abril 08, 2016

"Anna Karénina" (1877)

Confesso que vinha à procura de mais, nomeadamente porque é um livro que surge no topo de várias listas, e que raramente se encontra ausente de qualquer lista. O livro é bom, é até muito bom, mas depois de ler "Guerra e Paz" pouco daquilo que Tolstói aqui faz nos surpreende. Por outro lado a personagem principal, a sua estrutura em termos de conteúdo, apesar de bastante rica fica atrás de outras personagens do universo da literatura clássica.


Com Anna Karénina (1877) chego ao final da leitura das grandes heroínas clássicas, depois de Elizabeth Bennet (Orgulho e Preconceito, 1813), de Catherine Earnshaw (O Monte dos Vendavais, 1847), de Jane Eyre (Jane Eyre, 1847) e Emma Bovary (Madame Bovary, 1857). Europeias, representando a Rússia, Inglaterra e França, todas do século XIX, todas imensamente relevantes e ao mesmo tempo tão diferentes. Talvez o maior paralelo se possa aqui traçar seja entre Karénina e Bovary, mas de todas continuo a elevar a um patamar completamente distinto Jane Eyre.

Anna Karénina é uma personagem que vamos adorando e odiando ao longo do romance dada a sua organicidade, incerteza, e inconstância, caraterísticas próprias de verdadeiros seres-humanos mas que em termos de histórias e romances acabam contribuindo para alguma desfocagem do nosso processo de empatia. Talvez por isso existam críticos que prefiram como personagem principal da obra, em vez de Anna, Levin, espécie de alter-ego do próprio Tolstói, mas na verdade Anna é o reverso de Levin, e de certo modo passa a ideia de que esta poderá representar o grito interior do próprio Tolstói, nomeadamente em tudo o que tem que ver com todos os seus problemas com o amor e o desejo.

Tolstói acaba por na aproximação ao final evocar a fé como espécie de amor último, mas mais ainda como forma comparativa, para poder dizer da impossibilidade de compreender completamente o que é o amor. Era desnecessário, e não me parece sequer que funcione, mas é a forma de Tolstói trabalhar, sempre à procura de compreender os porquês, sempre questionando para além do questionável, e quando não encontra o que procura prossegue atrás dos comparativos. Levin não precisava de chegar àquele ponto, apesar de o servir bem, e conseguir fechar um livro trágico com uma nota otimista.

O melhor do livro são os interiores psicológicos do grupo central de personagens — Anna, Vronsky, Levin, Kitty, Dolly e Stepan — e as descrições dos seus encontros que Tolstói consegue literalmente "mostrar" através de palavras. Impressiona por vezes seguir no fluxo da descrição, ver e sentir não apenas a cena, o quadro narrativo exposto, mas tudo aquilo que percorre a mente de cada um dos envolvidos, verdadeiros momentos de puro xadrez de emoção humana.

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