fevereiro 07, 2013

videojogo como estímulo expressivo

Fica aqui um registo criado por uma criança com apenas 4 anos e que demonstra como os videojogos não destroem, nem engolem as mentes das nossas crianças. Pelo contrário, os videojogos ativam intensamente a sua imaginação e promovem as suas capacidades narrativas, algo que alguns pais por vezes chamam de mera "obsessão com o jogo". Se for promovida a externalização dessa imaginação, poderemos ver como a expressividade se enriqueceu, e compreender como os videojogos se podem tornar numa fonte criativa poderosa.

Mickey e Oswald (2013) desenhado por Pedro (4 anos)

Para quem não conhece o videojogo representado no desenho acima é o Epic Mickey 2: The Power of Two (2012). Como jogo apresenta algum grau de dificuldade para crianças de 4 anos, mas isso torna ainda mais interessante a interação com os pais, porque nos tornamos imprescindíveis para ajudar a passar as partes mais "difíceis".


A série Epic Mickey marcou a união entre um os designers mais respeitados no mundo dos videojogos, Warren Spector (System Shock (1994), Thief: The Dark Project (1998), Deus Ex (2000)) e a Disney. O primeiro episódio pode apenas ser jogado na Nintendo, mas este é multiplataforma. Neste segundo capítulo o Mickey ganha um companheiro, Oswald, com o qual terá de colaborar para poder progredir no jogo, tornando este segundo episódio mais empático que o primeiro.

Oswald e Mickey nos anos 1940, como se pode ver são quase iguais, com uma grande diferença que se tornaria a marca da Disney, as orelhas redondas.

É ainda interessante saber que Oswald, o coelho, precedeu Mickey, o rato, nos anos 1920. E não menos interessante perceber também porque a Disney é tão ciosa dos seus direitos de autor. É que Oswald foi criado pela Disney para a Universal. Quando a série ganhou sucesso, a Universal  relembrou a Disney que o personagem era seu por contrato, e não da Disney. E foi isto que obrigou a Disney a reagir criando Mickey Mouse.

fevereiro 06, 2013

Trier e a solidão da arte

É o segundo filme de Joachim Trier que vejo, e é o segundo embate que sinto. No ano passado tinha visto Oslo, 31. August (2011) e fiquei apaixonado pelo filme, apesar de não ter aqui escrito sobre ele, foi um dos melhores filmes que vi em 2012. E agora chegou a vez de ver o seu primeiro filme, Reprise de 2006.


Porque gosto tanto do trabalho de Trier? Não sei propriamente explicar, é algo que acredito ser mais de ordem perceptiva, e provavelmente bastante subjectivo. É verdade que em termos de linguagem cinematográfica temos aqui aquilo a que costumamos chamar de pérola. Adoro a sua planificação, adoro o ritmo da montagem, adoro a imagem e som, tudo junto criam toda uma atmosfera nórdica fria mas paradoxicalmente tão próxima.


Sinto-me próximo daquilo que se fala aqui, do desnorte, do desvario, da busca constante por algo mais, algo intangível, indefinível. Já passei por essa idade, mas sinto-me inevitavelmente a viajar no tempo e a relembrar todos estes questionamentos. A solidão e a arte como duas ideias indissociáveis, a importância de criar, de produzir algo, acima de tudo, algo original, algo para além de tudo o resto. Não deixa de ser estranho que este filme pareça quase uma primeira parte de Oslo, 31. August, embora não o possa ser já que Oslo, 31. August é um remake de Feu Follet (1963) de Louis Malle.


Depois a forma como Trier coloca todo este sentir em cena, impressiona. O cruzamento entre planos de detalhe, e gerais, o som, o corte de som, o som desfasado, desregulado, fora de tempo, como que se este fizesse parte das personagens, como se todo este trabalho da forma fosse em si uma expressividade da essência emanada do filme. Aqui a forma é o tema, e o tema é a forma. Ao contrário de muito cinema dito artístico, em que vemos a linguagem cinematográfica a servir a decoração, aqui ela fala, fala tão alto como as vozes dos personagens do filme.

