Carlos De Carvalho (38), é francês, filho de portugueses, nascido em Lille, França. Fez a sua formação de base numa escola de artes belga, a Saint Luc de Tournai, na área de ilustração e design gráfico (7 anos) e depois terminou a sua formação, em cinema digital (2 anos), na Supinfocom, Valenciennes, França. A sua recente curta de animação "Premier Automne" (2013) ganhou 15 prémios, em festivais um pouco por todo o mundo, de Tokyo a Buenos Aires.
Assim que vi a sua nova curta, “Juste de l’eau” (2014) quis imediatamente conversar com o Carlos. Porque se já tinha ficado imensamente impressionado com Premier Automne, agora parecia-me que as dimensões técnica e estética tinham atingido todo um novo patamar. Por isso trocámos várias ideias, e aqui fica o resultado dessa conversa.
1 - De onde veio a ideia para “Juste de l’eau”?
:: Para mim "Juste de l’eau" é um bom resumo do meu trabalho. O meu trabalho é muito baseado na interpretação que o espectador possa fazer dele. Responder cabalmente a essa pergunta seria como congelar a história do filme. Direi apenas que existe alguma da minha fantasia na ideia de que sou de Portugal, e muito do meu amor por este país.
2 - Como foi financiado o filme?
:: O filme é inteiramente auto-produzido, eu sozinho durante um mês de pré-produção, e depois três meses de produção com uma equipa de 6 pessoas.
3 - O estúdio JeRegarde é um estúdio independente, como é que vocês financiam o vosso trabalho?
:: Je Regarde é um coletivo que reúne muitos artistas de diferentes origens. Como Masanobu e Shino que trabalham e vivem no Japão, ou Andrea que vem de Itália. Os restantes membros são franceses. O financiamento dos nossos projetos é altamente variável. Por exemplo, "Premier Automne" recebeu apoio financeiro por parte das autoridades e de assistência a nível local e nacional (CNC).
No entanto, "Juste de l'eau", não teve qualquer apoio financeiro. Aconteceu tudo muito rápido. E a obtenção de subsídios é um processo muito longo e tedioso. Por isso alguns projetos podem ser montados sem financiamento por causa da flexibilidade e velocidade a que decorrem.
4 - Como está a produção de animação em França para jovens criadores? É um país que apresenta boas oportunidades a quem quiser deslocar-se, para aí fazer uma carreira?
:: Embora a obtenção de financiamento seja um processo longo e tedioso, em França temos um dos melhores sistemas de financiamento para curtas-metragens. Não acho que seja a melhor a pessoa para responder à pergunta sobre a vinda de criativos para França. O que posso dizer é que há um montes de oportunidades, porque França é neste momento o terceiro maior produtor de animação do mundo. Além disso, as escolas da área, pela qualidade da sua formação ganharam uma reputação internacional, exemplos como Supinfocom, Les Gobelins, La Poudrière...
5 - A julgar por um filme tão próximo de Portugal, gostarias de viver e trabalhar em Portugal?
:: Sim, se surgir a oportunidade, será um prazer viver e trabalhar em Portugal.
6 - Em termos estéticos, e percebendo que é uma marca de algumas animações tuas, o que buscas com aquele efeito de centrifugação da imagem? É apenas um efeito visual, ou tem algo mais subjacente?
:: A minha abordagem não é reproduzir a realidade, mas antes garantir a maior distância possível. Eu procuro todos os meios possíveis para extrapolar e expandir o meu universo, sem me fixar no realismo. Essa liberdade, e despreendimento, torna o meu trabalho muito mais fácil, pelo menos para mim. Estas perspectivas amplificadas, permitem-me colocar as minhas linhas de força onde quero, a fim de compor as imagens como pretendo.
7 - No teu filme anterior, "Premier Automne" essa técnica não está presente porquê?
