Ainda ontem aqui falei dos problemas da enorme duração das experiências das séries TV e dos jogos. Agora trago uma belíssima campanha da Asociación De Editores De Madrid que se foca sobre isso mesmo, com o objetivo de alertar as pessoas de que é preciso salvar a leitura!
Esta é a realidade, por muito que aos jogadores e amantes das séries lhes custe. O tempo que se gasta com séries e jogos intermináveis é valioso, e pelo meio muito fica para trás. Não coloco aqui em questão deixar de jogar ou ver séries para ir ler, apenas relembro que como em tudo, é preciso moderação. É preciso conseguir distribuir melhor o tempo que se investe em cultura. E queiramos ou não, entre ler Dom Quixote ou jogar centenas de horas de Angry Birds, ou ver centenas de horas de Lost, existe uma clara diferença no retorno cognitivo. Aliás, além destes consumidores de horas, como muito bem diz o Carlos Merigo do Brainstorm9, era bom ter visto um cartaz destes com o Facebook como "assassino" de tempo.
A campanha é constituída de três cartazes em que personagens clássicos da literatura morrem: Dom Quixote por Angry Birds, O Pequeno Príncipe por Call of Duty, e Moby Dick por Lost.
abril 30, 2013
Comunicação e as falácias da Sociedade de Informação (Copyright, MOOC, Democracia Directa, Open Access, Rankings)
No dia em que se comemoram 20 anos da WWW trago algumas reflexões sobre o impacto da internet no pensamento contemporâneo. Ao longo dos últimos meses envolvi-me em discussões mais ou menos acesas sobre o Copyright. As discussões sobre o copyright nunca foram pacíficas, mas acentuaram-se com a massificação do acesso à internet. De uma forma geral e a um nível internacional os detractores defendem a legalidade da partilha de conteúdos sob copyright desde o Napster aos torrents, até ao acesso aberto às publicações científicas. Em Portugal temos vários defensores desta ideologia, e nos últimos dois meses tive oportunidade de me debater com dois deles – Ludwig Krippahl, especialista em bioinformática na UNL e Eloy Rodrigues especialista em sistemas de documentação na UM.
Tive uma discussão no blog do Krippahl que se prolongou por dois textos seus - Um acidente histórico, 15.2.2013; Censura, 29.3.2013 - que nos serviram para discutir os fundamentos do copyright ao longo de mais de uma dezena de respostas e contra-respostas nas caixas de comentários. A discussão circulou à volta da defesa da inovação, criatividade, liberdade de expressão e censura. Ludwig Krippahl defende que o copyright confere aos criadores um direito monopolista sobre a informação, o que tem como consequência a transformação a lei do copyright numa lei censória, porque impossibilita as pessoas de poderem transmitir determinada informação. Nesse sentido defende que o copyright deve ser extinto, porque este não pode sobrepôr-se à liberdade expressão. Quanto ao modo como podem os criadores ganhar vida com aquilo que criam, não apresenta qualquer solução. Deixo um resumo daquilo que eu defendi nessa discussão,
Contra mim existem os argumentos suportados por pessoas como Lawrence Lessig catedrático da Faculdade de Direito da Universidade de Harvard. Ou Aaron Swartz a pessoa que ousou pôr à prova as revistas científicas, tendo instalado um computador dentro do MIT e feito o download de milhões de artigos para depois os disponibilizar em modo aberto. Swartz era uma mente brilhante, mas com sérios problemas de gestão de emoções, tendo recentemente posto fim à vida e assim tornando-se num mártir da causa. Lessig e Swartz trabalharam juntos na criação dos Creative Commons, vale a pena ver a palestra de Lessig no dia do início da sua cátedra, como homenagem a Aaron Swartz (vídeo e transcrição). Sobre Swartz vale a pena ler os artigos Requiem for a Dream da New Yorker e ainda A cidade e o futuro do mundo, segundo Aaron Swartz. Além destes temos Cory Doctorow um escritor de ficção-científica, conhecido pelo seu blog Boing Boing, e que num artigo no mês passado no Guardian, Copyright wars are damaging the health of the internet, resume tudo aquilo que Kripahl defende, propondo o fim do copyright em nome da liberdade expressão, nem que para isso tenha de trucidar todos aqueles que vivem das indústrias criativas.
Mas perguntam, como posso eu não defender a Liberdade de Expressão, como posso eu não defender o Acesso ao Conhecimento para todos? Como posso ir contra fundamentos que considero basilares? A primeira constatação está relacionada com o facto de que nada no mundo é sagrado, e tudo pode e deve ser questionado sempre. Nesse sentido as nossas posições devem ser casuísticas, e não de princípio. Tão importante como a liberdade de expressão, é a liberdade de pensar. Enredar o pensamento em fundamentalismos cega a nossa capacidade de apreender o diferente, e condiciona o nosso pensamento.
Neste sentido julgo que estamos perante um discurso que apenas consegue ver uma parte da problemática, querendo resolver essa parte, sem se preocupar com todas as variáveis que lhe dizem respeito. E se resolvi escrever este artigo foi para me ajudar a mim próprio a compreender as razões que toldam o pensamento desta abordagem. É algo que comecei a perceber apenas a partir da última discussão sobre os repositórios de conhecimento, quando comecei a notar paralelos com os discursos dos defensores dos cursos universitários massivos online (MOOCs), dos rankings de publicações científicas, dos rankings de escolas e os exames nacionais, entre outras coisas. Venho-me debatendo internamente e em discussões online contra aquilo que considero serem acções de uma minoria que pretende passar a "gerir" a sociedade através de verdades estatísticas, económicas e quantitativas em desfavor da singularidade individual e da criatividade humana. Considero que isto é em parte resultante do deslumbramento com a chamada "sociedade de informação" que choca com algumas teorias sobre o embebimento de conhecimento em Tecnologias Criativas que venho estudando.
As tecnologias criativas têm sido o meu pet project dos últimos anos, para o qual tenho trabalhado conceitos muito abrangentes como a criatividade, a tecnologia, a internet, o artesanato, a revolução industrial, o conhecimento, etc. Muitos dos discursos que vou lendo nestes domínios estão a maior parte do tempo apenas concentrados num único assunto: os impactos da internet nos sistemas de informação. Muito desses impactos têm-nos levado a discutir a suposta gratuitidade do digital, as modificações das massas, dos processos de distribuição, dos processos de produção. Muitas destas discussões têm vindo a promover a crença em teorias que comparam o funcionamento da internet com o funcionamento do nosso cérebro, como Doctorow diz, nós precisamos de "acknowledge that the internet is the nervous system of the information age."
Por outro lado toda uma outra barricada se começou a levantar do lado oposto e tem acusado os defensores da internet e das ideologias subjacentes, de fundamentalistas e crentes, defensores cegos da tecnologia a qualquer custo. Um dos mais conhecidos detractores e que se tem afirmado internacionalmente é Evgeny Morozov que no campo da ciência política tem procurado demonstrar a falácia por detrás destes pensamento hegemónico com The Net Delusion: The Dark Side of Internet Freedom e To Save Everything, Click Here: Technology, Solutionism, and the Urge to Fix Problems that Don’t Exist (2013). Mas mesmo no campo da própria tecnologia temos visto vozes a levantar-se. Jaron Lanier um dos principais mentores da Realidade Virtual escreveu o manifesto, You Are Not a Gadget (2010) nesse sentido. Ou ainda Andrew Keen um dos maiores evangelistas de Silicon Valley que a uma dada altura começou a escrever a propósito do assunto, The Cult of the Amateur: How Today's Internet Is Killing Our Culture (2007) e Digital Vertigo: How Today's Online Social Revolution Is Dividing, Diminishing, and Disorienting Us (2012). E vão aparecendo já alguns artigos mais honestos sobre as limitações dos MOOCs. Alguns acusam este lado da barricada de mero “ludditismo”. Não aceito porque ao colocar-me deste lado da barricada, não estou de modo algum a apontar o dedo à tecnologia. Para mim as grandes questões subjacentes ao copyright e ao acesso ao conhecimento científico não estão condicionadas pelo surgimento da internet ou qualquer outra tecnologia. Antes pelo contrário, esta tem servido para ajudar a promover tudo o que defendo no campo da criatividade.
Posto tudo isto os problemas que eu identifico e que estão na base da minha rejeição da abordagem Messiânica da Internet, grande responsável pelas ideias subjacentes ao fim do copyright, fim das revistas científicas, e fim das Universidades, não se relacionam com a tecnologia, mas com a forma como concebemos o seu uso. As tecnologias da comunicação se bem utilizadas podem servir o ser humano, se mal utilizadas colocarão o humano ao serviço da tecnologia a médio prazo. Muito já se ouve falar sobre a escrita de poemas por máquinas, a criação de filmes por algoritmos, a mais recente é a correcção de exames por máquinas. Deixo apenas uma nota a todos os crentes nestes sistemas: Só as máquinas não erram, mas é o erro que nos torna únicos, é do erro que brota a nossa criatividade. Dizer ainda que a internet não se assemelha, de forma alguma, ao nosso sistema neuronal. É uma falácia, e é uma clara tentativa de colar uma metáfora de fácil compreensão no sentido de lhe garantir maior credibilidade. O nosso cérebro funciona de forma muito diferente, acima de tudo porque a informação não circula apenas orientada pela cognição, é também trabalhada pela emoção.
Assim a grande questão por detrás de todas as discussões sobre o copyright e o acesso gratuito à informação está ligado à confusão que existe entre os processos de Comunicação e os processos de Informação. Ao longo dos últimos anos assistimos a uma tentativa de colagem da Informação à Comunicação. Desde da aceitação internacional do termo “Tecnologias de Informação e Comunicação”, à integração nas mesmas áreas científicas das Ciências da Comunicação e Ciências da Informação. Para quem está de fora, não existe diferença. Apercebi-me disto apenas após discutir intensamente com pessoas que claramente dominam os pressupostos das Ciências da Informação, mas a quem falta conhecimento sobre as Ciências da Comunicação. Esta discussão colocou bem em evidência as diferenças fundamentais entre ambas. Mais sobre estas diferenças pode ser visto no texto que publiquei aqui a propósito do livro de Dominique Wolton, "Informar não é Comunicar".
Deste modo ao longo de todas estas discussões percebi que os defensores do fim dos modelos atuais - copyright, revistas especializadas, universidades - baseavam toda a sua argumentação num processo simplificado de comunicação, ou seja no primeiro modelo de comunicação de Claude Shannon de 1948. Nesta altura a comunicação encerrava-se sob um mero processo de transmissão de um produto, a informação. Estes modelos surgidos no pós-guerra procuravam melhorar os processos de transmissão de informação, daí que a sua preocupação fosse o meio ou canal. O relevante da discussão reduzia-se aos modelos de redução dos ruídos do canal. Assim os Emissores e Receptores não eram tidos em conta, eram meros recipientes, variáveis independentes, sem condicionantes sociais, psicológicas ou de competências.
Mas o conhecimento sobre a Comunicação evoluiu, transformou-se, e hoje sabemos muito mais sobre o que está em jogo. Quando comunicamos não estamos apenas a emitir ou a receber informação através de um canal, estamos a calcular uma imensidade de outras variáveis, que por vezes têm tanta ou mais importância que a própria mensagem que se quer transmitir. Ou seja, para além daquilo que é dito, importa a forma como é dito, mas sobretudo o contexto no qual é dito, e o contexto no qual é recebido. Tudo isto cria um processo complexo, que precisa de ser trabalhado para que a mensagem chegue verdadeiramente a ser compreendida e partilhada. Como dizia Watzlawick já em 1968, o processo de comunicação é relacional, ou seja cada mensagem partilhada contém em si mesma metacomunicação que diz respeito ao modo como deve ser lida pelo receptor. No diagrama acima apresenta-se um modelo unificado da comunicação de Davis Foulger que apresenta algumas, ainda que de modo introdutório, das questões que normalmente preocupam os investigadores das ciências da comunicação.