Nota-se que esta é uma primeira obra, comparando com Oslo, 31. August, diria que aí o método se sofisticou, amadureceu, mas está mais contido. Aqui temos a experimentação, o filme acelera por vezes, com discursos que nos deixam um pouco à deriva, mas o filme é na generalidade genial na forma como consegue expressar o que tem para dizer.

fevereiro 03, 2013

o genérico de Skyfall (2012)

Vi ontem Skyfall (2012) não me desiludiu, porque esperava pouco do filme. Passados 50 anos impressiona que ainda se tente explorar o tema. Mas gostei de duas coisas, o trabalho realizado à volta da identidade do personagem, e o genérico de abertura. No caso do personagem julgo que procuraram responder à tendência atual de enriquecimento dos personagens que até aqui apareciam do nada. Ao fim de 50 anos James Bond ganha alguma consistência pessoal, as suas origens são reconstruídas e ficamos pela primeira vez a saber algo sobre a sua infância.


Mas o melhor do filme é sem dúvida a sequência de créditos iniciais, e por várias razões. Primeiro porque é um assumir claro da sua importância no panorama do cinema atual, que tem procurado secundarizar os genéricos atirando-os para o fim do filme. Mais, é preciso acreditar muito na força do seu genérico para fazer um corte ao fim de quase 10 minutos e meter uma sequência animada de quase 4 minutos. A verdade é que Sam Mendes não tinha nada a temer, o genérico foi feito por Daniel Kleinman, criador dos genéricos de 007 desde GoldenEye (1995) a Casino Royale (2006). Além disso teve o suporte da excelente equipa de VFX da Framestore liderada por William Bartlett.





Esta sequência é para mim uma das mais bem conseguidas até hoje em 007. Não apenas pela excelência do trabalho visual, mas porque realiza a sua função na plenitude. O genérico enquadra o espectador resumindo visualmente os grandes momentos do filme, preparando assim o espectador emocionalmente para o que se segue.




Não foi ainda libertada a sequência para que a possa colocar aqui. Vários vídeos foram entretanto retirados do YouTube, e os que por lá ficaram são de muito má qualidade. Deixo aqui o link para uma versão menos má no Vimeo, ainda assim, se ainda não viram o filme, aconselharia a guardarem-se para experienciar o genérico aquando virem o filme.

Filmes de Janeiro 2013

Mais um mês passado, mais uma lista de filmes vistos que aproveito para deixar aqui com as notas que fui atribuindo a cada um. Flight (2012) surpreendeu-me já não via Zemeckys há muito a trabalhar imagem real, e ainda mais com esta força dramática, embora o filme deva imenso a Denzel Washington. Por outro lado Rust and Bone (2012) é um filme de verdadeiros mixed feelings, o filme tem uma componente artística em termos de enquadramentos e imagem de grande excelência, mas em determinados momentos parece que estamos perante mais uma daquelas histórias de telefilme. Aliás o blog Bonjour Tristesse define exactamente o que sinto pelo filme: "This is basically a popcorn film disguised with art-house sensibilities; pulling the audience's strings, just using a less recognizable set of tropes to do it with". Não deixa de ser um filme a ver e a reter, quanto mais não seja pelas belíssimas imagens e pela interpretação de Marion Cotilliard. A desilusão do mês foi para The Paperboy (2012), definitivamente tenho cada vez menos paciência para o grotesco.

