores, BSS vai mais longe, vai ao âmago da questão, defendendo que nem todos funcionamos da mesma forma e nem todos procuram a realização pessoal a todo o custo, muito menos no campo do trabalho.

Desenvolver sistemas de massas que se regem por extremos é meio caminho andado para a ruptura da coesão social. Aqui o extremo é bem evidente, se no comunismo o extremo era por baixo, baseado na nivelação dos mesmos objectivos para todos. Aqui nivela-se pelo extremo superior no qual o objectivo é o céu, e só quem adoptar um posicionamento maníaco-obsessivo em relação aos objectivos poderá obter reconhecimento do movimento em questão.

agosto 03, 2007

Fantasia e Criatividade

A Edições 70 lançou em Portugal, no mês de Junho passado, mais um belíssimo livro de Bruno Munari, Fantasia (1977). Alguns poderão questionar, quem é Bruno Munari? E para essa questão prefiro deixar-vos apenas com a seguinte citação,
"Bruno Munari is one of the most influential designers of the 20th century. Not because he has imposed a particular style or look, but because he has encouraged people to go beyond formal conventions and stereotypes by showing them how to widen their perceptual awareness" (Kate Vingleton, International Herald Tribune).
Neste livro, Munari procura definir o modo como desenvolvemos a criatividade, a partir do que é que a fantasia se constrói e do que necessita a arte para ser arte. Assunto complexo enredado em alguns tabus, tais como, a subjectividade não é decifrável ou os modos de desenvolvimento de arte não são compatíveis com os métodos científicos. Mas Munari não se deixa abater e procura respostas, coloca no papel as suas ideias e acima de tudo dá forma visual aos conceitos que vai debatendo ao longo do livro.
O Pensamento pensa e a Imaginação Vê (2007, pág.21)

A partir de uma desconstrução do modo de funcionamento da inteligência integrado com a memória desenvolve um possível modelo explicativo do modo de criação artística. A base desta visão passa pelo modo como a inteligência funciona, segundo o modelo associativo de ideias que se socorre de uma boa base de dados (a memória) para inventar ou imaginar a fantasia. Nesse sentido, Munari defende que quanto maior for esta base de dados, ou seja quanto mais conhecimento diversificado se possuir, maior será a facilidade de desenvolver a criatividade. Contudo não chega a base de dados, é necessário algo mais, e Munari refere isso mesmo. O que falta em certa medida, neste livro, apesar de ser uma teorização já mais própria para um texto de psicologia, é mesmo uma melhor abordagem do modo como se executa essa associação de ideias, eventos ou conceitos. Para além disso, como é que se têm noção que essa associação é válida, ou seja, é uma fantasia com valor para o "mundo externo". Apesar de tudo, vale a pena, antes de mais porque o próprio livro representa em si mesmo um excelente contributo e acrescento à nossa base de trabalho criativo por todos os exemplos que Munari vai trabalhando ao longo do livro e que desconstrói não apenas em texto mas em imagens.

agosto 02, 2007

desenvolvimentos na área do authoring 3d

O projecto Alice existe desde 1997, começou como um projecto de investigação na Carnegie Mellon University (CMU) e existe ainda hoje já sob o nome de Alice 2.0 e com um grupo de pessoas a trabalhar a tempo inteiro sob a direcção de Randy Pausch. O projecto Alice tem sido financiado pela National Science Foundation, DARPA, Intel e Microsoft. O objectivo de Alice foi desde o início o de permitir a qualquer sujeito, sem conhecimentos de programação, desenvolver histórias interactivas em ambientes 3d. Para tal desenvolveram um tipo de programação de autor que definiram de no-typing fazendo uso de uma interface de drag-and-drop para a construção de animação e interacção (ver imagem em baixo). Ou seja, não é necessário escrever código, as acções possíveis de executar no ambiente de Alice aparecem-nos em menus que podem ser arrastadas directamente para os objectos do ambiente onde se pretende que a acção seja executada.