Deste modo torna-se inevitável pensar que toda esta discussão é fruto de um ressuscitar de modelos de comunicação há muito defuntos. Um novo meio de comunicação surgiu, com novas potencialidades, e de repente esquecemos tudo o que aprendemos. Fazemos tábua rasa do conhecimento acumulado, e assumimos a internet como um novo messias da comunicação. O meio que tudo coloca em causa, que tudo pode, que tudo revoluciona. Assume-se uma sociedade que se adapta ao modelo desenhado pela internet, e não o seu contrário. Para os crentes na salvação pela internet, a sociedade passa a ser definida tal qual uma rede perfeita de relações (a internet) entre vários nós (as pessoas), desconsiderando os parâmetros da natureza humana que promovem a acção dos nós, responsáveis pelo estabelecimento dos laços do conhecimento. Deste modo toda a informação passa a ser livre e grátis, o copyright deixa de fazer sentido, e o ensino à distância substitui a necessidade de contacto interpessoal. Mas vai ainda mais longe, os países passam a ser governados por democracia directa, a salvação da democracia trazida pela internet, que abre caminho a que todas as decisões sejam tomadas por referendos. Do mesmo modo que as escolas já passaram a ser medidas em função das notas que os alunos tiram em exames nacionais, e a ciência passou a medir-se em função do número de publicações que os cientistas publicam. O que conta é apenas e só o resultado medível da quantidade de informação que é passada de um ponto A para um ponto B.
No final, tudo isto seria perfeito, e um gestor do alto do seu pedestal, conectado à internet, recebendo os dados em tempo real, directamente na sua folha de excel que tudo filtra através de algoritmos perfeitamente calibrados, poderia finalmente descansar, porque a sociedade estaria a funcionar tal qual uma grande fábrica de produtos em série, fruto da grande revolução industrial. Seria tudo assim, se os laços da comunicação humana, se pudessem criar desse modo. O problema é que não criam, não emergem e sem eles o Conhecimento não se constrói, não acontece. Transmite-se informação, acumula-se informação, transacciona-se informação, mas isso muda pouco os sujeitos envolvidos.
Ao longo de milhares de anos desde a criação da escrita, mais acentuadamente desde o aparecimento dos métodos de impressão, desenvolvemos sistemas de gestão de informação, envolvidos em sistemas humanos de comunicação, que foram evoluindo e sendo aperfeiçoados à medida que fomos compreendendo como construímos o conhecimento. Não massificámos as escolas para servirem a mera transmissão de informação, elas surgiram para estimular a criação de competências cognitivas nas pessoas de modo a permitir-lhes chegar ao conhecimento autonomamente. Não criámos a ciência para produzir mais informação, a descoberta científica não se traduz em qualquer artigo ou citação, o seu impacto só pode ser medido pelo avanço que provoca no nosso auto-conhecimento. Do mesmo modo não criámos editores nem copyrights para serem meros gestores de informação, eles existem porque têm uma função específica na cadeia de construção do conhecimento humano.
Podemos mudar, devemos evoluir, mas não devemos pôr tudo em causa simplesmente porque descobrimos um novo meio de comunicação. Para quem ainda pensa que a Internet veio para salvar o mundo, imagine-se em 1895 numa sala às escuras, ver um comboio em andamento vindo em direcção a si, a partir de um rectângulo de luz projectado numa parede! Imagine as ideias fantásticas que não passaram pela cabeça de muitos quando viram como a realidade podia a partir daquele momento ser registada e preservada para todo o sempre e ser mostrada em qualquer parte do mundo. A verdade é que a sociedade humana é bastante mais complexa, e as faculdades cognitivas do ser humano não mudam à velocidade do surgimento de cada nova tecnologia. Olhemos para a nossa história, temos conseguido criar muita tecnologia nova, mas a nossa biologia continua quase intacta passados vários milénios. Deixemo-nos de ilusões quanto a definir os tempos que se vivem como diferentes de tudo o que já passou, alguns colam-lhes adjectivos fortes como revolucionários ou de velocidade vertiginosa. Mas o passado será sempre visto como algo mais simples que o futuro, não porque verdadeiramente o foi, mas apenas e só porque é agora certo e imutável, sem as variáveis impossíveis de quantificar que o futuro nos reserva.
O ser humano é criativo por natureza, mas a capacidade de criar conhecimento pode ser posta em causa se deixar de interessar o processo e a descoberta, e passar a interessar apenas o produto resultante.
Tive uma discussão no blog do Krippahl que se prolongou por dois textos seus - Um acidente histórico, 15.2.2013; Censura, 29.3.2013 - que nos serviram para discutir os fundamentos do copyright ao longo de mais de uma dezena de respostas e contra-respostas nas caixas de comentários. A discussão circulou à volta da defesa da inovação, criatividade, liberdade de expressão e censura. Ludwig Krippahl defende que o copyright confere aos criadores um direito monopolista sobre a informação, o que tem como consequência a transformação a lei do copyright numa lei censória, porque impossibilita as pessoas de poderem transmitir determinada informação. Nesse sentido defende que o copyright deve ser extinto, porque este não pode sobrepôr-se à liberdade expressão. Quanto ao modo como podem os criadores ganhar vida com aquilo que criam, não apresenta qualquer solução. Deixo um resumo daquilo que eu defendi nessa discussão,
- O que se pede à sociedade no respeito do copyright e das patentes está relacionado com um ponto único, o estímulo à inovação e criatividade humana.
- A internet será tão livre quanto tudo o resto nas nossas vidas em sociedade.
- Sobre a Liberdade de Expressão, leia-se o ponto 2 do Artigo 10º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, sobre a Liberdade de Expressão. Não existe sociedade sem cedências de princípios, por muito que custe a cada um de nós.
- O fundamentalismo é mau, seja em que direcção for, para proteger seja o que for ou seja quem for. A vida é demasiada complexa, cheia de variáveis, e em constante transformação para estar sujeita a fundamentalismos.
- A grande questão é que terei muita dificuldade em incentivar jovens a investir 10 anos da sua vida (10 mil horas para atingir a mestria) para se tornarem músicos de excelência, ou escritores, ou desenhadores, etc. se souberem que todo esse investimento terá um retorno igual a zero.
- Nem toda a arte é produzida por uma única pessoa... Fernando Pessoa foi um grande artista e não precisou do dinheiro de ninguém. Aliás podemos dizer o mesmo de Saramago. Mas não comparemos a escrita de um livro ao longo de anos em part-time, com a criação de um filme ou de um jogo que pode necessitar na sua produção de dezenas e até centenas de pessoas para ser criado, fora as tecnologias. Pessoas que não fazem nada genial e brilhante aos olhos comuns, mas são peças essenciais na engrenagem da criação do artefacto final, sem eles não existe um grande maestro, nem um grande realizador.
- Continuo a discordar da rotulagem de censura… A censura não quer saber da estrutura das palavras, quer saber das ideias. Já o copyright protege a estrutura, não as ideias… Ninguém é impedido de dizer o que pensa. Como já disse, para mim censura, é impedir alguém de expressar os seus pensamentos, ideias e visões. Um acto de censura implica impedir alguém de comunicar as suas ideias a outras pessoas. Isso não acontece, nunca. Mesmo que a sua ideia seja igual à do escritor A ou B, ele não é impedido de expressar a ideia, apenas de o dizer numa determinada organização de palavras. Basta ler o ponto 2 do artigo 1º do CDADC.
- A investigação científica também é protegida, não com copyrights, mas com patentes. A indústria farmacêutica, a indústria automóvel, a indústria informática, etc. etc. está cheia de investigação protegida. Por isso não é porque nós que fazemos a nossa investigação com dinheiro público, que a investigação científica é toda pública. E o progresso aí não parou por estar protegido, antes aumentou, porque existem muitos mais meios para quem trabalha nesses laboratórios. É claro que a patente não dura o mesmo do copyright. Está entre os 15 e os 20 anos. Aliás como já tinha dito lá atrás, não concordo que o copyright possa durar uma vida. [Não concordo com várias coisas da Lei do Copyright, mas uma coisa é lutar por uma melhor lei, outra é procurar bani-la sem apresentar qualquer contra-solução. Fiquei contente com a decisão do tribunal americano de permitir a apropriação fotográfica, um sinal de que o remix deve ser respeitado.]
- Eu gostava de ver a sociedade viver sem cinema, literatura, música, pintura, escultura, videojogos, arquitectura, etc. etc. etc.
- Enfim. É tudo muito giro, mas é quando não nos toca a nós. Todo este discurso da partilha e da liberdade é muito giro, mas qualquer pessoa que tenha de viver do que cria, sabe bem do que falo aqui. [Para se perceber melhor o que acontece quando não existe forma de rentabilizar os produtos que se criam aconselho jogarem a versão pirata do Game Dev Tycoon]Numa segunda discussão online no Facebook com o Eloy trabalhou-se os fundamentos do Open Access na publicação científica. A ideia de que não faz sentido vedar o acesso a informação produzida pelos investigadores, até porque muita desta já foi antes paga pelos próprios contribuintes. Eloy defende uma abertura do acesso ao conhecimento, propondo como ideal a atingir, o fim das revistas científicas internacionais, vistas como os grandes promotores do fechamento do conhecimento. A ideia passa por colocar toda a produção científica em repositórios públicos, sistemas de disponibilização de artigos com custos reduzidos para as instituições, e deste modo garantir que a informação fica disponível para todos de modo gratuito.
- O mundo da comunicação todos para todos é muito bonito na teoria, mas quando enfrenta a realidade das nossas limitações de gestão de tanta interacção, percebe-se que afinal, existem outras razões por detrás de estruturas [editoras, gatekeeping, etc.] que se criaram no passado.
- Resta algo mais problemático. O conhecimento de que a informação existe, e mais importante ainda, de que essa informação é credível. Ou seja os repositórios são interessantes, enquanto eu souber que o que lá está foi triado antes por Revistas e Conferências de renome que garantem a credibilidade, pagando-se por isso. A partir do momento que um repositório passe a aceitar todo e qualquer artigo sem discriminação, perde o interesse para a comunidade. Obriga-me a investir mais tempo na filtragem do material.
- O que me preocupa em toda a discussão à volta do acesso aberto, e também do copyright, é aquela crença de que Editar e Distribuir, é algo menor, ou algo sem custos. As pessoas esquecem que a informação a que acedem, antes de lhes chegar, foi triada, preparada e disponibilizada nos sítios certos para que as pessoas dela ganhassem conhecimento. Existe todo um processo social que demora tempo, em que as pessoas vão ganhando respeito, em que a credibilidade se joga. É um pouco como a "confiança dos mercados", para falar na linguagem corrente.”Simplificando. Se não existissem revistas, e cada Universidade tivesse um repositório de todos os artigos publicados pelos seus investigadores, como é que eu poderia triar o que é novo? Triaria apenas o que é do MIT, de Harvard e mais meia-dúzia de universidades respeitadas mundialmente. E os investigadores de universidade menores passariam à história. Mais valeria dedicarem-se só às aulas. As revistas apesar de parecerem pouco democráticas, são-no muito mais do que se possa pensar.
Contra mim existem os argumentos suportados por pessoas como Lawrence Lessig catedrático da Faculdade de Direito da Universidade de Harvard. Ou Aaron Swartz a pessoa que ousou pôr à prova as revistas científicas, tendo instalado um computador dentro do MIT e feito o download de milhões de artigos para depois os disponibilizar em modo aberto. Swartz era uma mente brilhante, mas com sérios problemas de gestão de emoções, tendo recentemente posto fim à vida e assim tornando-se num mártir da causa. Lessig e Swartz trabalharam juntos na criação dos Creative Commons, vale a pena ver a palestra de Lessig no dia do início da sua cátedra, como homenagem a Aaron Swartz (vídeo e transcrição). Sobre Swartz vale a pena ler os artigos Requiem for a Dream da New Yorker e ainda A cidade e o futuro do mundo, segundo Aaron Swartz. Além destes temos Cory Doctorow um escritor de ficção-científica, conhecido pelo seu blog Boing Boing, e que num artigo no mês passado no Guardian, Copyright wars are damaging the health of the internet, resume tudo aquilo que Kripahl defende, propondo o fim do copyright em nome da liberdade expressão, nem que para isso tenha de trucidar todos aqueles que vivem das indústrias criativas.