xxxx Rust and Bone 2012 Jacques Audiard França

xxxx Flight 2012 Robert Zemeckys EUA

xxxx The Red Shoes 1948 Michael Powell UK



xxx Dredd 2012 Pete Travis EUA

xxx The Dark Knight Rises 2012 Christopher Nolan EUA

xxx ParaNorman 2012 Chris Butler, Sam Fell EUA

xxx The Words 2012 Brian Klugman, Lee Sternthal EUA

xxx Cairo 678 2010 Mohamed Diab Egipto

xxx The Man from Earth 2007 Richard Schenkman EUA



xx The Paperboy 2012 Lee Daniels EUA

xx The Bourne Legacy 2012 Tony Gilroy EUA

xx Trouble with the Curve 2012 Robert Lorenz EUA

xx Deadfall 2012 Stefan Ruzowitzky EUA

xx Seeking a Friend For The End of The World 2012 Lorene Scafaria EUA

[Nota, Título, Ano, Realizador, País]
[x - insuficiente; xx - a desfrutar; xxx - bom; xxxx - muito bom; xxxxx - obra prima]

fevereiro 02, 2013

O declínio das App Stores!

Publiquei hoje na Eurogamer um artigo em que reflicto sobre o estado atual das App Stores. O sentimento de declínio apareceu essencialmente depois de ter passado algum tempo a analisar o comportamento de vários jogos nacionais e comparando o seu comportamento com títulos internacionais de sucesso em várias lojas de aplicações móveis.


Começa a criar-se a ideia de que estas lojas não são apropriadas ao lançamento de pequenos jogos independentes, dado exigirem um investimento demasiado elevado para o retorno que garantem. Existem claramente vários problemas que os criadores precisam de aprender a trabalhar se quiserem verdadeiramente obter proveito do potencial da plataforma. No artigo falo de três problemas das lojas: promoção, preços e interface.

Podem ler o artigo completo na Eurogamer.pt.

OffBook: "The Effect of Color"

Este episódio da OffBook fala-nos da cor como uma "linguagem silenciosa e emocional", uma comunicação contínua operada pelo mundo que nos rodeia. Em The Effect of Color  podemos ver discutidas três perspectivas sobre a cor: a teoria, a psicologia e a arte.



Gostei imenso da entrevista com Leslie Harrington directora da The color Association que nos apresenta a perspectiva psicológica da cor a partir de uma perspectiva tripartida em termos associativos de ideias: Universal, Cultural e Individual. Sendo que a dimensão universal trata de analisar os efeitos fisiológicos despoletados pela cor que podemos encontrar na generalidade dos seres humanos porque são associações que nascem connosco; a componente cultural trabalha as dimensões contextuais variáveis no tempo, que são determinadas pela partilha com outras pessoas das mesmas associações de ideias com cores; e a dimensão individual acontece a partir das experiências individuais de cada um que vão servindo para construir uma base de referência sobre as nossas preferências de cores.

"Well, there's a reason why the read carpet is a red carpet and that's because it keeps the traffic flowing!"


fevereiro 01, 2013

MonMazes (2013), arte jogável e colaborativa

MonMazes (2013) é mais um trabalho de estudante brilhante realizado no mestrado em Tecnologia e Arte Digital pela Ana Carina Figueiredo, Teresa Abreu e Marco Heleno. Não me surpreende a Ana Carina e a Teresa Abreu já nos tinham dado o belíssimo projecto Entra na Minha Casa, vencedor do Semibreve Award 2012.


Desta vez temos aqui um conceito que me entusiasmou ainda mais porque souberam explorar a convergência de vários elementos de relevo na investigação atual do engageLab - arte, jogo, colaboração e electrónica - tudo num único artefacto. Ou seja MonMazes apresenta-nos um ambiente virtual para onde entramos em conjunto com outra pessoa, e no qual podemos visitar várias obras de Piet Mondrian. Ao entrar nessas obras, que apresentam particularidades gráficas concretas, somos confrontados com a necessidade de conduzir uma esfera até à saída do quadro para poder sair desse ambiente. O mais interessante é que só poderemos levar a esfera à saída, se o fizermos em conjunto com o nosso parceiro. Imaginem isto a funcionar num museu, cheio de crianças em visita, geraria imediatamente um momento de enorme ludicidade contribuindo assim para melhorar todo o envolvimento das crianças com as obras.



