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setembro 23, 2013

o rádio-documentário

Numa destas noites de sábado, estava eu deitado na cama, com os auscultadores à procura de uma estação de rádio que me ajudasse a adormecer, e parei na Antena 1... uma senhora falava, muito emocionada, do tempo em que era angolana, antes de Angola ser um país independente... o programa de rádio chamava-se “Começar de Novo”.


Não tenho sido um grande defensor do meio da rádio, passei uma fase em que não percebia já a sua utilidade, questionava-me porque continuava a existir... Hoje, e cada vez mais, acredito na máxima dos Estudos dos Media que diz, "os media não morrem, apenas se transformam". Este programa da RDP é uma prova disso mesmo.

"Começar de Novo", apresenta-se como uma dramatização para rádio dos eventos ocorridos entre 1975 e 1976, com a deportação de milhares de pessoas das colónias portuguesas – Angola, Moçambique, Timor, Cabo Verde - para Portugal. Muitas destas pessoas nunca tinham estado em Portugal, nem sequer portuguesas se consideravam. Na verdade, se os meus pais, e avós tivessem nascido noutro país, provavelmente sentiria o mesmo. Os portugueses não foram para as colónias no século XX, antes começaram a chegar ali no século XVI. É natural que, para muitos dos que se viram envolvidos na confusão destes anos, não se tratou de qualquer regresso à pátria, mas antes, apenas e só, de fugir à guerra, de ser expulso de um país em guerra.


Durante décadas ouvi, em surdina, a palavra Retornados. Hoje, e depois de conhecer este programa de Rádio, fiquei a compreender melhor, o que se passou nesta fase da história de Portugal. Na generalidade, estas pessoas de retornados tinham pouco, eram antes refugiados de guerra, que Portugal, enquanto responsável pelas colónias, necessitou de acolher.


"Começar de Novo" é um programa da RDP criado por Iolanda Ferreira, Inês Lopes Gonçalves, Madalena Balça e Manuela Silva Reis. São 15 26 rádio-documentários, de uma hora cada um, muito emocionantes e informativos. Cada episódio assenta a sua base na entrevista de uma pessoa, que revive os momentos mais marcantes do processo de vir para Portugal, deixando aquilo que possuía numa das ex-colónias. A construção sonora em redor da entrevista, é bastante rica, tanto utilizando música da época, como sons marcantes que acompanham cada um dos relatos. As revelações dos entrevistados são confrontadas com fatos da história, e ainda com historiadores a quem se pede confirmação e reflexão sobre essas revelações, enriquecendo assim tremendamente cada um dos episódios. É um trabalho de excelência que merece ser aplaudido, e discutido.

Todos os 15 26 episódios podem ser ouvidos na página da RDP e mais informação pode ser obtida na página Facebook do programa.
"Mais de meio milhão de pessoas chegou, de repente, a Portugal. Essas pessoas, porém, de uma forma notável,  conseguiram integrar-se na sociedade portuguesa sem conflitos de maior. Do número de retornados recenseados pelo INE em 1981, 61% eram oriundos de Angola, 34% de Moçambique e apenas 5% das restantes colónias."

fevereiro 09, 2013

Steam quer ser uma App Store

Na semana passada publiquei um artigo na Eurogamer sobre os problemas da "multidão" nas App Stores. A ausência de curadoria dos jogos disponibilizados na App Store faz com que o número de jogos aí disponíveis tenda para o infinito em termos do tempo que temos disponível para os jogar. Pois esta semana Gabe Newell veio ingenuamente (será mesmo?) dizer que quer transformar o Steam numa App Store.

"One of the worst characteristics of the current Steam system is that we've become a bottleneck. There's so much content coming at us that we just don't have enough time to turn the crank on the production process of getting something up on Steam. So whether we want to or not, we're creating artificial shelf space scarcity.
So the right way to do that is to make Steam essentially a network API that anyone can call. Now, this is separate from issues about viruses and malware. But essentially, it's like, anyone can use Steam as a sort of a distribution and replication mechanism.
It's the consumers who will draw it through. It's not us making a decision about what should or shouldn't be available. It's just, you want to use this distribution facility? It's there. And customers decide which things actually end up being pulled through. So Steam should stop being a curated process and start becoming a networking API." [Gabe Newell, Video]
É depois muito interessante ler os comentários ao discurso de Newell na Gamasutra, pensei eu que iria encontrar ali a comunidade delirante com estas ideias, mas não. Deixo aqui alguns dos melhores comentários que vêm totalmente de encontro ao que disse no artigo na Eurogamer a propósito da App Store. É claro que a Gamasutra é uma revista seguida essencialmente por criadores, e a perspectiva que aqui podemos ler é a de alguém que sabe o que custa desenvolver e garantir o retorno investido no seu trabalho.