"Oh, sure, I worry about the income of artists, too, but that's a secondary concern. After all, practically everyone who ever set out to earn a living from the arts has failed – indeed, a substantial portion of those who try end up losing money in the bargain. That's nothing to do with the internet: the arts are a terrible business..." Cory DoctorowE se já era ridículo dizer isto, uma vez que as indústrias criativas são reconhecidas como um dos braços mais relevante das economias desenvolvidas, a alucinação de Doctorow em redor da sacrossanta liberdade da internet vai ao ponto de propôr que se termine com todo o tipo de vigilância da rede desde o terrorismo à pedofília. Aqui a única coisa que posso dizer é que Doctorow não tem a menor ideia do que está a falar. Aconselhava-o a fazer uma visita a uma qualquer conferência sobre a temática e ver responsáveis por brigadas falar, ouvir algumas histórias reais sobre o submundo da internet, para perceber o quão ingénuo e perigoso é aquilo que afirma. Na verdade é aqui que chegamos, quando optamos por defender ideias de modo extremista. Nada se pode intrometer no nosso caminho, seja o que for, tudo é tratado pela mesma bitola.
Mas perguntam, como posso eu não defender a Liberdade de Expressão, como posso eu não defender o Acesso ao Conhecimento para todos? Como posso ir contra fundamentos que considero basilares? A primeira constatação está relacionada com o facto de que nada no mundo é sagrado, e tudo pode e deve ser questionado sempre. Nesse sentido as nossas posições devem ser casuísticas, e não de princípio. Tão importante como a liberdade de expressão, é a liberdade de pensar. Enredar o pensamento em fundamentalismos cega a nossa capacidade de apreender o diferente, e condiciona o nosso pensamento.
Neste sentido julgo que estamos perante um discurso que apenas consegue ver uma parte da problemática, querendo resolver essa parte, sem se preocupar com todas as variáveis que lhe dizem respeito. E se resolvi escrever este artigo foi para me ajudar a mim próprio a compreender as razões que toldam o pensamento desta abordagem. É algo que comecei a perceber apenas a partir da última discussão sobre os repositórios de conhecimento, quando comecei a notar paralelos com os discursos dos defensores dos cursos universitários massivos online (MOOCs), dos rankings de publicações científicas, dos rankings de escolas e os exames nacionais, entre outras coisas. Venho-me debatendo internamente e em discussões online contra aquilo que considero serem acções de uma minoria que pretende passar a "gerir" a sociedade através de verdades estatísticas, económicas e quantitativas em desfavor da singularidade individual e da criatividade humana. Considero que isto é em parte resultante do deslumbramento com a chamada "sociedade de informação" que choca com algumas teorias sobre o embebimento de conhecimento em Tecnologias Criativas que venho estudando.
As tecnologias criativas têm sido o meu pet project dos últimos anos, para o qual tenho trabalhado conceitos muito abrangentes como a criatividade, a tecnologia, a internet, o artesanato, a revolução industrial, o conhecimento, etc. Muitos dos discursos que vou lendo nestes domínios estão a maior parte do tempo apenas concentrados num único assunto: os impactos da internet nos sistemas de informação. Muito desses impactos têm-nos levado a discutir a suposta gratuitidade do digital, as modificações das massas, dos processos de distribuição, dos processos de produção. Muitas destas discussões têm vindo a promover a crença em teorias que comparam o funcionamento da internet com o funcionamento do nosso cérebro, como Doctorow diz, nós precisamos de "acknowledge that the internet is the nervous system of the information age."
Por outro lado toda uma outra barricada se começou a levantar do lado oposto e tem acusado os defensores da internet e das ideologias subjacentes, de fundamentalistas e crentes, defensores cegos da tecnologia a qualquer custo. Um dos mais conhecidos detractores e que se tem afirmado internacionalmente é Evgeny Morozov que no campo da ciência política tem procurado demonstrar a falácia por detrás destes pensamento hegemónico com The Net Delusion: The Dark Side of Internet Freedom e To Save Everything, Click Here: Technology, Solutionism, and the Urge to Fix Problems that Don’t Exist (2013). Mas mesmo no campo da própria tecnologia temos visto vozes a levantar-se. Jaron Lanier um dos principais mentores da Realidade Virtual escreveu o manifesto, You Are Not a Gadget (2010) nesse sentido. Ou ainda Andrew Keen um dos maiores evangelistas de Silicon Valley que a uma dada altura começou a escrever a propósito do assunto, The Cult of the Amateur: How Today's Internet Is Killing Our Culture (2007) e Digital Vertigo: How Today's Online Social Revolution Is Dividing, Diminishing, and Disorienting Us (2012). E vão aparecendo já alguns artigos mais honestos sobre as limitações dos MOOCs. Alguns acusam este lado da barricada de mero “ludditismo”. Não aceito porque ao colocar-me deste lado da barricada, não estou de modo algum a apontar o dedo à tecnologia. Para mim as grandes questões subjacentes ao copyright e ao acesso ao conhecimento científico não estão condicionadas pelo surgimento da internet ou qualquer outra tecnologia. Antes pelo contrário, esta tem servido para ajudar a promover tudo o que defendo no campo da criatividade.
Posto tudo isto os problemas que eu identifico e que estão na base da minha rejeição da abordagem Messiânica da Internet, grande responsável pelas ideias subjacentes ao fim do copyright, fim das revistas científicas, e fim das Universidades, não se relacionam com a tecnologia, mas com a forma como concebemos o seu uso. As tecnologias da comunicação se bem utilizadas podem servir o ser humano, se mal utilizadas colocarão o humano ao serviço da tecnologia a médio prazo. Muito já se ouve falar sobre a escrita de poemas por máquinas, a criação de filmes por algoritmos, a mais recente é a correcção de exames por máquinas. Deixo apenas uma nota a todos os crentes nestes sistemas: Só as máquinas não erram, mas é o erro que nos torna únicos, é do erro que brota a nossa criatividade. Dizer ainda que a internet não se assemelha, de forma alguma, ao nosso sistema neuronal. É uma falácia, e é uma clara tentativa de colar uma metáfora de fácil compreensão no sentido de lhe garantir maior credibilidade. O nosso cérebro funciona de forma muito diferente, acima de tudo porque a informação não circula apenas orientada pela cognição, é também trabalhada pela emoção.
Assim a grande questão por detrás de todas as discussões sobre o copyright e o acesso gratuito à informação está ligado à confusão que existe entre os processos de Comunicação e os processos de Informação. Ao longo dos últimos anos assistimos a uma tentativa de colagem da Informação à Comunicação. Desde da aceitação internacional do termo “Tecnologias de Informação e Comunicação”, à integração nas mesmas áreas científicas das Ciências da Comunicação e Ciências da Informação. Para quem está de fora, não existe diferença. Apercebi-me disto apenas após discutir intensamente com pessoas que claramente dominam os pressupostos das Ciências da Informação, mas a quem falta conhecimento sobre as Ciências da Comunicação. Esta discussão colocou bem em evidência as diferenças fundamentais entre ambas. Mais sobre estas diferenças pode ser visto no texto que publiquei aqui a propósito do livro de Dominique Wolton, "Informar não é Comunicar".
Primeiro modelo de comunicação, de Claude Shannon (1948)
Deste modo ao longo de todas estas discussões percebi que os defensores do fim dos modelos atuais - copyright, revistas especializadas, universidades - baseavam toda a sua argumentação num processo simplificado de comunicação, ou seja no primeiro modelo de comunicação de Claude Shannon de 1948. Nesta altura a comunicação encerrava-se sob um mero processo de transmissão de um produto, a informação. Estes modelos surgidos no pós-guerra procuravam melhorar os processos de transmissão de informação, daí que a sua preocupação fosse o meio ou canal. O relevante da discussão reduzia-se aos modelos de redução dos ruídos do canal. Assim os Emissores e Receptores não eram tidos em conta, eram meros recipientes, variáveis independentes, sem condicionantes sociais, psicológicas ou de competências.
Modelo unificado do processo de comunicação (Foulger, 2004)
Mas o conhecimento sobre a Comunicação evoluiu, transformou-se, e hoje sabemos muito mais sobre o que está em jogo. Quando comunicamos não estamos apenas a emitir ou a receber informação através de um canal, estamos a calcular uma imensidade de outras variáveis, que por vezes têm tanta ou mais importância que a própria mensagem que se quer transmitir. Ou seja, para além daquilo que é dito, importa a forma como é dito, mas sobretudo o contexto no qual é dito, e o contexto no qual é recebido. Tudo isto cria um processo complexo, que precisa de ser trabalhado para que a mensagem chegue verdadeiramente a ser compreendida e partilhada. Como dizia Watzlawick já em 1968, o processo de comunicação é relacional, ou seja cada mensagem partilhada contém em si mesma metacomunicação que diz respeito ao modo como deve ser lida pelo receptor. No diagrama acima apresenta-se um modelo unificado da comunicação de Davis Foulger que apresenta algumas, ainda que de modo introdutório, das questões que normalmente preocupam os investigadores das ciências da comunicação.
Deste modo torna-se inevitável pensar que toda esta discussão é fruto de um ressuscitar de modelos de comunicação há muito defuntos. Um novo meio de comunicação surgiu, com novas potencialidades, e de repente esquecemos tudo o que aprendemos. Fazemos tábua rasa do conhecimento acumulado, e assumimos a internet como um novo messias da comunicação. O meio que tudo coloca em causa, que tudo pode, que tudo revoluciona. Assume-se uma sociedade que se adapta ao modelo desenhado pela internet, e não o seu contrário. Para os crentes na salvação pela internet, a sociedade passa a ser definida tal qual uma rede perfeita de relações (a internet) entre vários nós (as pessoas), desconsiderando os parâmetros da natureza humana que promovem a acção dos nós, responsáveis pelo estabelecimento dos laços do conhecimento. Deste modo toda a informação passa a ser livre e grátis, o copyright deixa de fazer sentido, e o ensino à distância substitui a necessidade de contacto interpessoal. Mas vai ainda mais longe, os países passam a ser governados por democracia directa, a salvação da democracia trazida pela internet, que abre caminho a que todas as decisões sejam tomadas por referendos. Do mesmo modo que as escolas já passaram a ser medidas em função das notas que os alunos tiram em exames nacionais, e a ciência passou a medir-se em função do número de publicações que os cientistas publicam. O que conta é apenas e só o resultado medível da quantidade de informação que é passada de um ponto A para um ponto B.
No final, tudo isto seria perfeito, e um gestor do alto do seu pedestal, conectado à internet, recebendo os dados em tempo real, directamente na sua folha de excel que tudo filtra através de algoritmos perfeitamente calibrados, poderia finalmente descansar, porque a sociedade estaria a funcionar tal qual uma grande fábrica de produtos em série, fruto da grande revolução industrial. Seria tudo assim, se os laços da comunicação humana, se pudessem criar desse modo. O problema é que não criam, não emergem e sem eles o Conhecimento não se constrói, não acontece. Transmite-se informação, acumula-se informação, transacciona-se informação, mas isso muda pouco os sujeitos envolvidos.