:: "Premier Automne" é essencialmente um mundo vegetal em curva. A característica visual é principalmente sobre o fundo negro que absorve leves toques de vegetação. Este é um universo introspectivo e espectral. As perspectivas distorcidas são mais facilmente adaptadas às linhas retas como linhas de edifícios. Por outro lado, cada filme tem sua própria identidade e espero desenvolver um novo estilo visual para cada novo projeto.
8 - O que quer dizer o ganso morto nas costas do pequeno porco?
:: A primeira vez que vemos o personagem principal, parece que enfrentamos um anjo. O contra-campo corrige a percepção deste porquinho para nos mostrar um animal morto. Eu gosto deste contraste. Ajuda a diferenciá-lo dos outros porquinhos, e a tornar visível ao espectador a representação da sua alma morta. Também é importante para simbolizar o que leva da vida, e no final a esperança.
9 - Que técnicas e tecnologias foram utilizadas para a criação do filme?
:: Os personagens, as caravelas, e a água é tudo em 3D, feito com Softimage. O resto é feito a partir de ilustração 2D, com muita composição em After Effects. Tentamos otimizar o trabalho, há coisas que são mais rápidas em 3D, e por vezes outras são mais rápidas em 2D.
10 - Qual foi a cena mais complicada de compor?
:: Todas as cenas de multidão foram bastante complexas. Houve muita animação para gerir e colisões a serem evitadas.
11 - Existe algum detalhe técnico que te deixe particularmente orgulhoso neste filme?
:: Embora o plano seja muito curto, fiquei muito feliz com o resultado da dança dos porcos casados que se transformam em monstros. Esta foi uma técnica que eu gostaria de ter desenvolvido e ampliado ainda mais. Para mim o 3D é muito rígido, por isso quis encontrar alternativas para que os personagens pudessem evoluir na sua aparência.
12 - Qual é o futuro desta curta? Vais enviar para Festivais, TV, etc?
:: Sim, é isso. Embora eu ache que a prioridade desta curta-metragem continue a ser a Web.
13 - E tu, como vai ser o futuro, que projectos novos tens?
:: Fazer curtas-metragens é caro. Eu não posso fazer isto por tempo indeterminado, por isso preciso de alternar com encomendas da publicidade. Sobre os meus projetos futuros, tenho um monte de ideias que gostaria de desenvolver, mas uma coisa de cada vez.
janeiro 29, 2014
janeiro 28, 2014
um naturalismo especulativo
"Her" (2013) é um filme capaz de exercer sobre nós o encanto de um enredo tão entrelaçado como só a literatura sabe fazer. É ficção-científica, sem show nem artifício, apenas realidade, uma espécie de naturalismo especulativo. A tranquilidade do discurso em conjunto com a leveza visual dos tons pastel, muito própria da filmografia de Spike Jonze, conduz-nos através de uma história sobre o amor em tempo de relações virtuais.
“Her” tem tanto de distopia como de utopia. O isolamento a que os seres humanos se deixam votar, empurrados pelo progresso do seu individualismo, numa sociedade higienizada pelo digital, dá lugar ao romance do impossível. O computador pessoal, que passa a assistente pessoal, assume agora o lugar da alma gémea.
Nada mais temos feito do que evoluir intelectualmente, desenvolvendo conhecimento sobre aquilo que somos enquanto seres conscientes, e à medida que nos conhecemos melhor, isolamo-nos cada vez mais. Assumimos a identidade, como um Eu, porque só nós nos podemos sentir. Só nós sabemos aquilo que sentimos, mas não sabemos porquê, e quando questionamos os nossos semelhantes, não lhes encontramos respostas. Por isso o caminho para a individualização torna-se uma necessidade do desenvolvimento do nosso auto-conhecimento.
Com todo o auto-conhecimento acumulado conseguimos recriar algo semelhante a nós, uma espécie de inteligência artificial que nos imita, aprende e cresce a cada interação connosco. Mas assim como nós nos isolámos, esta acabará por fazer o mesmo. Quando a capacidade para abstrair a realidade, e a procura por respostas atinge o limiar da consciência humana, a fuga interior é a única escapatória.