Interface drag-and-drop de Alice

No ano passado em Março, a CMU assinou um protocolo com a Eletronic Arts (EA) para a re-escrita do software de base Java e a re-utilização dos recursos de arte do videojogo Sims 2 nos ambientes de Alice que passará chamar-se Alice 3.0. Sendo um projecto a 2 anos, desde então pouco se ouviu falar do software deixo no entanto aqui a transcrição das mais recentes novidades obtidas na comunidade de Alice, nomeadamente no modo de programação da nova versão.
We are making good progress with Alice 3.0 development; however, the only estimate we are comfortable giving as of now is that it will be released in 2008. Alice v3.0 is still under development, but here is what we can tell you now:

The "programming language" of Alice v3.0 will be Java. Said another way,Alice v3.0 is an IDE for Java that has been optimized for learning to program. If teachers want to use Alice v3.0 with a "totally keyboard based experience," they can do that. We will provide a drag-and-drop interface, similar to Alice v2.0, which will be able to display the code either as Java, or in a more simplified form, like the current Alice v2.0 default presentation.

Therefore, the "Alice v3.0 experience" can feel very much like the Alice v2.0 experience. Whether one is typing or drag-and-dropping, Alice v3.0 will read, write, and execute real Java programs, so one can mix & match a typing or drag-and-drop experience.

Alice v3.0 will provide mechanisms to control the 3D characters from the Sims, which EA has graciously provided. Students will be able to control Sims characters whether they use drag-and-drop or type to create their worlds/programs.
Gabe, CMU, 11.07.2007

Mas até mais surpreendente que esta ligação à EA e o incremento de qualidade que se adivinha é verificar a quantidade de textbooks dedicados à plataforma e de notar que grande parte deles datam de 2007 e alguns estão ainda só anunciados para 2008. Isto demonstra que existe aqui uma clara apetência do mercado por estas novas possibilidades no que toca ao desenvolvimento de histórias interactivas em ambientes virtuais.

agosto 01, 2007

interacção sem click


Apesar de ser um projecto já de 2005 não resisto a deixar uma nota aqui sobre o brilhantismo, não só da ideia, mas na capacidade da sua implementação. Existe aqui realmente algo que nos pode abrir portas para novas formas de interacção que julgo estar na altura de começarmos a explorar. Apesar de estarmos aqui num ambiente bidimensional não deixa de me fazer reflectir sobre o que será o Second Life dentro de algum tempo, quando a loucura se tiver consumido. Julgo que é aqui, no modo de interacção com a representação, que está o caminho para novos desenvolvimentos e manutenção do interesse dos utilizadores nas plataformas de ambientes virtuais.

Quanto ao DONTCLICK.IT representa o projecto de conclusão de licenciatura de Alex Frank no curso de Design de Comunicação na Universidade de Essen-Duisburg, Alemanha. Não posso dizer que a interface aumente o desempenho na realização de tarefas, porque de uma forma geral não o faz, acima de tudo peca pelos tempos de execução. Mas melhora imenso ao nível da promoção da informação visual impossibilitando o tornando mais difícil a informação linear ou dissimulada por debaixo de um click.

destaque na hora da morte

à esquerda, edição de 31.07.2007; à direita, edição de 01.08.2007

Se não tivessem morrido no mesmo dia e com espaçamento noticioso de um dia, será que Antonioni não teria tido direito ao mesmo tratamento que teve Bergman por parte da imprensa. Enquanto Bergman teve direito ao topo da manchete e com um preenchimento da mancha da ordem dos 70% no Público de 31 de Julho e com 4 páginas interiores. No dia seguinte o Público dedica na sua manchete apenas a parte inferior, ocupando cerca de 40% da mancha total e tendo no seu interior apenas 3 páginas.