Ao longo de milhares de anos desde a criação da escrita, mais acentuadamente desde o aparecimento dos métodos de impressão, desenvolvemos sistemas de gestão de informação, envolvidos em sistemas humanos de comunicação, que foram evoluindo e sendo aperfeiçoados à medida que fomos compreendendo como construímos o conhecimento. Não massificámos as escolas para servirem a mera transmissão de informação, elas surgiram para estimular a criação de competências cognitivas nas pessoas de modo a permitir-lhes chegar ao conhecimento autonomamente. Não criámos a ciência para produzir mais informação, a descoberta científica não se traduz em qualquer artigo ou citação, o seu impacto só pode ser medido pelo avanço que provoca no nosso auto-conhecimento. Do mesmo modo não criámos editores nem copyrights para serem meros gestores de informação, eles existem porque têm uma função específica na cadeia de construção do conhecimento humano.
Podemos mudar, devemos evoluir, mas não devemos pôr tudo em causa simplesmente porque descobrimos um novo meio de comunicação. Para quem ainda pensa que a Internet veio para salvar o mundo, imagine-se em 1895 numa sala às escuras, ver um comboio em andamento vindo em direcção a si, a partir de um rectângulo de luz projectado numa parede! Imagine as ideias fantásticas que não passaram pela cabeça de muitos quando viram como a realidade podia a partir daquele momento ser registada e preservada para todo o sempre e ser mostrada em qualquer parte do mundo. A verdade é que a sociedade humana é bastante mais complexa, e as faculdades cognitivas do ser humano não mudam à velocidade do surgimento de cada nova tecnologia. Olhemos para a nossa história, temos conseguido criar muita tecnologia nova, mas a nossa biologia continua quase intacta passados vários milénios. Deixemo-nos de ilusões quanto a definir os tempos que se vivem como diferentes de tudo o que já passou, alguns colam-lhes adjectivos fortes como revolucionários ou de velocidade vertiginosa. Mas o passado será sempre visto como algo mais simples que o futuro, não porque verdadeiramente o foi, mas apenas e só porque é agora certo e imutável, sem as variáveis impossíveis de quantificar que o futuro nos reserva.
O ser humano é criativo por natureza, mas a capacidade de criar conhecimento pode ser posta em causa se deixar de interessar o processo e a descoberta, e passar a interessar apenas o produto resultante.
abril 29, 2013
Séries TV e RPGs, a dura duração da ilusão das experiências
Esta semana escrevi na Eurogamer a propósito das memórias que guardamos das experiências que vivemos, A Memória da Experiência. Não é algo que eu tenha investigado, antes me baseio no excelente trabalho da dupla Daniel Kahneman e Amos Tversky. Mas se tinha sido interessante a descoberta destes estudos, foi ainda mais interessante este fim-de-semana a coincidência que se deu com o relato de experiências distintas por parte de dois amigos no Facebook, um sobre as Séries de TV e outro sobre os RPGs. A eles digo apenas, leiam o artigo que escrevi, e se puderem deixem nos comentários as vossas memórias.
Tiago Sousa 27.04.2013: "Finally finished watching Lost series - was great but that's it, not watching more series without a begin/end on same freakin episode - too much addictive/time waste ^_^"
Luis Melo 29.04.2013: "How can you gamers play so many games a year? I just got back to Dark Souls (finally got it for PS3) and a whole week just flashed before my eyes. I'm not going to touch any games for several months after this. Not kidding."Achei muito interessante ler os comentários ao artigo que fiz para a Eurogamer, ver como os jogadores desesperadamente tentam demonstrar que estou errado. Totalmente ao contrário daquilo que é aqui dito pelo Tiago e pelo Luís, que tiveram um momento de lucidez racional no final das suas experiências. Muito do discurso presente nas caixas de comentários, encaixa numa inversão daquilo que Kahneman define como a "ilusão cognitiva". Ou seja, a nossa mente lembra apenas o pico mais intenso, e o final das experiências, mas nós queremos acreditar que não. Queremos acreditar que vale a pena investir todo aquele tempo, passar por todas aquelas experiências menores mas durante mais tempo, porque elas racionalizadas como um cálculo somatório representariam mais prazer do que aquele que verdadeiramente a nossa memória preserva de cada experiência.
antropomorfia realista
5m80 (2013) é um trabalho de Nicolas Deveaux para a produtora francesa de 3d para publicidade, a Cube Créative. Deveuax saiu da Supinfocom em 2002, e pouco depois realizava 7 tonnes 3 (2003). 5m80 é um voltar atrás 10 anos, e criar uma continuação para 7 tonnes 3.
O que temos aqui é algo que de tão estranho se entranha em nós. A fusão de dois universos tão longínquos, tão bem conseguido que ao fim de algum tempo começam a fazer a sentido, e nós próprios nos surpreendemos por isso. O realismo gráfico é impressionante, assim como a naturalidade dos movimentos, bem ritmado, sem simetrias fáceis. Não tem um objectivo narrativo, procura apenas surpreender e abrir a nossa curiosidade.
O que temos aqui é algo que de tão estranho se entranha em nós. A fusão de dois universos tão longínquos, tão bem conseguido que ao fim de algum tempo começam a fazer a sentido, e nós próprios nos surpreendemos por isso. O realismo gráfico é impressionante, assim como a naturalidade dos movimentos, bem ritmado, sem simetrias fáceis. Não tem um objectivo narrativo, procura apenas surpreender e abrir a nossa curiosidade.
abril 26, 2013
"A Story About Robots" (2013), simples e perfeito
Uma pequenina animação tão cheia de emoção e questionamento. Tão simples quanto um pequeno robô que sente o emergir de consciência do belo quando encara "O Beijo" (1908) de Gustav Klimt. É um projecto sem respostas, nem delongas, é um minuto e meio de puro encantamento adentro da análise da singularidade tecnológica. Um filme criado pela espanhola Paramotion Pictures.
Claro que tudo isto ganha uma maior importância quando o trabalho visual é de elevada qualidade. Quando o 3d e o "camera match" é perfeito, quando a cor e atmosfera são perfeitas, quando se tem uma noção perfeita do uso do enquadramento para contar uma história. É perfeito.
"A Story About Robots" is an animation short film, is a personal project we did on the weekends, made in Spain, in a small village called Segovia, with lot of love no budget. The backgrounds were photographed with Canon 50D. All the camera movements and travellings were made in stop motion. The robot was elaborated with 3D Studio Max and the integration with After Effects."
"A Story About Robots" is an animation short film, is a personal project we did on the weekends, made in Spain, in a small village called Segovia, with lot of love no budget. The backgrounds were photographed with Canon 50D. All the camera movements and travellings were made in stop motion. The robot was elaborated with 3D Studio Max and the integration with After Effects."
abril 24, 2013
David Lynch e a consciência
Trago uma belíssima conversa com David Lynch na conferência Consciousness, Creativity, and the Brain que decorreu na Universidade de Emerson, Boston em 2005. Nesta conversa podemos ver algumas das perguntas que muitos de nós já se colocaram sobre o seu trabalho, respondidas de modo directo e sem rodeios. Vale a pena ver entre o minuto 8'30'' e o minuto 36'.
Esta conferência surge no âmbito de questões relacionadas com a meditação, algo que David Lynch practica há mais de 30 anos. Com ele estão no palco o físico John Hagelin e o neurocientista Fred Travis. Ao longo de uma hora e meia pode ouvir-se muito sobre os efeitos da meditação na nossa capacidade de controlo. Um dos momentos altos acontece na viragem da primeira hora, quando em pleno palco uma pessoa que medita desde os 5 anos, é ligado a sensores EEG que medem a actividade eléctrica no cérebro. Nos minutos que se seguem poderão ver as ondas eléctricas de um cérebro durante a actividade de meditação. Se quiserem mais sobre esta discussão em redor da análise do processo mental em meditação vejam o artigo A Felicidade segundo o budista Matthieu Ricard.
Deixo aqui algumas das respostas dadas por Lynch. Deve-se ter em atenção que tudo isto é dito em 2005.
Q - Filmes que não fazem sentido.
:: "Eu gosto de histórias que tenham uma estrutura concreta, mas que possuam também algumas abstracções. A vida está cheia de abstracções. E o modo como fazemos sentido dela é através da intuição.
As pessoas estão tão formatadas para os filmes que explicam tudo a 100% que de certo modo acabam por desligar a sua intuição no momento de interpretar um filme com abstracções. Outras pessoas adoram estas abstrações, porque lhes dá espaço para sonhar. Para mim dá-me prazer criar estas abstrações e mantê-las no fluxo das imagens de um filme, porque são coisas que só o cinema pode dizer. Não são palavras, não é só música, é um conjunto de coisas misturadas dizendo algo que nunca foi dito antes.
Depende das pessoas encontrarem a sua própria interpretação. Não interessa o que eu penso. Intuição, pensamento, emoção tudo junto que trará um sentido para si."
Q - Porquê tanta violência nos seus filmes.
:: "As histórias têm áreas negras, e têm áreas claras. Têm todo o tipo de coisas... Não começamos uma história feliz, e seguimos sempre assim até ao final, se não todos adormeceriam. As histórias têm de ter estes contrastes."
Q - Meditação transcendente e cinema
:: "Existe um oceano de puro consciência dentro de cada um de nós. Mesmo na fonte do pensamento."
Q - Como cria a não-linearidade nos seus filmes
:: "As ideias não são rearranjadas. Tem que ver com o ritmo, com a emoção. Um frame a mais, ou um frame a menos pode mudar tudo."
Q - Digital e Película.
:: "A película está completamente morta. Eu penso. Com o DV temos tanta liberdade, que é magnifico.
Penso que nunca mais trabalharei com película."
Deixo aqui algumas das respostas dadas por Lynch. Deve-se ter em atenção que tudo isto é dito em 2005.
Q - Filmes que não fazem sentido.
:: "Eu gosto de histórias que tenham uma estrutura concreta, mas que possuam também algumas abstracções. A vida está cheia de abstracções. E o modo como fazemos sentido dela é através da intuição.
As pessoas estão tão formatadas para os filmes que explicam tudo a 100% que de certo modo acabam por desligar a sua intuição no momento de interpretar um filme com abstracções. Outras pessoas adoram estas abstrações, porque lhes dá espaço para sonhar. Para mim dá-me prazer criar estas abstrações e mantê-las no fluxo das imagens de um filme, porque são coisas que só o cinema pode dizer. Não são palavras, não é só música, é um conjunto de coisas misturadas dizendo algo que nunca foi dito antes.
Depende das pessoas encontrarem a sua própria interpretação. Não interessa o que eu penso. Intuição, pensamento, emoção tudo junto que trará um sentido para si."
Q - Porquê tanta violência nos seus filmes.
:: "As histórias têm áreas negras, e têm áreas claras. Têm todo o tipo de coisas... Não começamos uma história feliz, e seguimos sempre assim até ao final, se não todos adormeceriam. As histórias têm de ter estes contrastes."
Q - Meditação transcendente e cinema
:: "Existe um oceano de puro consciência dentro de cada um de nós. Mesmo na fonte do pensamento."
Q - Como cria a não-linearidade nos seus filmes
:: "As ideias não são rearranjadas. Tem que ver com o ritmo, com a emoção. Um frame a mais, ou um frame a menos pode mudar tudo."
Q - Digital e Película.
:: "A película está completamente morta. Eu penso. Com o DV temos tanta liberdade, que é magnifico.
Penso que nunca mais trabalharei com película."
Conferência "Consciousness, Creativity, and the Brain", 2005
Motherland = Metropolis + 300 + CryEngine
Motherland (2010) trabalha um tema já bastante visto, com uma técnica visual igualmente bastante utilizada, no entanto consegue fazê-lo com tanta qualidade técnica que nos deixa colados ao ecrã até ao final. Como se não bastasse, temos ainda todo o mundo virtual a ser criado sobre o motor de jogos CryEngine. Tudo isto é um projecto de estudante de fim de curso do Institute of Animation Filmakademie Baden-Württemberg.
