Brown realiza no vídeo um trabalho sobre as motivações e contextualização do criador de “The Last Guardian”, Fumigo Ueda, trazendo para a discussão os seus dois anteriores videojogos, “Ico” (2001) e “Shadow of Colossus” (2005). Mas é na comparação com outros jogos, também bastante relevantes no campo dos videojogos narrativos — “Enslaved” (2010) "Bioshock Infinite" e "The Last of Us" (2013) — que Brown vai alcançar a principal conclusão deste pequeno ensaio vídeo. Opto por então citar o excerto principal do ensaio, e juntar ao mesmo partes do meu texto, acima referenciado:
“ Each artistic medium has its own unique language, painting uses the language of shape and colour, music is an exploration of sound, literature uses the language, of language, and film is about moving image. Videogames, can of course use all of this stuff...” (Brown, 2017)
"O videojogo contém em si mesmo tudo aquilo que o cinema contém, por isso nos interessa perceber o que o cinema alcança. É para nós claro que antes de surgir o cinema enquanto meio de expressão, e não mera tecnologia, tivemos o teatro. O cinema não é mais do que o resultado da plastificação do teatro, sob o desígnio expressivo da fotografia. Depois de termos conseguido melhorar a tecnologia de suporte ao registo da realidade, nomeadamente termos conseguido passar a fotografar a realidade várias vezes por segundo, o passo seguinte foi apontar essa possibilidade de registo para um palco de teatro. O objectivo primeiro foi o registo apenas, depois descobriu-se o seu potencial para transformar a comunicação teatral em tempo real e presencial num novo modo assíncrono e à distância. A pintura distanciou-se do retrato da fotografia, mas o teatro viu nesta, todo um novo mundo de possibilidades expressivas. Com o tempo a arte teatral que era registada por câmaras, agora condicionada por variáveis de distância e tempo diferentes, passou a trabalhar de forma diferente. Era agora possível num curto espaço de tempo mostrar mais do que um cenário, era possível mostrar mais perto ou mais longe, era possível contar histórias não apenas baseadas nas ações dos atores, mas também baseadas na forma e tempo como eram mostradas essas ações. Ou seja, tínhamos criado a montagem, e com ela nascia a essência narrativa do cinema” (Zagalo, 2013)
“but what makes the medium unique is interaction, things like mechanics, rules and systems, you can poke at and tell the language of videogames.” (Brown, 2017)
“É na interatividade que os videojogos se distanciam claramente do cinema. Se o cinema faz da montagem o seu motor de storytelling principal, os videojogos fazem da interatividade o seu centro nevrálgico de expressividade. Na literatura o autor “conta”, em texto, o que tem para dizer, já no cinema o autor não deve contar, mas antes “mostrar” o que tem para dizer. Nos videojogos o autor não conta, nem se limita a mostrar, antes leva o receptor a “fazer”. Ou seja, o receptor só compreende a mensagem contida na narrativa, realizando as ações pedidas pelo autor da obra. Estas ações são o centro narrativo do videojogo, e servem para conduzir o jogador de receptor a ator” (Zagalo, 2013)Para demonstrar estes pontos, Brown concentra-se no momento do videojogo "The Last Guardian" em que Trico quebra as regras que o próprio jogo tinha apresentado como parte integrante daquela realidade. Trico não pode ir contra os vidros coloridos, nada o faria nunca ir contra tal, até ao momento em que algo faz, algo inesperado, algo que se constitui parte de toda a interação desenvolvida por nós com Trico. A quebra da convenção é o ponto alto da fuga à essência de jogo, em que “The Last Guardian” se dá totalmente à narrativa. Ao sobrepôr a história à regra, o jogo deixa de o ser, passa de design a arte, dado que assume a expressão como mais relevante que aquilo que o constitui. E tudo é feito através de pura interatividade.
Ensaio "The Last Guardian and the Language of Games" (2017) de Mark brown
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