“Hipopotamy” é uma daquelas obras que dificilmente aqui traria dado o modelo de choque usado para trabalhar o tema em questão, mas se o faço é porque não só apresenta uma elevada qualidade formal, mas também porque essa mesma qualidade acaba por nos obrigar a todo um diferente posicionamento face ao tópico e ao que no fundo nos é apresentado.
Ou seja, o filme trata de forma sintética a violação sexual associada ao domínio de espécie, chegando a incluir o infanticídio, posicionando-se a partir da condição biológica. Neste sentido, pela frontalidade e assunção do condicionalismo humano acaba por retumbar num aparente niilismo, e é isso que mais choca. Por outro lado, o modo como o tema é trabalhado em termos visuais, de movimento e musical cria em nós um estado de tão grande atenção e foco, que torna impossível ficar apenas por essa camada da aparência. A força estética da animação obriga-nos a trabalhar, obriga-nos a procurar sentido, a dar significado, impede-nos de nos resignar como aparentemente o filme nos parece pedir, e é aí que acaba por residir talvez o grande segredo da sua força, originalidade, e no fundo acaba tornando o filme numa obra maior.
Para chegar a este ponto contribuem vários fatores, desde logo o realizador, Piotr Dumala, autor da adaptação para animação de “Crime e Castigo” (2000) de Dostoyevsky, que desenvolve todo um cenário e conjunto de ações de tom minimal, no qual explora os temas sem vulgaridade, criando algo mais próximo de um bailado do que de um mero relato. Este bailado acaba sendo fortemente enfatizado por toda a composição musical, operática, de Alexander Balanescu, o mentor do célebre Balanescu Quartet que têm trabalhado com Michael Nyman e Philip Glass.
"Hipopotamy" (2014) de Piotr Dumala
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