Como filme de estudante, resulta de uma reflexão sobre o tema da propaganda, e análise estética do tratamente gráfico dado ao tema, nomeadamente nos anos 1920 e 1930. Assim no campo do tema, é inevitável pensar em 1984 (1948) de George Orwell, e desde então todas as suas variações. Já em termos estéticos, temos aqui uma colagem entre a composição e arquitectura de Metropolis (1927) de Fritz Lang e a saturação e o excesso visual de 300 (2006) de Zack Snyder. O resultado final é um trabalho visualmente poderoso, totalmente focado na força da sua ideia.
Muito interessante saber que todos os cenários 3d foram "filmados" dentro do CryEngine da Crytek em tempo real, o que contribui ainda mais para a exuberância técnica do trabalho apresentado. Um motor de jogos está longe de ser um sistema com a capacidade de renderização final de um pacote de software dedicado, ainda assim apresenta outras vantagens como no diz o realizador, que agora trabalha na Crytek,
Como filme de estudante, resulta de uma reflexão sobre o tema da propaganda, e análise estética do tratamente gráfico dado ao tema, nomeadamente nos anos 1920 e 1930. Assim no campo do tema, é inevitável pensar em 1984 (1948) de George Orwell, e desde então todas as suas variações. Já em termos estéticos, temos aqui uma colagem entre a composição e arquitectura de Metropolis (1927) de Fritz Lang e a saturação e o excesso visual de 300 (2006) de Zack Snyder. O resultado final é um trabalho visualmente poderoso, totalmente focado na força da sua ideia.
Muito interessante saber que todos os cenários 3d foram "filmados" dentro do CryEngine da Crytek em tempo real, o que contribui ainda mais para a exuberância técnica do trabalho apresentado. Um motor de jogos está longe de ser um sistema com a capacidade de renderização final de um pacote de software dedicado, ainda assim apresenta outras vantagens como no diz o realizador, que agora trabalha na Crytek,
"Using a real-time 3d engine gave the director more freedom and interactive feedback when building environments, lighting and planning camera moves while decreasing render and waiting times multifold."
Motherland (2010) de Hannes Appell
abril 23, 2013
Montagem Constructiva por David Bordwell
David Bordwell é um dos académicos mais relevantes na história dos estudos fílmicos, com uma carreira extremamente produtiva, tanto que depois de se aposentar da U. Madison Wisconsin continua a escrever extensos textos sobre cinema no seu blog. Mas o seu contributo não se determina pela quantidade, antes pela sua capacidade de sintetizar os estudos fílmicos e conduzi-los a um caminho sustentado do ponto de vista científico, com discursos racionais e lógicos. O que aqui trago hoje é apenas um excerto desse trabalho, um pequeno filme em que Bordwell desconstrói dois conceitos sobre o processo de montagem.
Este pequeno filme foi criado para acompanhar o capítulo 6, The Relation of Shot to Shot: Editing, do famoso volume Film Art: An Introduction, de introdução aos estudos fílmicos. Nele podemos assistir à discussão e demonstração das diferenças entre a montagem analítica e a montagem construtiva. A componente analítica diz respeito à manutenção de uma progressão de planos que determinam o local e posicionamento dos intervenientes na acção de modo a conduzir, e a ajudar o espectador. Já a construtiva, adopta o seu nome do construtivismo, e define-se através da libertação da responsabilidade de conduzir o espectador, obrigando este a trabalhar mais cognitivamente para acompanhar o que se lhe vai apresentando no ecrã.
Bordwell demonstra depois o funcionamento construtivista da montagem no caso do filme Pickpocket (1959) de Robert Bresson, colocando em evidência de um modo lógico como se constrói a estética de um filme utilizando um determinado tipo de montagem.
Este pequeno filme foi criado para acompanhar o capítulo 6, The Relation of Shot to Shot: Editing, do famoso volume Film Art: An Introduction, de introdução aos estudos fílmicos. Nele podemos assistir à discussão e demonstração das diferenças entre a montagem analítica e a montagem construtiva. A componente analítica diz respeito à manutenção de uma progressão de planos que determinam o local e posicionamento dos intervenientes na acção de modo a conduzir, e a ajudar o espectador. Já a construtiva, adopta o seu nome do construtivismo, e define-se através da libertação da responsabilidade de conduzir o espectador, obrigando este a trabalhar mais cognitivamente para acompanhar o que se lhe vai apresentando no ecrã.
Bordwell demonstra depois o funcionamento construtivista da montagem no caso do filme Pickpocket (1959) de Robert Bresson, colocando em evidência de um modo lógico como se constrói a estética de um filme utilizando um determinado tipo de montagem.
abril 22, 2013
"Caldera", o mundo interior da esquizoafectividade
Mais um filme de animação que procura dar a ver estados mentais inacessíveis ao exterior. Neste caso Caldera (2012) dá-nos uma visulização imaginada dos estados mentais de quem sofre de trantorno esquizoafectivo. O filme assume um tom pessoal, já que o autor se baseia na doença do seu pai. Fica o seu manifesto,
Caldera esteve em concurso em vários festivais académicos - Siggraph Asia 2012 e Ars Electronica 2012 - e foi premiado no Seattle International Film Festival e no Rome Independent Film Festival.
CALDERA is inspired by my father's struggle with schizoaffective disorder. In states of delusion, my father has danced on the rings of Saturn, spoken with angels, and fled from his demons. He has lived both a fantastical and haunting life, but one that's invisible to the most of us. In our differing understanding of reality, we blindly mandate his medication, assimilate him to our marginalizing culture, and entirely misinterpret him for all he is worth. CALDERA aims to not only venerate my father, but all brilliant minds forged in the haunted depths of psychosis.Em termos visuais, não gostei da modelação da face, demasiado lisa, perde alguma densidade que podia ser utilizada em certos momentos. Embora também se possa ler como a cara de alguém que sofre de distúrbios emocionais. Por outro lado o trabalho realizado ao nível das cores foi capaz de criar verdadeiros momentos de deleite, dá vontade de parar o filme e ficar a admirar certos frames.
Caldera esteve em concurso em vários festivais académicos - Siggraph Asia 2012 e Ars Electronica 2012 - e foi premiado no Seattle International Film Festival e no Rome Independent Film Festival.
abril 19, 2013
Informar não é Comunicar
Esta semana andei a reler Informer n'est pas Communiquer (2009) de Dominique Wolton por causa de algumas reflexões que tenho andado a fazer sobre os conceitos de copyright e open access. Entretanto aproveitei para escrever algumas linhas como pequena síntese do livro. Sobre os conceitos que me trouxeram até ele, em breve publicarei aqui um texto sobre o assunto.
Dominique Wolton é um dos gurus internacionais das ciências da comunicação, destacando-se por tratar o tema da comunicação a partir de uma perspectiva optimista. Para Wolton o fundamento da comunicação assenta na criação de relação entre diferentes. Em Pensar a Comunicação (1997) Wolton apresentava a sua teorização sobre o processo de comunicação em duas dimensões: a) o funcional, que se concretiza em meros processos de transmissão e difusão, em que a preocupação é apenas garantir a emissão e recepção; b) o normativo que se define por uma codificação da mensagem em função do meio e em função do receptor de modo a garantir a compreensão e compartilha. Ou seja, o funcional é aquilo que temos na grande maioria da comunicação tecnológica, em que existe uma emissão de informação e uma preocupação com a garantia dessa recepção. Já o normativo está preocupado em desenhar todo um processo capaz de garantir que a informação veiculada, não só chega ao outro, como é compreendida, e acima de tudo é partilhada também pelo outro.
Ora neste seu livro mais recente, Informar não é Comunicar de 2009, apresenta uma divisão destas duas dimensões em dois processos distintos, os quais já não se colocam sob o chapéu da Comunicação. Embora Wolton não reconheça que o faz, e reconhecendo eu que estou a forçar os seus pressupostos, com o objetivo de simplificar a análise dos processos. Assim Wolton passa a definir a Comunicação Funcional como apenas Informação, e só a Comunicação Normativa como verdadeira Comunicação. Esta sua redefinição vem no sentido de acompanhar as transformações tecnológicas, que se têm vindo desenvolver a um ritmo galopante, conduzindo a uma aceleração dos processos de transmissão que superam largamente a capacidade de recepção humana. Nesse sentido todo o livro acaba por funcionar como uma crítica às evoluções operadas pelas tecnologias de comunicação, nomeadamente a internet, ou melhor, os modos informativos da internet.
Aliás esta é uma crítica que já vem detrás, e que começa no Elogio do Público (1990) em que Wolton discutia a problemática da segmentação dos canais de televisão, no sentido em que a perda de discussão de diversidade, diminuia as pontes de contacto, promovendo a guetização cultural da sociedade, conduzindo à incomunicação, criando a desconfiança e a violência. Por sua vez a internet é um ainda maior exacerbamento de toda esta individualização, provocando uma destruição dos laços entre as pessoas. Um pensamento em toda a linha seguido por Sherry Turkle no seu livro Alone Together: Why We Expect More from Technology and Less from Each Other (2012). Para Wolton o processo de comunicação é algo muito sensível, frágil, e em negociação permanente, ao contrário da informação que para além de poder ser à prova da tecnologia, é capaz de evoluir ao seu ritmo. Como diz Wolton logo no início do livro, "nós sonhámos com a Aldeia Global, e agora redescobrimos a Torre de Babel" (2009:17).
Ao criar uma discussão permanente 'todos para todos', assume-se um carácter profundamente funcional, já que na impossibilidade da partilha se assume como denominador a transmissão da informação. Além disso, todos assumem a posição de emissor, enquanto o papel de receptor praticamente desaparece, pondo fim à partilha e compreensão. Wolton diz, "onde estão os lugares e espaços de legitimação quando todo o mundo intervém?". Porque sem a legitimação, passamos mais tempo a tentar verificar a veracidade da informação que nos chega do que a tentar compreender o seu significado. E eu digo mesmo, não só passamos mais tempo a confirmar, como passamos mais tempo a "descascar" a informação para a conseguir compreender. Este é o grande problema de dar a todos a mesma legitimidade de falar sobre assuntos sem distinção. Daí a velha noção da comunicação social de basear as suas fontes em especialistas, algo que tem vindo a ser distorcido com o tempo. Quando temos comentadores que falam sobre todo e qualquer assunto, sabemos de antemão, que o que nos está a ser oferecido, não tem como intenção informar, menos ainda comunicar, mas apenas e só entreter. A situação atual do excessivo número de comentadores políticos em televisões nacionais é em Portugal já um clássico, claramente que estes emissores não estão ali para informar, mas apenas e só para entreter. Porque a função de um político é tomar decisões informadas, não emitir pareceres ou opiniões, para isso existem os especialistas e técnicos de cada área. Como os espectadores não estão interessadas em especialidade política, os contornos dos processos de decisão, eles falam de tudo e de nada. É para isso que as cadeias de televisão os contratam, para servirem de entertainers.
Aliás isto é fruto de uma ideologia que evoluiu com a internet mas não só, a ideia de que o que conta é o que a pessoa diz, e não a sua formação ou origem, é uma tentativa clara de deturpação do processo de comunicação. Porque se não tenho nenhuma forma de legitimar a origem da informação, como é que atribuo valor ao que é dito por ela? A alternativa seria verificar tudo o que ela diz, mas para isso não me adianta perder tempo a ouvi-la, já que terei de confirmar eu próprio a informação. Ou seja, temos um problema de desdobramento de emissores por um lado, em que todos falam para todos, e ao mesmo tempo um problema de concentração sobre os emissores, em que todos falam de tudo. Os dois processos conduzem a uma perda de qualidade da informação, ou seja a uma deterioração da comunicação.
