julho 31, 2007

Ciao Michelangelo

A sétima arte perde no mesmo dia dois consagrados monstros europeus. Ainda ontem tinha aqui deixado o pesar pela morte de Bergman e eis que hoje a sua mulher, Enrica Fico, dá a conhecer ao mundo que afinal morreu, ontem também, Michelangelo Antonioni.

Antonioni criou todo um modo expressivo próprio de comunicar através da câmara. Não tão genial na transformação em formas visuais do espaço íntimo introspectivo e cognitivo como Bergman, mas melhor na criação dos ambientes e principalmente das atmosferas onde se encaixavam na perfeição os seus personagens. A imensidão dos espaços abertos combinados com os silêncios "rítmicos" fazem de algumas das suas obras, marcos de referência intemporais, onde sempre se volta para inspirar criatividade e inventividade. Desde Avventura, L' (1960) a Deserto rosso, Il (1964) passando pelo brilhante Blowup (1966) e desembocando naquele que é para mim o seu expoente máximo Professione: reporter (1975). Antonioni teve uma carreira dividida entre o mercado europeu e americano e porventura isso poderá fazer dele um dos autores que melhor soube fazer uso da criatividade e originalidade europeias com a grande tecnicidade de contar histórias do cinema americano.

Como pensador profundo da arte fílmica Antonioni deixa-nos algumas ideias que foram sendo publicadas em entrevistas e que aqui deixo apenas em formato de citação. Nestas citações pode ver-se a preocupação de construção do set, que para ele envolvia ambientes e personagens num todo.
I mean simply to say that I want my characters to suggest the background in themselves, even when it is not visible. I want them to be so powerfully realized that we cannot imagine them apart from their physical and social context even when we see them in empty space.

Till now I have never shot a scene without taking account of what stands behind the actors because the relationship between people and their surroundings is of prime importance.

You know what I would like to do: make a film with actors standing in empty space so that the spectator would have to imagine the background of the characters.

Mais informação sobre Antonioni
- Biografia na Senses of Cinema, por James Brown
- Chatman, Seymour, (1985), Antonioni, or, The Surface of the World, University of California Press

jornalismo e democracia

Bordertown (2006) aborda o caso real das mulheres que trabalham na cidade Juarez, México na fronteira com os Estados Unidos. A cidade de Juarez é uma cidade fronteira que por estar muito perto dos Estados Unidos constitui um excelente atractivo para a instalação da indústria americana que recruta mão de obra a preços baixíssimos. Com o boom da instalação da indústria nos anos 90, vieram os assassínios, as violações, torturas e os desaparecimentos de mulheres que ali trabalhavam em turnos. Bordertown, não é nem na forma nem no conteúdo um filme que se destaque. Rodado com um orçamento limitado por não encontrar financiamento dentro dos Estados Unidos, estreado na Europa muito antes de chegar aos USA. Contudo estes promenores de produção de Bordertown só vêem dar ainda mais valor ao diálogo que se estabelece entre a reporter e o editor do jornal de referência de Chicago.


Reporter: This is a fucking important story!
Editor: I understand that.But you are blaming... the Mexican and American governments, and the Free Trade Agreement.
Reporter: It isn't free trade! It's slave trade. It's a scam. Everybody is making too much money... to give a shit about these women.
Editor: These are very serious accusations, they're damn near criminal. And this newspaper is not prepared to make 'em... and you can't substantiate them.
Reporter: And they're true!
Editor: This is now a matter of corporate responsibility.
Reporter: Since when do you put corporate responsibility above the truth?
Editor: Get off your soapbox. I liked you better as a cutthroat reporter.
Reporter: I like you better as an editor who couldn't be bought or intimidated! A man I admire.
Editor: The days of investigative reporting... are over. The news isn't news anymore. It's as dead as the typewriter I used! Corporate America is running the show now. And their news agenda is free trade, globalization and entertainment. That's our glorious future! You know what would happen to me if I published your story on my own.
Reporter: If you don't have the balls to print my story... I will find someone who will.
Editor: It's not that easy, kid. Read your contract.

julho 30, 2007

a sair... livros MIT

Persuasive Games
The Expressive Power of Videogames
Ian Bogost

Evocative Objects
Things We Think With
Edited by Sherry Turkle

Cheating
Gaining Advantage in Videogames
Mia Consalvo

Authoring Images / Filmmaking Design

A American Cinematographer acaba de lançar mais um Special Supplement em formato digital de acesso inteiramente gratuito. Desta vez o suplemento trata a composição digital de imagens com o título AUTHORING IMAGES - The Future of Filmmaking Design. Vários textos percorrem detalhes da produção de filmes como Titanic, Star Wars, The Prestige, Pirates of Caribbean ou ainda séries TV como Desperate Housewives sempre em busca da definição de parâmetros de design da imagem fotográfica. De destacar o excelente artigo sobre o design de imagem de Blade Runner (1982)