Simon Ludgate: "I rarely buy any games for my Google Android phone because of the lack of curation: I have no way of sifting through heaps and heaps of crapware to find a game worth playing, let alone buying. If the same thing happened to Steam I'd be forced to bail out."

Robert Boyd: "Right now, Steam sits at a happy medium between extremely curated storefronts like XBLA and anarchy like we see in the mobile space. If they don't tread carefully here, they could ruin that delicate balance."

Ameet Virdee: "I think this is quite simply about profitability. He wants to leverage the goodwill he's developed with Steam so there's less work for them for more gain (a traditional Valve practice, and nothing bad in itself for a business). You can make and lose money quite easily as a speculative trader, but you always make money as a trade broker. By letting anyone set up a steam store he's letting them take the risk and make the curating effort, while taking a cut from everything that actually sells...essentially crowd-sourcing the approval process."

Este último comentário pode parecer algo cínico face a tudo o que conhecemos da Valve e de Gabe Newell, mas é um comentário correcto. No fundo sintetizando tudo, temos Newell a dizer - "Nós não temos recursos para fazer a curadoria de tudo o que nos chega, por isso em vez de investirmos nos recursos, vamos passar esse trabalho para vocês".


Aliás este é um discurso muito em voga em tudo o que mexe com a internet, desde a arte à política. A internet criou os meios para que todos possam dar a sua opinião, o problema é que alguns destes iluminados começaram a confundir a opinião da multidão com democracia. Para quem estiver interessado em perceber em maior profundidade as problemáticas por debaixo desta falácia aconselho vivamente o texto Why Social Movements Should Ignore Social Media de Evgeny Morozov publicado esta semana na New Republic. Um magnífico texto de análise e resposta ao livro Future Perfect: The Case For Progress In A Networked Age (2012) de Steven Johnson.

dezembro 23, 2012

um polícia em cada escola?

Mais uma desgraça numa escola americana. No processo de busca por culpados a NRA (National Rifle Association) resolveu apontar baterias aos media - cinema, videoclips e videjogos. O Vice-presidente, Wayne La Pierre veio dizer,

Wayne LaPierre, vice-presidente da NRA
"There exists in this country a callous, corrupt, and corrupting shadow industry that sells, and sows, violence against its own people, through vicious, violent video games with names like Bulletstorm, Grand Theft Auto, Mortal Kombat, and Splatterhouse. And here's one: it's called Kindergarten Killers. It's been online for 10 years. How come my research department could find it and all of yours either couldn't or didn't want anyone to know you had found it?"
Interessante esta referência a Kindergarten Killers (2002), denota o desespero da NRA para atirar as culpas para alguém. Colocar Kindergarten Killers ao nível dos outros jogos citados, deve ser um motivo de orgulho para o seu criador, embora não tenha um artefacto de que se possa orgulhar. O que temos ali é uma espécie de pequeno experimento Flash que faz uso da velha mecânica do Duck Hunt (1984), em que os patos são substituídos por crianças. De mau gosto e por isso mesmo foi banido há muitos anos de vários sites conceituados de jogos como o Newgrounds e o Kongregate, por isso não se fala do jogo, e o departamento de investigação da NRA encontrou-o porque na internet nada desaparece completamente nunca. Podem jogar e confirmar o que digo aqui. Mas para a NRA não são só os jogos,
"Then there's the blood-soaked slasher films like American Psycho and Natural Born Killers that are aired like propaganda loops on Splatterdays and every day, and a thousand music videos that portray life as a joke and murder as a way of life. And then they have the nerve to call it entertainment. But is that what it really is? Isn't fantasizing about killing people as a way to get your kicks really the filthiest form of pornography?"
E para rematar, além de querer banir estes media, a NRA considera ainda que a melhor forma de atacar o problema é colocar um polícia em cada escola, porque segundo eles,
"The only thing that can stop a bad guy with a gun is a good guy with a gun, We care about our president, so we protect him with armed Secret Service agents. Members of Congress work in offices surrounded by Capitol Police officers".