Wolton define o processo geral da comunicação como sendo constituído por três componentes: o tecnológico, que diz respeito aos aspectos instrumentais da transmissão; o económico, ligado às técnicas de trocas de mensagens; e o cultural, que se refere ao espaço simbólico da comunicação. O tecnológico e o económico pertencem ao domínio do acto de informar, que por seu lado não revela preocupações de âmbito simbólico ou cultural, já que isso é relegado para a dimensão do processo de comunicação. Enquanto no processo de informar o Receptor é algo menor, no processo de comunicação o Receptor torna-se "protagonista ao negociar, filtrar, hierarquizar, recusar ou aceitar as mensagens recebidas". Contudo isto não deve ser visto, e mais ainda em tempos de interactividade, como uma troca de papéis entre emissor/autor e receptor. Wolton frisa muito claramente que “o reconhecimento da alteridade no esquema da comunicação, só o poderá ser com a condição de não se tornar na referência última. O receptor pode tornar-se tirânico. Entre a alteridade e o imperialismo, as margens são muito estreitas (..) sobrevalorizar o receptor pode implicar tanta tirania como tê-lo ‘ignorado’ em excesso” (2009:121). É isto que acaba por acontecer quando não se aceita a legitimidade de quem emite, em que as ações cognitivas do receptor passam da compreensão, à confirmação e questionação, e daí para a emissão, transformando a comunicação um-todos ou poucos-todos, num processo todos-todos. Isto é algo que tem vindo a afectar muito particularmente a indústria dos videojogos, leia-se Controlling creativity: Eight developers discuss the dilemma of interactive art (2013).
Neste sentido Wolton critica o tecnicismo, a ideologia que acredita que a essência do processo de comunicação assenta na tecnologia e nas suas economias. Um pouco como o médico que se foca na doença e no seu tratamento, esquecendo o ser humano que se encontra à sua frente. Assim fugir ao tecnicismo é vital para se poder providenciar uma comunicação efectiva, em que o centro não seja o processo de transmissão, mas o receptor. Deste modo torna-se algo irrelevante os avanços técnicos da tecnologia nos domínios da velocidade ou multiplicidade de acessos, já que estes avanços não podem mudar o tempo que os homens precisam para se compreender mutuamente. Neste sentido a evolução tecnológica acaba por acentuar os processos de incomunicação, uma vez que o nosso cérebro não os consegue acompanhar. Daí que a informação em directo, ou as grandes ideias de 'democracia directa' percam validade, uma vez que não é pelo simples facto de ganhar acesso à informação que consigo ter tempo e capacidade para a 'digerir'. O problema é mesmo maior do que a velocidade e a quantidade de informação, já que para além de não se conseguir responder à velocidade exigida ou à quantidade apresentada, teremos sempre ainda a falta do conhecimento necessário para interpretar toda a informação, isto porque não nos poderemos especializar em tudo. Como dizia Gustavo Reis na sua palestra TEDxUnisinos 2012,
Neste sentido, o intermediário – jornalista, professor, editor, curador, académico, etc. – continua a ser fundamental para triar, hierarquizar, verificar, comentar, legitimar, eliminar e criticar a informação de modo a guiar o receptor. “Estas profissões intermediárias são indispensáveis para relativizar a ilusão de um mundo transparente, no qual cada um seria um ‘actor multiconectado’. Recordam-nos o papel dos conhecimentos que se devem transmitir. Existem competências específicas que justificam a transmissão” (2009:121). Neste sentido o intermediário terá maior ou menor capacidade para legitimar, quanto maior for o seu “capital simbólico” (Bourdieu), aquilo que permite ao receptor definir as hierarquias de credibilidade dos intervenientes na comunicação. Ou seja, não é indiferente para o receptor, a fonte que emite, o seu reconhecimento confere um determinado grau de credibilidade que facilita e incrementa a verdadeira ação de comunicação, ou seja de compreensão e compartilha.
No essencial esta obra resume o acto de comunicar como um ato de partilha, de sedução e de persuasão, mas como diz Wolton, “o desafio está menos no acto de partilhar o que é comum, e mais no facto de aprender a gerir as diferenças que nos separam” (2009:11). Wolton baseia todo o seu discurso no pressuposto antropológico da “alteridade”, que nos diz que todo o homem social interage e é interdependente do outro. Assim a comunicação tem como referente "a busca do outro e da relação", sendo um processo frágil, em negociação e legitimação constante.
Dominique Wolton é um dos gurus internacionais das ciências da comunicação, destacando-se por tratar o tema da comunicação a partir de uma perspectiva optimista. Para Wolton o fundamento da comunicação assenta na criação de relação entre diferentes. Em Pensar a Comunicação (1997) Wolton apresentava a sua teorização sobre o processo de comunicação em duas dimensões: a) o funcional, que se concretiza em meros processos de transmissão e difusão, em que a preocupação é apenas garantir a emissão e recepção; b) o normativo que se define por uma codificação da mensagem em função do meio e em função do receptor de modo a garantir a compreensão e compartilha. Ou seja, o funcional é aquilo que temos na grande maioria da comunicação tecnológica, em que existe uma emissão de informação e uma preocupação com a garantia dessa recepção. Já o normativo está preocupado em desenhar todo um processo capaz de garantir que a informação veiculada, não só chega ao outro, como é compreendida, e acima de tudo é partilhada também pelo outro.
Ora neste seu livro mais recente, Informar não é Comunicar de 2009, apresenta uma divisão destas duas dimensões em dois processos distintos, os quais já não se colocam sob o chapéu da Comunicação. Embora Wolton não reconheça que o faz, e reconhecendo eu que estou a forçar os seus pressupostos, com o objetivo de simplificar a análise dos processos. Assim Wolton passa a definir a Comunicação Funcional como apenas Informação, e só a Comunicação Normativa como verdadeira Comunicação. Esta sua redefinição vem no sentido de acompanhar as transformações tecnológicas, que se têm vindo desenvolver a um ritmo galopante, conduzindo a uma aceleração dos processos de transmissão que superam largamente a capacidade de recepção humana. Nesse sentido todo o livro acaba por funcionar como uma crítica às evoluções operadas pelas tecnologias de comunicação, nomeadamente a internet, ou melhor, os modos informativos da internet.
Aliás esta é uma crítica que já vem detrás, e que começa no Elogio do Público (1990) em que Wolton discutia a problemática da segmentação dos canais de televisão, no sentido em que a perda de discussão de diversidade, diminuia as pontes de contacto, promovendo a guetização cultural da sociedade, conduzindo à incomunicação, criando a desconfiança e a violência. Por sua vez a internet é um ainda maior exacerbamento de toda esta individualização, provocando uma destruição dos laços entre as pessoas. Um pensamento em toda a linha seguido por Sherry Turkle no seu livro Alone Together: Why We Expect More from Technology and Less from Each Other (2012). Para Wolton o processo de comunicação é algo muito sensível, frágil, e em negociação permanente, ao contrário da informação que para além de poder ser à prova da tecnologia, é capaz de evoluir ao seu ritmo. Como diz Wolton logo no início do livro, "nós sonhámos com a Aldeia Global, e agora redescobrimos a Torre de Babel" (2009:17).
Em vez da simplicidade e facilidade de comunicar prometida pela Aldeia Global, encontrámos a complexidade e a confusão da Torre de Babel.
Ao criar uma discussão permanente 'todos para todos', assume-se um carácter profundamente funcional, já que na impossibilidade da partilha se assume como denominador a transmissão da informação. Além disso, todos assumem a posição de emissor, enquanto o papel de receptor praticamente desaparece, pondo fim à partilha e compreensão. Wolton diz, "onde estão os lugares e espaços de legitimação quando todo o mundo intervém?". Porque sem a legitimação, passamos mais tempo a tentar verificar a veracidade da informação que nos chega do que a tentar compreender o seu significado. E eu digo mesmo, não só passamos mais tempo a confirmar, como passamos mais tempo a "descascar" a informação para a conseguir compreender. Este é o grande problema de dar a todos a mesma legitimidade de falar sobre assuntos sem distinção. Daí a velha noção da comunicação social de basear as suas fontes em especialistas, algo que tem vindo a ser distorcido com o tempo. Quando temos comentadores que falam sobre todo e qualquer assunto, sabemos de antemão, que o que nos está a ser oferecido, não tem como intenção informar, menos ainda comunicar, mas apenas e só entreter. A situação atual do excessivo número de comentadores políticos em televisões nacionais é em Portugal já um clássico, claramente que estes emissores não estão ali para informar, mas apenas e só para entreter. Porque a função de um político é tomar decisões informadas, não emitir pareceres ou opiniões, para isso existem os especialistas e técnicos de cada área. Como os espectadores não estão interessadas em especialidade política, os contornos dos processos de decisão, eles falam de tudo e de nada. É para isso que as cadeias de televisão os contratam, para servirem de entertainers.
Em 2013 o número de comentadores políticos com espaço próprio na TV atingiu proporções que não se conhecem em mais nenhum país. Os políticos portugueses, deixaram de agir e tomar decisões, para estar ao serviço do entretenimento.
Aliás isto é fruto de uma ideologia que evoluiu com a internet mas não só, a ideia de que o que conta é o que a pessoa diz, e não a sua formação ou origem, é uma tentativa clara de deturpação do processo de comunicação. Porque se não tenho nenhuma forma de legitimar a origem da informação, como é que atribuo valor ao que é dito por ela? A alternativa seria verificar tudo o que ela diz, mas para isso não me adianta perder tempo a ouvi-la, já que terei de confirmar eu próprio a informação. Ou seja, temos um problema de desdobramento de emissores por um lado, em que todos falam para todos, e ao mesmo tempo um problema de concentração sobre os emissores, em que todos falam de tudo. Os dois processos conduzem a uma perda de qualidade da informação, ou seja a uma deterioração da comunicação.
Surgiu um comentador na televisão portuguesa em 2012 que legitimava aquilo que dizia com o "facto" de ser coordenador de um observatório de economia das Nações Unidas, e ainda como consultor do Banco Mundial, doutorado e docente numa universidade americana. Descobriu-se mais tarde que tudo o que o legitimava não existia. Com isto esvaziou-se o discurso, pois deixou de ser credível, já que aquilo que dizia, careceria de ser tudo confirmado, para aferir da veracidade. Ou seja, deixou se ser relevante ser ouvido, naquelas matérias em particular, em que se pretendia fazer ouvir.
Wolton define o processo geral da comunicação como sendo constituído por três componentes: o tecnológico, que diz respeito aos aspectos instrumentais da transmissão; o económico, ligado às técnicas de trocas de mensagens; e o cultural, que se refere ao espaço simbólico da comunicação. O tecnológico e o económico pertencem ao domínio do acto de informar, que por seu lado não revela preocupações de âmbito simbólico ou cultural, já que isso é relegado para a dimensão do processo de comunicação. Enquanto no processo de informar o Receptor é algo menor, no processo de comunicação o Receptor torna-se "protagonista ao negociar, filtrar, hierarquizar, recusar ou aceitar as mensagens recebidas". Contudo isto não deve ser visto, e mais ainda em tempos de interactividade, como uma troca de papéis entre emissor/autor e receptor. Wolton frisa muito claramente que “o reconhecimento da alteridade no esquema da comunicação, só o poderá ser com a condição de não se tornar na referência última. O receptor pode tornar-se tirânico. Entre a alteridade e o imperialismo, as margens são muito estreitas (..) sobrevalorizar o receptor pode implicar tanta tirania como tê-lo ‘ignorado’ em excesso” (2009:121). É isto que acaba por acontecer quando não se aceita a legitimidade de quem emite, em que as ações cognitivas do receptor passam da compreensão, à confirmação e questionação, e daí para a emissão, transformando a comunicação um-todos ou poucos-todos, num processo todos-todos. Isto é algo que tem vindo a afectar muito particularmente a indústria dos videojogos, leia-se Controlling creativity: Eight developers discuss the dilemma of interactive art (2013).
Mass Effect 3 (2012), o final do jogo gerou tanta pressão por parte dos receptores, que os criadores se viram obrigados a criar um novo final para satisfazer os seus receptores. Ou seja, foi colocado em causa a legitimidade dos criadores, e o processo de comunicação foi corrompido.