Mais em detalhe, a capa de 30.07 é uma capa de cariz artístico, socorre-se do espaço do logo, destaca o nome do realizador em letras de primeiro nível, brancas sobre um fundo extenso negro. Já a de 31.07, reassume o traço visual informativo e relega Antonioni para um segundo plano noticioso, como que a dizer-nos, "já ontem dedicámos o espaço ao cinema, por isso hoje voltemos ao mundo do real". Não que as noticias sobre o Darfur me desmereçam valor, mas é evidente que o destaque dado às noticias do P2, no topo, eram perfeitamente dispensáveis, tal como tinha sido com Bergman. Antonioni está ao nível de Bergman e sobre isso não devem restar quaisquer dúvidas.

Apesar de tudo, não posso deixar de reconhecer que o Público deu o destaque desejado e merecido a ambos ao contrário de outra imprensa que parece continuar a preferir relegar a cultura para os cantos em detrimento do crime ou mexerico político. Agradeço também o facto de terem publicado parte dos textos aqui dedicados a Bergman e Antonioni, nas folhas do jornal na rubrica Blogues em papel (1 e 2).

julho 31, 2007

Novos Media 07 | Second Life

O workshop Novos Media 07, inserido no 5º Congresso SOPCOM, vai realizar-se a 5 de Setembro próximo, na Universidade do Minho, com a temática do Second Life (SL).

A iniciativa, que conta com a colaboração de investigadores das Universidades de Aveiro, do Minho, da UTAD e Porto, bem como da empresa Beta Technologies, desdobra-se em dois tempos autónomos: de manhã, o workshop terá um carácter mais aberto e expositivo; a tarde será dedicada à formação sobre 'Desenvolvimento em Ambientes SL'. Nesta parte, os participantes, em número restrito, trabalharão em laboratório.

As inscrições podem ser feitas apenas para o período da manhã ou para todo o dia através do preenchimento de ficha própria. Para qualquer dúvida ou esclarecimento, há um contacto de e-mail: nm07secondlife@ics.uminho.pt. Para acompanhar esta iniciativa foi criado o blogue Novos media 07 | Second Life.

Ciao Michelangelo

A sétima arte perde no mesmo dia dois consagrados monstros europeus. Ainda ontem tinha aqui deixado o pesar pela morte de Bergman e eis que hoje a sua mulher, Enrica Fico, dá a conhecer ao mundo que afinal morreu, ontem também, Michelangelo Antonioni.

Antonioni criou todo um modo expressivo próprio de comunicar através da câmara. Não tão genial na transformação em formas visuais do espaço íntimo introspectivo e cognitivo como Bergman, mas melhor na criação dos ambientes e principalmente das atmosferas onde se encaixavam na perfeição os seus personagens. A imensidão dos espaços abertos combinados com os silêncios "rítmicos" fazem de algumas das suas obras, marcos de referência intemporais, onde sempre se volta para inspirar criatividade e inventividade. Desde Avventura, L' (1960) a Deserto rosso, Il (1964) passando pelo brilhante Blowup (1966) e desembocando naquele que é para mim o seu expoente máximo Professione: reporter (1975). Antonioni teve uma carreira dividida entre o mercado europeu e americano e porventura isso poderá fazer dele um dos autores que melhor soube fazer uso da criatividade e originalidade europeias com a grande tecnicidade de contar histórias do cinema americano.

Como pensador profundo da arte fílmica Antonioni deixa-nos algumas ideias que foram sendo publicadas em entrevistas e que aqui deixo apenas em formato de citação. Nestas citações pode ver-se a preocupação de construção do set, que para ele envolvia ambientes e personagens num todo.
I mean simply to say that I want my characters to suggest the background in themselves, even when it is not visible. I want them to be so powerfully realized that we cannot imagine them apart from their physical and social context even when we see them in empty space.

Till now I have never shot a scene without taking account of what stands behind the actors because the relationship between people and their surroundings is of prime importance.

You know what I would like to do: make a film with actors standing in empty space so that the spectator would have to imagine the background of the characters.

Mais informação sobre Antonioni
- Biografia na Senses of Cinema, por James Brown
- Chatman, Seymour, (1985), Antonioni, or, The Surface of the World, University of California Press