Adeus, Bergman

Foi hoje anunciada a morte de Ingmar Bergman na sua casa na ilha sueca de Gotland pela sua filha Eva Bergman. Face a esta notícia Fernando Lopes dizia à pouco na TSF que a morte de Bergman representa para ele o mesmo que se lhe dissessem "que a Suécia tinha sido apagada do mapa". Com meia centena de filmes realizados e uma carreira de mais de 60 anos dedicada ao cinema e ao teatro, Bergman morre com 89 anos. Um dos cineastas mais querido e respeitado, não só na Europa como, em todo o mundo.

O seu legado é um traço cinematográfico inconfundível marcado pela sua enorme capacidade de verbalização visual da introspecção humana. O que representa, talvez, o que de mais difícil podemos pensar em trabalhar quando olhamos para uma tela. A sua criatividade, inovação e inventividade levou-nos a encarar o cinema como uma arte maior, com capacidade para igualar o nível de desvelamento da condição humana, até então, só possível na literatura.

David: Come over here Maria. Look at yourself in the mirror. You are beautiful. Perhaps more so than in our time. But you've changed. I want you to see that you've changed. These days you cast rapid, calculating, sidelong glances. You're gaze used to be direct, open, and without any disguise. Your mouth is an expression of discontent and hunger. It used only to be soft. Your complexion has become pallid, you use make-up. Your fine, broad forehead now has four creases above each eyebrow. You can't tell in this light, though you can in daylight. Do you know how they get there? Indifference, Maria. And this fine contour from the ear to the chin, it's no longer quite so evident. That's where complacency and indolence reside. Look here, at the bridge of the nose, why do you sneer so often, Maria? Do you see, you sneer to often. Do you see, Maria? Beneath your eyes, those sharp, barely visible wrinkles of boredom and impatience.
Maria: Do you see all that in my face?
David: No, but I feel it when you kiss me.
Maria: You're making fun of me. But I know where you see it.
David: And where would that be?
Maria: In yourself. Because we're so alike, you and me.
David: You mean the selfishness, the coldness, the indifference?


diálogo de Cries and Whisperes (1973)

Links para Bergman

Página Oficial - http://www.ingmarbergman.se/
Wikipedia - http://en.wikipedia.org/wiki/Ingmar_Bergman
IMDB - http://www.imdb.com/name/nm0000005/

Répteis, emocionalmente mais próximos dos mamíferos

"Os crocodilos bebés chamam as suas progenitoras antes mesmo de saírem do ovo, descobriram biólogos no final de um estudo realizado na Quinta dos Crocodilos em Pierrelatte, no Sudeste de França. A experiência foi efectuada em dez crocodilos do Nilo fêmeas, cujos ovos, postos cerca de três meses antes, foram colocados em incubadoras. Os investigadores registaram gritos de pré-eclosão na incubadora, enterraram na areia uma coluna para difundir, no momento da eclosão, duas séries de sons: os gritos gravados e barulhos sem significado" [1]
O que tem isto de especial? Podem perguntar alguns. O fantástico desta notícia é que se isto estiver correcto os répteis também possuem, à semelhança dos mamíferos, sistemas de gestão social ou seja forças de manutenção gregária, forças essas que são grandemente responsáveis pela emocionalidade mamífera. E mais impressionante é que o sistema é inato ou hard-wired sendo muito provavelmente depois adulterado com a experiência de abandono a que as espécies répteis são votadas. Contudo, também é verdade que estas espécies só sobrevivem porque possuem depois outros sistemas de sobrevivência que têm capacidade para ultrapassar a ausência de relação, dependência ou vínculo, ao contrário dos mamíferos.

[1] Ciência Hoje

julho 26, 2007

GTA IV, brevemente


Depois de Vice City (2002), San Andreas (2004), Liberty City Stories (2005) e Vice City Stories (2006) que se pode dizer que não passaram de "expansões" de GTA III chega agora o episódio IV que promete revolucionar mais uma vez o conceito GTA à semelhança dos saltos entre o I, II e III. O volume III não só se estreou na PS2 como criou um novo conceito de videojogo, o chamdo sandbox ou open-world, em que o personagem jogável é colocado num ambiente virtual "vivo" onde necessita de executar determinadas ordens lineares mas onde pode também desenvolver acções livres sobre o mundo que o rodeia. IV vai estrear-se na PS3 e 360 e como se pode ver pela imagem acima, visualmente, GTA está mais cinemático que nunca. Falta-nos saber como é que a Rockstar vai conseguir desta vez ultrapassar os precedentes títulos e abrir novos caminhos à interactividade. Ao que parece, as ideias da Rockstar, vão no sentido da linearidade e causalidade que defendemos a semana passada com a apresentação das conclusões do phd,