Neste sentido Wolton critica o tecnicismo, a ideologia que acredita que a essência do processo de comunicação assenta na tecnologia e nas suas economias. Um pouco como o médico que se foca na doença e no seu tratamento, esquecendo o ser humano que se encontra à sua frente. Assim fugir ao tecnicismo é vital para se poder providenciar uma comunicação efectiva, em que o centro não seja o processo de transmissão, mas o receptor. Deste modo torna-se algo irrelevante os avanços técnicos da tecnologia nos domínios da velocidade ou multiplicidade de acessos, já que estes avanços não podem mudar o tempo que os homens precisam para se compreender mutuamente. Neste sentido a evolução tecnológica acaba por acentuar os processos de incomunicação, uma vez que o nosso cérebro não os consegue acompanhar. Daí que a informação em directo, ou as grandes ideias de 'democracia directa' percam validade, uma vez que não é pelo simples facto de ganhar acesso à informação que consigo ter tempo e capacidade para a 'digerir'. O problema é mesmo maior do que a velocidade e a quantidade de informação, já que para além de não se conseguir responder à velocidade exigida ou à quantidade apresentada, teremos sempre ainda a falta do conhecimento necessário para interpretar toda a informação, isto porque não nos poderemos especializar em tudo. Como dizia Gustavo Reis na sua palestra TEDxUnisinos 2012,
"The infinite information that is offered by search engines, translates into zero knowledge.Ou seja, se aquilo que é comunicado é-o feito de modo meramente funcional, ou informativo, então fica de lado a hipótese do receptor poder agir sobre essa informação. Liquida-se o processo de comunicação, apesar da informação continuar a ser transmitida.
If there is no selection of relevant information and the creation of links between the relevant parts of that information, the infinite information tends to zero knowledge."
Neste sentido, o intermediário – jornalista, professor, editor, curador, académico, etc. – continua a ser fundamental para triar, hierarquizar, verificar, comentar, legitimar, eliminar e criticar a informação de modo a guiar o receptor. “Estas profissões intermediárias são indispensáveis para relativizar a ilusão de um mundo transparente, no qual cada um seria um ‘actor multiconectado’. Recordam-nos o papel dos conhecimentos que se devem transmitir. Existem competências específicas que justificam a transmissão” (2009:121). Neste sentido o intermediário terá maior ou menor capacidade para legitimar, quanto maior for o seu “capital simbólico” (Bourdieu), aquilo que permite ao receptor definir as hierarquias de credibilidade dos intervenientes na comunicação. Ou seja, não é indiferente para o receptor, a fonte que emite, o seu reconhecimento confere um determinado grau de credibilidade que facilita e incrementa a verdadeira ação de comunicação, ou seja de compreensão e compartilha.
No essencial esta obra resume o acto de comunicar como um ato de partilha, de sedução e de persuasão, mas como diz Wolton, “o desafio está menos no acto de partilhar o que é comum, e mais no facto de aprender a gerir as diferenças que nos separam” (2009:11). Wolton baseia todo o seu discurso no pressuposto antropológico da “alteridade”, que nos diz que todo o homem social interage e é interdependente do outro. Assim a comunicação tem como referente "a busca do outro e da relação", sendo um processo frágil, em negociação e legitimação constante.
abril 18, 2013
Space Bound (2013), ternura em 3d
When Death’s door is only a few breaths away, how would you choose to spend your last moments? É este o ponto de partida de mais um filme de estudante de Ellen Su e Kyle Moy da School of Visual Arts de Nova Iorque.
Space Bound (2013) é um filme com dois minutos e meio, uma criança e um cão no espaço, consegue questionar-nos sobre tanto em tão pouco tempo. É uma curta de animação 3d carregada de ternura, amizade e empatia. Impossível não se ligar no tema e sentir a mensagem. O final fica por conta da imaginação de cada um decidir!
Em termos estéticos, temos um 3d clássico, muito conseguido, com um bom trabalho ao nível da cor, muito saturada muito orientada à animação tradicional para crianças mais novas. A modelação e o character design muito redondinho capaz de conferir um carácter de brandura à mensagem e tema. No campo narrativo temos uma clara influência do mundo dos videojogos, conseguindo dessa forma criar em tão pouco tempo 2 ou 3 momentos de grande ligação emocional.
Space Bound (2013) é um filme com dois minutos e meio, uma criança e um cão no espaço, consegue questionar-nos sobre tanto em tão pouco tempo. É uma curta de animação 3d carregada de ternura, amizade e empatia. Impossível não se ligar no tema e sentir a mensagem. O final fica por conta da imaginação de cada um decidir!
Em termos estéticos, temos um 3d clássico, muito conseguido, com um bom trabalho ao nível da cor, muito saturada muito orientada à animação tradicional para crianças mais novas. A modelação e o character design muito redondinho capaz de conferir um carácter de brandura à mensagem e tema. No campo narrativo temos uma clara influência do mundo dos videojogos, conseguindo dessa forma criar em tão pouco tempo 2 ou 3 momentos de grande ligação emocional.
Space Bound (2013) de Ellen Su e Kyle Moy
Retratos da auto-estima
Não é um experimento científico, longe disso, faltam aqui muitos ingredientes, nomeadamente a experimentação com homens ou a experimentação com pessoas que conhecem há mais tempo as pessoas, além do facto de o desenho não poder ser equacionado como um dado completamente objectivo, já que se socorre da subjectivade do desenhador e do receptor. Apesar disso é um experimento poderoso, e capaz de lançar algumas luzes sobre a a construção que cada um de nós faz sobre a identidade.
O experimento é simples e consiste em ter um profissional de desenho criminal a desenhar dois retratos de uma mesma pessoa. Um dos retratos descrito pela própria, e outro descrito por uma pessoa desconhecida que teve apenas uma pequena conversa com esta antes de fazer o retrato. O resultado final expõe as retratadas à imagem que fazem de si, e à imagem que os outros concebem de si. Os retratos finais são completamente díspares.
A campanha concentra-se na beleza, é uma campanha feita pela Ogilvy Brazil, aliás por isso mesmo se forem ao site da campanha poderão ver o filme com legendas em português. O objectivo passava por dar às mulheres uma demonstração mais objectiva da sua beleza. Algo dentro do estilo de campanhas anteriores da Dove (Ogilvy Toronto, The Evolution of Beauty), mas nos casos anteriores pretendia-se passar a ideia através da desconstrução professional das imagens de beleza que pululam nos media. Aqui foi seguido um caminho diferente, em vez de atacar o criativo, atacar directamente a fonte do problema, a ideia que cada sujeito faz de si.
Julgo que esta campanha é muito conseguida, não propriamente do ponto de vista da beleza, mas antes mais da identidade. A beleza diz apenas respeito à nossa aparência, e o que podemos ver nestes retratos vai muito para além da diferença de aparências. Os retratos criados por Gil Zamora estão na medida do possível despojados de emoção, embora quando vemos o filme não pareça, porque a montagem fílmica entre o retrato e a retratada confere propriedades ao desenho que este não tem (vejam depois os desenhos isoladamente abaixo). Apesar do esforço de neutralidade emocional (nomeadamente manutenção de mesma posição da boca e dos olhos/sobrancelhas) quando realizamos a comparação é inevitável ler emoções porque elas servem-nos para caracterizar e diferenciar os retratos. Neste sentido o que se pode identificar nos retratos e que me parece mais relevante são as questões relacionadas com a jovialidade e a força interior.
Existe uma tendência para ser mais crítico de si, para exagerar os traços pessoais, por exemplo se a mulher se considera mais forte aparece com uma cara muito redonda, se se considera muito magra aparece com uma cara cadavérica. O problema acaba por emergir desta exacerbação dos defeitos que cada um vê em si que por sua vez acabam por contribuir para criar uma imagem de si mais triste e sem vida. E isto não será imune ao modo como as pessoas se vão descrevendo, claramente que quando me descrevo de modo crítico o faço com algum pesar e tristeza porque a crítica está imbuída desse espírito, e claramente esse tom foi passado para o desenho final. Por outro lado as imagens criadas a partir daquilo que as outras viram, estão desprovidas de tom crítico já que a interação entre as pessoas foi mínima, por isso o modo como se descreve é carregado de um tom mais positivo, reforçando a ideia de jovialidade, alegria, simpatia, ou amizade. Por isso falava no início que seria interessante fazer este retrato com pessoas que se conhecem desde pequenas, ou ainda com pessoas que gostam da pessoa e pessoas que não gostam, para vermos como as diferenças seriam ainda mais carregadas.
Tudo isto apenas para concluir que precisamos não propriamente de nos preocupar mais ou menos com a nossa beleza, mas precisamos sim, e muito de nos preocupar com a nossa auto-estima. Muito mais importante do que ter capacidade para ver em nós uma pessoa bonita, é a capacidade para reconhecer em nós, uma pessoa de que gostamos, independentemente da beleza.
O experimento é simples e consiste em ter um profissional de desenho criminal a desenhar dois retratos de uma mesma pessoa. Um dos retratos descrito pela própria, e outro descrito por uma pessoa desconhecida que teve apenas uma pequena conversa com esta antes de fazer o retrato. O resultado final expõe as retratadas à imagem que fazem de si, e à imagem que os outros concebem de si. Os retratos finais são completamente díspares.
Retratos da Beleza Real (2013) Ogilvy Brazil
A campanha concentra-se na beleza, é uma campanha feita pela Ogilvy Brazil, aliás por isso mesmo se forem ao site da campanha poderão ver o filme com legendas em português. O objectivo passava por dar às mulheres uma demonstração mais objectiva da sua beleza. Algo dentro do estilo de campanhas anteriores da Dove (Ogilvy Toronto, The Evolution of Beauty), mas nos casos anteriores pretendia-se passar a ideia através da desconstrução professional das imagens de beleza que pululam nos media. Aqui foi seguido um caminho diferente, em vez de atacar o criativo, atacar directamente a fonte do problema, a ideia que cada sujeito faz de si.
Julgo que esta campanha é muito conseguida, não propriamente do ponto de vista da beleza, mas antes mais da identidade. A beleza diz apenas respeito à nossa aparência, e o que podemos ver nestes retratos vai muito para além da diferença de aparências. Os retratos criados por Gil Zamora estão na medida do possível despojados de emoção, embora quando vemos o filme não pareça, porque a montagem fílmica entre o retrato e a retratada confere propriedades ao desenho que este não tem (vejam depois os desenhos isoladamente abaixo). Apesar do esforço de neutralidade emocional (nomeadamente manutenção de mesma posição da boca e dos olhos/sobrancelhas) quando realizamos a comparação é inevitável ler emoções porque elas servem-nos para caracterizar e diferenciar os retratos. Neste sentido o que se pode identificar nos retratos e que me parece mais relevante são as questões relacionadas com a jovialidade e a força interior.
Existe uma tendência para ser mais crítico de si, para exagerar os traços pessoais, por exemplo se a mulher se considera mais forte aparece com uma cara muito redonda, se se considera muito magra aparece com uma cara cadavérica. O problema acaba por emergir desta exacerbação dos defeitos que cada um vê em si que por sua vez acabam por contribuir para criar uma imagem de si mais triste e sem vida. E isto não será imune ao modo como as pessoas se vão descrevendo, claramente que quando me descrevo de modo crítico o faço com algum pesar e tristeza porque a crítica está imbuída desse espírito, e claramente esse tom foi passado para o desenho final. Por outro lado as imagens criadas a partir daquilo que as outras viram, estão desprovidas de tom crítico já que a interação entre as pessoas foi mínima, por isso o modo como se descreve é carregado de um tom mais positivo, reforçando a ideia de jovialidade, alegria, simpatia, ou amizade. Por isso falava no início que seria interessante fazer este retrato com pessoas que se conhecem desde pequenas, ou ainda com pessoas que gostam da pessoa e pessoas que não gostam, para vermos como as diferenças seriam ainda mais carregadas.