"Yet, when it comes to our most beloved, innocent, and vulnerable members of the American family, our children, we as a society leave them every day utterly defenseless, and the monsters and the predators of the world know it, and exploit it."
Ideia de protesto contra o discurso da NRA

O discurso foi criticado por todos os quadrantes, mas no dia seguinte veio o presidente da NRA, David Keene veio recordar os bons velhos tempos em que,
“we often brought our shotguns to school and went hunting afterwards. You got to take your gun on the plane and throw it in the overhead.”
David Keene, presidente da NRA

Isto é insanidade. E por isso não adianta perder muito tempo a discutir o caso. Sobre tudo isto resolvi escrever um texto esta semana para a Eurogamer, não para desmontar estas insanidades, mas para compreendermos melhor as razões por detrás do design do acto de matar nos videojogos.

outubro 05, 2012

"From New York With Love" de André Valentim Almeida

André Valentim Almeida lançou o seu segundo documentário, From New York With Love, no IndieLisboa'12, mas só agora tive oportunidade de o ver. Em 2010 tinha-se estreado com Uma na Bravo Outra na Ditadura (2010) um documentário sobre a geração portuguesa dos anos 1970, agora traz-nos um olhar sobre o modo como nos relacionamos com o exterior, como reagimos à diferença, e como encaixamos isso nas nossas origens culturais.


Este segundo trabalho do André é em termos de linguagem expressiva mais bem conseguido que o primeiro, mas acaba por se deixar levar demasiado pela experimentação estética em detrimento da narrativa e storytelling. Nem sempre o filme está preocupado em conduzir-nos por uma linha temporal de mensagem, está quase sempre mais preocupado com o momento, com o presente nas imagens, como que se estas estivessem desconectadas das restantes. Percebemos melhor a ligação temporal e narrativa quando nos fala das comparações explícitas entre países e culturas, quando se vê NY a partir de Portugal. Mas para chegar aqui passamos muito tempo a deambular por NY com personagens que desconhecemos, e que o filme nem sequer parece muito interessado em dar a conhecer.



O filme apresenta uma particularidade estética na exploração de diferentes tecnologias de comunicação, no sentido de potenciar a linguagem audiovisual. O facto de termos um narrador continuamente a trabalhar as imagens, pode até parecer um recurso fácil de construção narrativa mas quando entramos adentro do filme percebemos que o discurso textual não é uma mera redundância do discurso imagético. O autor quis ir além da imagem fixa, estabeleceu pontes intertextuais com vários excertos de filmes para ilustrar sentimentos, assim como cita extensivamente Robert Bresson e Roland Barthes entre outros, atirando o espectador para discussões sobre a natureza do próprio medium.




Neste sentido o que resulta melhor da experiência de ver From New York With Love é a forma como o autor brinca com as componentes formais, como este agilmente encena o real e o mistura com o ficcional. A passagem do formato de legendagem para audio é nisso um dos pontos altos do filme. A crença é derrubada, percebemos que o autor fala connosco, sentimos que o que nos é mostrado é o interior das ideias do autor, e deixamo-nos levar. Talvez por isso mesmo não se exija uma linha coerente, mas antes se aceite a lógica narrativa de ideias em modo associativo. Por outro lado é também fruto do modo como o filme foi elaborado, uma vez que foi estruturado apenas depois das imagens captadas, como diz o André numa entrevista ao c7nema.net.
"A escrita do guião é um exercício de olhar para as imagens. São um género de imagens que muita gente tem nos seus computadores – mas eu como documentarista achei que seria necessário trabalha-las." in c7nema.net
Em termos de enredo, o documentário toca em vários pontos importantes da vida fora do país de nascimento. Para quem viveu uma grande parte da vida num país, de repente mudar para outro país e adaptar-se é sempre uma aventura, e cria emoções fortes e sentimentos que nos arrastam. O filme é um retrato de tudo isso, é um poderoso postal de melancolia que se agarra a nós e dificilmente nos deixa, muito depois de ser visto.
"Muitas vezes as pessoas dizem que quem emigra passa a ter duas nacionalidades, mas acho que a que tínhamos se perde e acabamos por não ser de lado nenhum. Estamos sempre num exercício comparativo – quando estamos em Nova Iorque pensamos em Portugal e vice-versa. É um estranho exercício de perda: quando estamos num sítio só pensamos no que está do outro lado da margem. Por isso ficamos com a síndroma do emigrante, se vê muito – essa relação estranha e mal resolvida. O filme é um pouco a tentativa de resolver isso, desta angústia e desconfortos iniciais. No decorrer do processo encontro alguma serenidade, algum conforto, embora não total." in c7nema.net