Simplesmente adorei. Não é apenas o projecto que é brilhante, o vídeo é também uma pérola, sem qualquer diálogo nem texto, o funcionamento da instalação é demonstrado com um altíssimo nível de inteligibilidade. Reparem como a câmara enquadra o ecrã e os jogadores, como vai alterando entre o espaço físico e virtual, e no final ainda temos direito a um "how to". Só hoje descobri o projecto que foi criado para a UC de Realidade Virtual do primeiro semestre deste ano, leccionada pelo Prof. Paulo Brito. A parte digital foi realizada em Unity e a parte física sobre o Arduino.

MonMazes (2013) de Ana Carina Figueiredo, Teresa Abreu e Marco Heleno

janeiro 30, 2013

Paperman, nova técnica de animação (actualizado)

A Disney colocou online a curta Paperman de John Kahrs que está nomeada para o Oscar de Melhor Curta de Animação 2013. A curta faz uso de uma nova técnica de mistura entre a arte tradicional 2d e o CGI 3d possibilitada por um novo software da Disney, Meander (software não disponível ao público).


"There is something so primal and expressive about drawing, and our hope was to get it back into the CG animation process (..)
The animation is completed in CG and the final images are traced over by 2D artists, as the line work follows along the CG layer underneath. It does it in a very flat, image-based way—it’s vector-based, not a texture map. That’s why the line work maintains its linear quality and texture as it moves. It’s about celebrating the line and letting the artists maintain control right there on their Cintiqs. The computer is assisting them to get the images they want to get. They’re not sending it somewhere else. We’re very proud of the fact that the 2D artists are some of the last people to touch the image (..)
It really brings it back to the animation in a way that celebrates the artistry of the line. All the 2D artists that worked on it came to terms with it, and as the project went along, they came to understand that it was really the line that told the story."

John Kahrs in Animation Magazine

Em termos de narrativa, temos a magia da Disney a funcionar em pleno. Um simples encontro ocasional, produz uma peripécia de situações que acabam por levar à magia do amor transformado num grupo de aviões que leva os amantes para os braços um do outro.

Paperman (2012) de John Kahrs


Actualização 1.2.2012
A colega Marina Estela Graça partilhou hoje na discussão sobre o filme no Facebook um making of que dá conta de forma exemplar do modo como a técnica de fusão entre o 3d e o 2d foi conseguido. Muito bom, vale a pena ver, depois do filme.

Making of Paperman

Reverso, a diferença em sociedade

Reverso (2012) é uma deliciosa curta de estudante com uma ideia original sobre um tema universal. O filme apresenta a vida de uma pessoa que perdeu o sentido de gravidade, e usa esta condição para trabalhar a diferença e a rejeição em sociedade. O filme foi realizado por Kimberly Honma, Clément Lauricella e Arthur Seguin na escola ArtFx de Montpellier, França.


Aparte a abordagem original do efeito de gravidade, o melhor do filme está no modo como comunica tudo o que tem a dizer sem qualquer diálogo, criando toda a progressão narrativa assente na linguagem não-verbal do filme. Vale a pena esperarem pelo fim dos créditos. Além da componente do storytelling a atmosfera criada pela luz e cor é soberba.



Em termos técnicos foi tudo feito com Maya, AfterEffects e RealFlow. Recorreram ainda bastante à gravação deles próprios para compreenderem os movimentos a executar no ecrã. Numa entrevista os criadores referem a dificuldade em criar as animações do personagem e do movimento dos objectos invertidos de modo a manter a naturalidade. Diga-se que essa parte ficou muito boa, ao longo do filme sentimos uma total naturalidade naquela diferença. Depois do filme podem ainda ver o Making Of.

Reverso (2012) de  Kimberly Honma, Clément Lauricella e Arthur Seguin