Tudo isto apenas para concluir que precisamos não propriamente de nos preocupar mais ou menos com a nossa beleza, mas precisamos sim, e muito de nos preocupar com a nossa auto-estima. Muito mais importante do que ter capacidade para ver em nós uma pessoa bonita, é a capacidade para reconhecer em nós, uma pessoa de que gostamos, independentemente da beleza.
abril 17, 2013
histórias do Title Design
Esta semana surgiu mais um documentário na rede sobre a história do desenho de genéricos, The Film before The Film (2013). Esta é uma arte que me interessa particularmente e sobre a qual já trabalhei do ponto de vista académico. De qualquer modo aproveito este artigo para listar três trabalhos anteriores que se cruzam e ajudam a reforçar os momentos mais relevantes da história deste meio.
O filme A History Of The Title Sequence traça, literalmente, a história do desenho dos genéricos apresentando os nomes dos mais importantes designers desenhando-os seguindo os estilos de cada designer. É um pequeno filme que poderia funcionar como genérico de um documentário maior sobre a área. Vale a pena ver um pequeno making of do filme.
Ainda em 2011 o site The Art of Title preparou uma sequência com alguns dos mais importantes excertos de title design da história do cinema, desde Intolerance até The Social Network. A curta tem apenas música, e apresenta os excertos em modo cronológico. Foi criado para introduzir o prémio Title Design Finalists Screening no SXSW, Austin em 2011.
Em 2012 foi a vez da série OffBook realizar também um episódio dedicado à arte do desenho de genéricos. Nessa altura apresentei aqui o documentário e discuti-o em função do artigo que tinha escrito para a academia sobre o assunto, com excertos traduzidos para português.
E finalmente chega-nos agora este novo trabalho, The Film before The Film (2013) de Nora Thoes e Damian Pérez criado na Berliner Technische Kunsthochschule. Uma curta documental que traça a evolução dos genéricos através de uma breve análise da história do cinema. Em certa medida é como se pegasse no trabalho A Brief History of Title Design (2011) de Ian Albinson e o estendesse, adicionando ainda uma narração que vai contando toda a história e importância do meio. É provavelmente o trabalho documental mais completo sobre a história do meio.
The Film before The Film (2013) de Nora Thoes e Damian Pérez
Outros trabalhos na área dos genéricos que tenho aqui discutido podem ser encontrados seguindo a etiqueta Titles.
ACTUALIZAÇÃO 20/04/2013
Em conversa o Daniel Brandão referenciou ainda a curta documental "What is Motion Design ?" (2012) de Paola Boileau e Kook Ewo, na qual podemos ver excertos de genéricos misturados com idents de televisão, videoclips e jogos. Um documentário criado para dar suporte a uma ideia que os autores têm e que passa por criar em França um museu dedicado ao Motion Design. Vale a pena ver.
O filme A History Of The Title Sequence traça, literalmente, a história do desenho dos genéricos apresentando os nomes dos mais importantes designers desenhando-os seguindo os estilos de cada designer. É um pequeno filme que poderia funcionar como genérico de um documentário maior sobre a área. Vale a pena ver um pequeno making of do filme.
A History Of The Title Sequence (2011) de Jurjen Versteeg
Ainda em 2011 o site The Art of Title preparou uma sequência com alguns dos mais importantes excertos de title design da história do cinema, desde Intolerance até The Social Network. A curta tem apenas música, e apresenta os excertos em modo cronológico. Foi criado para introduzir o prémio Title Design Finalists Screening no SXSW, Austin em 2011.
A Brief History of Title Design (2011) de Ian Albinson
Em 2012 foi a vez da série OffBook realizar também um episódio dedicado à arte do desenho de genéricos. Nessa altura apresentei aqui o documentário e discuti-o em função do artigo que tinha escrito para a academia sobre o assunto, com excertos traduzidos para português.
Discussão académica de The Art of Film and TV Title Design da série OffBook
E finalmente chega-nos agora este novo trabalho, The Film before The Film (2013) de Nora Thoes e Damian Pérez criado na Berliner Technische Kunsthochschule. Uma curta documental que traça a evolução dos genéricos através de uma breve análise da história do cinema. Em certa medida é como se pegasse no trabalho A Brief History of Title Design (2011) de Ian Albinson e o estendesse, adicionando ainda uma narração que vai contando toda a história e importância do meio. É provavelmente o trabalho documental mais completo sobre a história do meio.
The Film before The Film (2013) de Nora Thoes e Damian Pérez
Outros trabalhos na área dos genéricos que tenho aqui discutido podem ser encontrados seguindo a etiqueta Titles.
ACTUALIZAÇÃO 20/04/2013
Em conversa o Daniel Brandão referenciou ainda a curta documental "What is Motion Design ?" (2012) de Paola Boileau e Kook Ewo, na qual podemos ver excertos de genéricos misturados com idents de televisão, videoclips e jogos. Um documentário criado para dar suporte a uma ideia que os autores têm e que passa por criar em França um museu dedicado ao Motion Design. Vale a pena ver.
What is Motion Design ?" (2012) de Paola Boileau e Kook Ewo
abril 16, 2013
Entrevista com Mario Costa, realizador freelance
Portugal transborda de talento, trago mais um magnífico videoclip criado por um antigo aluno meu, o Mario Costa que me deixa muito contente. O Mario esteve na UMinho a fazer o seu mestrado em Audiovisual e Multimédia, tendo depois estagiado na produtora Persona Non Grata em Coimbra. O mais relevante em si é o interesse genuíno pela arte cinematográfica e a admiração que nutre pelo cinema português. Algo que fica bem evidenciado neste pequeno videoclip de cinco minutos.
Sem dúvida que o melhor está na fotografia e montagem, as suas áreas de preferência. Diria que em termos de estética se nota alguma influência do trabalho de António Ferreira, o que me diz particularmente bastante já que considero ser um dos mais interessantes talentos nacionais pela singularidade do seu trabalho que consegue juntar muito bem influências internacionais com traços profundamente portugueses. E isso podemos também sentir neste videoclip do Mario Costa para os Lululemon.
Lululemon, Flying Fortress (2013)
Entretanto resolvi passar-lhe algumas perguntas para percebermos melhor o que está por detrás do filme, e percebermos também como anda o espirito criativo nacional em tempos de crise profunda.
Em relação ao videoclip, quanto tempo demorou a fazer? Que tecnologias e softwares utilizaste?
:: O projeto surgiu no final do ano passado e foi-se alongando devido a fatores como a falta de disponibilidade e o estado do tempo. Como não havia um prazo estabelecido para a entrega do projeto, foi possível trabalhar nele durante algum tempo.
Em relação às tecnologias e software, usei o que tinha ao meu dispor. Uma DSLR (Canon 550D), uma GoPro Hero (esta apenas foi utilizada em três cenas), um tripé e um slider.
Na edição e pós produção usei o Adobe Premier pro e o After Effects (para algumas composições). A correção de cor foi feita com o DaVinci Resolve Lite.
O que é que foi mais complicado de fazer?
:: Para mim, o mais complicado foi a parte da produção porque é a parte com a qual me identifico menos. O facto de exercer várias funções nem sempre permitiu que me conseguisse concentrar a 100% em todas. É complicado realizar e ao mesmo tempo filmar, há sempre pormenores de que só mais tarde, já na fase da edição, nos apercebemos.
O que é que te deu mais prazer em todo o projeto?
:: Foi ter trabalhado com pessoas que conheço bem. Estivemos entre amigos e houve alguns momentos de diversão. Para além disso, também me identifico bastante com este projeto.
Como é que surgiu o projeto? Quantas pessoas trabalharam na concepção do filme? E dessas quantas foram pagas para trabalhar?
:: Conheço os Lululemon, somos da mesma cidade, eles convidaram-me para fazer este videoclip e eu aceitei. Eu fiz o trabalho técnico e a realização e participaram três atores. O trabalho foi remunerado.
Como é que está a área em Portugal? Como é que se conseguem estes trabalhos? Dão para viver, ou servem apenas para fazer currículo?
:: Pela minha experiência, é preciso ser muito persistente. Para além disso, a construção de uma boa base de contactos é fundamental e isso só se consegue trabalhando e também é deste modo que se vai criando um currículo. É muito difícil viver destes trabalhos, mas à medida que o nosso trabalho é reconhecido, as propostas vão surgindo.
Como é que se luta todos os dias para produzir trabalhos criativos num país que aparentemente lhe dá tão pouco valor?
:: É preciso gostar muito do que se faz, a situação do nosso país, como todos sabemos é bastante complicada e em tempos de crise a cultura é relegada para segundo plano. Como consequência ou até mesmo pela falta de uma cultura de trabalho nesta área, o audiovisual é pouco reconhecido em Portugal.
Sem dúvida que o melhor está na fotografia e montagem, as suas áreas de preferência. Diria que em termos de estética se nota alguma influência do trabalho de António Ferreira, o que me diz particularmente bastante já que considero ser um dos mais interessantes talentos nacionais pela singularidade do seu trabalho que consegue juntar muito bem influências internacionais com traços profundamente portugueses. E isso podemos também sentir neste videoclip do Mario Costa para os Lululemon.
Lululemon, Flying Fortress (2013)
Entretanto resolvi passar-lhe algumas perguntas para percebermos melhor o que está por detrás do filme, e percebermos também como anda o espirito criativo nacional em tempos de crise profunda.
Em relação ao videoclip, quanto tempo demorou a fazer? Que tecnologias e softwares utilizaste?
:: O projeto surgiu no final do ano passado e foi-se alongando devido a fatores como a falta de disponibilidade e o estado do tempo. Como não havia um prazo estabelecido para a entrega do projeto, foi possível trabalhar nele durante algum tempo.
Em relação às tecnologias e software, usei o que tinha ao meu dispor. Uma DSLR (Canon 550D), uma GoPro Hero (esta apenas foi utilizada em três cenas), um tripé e um slider.
Na edição e pós produção usei o Adobe Premier pro e o After Effects (para algumas composições). A correção de cor foi feita com o DaVinci Resolve Lite.
O que é que foi mais complicado de fazer?
:: Para mim, o mais complicado foi a parte da produção porque é a parte com a qual me identifico menos. O facto de exercer várias funções nem sempre permitiu que me conseguisse concentrar a 100% em todas. É complicado realizar e ao mesmo tempo filmar, há sempre pormenores de que só mais tarde, já na fase da edição, nos apercebemos.
O que é que te deu mais prazer em todo o projeto?
:: Foi ter trabalhado com pessoas que conheço bem. Estivemos entre amigos e houve alguns momentos de diversão. Para além disso, também me identifico bastante com este projeto.
Como é que surgiu o projeto? Quantas pessoas trabalharam na concepção do filme? E dessas quantas foram pagas para trabalhar?
:: Conheço os Lululemon, somos da mesma cidade, eles convidaram-me para fazer este videoclip e eu aceitei. Eu fiz o trabalho técnico e a realização e participaram três atores. O trabalho foi remunerado.
Como é que está a área em Portugal? Como é que se conseguem estes trabalhos? Dão para viver, ou servem apenas para fazer currículo?
:: Pela minha experiência, é preciso ser muito persistente. Para além disso, a construção de uma boa base de contactos é fundamental e isso só se consegue trabalhando e também é deste modo que se vai criando um currículo. É muito difícil viver destes trabalhos, mas à medida que o nosso trabalho é reconhecido, as propostas vão surgindo.
Como é que se luta todos os dias para produzir trabalhos criativos num país que aparentemente lhe dá tão pouco valor?
:: É preciso gostar muito do que se faz, a situação do nosso país, como todos sabemos é bastante complicada e em tempos de crise a cultura é relegada para segundo plano. Como consequência ou até mesmo pela falta de uma cultura de trabalho nesta área, o audiovisual é pouco reconhecido em Portugal.