Em "Her" deixamo-nos levar pelo desejo racional da possibilidade latente nos seres virtuais de algum dia se tornarem reais. Mas sabemos que tudo está no mero reino da especulação sem sustentação. Enquanto formos consciências presas dentro de corpos perceptivos, a premissa de "Her" não se poderá realizar. A fuga para o individualismo é real, mas apenas num plano mental, o nosso corpo terá sempre uma palavra a dizer. Podemos até desejar a fuga, podemos até sonhar com o contacto entre duas consciências, mas o corpo exigirá sempre a sua parte. A nossa consciência não existe sem este, porque aquilo de que somos feitos, é o todo que o suporta, e não apenas uma teia de ligações neuronais.
Se me sinto triste, alegre, ou com medo, é porque a configuração biológica das minhas vísceras assim definem o meu sentir. Sem elas não passo de um sistema de lógica, incapaz de ser. O sentir é predominantemente corpóreo, o contacto humano é fundamental, o toque humano representa muito mais do que um mero contacto de pele.
Spike Jonze produziu uma obra brilhante, capaz de questionar a sociedade atual e as mudanças que esta atravessa. Apesar da problemática mente/corpo que aqui levanto, a fuga para o interior é uma realidade dos nossos tempos. O final do filme aponta algumas pistas, mas cabe a cada um procurar as respostas.
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Design de Interacção em "Her"
“Her” tem tanto de distopia como de utopia. O isolamento a que os seres humanos se deixam votar, empurrados pelo progresso do seu individualismo, numa sociedade higienizada pelo digital, dá lugar ao romance do impossível. O computador pessoal, que passa a assistente pessoal, assume agora o lugar da alma gémea.
Nada mais temos feito do que evoluir intelectualmente, desenvolvendo conhecimento sobre aquilo que somos enquanto seres conscientes, e à medida que nos conhecemos melhor, isolamo-nos cada vez mais. Assumimos a identidade, como um Eu, porque só nós nos podemos sentir. Só nós sabemos aquilo que sentimos, mas não sabemos porquê, e quando questionamos os nossos semelhantes, não lhes encontramos respostas. Por isso o caminho para a individualização torna-se uma necessidade do desenvolvimento do nosso auto-conhecimento.
Com todo o auto-conhecimento acumulado conseguimos recriar algo semelhante a nós, uma espécie de inteligência artificial que nos imita, aprende e cresce a cada interação connosco. Mas assim como nós nos isolámos, esta acabará por fazer o mesmo. Quando a capacidade para abstrair a realidade, e a procura por respostas atinge o limiar da consciência humana, a fuga interior é a única escapatória.
Em "Her" deixamo-nos levar pelo desejo racional da possibilidade latente nos seres virtuais de algum dia se tornarem reais. Mas sabemos que tudo está no mero reino da especulação sem sustentação. Enquanto formos consciências presas dentro de corpos perceptivos, a premissa de "Her" não se poderá realizar. A fuga para o individualismo é real, mas apenas num plano mental, o nosso corpo terá sempre uma palavra a dizer. Podemos até desejar a fuga, podemos até sonhar com o contacto entre duas consciências, mas o corpo exigirá sempre a sua parte. A nossa consciência não existe sem este, porque aquilo de que somos feitos, é o todo que o suporta, e não apenas uma teia de ligações neuronais.
Se me sinto triste, alegre, ou com medo, é porque a configuração biológica das minhas vísceras assim definem o meu sentir. Sem elas não passo de um sistema de lógica, incapaz de ser. O sentir é predominantemente corpóreo, o contacto humano é fundamental, o toque humano representa muito mais do que um mero contacto de pele.