Em termos reflexivos, à posteriori gostei de ler este último pensamento do André sobre a comparação entre a cultura nacional e a cultura americana. Questiona-nos sobre muito daquilo que o nosso país é, do seu lado empreendedor, ou falta dele. Do modo como nos resignamos e como aceitamos o nosso "Fado".
"Como é que eu, como português, posso me enquadrar lá – com essa forma enraizada de pensar, essa culpa católica, esse pessimismo que não me é permitido ter lá. Os americanos não permitem que eu seja pessimista, que eu seja derrotista. Eles não permitem! (risos). Quando estou lá tenho que transformar a minha forma de ser. É interessante porque não é uma transformação violenta mas que acarreta algumas coisas boas. Lá sinto-me mais positivo, mais capaz de realizar projetos." in c7nema.net

junho 12, 2012

TED: Efeitos da História Única

A razão pela qual algumas TEDs são magníficas, e muitas outras nomeadamente as que pululam pelos milhares de TEDx, são apenas satisfatórias ou até medíocres, tem que ver com a capacidade para contar uma história. Não uma qualquer, mas uma história pessoal, a história de uma vida, de se expor e abrir-se ali naquele momento, como se fosse uma confidência que se faz em primeira mão com a audiência.


E é isso que podemos ver nesta magnífica Ted Talk da escritora nigeriana Chimamanda Adichie.
"Quando era criança escrevia histórias passadas na neve, com pessoas que comiam macãs, falavam constantemente do tempo, e que diziam que bom que estava o dia quando o sol brilhava. Mas se o escrevia não era por viver naquela realidade, eu vivia na Nigéria aonde não existia neve, não comiamos maçãs, mas mangas, e não falávamos do tempo porque não era necessário. Eu escrevia sobre aquelas coisas porque aquela era a realidade literária a que eu tinha acesso. E isto demonstra o quão vulnerável podemos ser a uma história, particularmente enquanto crianças.Quando tive acesso a literatura africana fiquei impressionada, ocorreu uma mudança mental em mim."
Sobre os efeitos negativos da História Única, como nos diz Adichie, quando a única história que tenho sobre os Nigerianos é sobre um pai que abusa de uma filha, essa história converte-se na história única sobre os nigerianos, e cria modelos mentais em quem conhece apenas essa história. Deste modo todos os nigerianos homens passam a ser violadores. Por outro lado,
"Não é porque vejo o filme American Psycho que acredito que todos os americanos são serial killers. Mas não é por eu ser uma pessoa melhor do que qualquer outra de outro país. É antes porque tenho acesso a imensas histórias diferentes sobre os americanos". 
No final da comunicação Adichie deixa-nos com um pensamento poderoso, e que nos devia levar a todos a reflectir,
"Quando rejeitarmos a História Única, quando percebermos que não existe, nunca, apenas uma história sobre qualquer lugar, redescobriremos uma espécie de paraíso."

junho 11, 2012

Artigos "estúpidos" na Sábado?!

A primeira vez que li o artigo, Porque nos viciamos em jogos estúpidos da Sábado, ignorei, entretanto voltou a chegar-me o texto e por isso não pude deixar de o trazer aqui, dado a quantidade de erros, e juízos mal-formados que contém. Algo que na verdade não admira nesta revista nem nesta jornalista. Aqui há uns meses eram os estudantes universitários que eram ignorantes, agora são os videojogos que são estúpidos.