"Rockstar... is now restraining that freedom with GTA IV, which will place more immediate and noticeable limits on--and stricter consequences for--the sort of illicit behavior you can get away with as you go about your dirty business around Liberty City. The goal of this constrained design isn't to ruin your happy crime sprees, but rather to immerse you deeper into the world of Liberty City by making some of those explicitly gamelike elements of the GTA titles a little more realistic." [1]

Ou seja, o mais importante é que a ficção se intrinque e estruture linearmente no sentido da produção de forte sentido e nexos provenientes da causalidade de eventos inerentes ao mundo virtual. Não basta a força visual ou a imersão criada pelo hardware é necessário que a narrativa envolva o jogador e o faça imergir nos eventos, é aí que reside o poder emocional. Vamos aguardar, para ver o que GTA nos reserva para Outubro, entretanto, foi disponibilizado o segundo trailer.



UPDATE: Officials from major publisher Take-Two have announced that the company's heavily anticipated Grand Theft Auto IV has been delayed from October of this year to now be released in the second quarter of fiscal 2008.

[1] Shoemaker e Torres da Gamespot.com

julho 25, 2007

Sony na E3 2007

Apesar de sabermos que a política de cortes nos preços dos produtos da Sony é bastante cautelosa e morosa, tendo em conta que as suas projecções de longevidade de mercado das consolas têm prazos a 10 anos, a Sony abriu o seu discurso na E3 com a notícia de que vai cortar 100 dólares no preço da PS3 no mercado americano, passando o seu novo preço para $499. Vamos esperar para ver se o mesmo sucede na Europa, apesar de Dave Karraker da SCEA dizer que "this news does not affect any other PS3 territory". Julgo ser muito difícil sustentar uma diferença que vai muito além dos $100 uma vez que o preço europeu situado nos 599 €, realizado o cambio vai para valores em dólares completamente ridículos, cerca de $800.

Como também já era esperado após o corte de $30 na PSP (os cortes quando em fases iniciais, estão quase sempre relacionados com o aparecimento de novas versões) a Sony anunciou o re-design da PSP que para nossa desilusão mantém a aposta no leitor de HMD quando esperávamos um mudança para sistemas de memória flash. As vantagens do novo sistema [1] são então:

PSP re-desenhada, 19% mais fina

a) 19% mais fina
b) 1/3 mais leve
c) Saida vídeo, que vai permitir ver fotos, filmes ou jogar numa televisão. Testes realizados falam de capacidades de play de ficheiros vídeo 640X480 sem problemas.
b) A bateria com duração para 5 horas e haverá a possibilidade de carregar a bateria através da ligação USB
c) A memória interna é agora de 64 Mb o que vai permitir o aumento de velocidade nos loadings a partir dos UMDs.

No meio de tudo isto, de destacar que o preço prevê-se que se mantenha nos 169€. A PSP já não era apenas uma consola de jogos, mas agora tornou-se num autêntico media entertainment player que pode interessar a um público que vai muito para além dos entusiastas de videojogos. A possibilidade de aceder a web via wi-fi, visualização de filmes e fotos, música, projecção de media, GPS, TV (novo dispositivo disponivel no Japão). Julgo que fica apenas a faltar a parte de telefone para que a competição com a Apple se agudize. Falta-me também confirmar como se comportará esta PSP na projecção de slides Powerpoint, o que daria imenso jeito para as conferências.

[1] Gamespot

julho 20, 2007

Emoção, Ética e Gastronomia

Software de reconhecimento facial

A questão levantada durante a defesa do meu doutoramento sobre os prováveis problemas éticos que se poderiam vir a levantar com o avanço tecnológico, já também levantados por Sherry Turkle, parecem afinal estar já aí. Segundo a Wired, a Unilever contratou Theo Gevers da Universidade de Amesterdão, responsável pelo grupo de investigação que estudou o sorriso da Mona Lisa, e o seu software de reconhecimento facial para analisar as expressões faciais de alegria enquanto um grupo europeu de 300 sujeitos femininos degustava vários tipos de comida. Como seria de esperar o Chocolate e os Gelados foram as comidas a obter as faces mais alegres :o) mas ao mesmo tempo mostrou caras muito pouco sorridentes no consumo das chamadas comidas saudáveis.

O problema aqui é que já não estamos no reino da investigação mas sim do puro marketing. Uma empresa de fundos privados utiliza o melhor da investigação para decifrar as necessidades e os comportamentos hard-wired na nossa biologia e assim poder explorar mensagens com um nível de aceitabilidade assustadoramente universal e intenso ainda que em parte estes comportamentos se alterem culturalmente com as experiências.