Spike Jonze produziu uma obra brilhante, capaz de questionar a sociedade atual e as mudanças que esta atravessa. Apesar da problemática mente/corpo que aqui levanto, a fuga para o interior é uma realidade dos nossos tempos. O final do filme aponta algumas pistas, mas cabe a cada um procurar as respostas.
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Design de Interacção em "Her"
janeiro 26, 2014
quando a animação reflete o país de origem
Há um ano falei aqui de Carlos Carvalho a propósito da sua multi-premiada curta de animação, Premier Automne (2013). Agora volto com o seu novo trabalho, "Juste de L’Eau" (2014) que trata um dos momentos de regresso a casa dos velejadores portugueses no auge dos Descobrimentos. Um tema que não é indiferente ao facto de Carlos Carvalho ser filho de portugueses, nascido e formado em França, tendo passado pela famosa escola Supinfocom.
Em Juste de L’eau (2014) Carvalho volta a universos visuais muito seus, nomeadamente a distorção e centrifugação dos cenários, a que já pudemos assistir em “L’Histoire de Rouge” (2008). Em Juste de L’Eau a distorção visual parece no entanto ser ainda mais intensa, o que em conjunto com a saturação e multiplicidade de cor, lhe dá todo um corpo surreal, como se Carvalho estivesse a transpor para o ecrã um sonho visto de longe.
Em termos interpretativos, podemos dizer que Carvalho se encena a si próprio, a olhar para todo aquele reconfortar de almas, fonte da saudade nacional, que desde os descobrimentos se apossou do nosso povo, para não mais o largar. São os velejadores que regressam de viagens duras, e encontram as famílias, num século XV, mas podiam bem ser imigrantes portugueses que regressam a Portugal no século XX. E quem por ninguém espera, assume aqui a sua melancolia, por sentir a falta dessa saudade, que só sente quem está longe. Em certa medida, poderia dizer que o título nos diz que a única diferença entre o século XV e o século XX, foi o caminho feito, apenas de água (juste de l'eau).
Impressiona-me ver estes artistas, com alma portuguesa, que trabalham espalhados pelo mundo, nunca precisaram do país, nem nunca este lhes ofereceu nada, mas eles continuam a recordá-lo como algo que lhes diz, que lhes fala, que transmite um pulsar. Ainda na semana passada aqui falava do último trabalho de Daniel Sousa, Feral (2012), agora nomeado ao Oscar 2013 de Melhor Curta de Animação, que apesar de não ser tão explicitamente sobre Portugal, como é Juste de L'eau, transpira atmosferas e costumes nacionais.
Atualização 29.01.2014
Entrevista com Carlos De Carvalho
Em Juste de L’eau (2014) Carvalho volta a universos visuais muito seus, nomeadamente a distorção e centrifugação dos cenários, a que já pudemos assistir em “L’Histoire de Rouge” (2008). Em Juste de L’Eau a distorção visual parece no entanto ser ainda mais intensa, o que em conjunto com a saturação e multiplicidade de cor, lhe dá todo um corpo surreal, como se Carvalho estivesse a transpor para o ecrã um sonho visto de longe.
Em termos interpretativos, podemos dizer que Carvalho se encena a si próprio, a olhar para todo aquele reconfortar de almas, fonte da saudade nacional, que desde os descobrimentos se apossou do nosso povo, para não mais o largar. São os velejadores que regressam de viagens duras, e encontram as famílias, num século XV, mas podiam bem ser imigrantes portugueses que regressam a Portugal no século XX. E quem por ninguém espera, assume aqui a sua melancolia, por sentir a falta dessa saudade, que só sente quem está longe. Em certa medida, poderia dizer que o título nos diz que a única diferença entre o século XV e o século XX, foi o caminho feito, apenas de água (juste de l'eau).