O artigo começa da melhor forma, a jornalista que diz que nunca jogou videojogos porque não gosta, é a eleita pela Sábado para escrever um artigo sobre algo que parece ser a nova descoberta da revista, e que é o "facto" de não só os videojogos de smartphones serem estúpidos, como também parece que viciam! Pois porque ao que parece a Sábado ainda duvida que os jogos para smartphones viciem, mas lá que são estúpidos não há dúvidas. Mesmo quando Jason Kapalka refere que os jogos em que a Sábado está interessada, são reconhecidos pela comunidade de criadores, jogadores e académicos, como Jogos Casuais (Casual Games), a jornalista não hesita em dizer que não, estes jogos são estúpidos ele é que "não se atreve a chamar-lhes estúpidos". O que não se percebe é que passamos o artigo todo sem nos apresentarem um único argumento para qualificar os jogos de "estúpidos".

É verdade que aqui há uns meses um jornalista do NYT publicou um artigo levantando a questionabilidade do interesse formativo dos jogos para smartphones, e na altura designou-os de "estúpidos". Mas sobre o que ele quis dizer, e sobre o que está ali em causa discuti já amplamente o assunto na Eurogamer.Pt. Não me parece que a jornalista da Sábado tivesse lido o artigo do NYT, porque se o tivesse lido teria percebido o quão mais amplo é o mundo dos videojogos. Mas isso talvez fosse pedir demais a quem não gosta de videojogos mas tem de escrever sobre eles como ganha pão.


Mas se a questão da categorização dos jogos é feita no ar, sem qualquer argumento que sustente a designação, a demonstração de que este viciam é ainda mais hilariante. Porque é que os jogos de smartphones viciam,
"porque são baratos ou até gratuitos; porque estão incorporados num dispositivo portátil do qual não nos separamos ao longo do dia; e, sobretudo, porque é fácil ganhar."
Mas aqui a Sábado tentou jogar seguro, foi buscar um especialista em Psiquiatria, que em vez de explicar o que é o fenómeno da adicção fala sobre jogos sem saber do que fala. Segundo o especialista o problema está na gratificação constante, e compara o aumento de vício do PC para os jogos smartphones, como da Roleta para as Slot-machines. Isto é insano. Compara o incomparável. Inicialmente ainda pensei que se estivéssemos a falar de Farmville até poderia aceitar a questão da "gratificação constante", mas saltar para os exemplos de Casino é jogo sujo. Porquê? Simplesmente porque numa slot machine ou numa roleta a recompensa não é feita em função de nenhuma acção que mereça a compensação.


Ou seja enquanto em Angry Birds eu tenho de escolher intelectualmente as melhores estratégias de entre: os pássaros que me são dados, os materiais que estes destroem, a ordem em que os posso jogar, a direcção em que os vou lançar, a força com que os vou lançar, e o timing em que vou activar as suas propriedades específicas. Na Slot Machine, o único pensamento que tenho de realizar é saber se ainda tenho moedas para continuar. Em ambos busco a recompensa, mas o modo de chegar até ela é completamente diferente.

Modos de Pensamento Lógico 

Num videojogo a recompensa é dada em função de um conjunto de acções lógicas executadas de modo adequado pelo jogador, seguindo as regras, procurando dar respostas aos problemas apresentados pelos jogos, enquanto na slot-machine a recompensa é pura sorte. Ou seja como nada explica as recompensas das Slot-machines, para os indivíduos menos resistentes a este tipo de estímulos, torna-se impossível parar, porque o seu cérebro não consegue perceber o que se está a passar, e exige mais libertação de dopamina. Por isso os americanos designam o jogo de casino com uma terminologia distinta dos jogos de tabuleiro, nos casinos temos o Gambling, (em Portugal também utilizamos uma expressão por vezes distinta - Jogos de Azar) enquanto nos videojogos temos o Gaming ou Playing.