Impressiona-me ver estes artistas, com alma portuguesa, que trabalham espalhados pelo mundo, nunca precisaram do país, nem nunca este lhes ofereceu nada, mas eles continuam a recordá-lo como algo que lhes diz, que lhes fala, que transmite um pulsar. Ainda na semana passada aqui falava do último trabalho de Daniel Sousa, Feral (2012), agora nomeado ao Oscar 2013 de Melhor Curta de Animação, que apesar de não ser tão explicitamente sobre Portugal, como é Juste de L'eau, transpira atmosferas e costumes nacionais.
"Juste de l'eau" (2014) de Carlos Carvalho
Atualização 29.01.2014
Entrevista com Carlos De Carvalho
janeiro 21, 2014
"Emoções Interactivas", disponível gratuitamente
Cinco anos depois de ter sido publicado em papel, o meu livro "Emoções Interactivas. Do Cinema para os Videojogos" (2009) passa a estar disponível gratuitamente no formato PDF. Para quem o quiser adquirir em papel, pode continuar a fazê-lo nas lojas ou no próprio editor.
Este livro foi o resultado de cinco anos de pesquisa, resultando na minha tese de doutoramento em 2007. Depois de editado e reformatado para uma leitura mais acessível, saiu em 2009 na colecção Comunicação e Sociedade do Centro de Estudos de Comunicação e Sociedade. Durante os primeiros cinco anos mantive uma página dedicada, a que nunca consegui dar a atenção necessária, por isso acabei por criar uma página no Facebook para quem pretender comunicar sugestões, críticas, etc.
É um livro que trata o contar de histórias em universos virtuais a partir de uma abordagem multidisciplinar que mistura o Cinema, os Videojogos, a Emoção e a Tecnologia. Os capítulos que poderão ser mais relevantes para quem estuda o tema são os da primeira parte. Na segunda parte do livro é feita a apresentação do projecto realizado, e apresentam-se resultados que podem ser relevantes para quem trabalha no campo do design de mundos virtuais.
Este livro foi o resultado de cinco anos de pesquisa, resultando na minha tese de doutoramento em 2007. Depois de editado e reformatado para uma leitura mais acessível, saiu em 2009 na colecção Comunicação e Sociedade do Centro de Estudos de Comunicação e Sociedade. Durante os primeiros cinco anos mantive uma página dedicada, a que nunca consegui dar a atenção necessária, por isso acabei por criar uma página no Facebook para quem pretender comunicar sugestões, críticas, etc.
PARTE IAqui fica então o link para descarregar o livro completo, no RepositoriUM ou no Academia.Edu.
1. Natureza da Emoção Humana
2. Comunicação Afectiva
3. Da Ilusão Cinematográfica
4. Cinema e Tecnologia
5. Cinema de Entretenimento
6. Propriedades dos Ambientes Virtuais
7. Entretenimento Digital
8. Storytelling Interactivo
PARTE II
1. Estudo Empírico do Espectro Emocional
2. Problemática da Divergência Emocional
3. Análise de Conteúdos
4. Avaliação de classes e parâmetros
5. Correlação de classes e parâmetros
6. Caso Específico da Tristeza
janeiro 20, 2014
"Feral", da ilustração à animação
"Feral" (2012) de Daniel Sousa está nomeado para o Óscar de melhor curta-metragem de animação de 2013, tendo ganho antes o Anima Mundi e prémios no Annecy e Cinanima, entre outros. Já aqui tinha falado a propósito de “Feral” quando este ainda estava em desenvolvimento, aproveitando nessa altura para apresentar três filmes anteriores. Entretanto consegui finalmente ver “Feral”, graças ao sistema VOD do Vimeo, no qual se pode pagar apenas um dólar pelo aluguer, ou dois dólares para comprar.