O artigo está repleto de pérolas, como por exemplo que,
Grand Theft Auto (o polémico jogo para computador em que se ganham pontos por atropelar velhinhas na passadeira e roubar carteiras).

janeiro 25, 2010

Videojogos, maiores de 18


Neste Natal, e em Janeiro continua a tendência, quem olhasse para as prateleiras de jogos veria que tem vindo a aumentar o número de jogos etiquetados pela PEGI para maiores de 18. O que nos faria pensar em outras discussões, como por exemplo interrogar-nos como é que alguns destes jogos são depois avaliados em UK para 15 anos apenas (ex. Darksiders ou Assassin's Creed 2), quando em UK a BBFC é reconhecida pela elevada exigência. Mas não é isso que importa aqui agora até porque UK vai passar a reger-se também pelo sistema PEGI. O que me interessa é verificar este aumento da faixa e tentar perceber o que se estará a passar.
Como é possivel que uma indústria que investe milhões num jogo "triple A" (blockbuster de jogos) depois não se preocupe em fazê-lo passar abaixo da linha dos 18 anos, que é uma linha negativa no sentido em que automaticamente conota o artefacto com os temas adultos da pornografia ou violência extrema. Aliás a indústria de Hollywood não se cansa de o fazer. E mesmo nos videojogos tivemos casos como Manhunt 2 a ser revisto pela Rockstar por forma a sair do AO (Adults Only). Assim precisamos de nos interrogar sobre o que estará a acontecer:

1 - As editoras sabem que os miúdos conseguem comprar os jogos de qualquer forma, por isso é-lhes indiferente a idade que sairá etiquetado o jogo?

2 - O facto de a tecnologia potenciar elevados graus de fotorealismo confere aos artefactos uma maior capacidade de gerar efeitos nos espectadores.

3 - Estarão as editoras menos receosas de perder nas vendas porque sabem que o seu target está bastante acima dos 18 anos?

No caso da primeira questão é um tanto infundada. Porque apesar de ter sido o caso durante os últimos, é cada vez menos uma realidade em sociedades desenvolvidas.

Cena de esfaqueamento censurada em Siren: Blood Curse (2008)

Sobre a segunda é uma realidade que sempre assumi como sendo um potencial problema para o futuro dos jogos no que toca a estas classificações. Se nos lembrarmos de muitos jogos de Survival Horror da PS2/Xbox era estranho que alguns desses objectos não ficassem qualificados acima de muito cinema de Horror. Ora o que acontecia era que o grafismo 3d e em tempo real nessas máquinas dada a sua falta de fotorealismo oferecia espaço à abstracção e isso tornava o objecto visualmente menos impactante que a imagem real em cinema.

God of War III (a lançar em 2010)

Apesar de tudo é sobre a terceira questão que me parece recair a origem do fenómeno, ainda que aliado à segunda. A idade dos jogadores de videojogos anda entre os 18 e os 40, com uma média calculada nos 35 anos, segundo as últimas estatísticas.
The average game player is 35 years old and has been playing games for 12 years.
The average age of the most frequent game purchaser is 39 years old.
It is fair to say that a major driver in the growth of the games industry has been the Nintendo generation itself. As this generation grows older and begins to enter middle age, members of this generation are bringing their video games with them. The average age of video-game players is now over 30 years old (10 years ago, the average age of video-game players was 16 to 18 years).
Kurt Squire, in Video-Game Literacy
Esta afirmação de Squire explica bem o tipo de target que temos actualmente e percebe-se porque é a indústria deixou de ter receio em avançar para este campo. Ainda que a indústria saiba que está a perder uma grande fatia demográfica tanta na faixa etária como no género, a verdade é que tendo em conta os preços altos de aquisição dos artefactos, este não se compadece com o mero interesse gerado pelos jogos casuais. As grandes audiências dificilmente investirão 70 euros num novo jogo, podendo com esse dinheiro ir mais de 10 vezes ao cinema. Como um caso exemplar vejam-se os actuais blockbusters "Avatar" no cinema e "Call of Duty" nos videojogos. "Avatar" está regulado para maiores de 12 anos (em Portugal é mesmo maiores de 6), "Call of Duty" para maiores de 18 (Portugal segue PEGI por isso também está em 18). Uma comparação económica entre estes dois artefactos pode ser vista num post anterior.

Contudo e apesar de tudo isto em Portugal parece que a arte dos videojogos continua a existir apenas para o imberbe adolescente e a criancinha dos papás. Repare-se na linguagem utilizada em programas de TV como "Insert Coin" ou em revistas como a "Smash" ou "MaxiConsolas". Ou mesmo nas poucas coisas que se vão fazendo nos jornais/semanários de referência nacionais (Público, i, DN, Expresso, Sol, Visão, Sábado) a pobreza na quantidade e qualidade do espaço dedicado ao meio.

novembro 02, 2009

Gripes e suicídos

Sendo algo off-topic parece-me importante deixar aqui esta nota a bem de todos. Aliás estive para falar do assunto quando regressei de Bolonha na semana passada, onde não encontrei desinfectantes por todo lado, nem nos aeroportos de Frankfurt nem de Bolonha. Mas também não na Universidade de Bolonha nem em qualquer outro local. Nos media também pouco ou nada, e a única coisa que me chegou de gripe A aos ouvidos e olhos em 5 dias fora de Portugal (na Europa) foi a notícia de que o Obama preparava um plano para enfrentar a gripe A nos EUA. Isto poderá dizer-nos muito sobre a permeabilidade do jornalismo nacional e não só...

Mas hoje deixo aqui uma mensagem porque encontrei algo que procurava, dados científicos sobre o real potencial da chamada Gripe A e a sua relação com a gripe sazonal que nos afecta desde que nascemos. Coloco aqui apenas um excerto que em minha opinião mostra tudo a nu, e deixo o resto para lerem no sítio original de publicação. O texto vem assinado por Teresa Forcades i Vila, médica especialista em Medicina Interna e Doutorada em Saúde em Pública.
Desde su inicio hasta el 15 de septiembre del 2009, han muerto de esta gripe 137 personas en Europa y 3.559 en todo el mundo [6]; hay que tener en cuenta que cada año mueren en Europa entre 40.000 y 220.000 personas a causa de la gripe [7]
UPDATE:
Para quem questiona a autenticidade do texto desta senhora e da sua boa-vontade deixo aqui a ligação para os números oficiais que podem ser obtidos publicamente através de um organismo Europeu pago pelos impostos de todos nós o European Centre for Disease Prevention and Control (ECDC) e o excerto concreto onde os números aparecem.
Applying the range to the EU population as a whole (around 500 million in 2008) would result in between 40,000 excess death in a moderate season and 220,000 in a bad season, though Europe has not seen a bad season for some years.
Mas se não for suficiente podemos ainda comparar os mesmos com os números dos EUA mesmo devidamente tratados com métricas de redução de outras prováveis variáveis em vários artigos como este do Journal of Epidemiology que apontam para os 40,000/ano num período 1979-2001. Se tivermos em conta uma população similar à Europeia os números equivalem-se.

E finalmente os números de mortalidade da Gripe A, actualizados para 2 de Novembro 2009,

Europa: 317 casos fatais
Mundo: 6153 casos fatais

Dados retirados da Influenza A(H1N1)v Outbreak Table constantemente actualizada pela ECDC.


Este é sem dúvida um fenómeno da modernidade em que as "narrativas globais" proliferam à velocidade dos media omnipresentes, em que a pós-modernidade sofre o seu retrocesso. Veja-se o recente fenómeno dos chamados "suícidos na France Telecom". Mais um caso alimentado pelos media de forma totalmente passiva e sem o mínimo esforço de análise da autenticidade do epifenómeno. Bastava aos jornalistas um simples exercício de matemática para saber como tratar o assunto, mas não, interessa muito mais a NARRATIVA. Na verdade o jornalismo é hoje muito mais drama do que facto. Além de que sabe bem ter o poder para linchar um CEO de uma grande empresa como acabou por acontecer.

Édouard Manet, Le Suicidé, 1877-81, oil on canvas, 38 x 46 cm.

Neste caso veja-se que segundo a OMS, a França apresenta uma taxa de suicídio relativamente a 2006, de 25,5 por cada 100,000 homens, e 9,0 por cada 100,000 mulheres. Agora verifique-se que o número de suicídios na France Telecom foi de 25,0 em 18 meses (quase todos, ou todos homens). Isto dá-nos um número de 16,6 por ano. Se tivermos em linha de conta que a France Telecom tem entre 100,000 a 120,000 funcionários, retirem-se as devidas conclusões.