“Feral” continua a mostrar o melhor da arte de Daniel Sousa, nomeadamente no trabalho de ilustração e na sua transição para movimento na animação. Sousa continua a afirmar-se como pintor, além de animador, e isso é por demais evidente neste trabalho. Cada composição visual é um quadro, com todo um detalhe gráfico soberbo, uma riqueza visual que impregna de sentidos múltiplos o filme que vemos. Sousa trabalha sem qualquer suporte de storyboard, o que explica as razões estéticas, mas também técnicas, da sua fuga à linearidade narrativa. Baseia a evolução do movimento numa busca visual, quadro a quadro, algo que é feito de um modo particular, já que inicia todo o trabalho no Adobe Flash, depois imprime cada um dos quadros em papel, retraça-os a lápis, e volta a digitalizar (ver vídeo abaixo "Feral: process workflow"). Podemos dizer que Sousa criou o seu próprio método de desenvolvimento de animação, e isso contribui indelevelmente para o resultado final do carácter autoral.
Em termos narrativos Sousa prefere a visceralidade, envolvendo-nos e recompensando-nos a cada novo quadro, ainda que desta vez Sousa tenha seguido uma lógica mais linear para criar o seu universo, como nos diz em entrevista. Temos assim não apenas a criação de um universo espacial, mas o relato de um evento temporal concreto. Sousa transporta-nos para o seu mundo, mas concretiza as razões porque o faz. Sempre muito enredado pela mitologia, “Feral” trabalha sobre o mito do menino selvagem e a sua incapacidade para se adaptar às normas de um processo civilizacional desconhecido. O mito e a abordagem plástica elevam as possíveis leituras que se podem retirar do filme, e isso acaba por contribuir para o enorme interesse suscitado em redor da curta de apenas 12 minutos.
“Feral” continua a mostrar o melhor da arte de Daniel Sousa, nomeadamente no trabalho de ilustração e na sua transição para movimento na animação. Sousa continua a afirmar-se como pintor, além de animador, e isso é por demais evidente neste trabalho. Cada composição visual é um quadro, com todo um detalhe gráfico soberbo, uma riqueza visual que impregna de sentidos múltiplos o filme que vemos. Sousa trabalha sem qualquer suporte de storyboard, o que explica as razões estéticas, mas também técnicas, da sua fuga à linearidade narrativa. Baseia a evolução do movimento numa busca visual, quadro a quadro, algo que é feito de um modo particular, já que inicia todo o trabalho no Adobe Flash, depois imprime cada um dos quadros em papel, retraça-os a lápis, e volta a digitalizar (ver vídeo abaixo "Feral: process workflow"). Podemos dizer que Sousa criou o seu próprio método de desenvolvimento de animação, e isso contribui indelevelmente para o resultado final do carácter autoral.
Making of do processo de animação
Em termos narrativos Sousa prefere a visceralidade, envolvendo-nos e recompensando-nos a cada novo quadro, ainda que desta vez Sousa tenha seguido uma lógica mais linear para criar o seu universo, como nos diz em entrevista. Temos assim não apenas a criação de um universo espacial, mas o relato de um evento temporal concreto. Sousa transporta-nos para o seu mundo, mas concretiza as razões porque o faz. Sempre muito enredado pela mitologia, “Feral” trabalha sobre o mito do menino selvagem e a sua incapacidade para se adaptar às normas de um processo civilizacional desconhecido. O mito e a abordagem plástica elevam as possíveis leituras que se podem retirar do filme, e isso acaba por contribuir para o enorme interesse suscitado em redor da curta de apenas 12 minutos.
Trailer, filme completo no Vimeo VOD
janeiro 16, 2014
A história da tipografia em videojogo
"Type:Rider" (2013) é uma belíssima surpresa no mundo dos videojogos. Um jogo com carácter educativo capaz de apresentar argumentos e ombrear com qualquer jogo de entretenimento na plataforma tablet. A uma jogabilidade eficaz e criativa junta-se uma arte sonora e visual de grande qualidade, fazendo desta obra um exemplo do que pode ser feito no mundo dos videojogos educativos. Além de tudo isto, Type:Rider fará as maravilhas de qualquer designer gráfico pelo tema tratado.
Type:Rider é a primeira produção de um videojogo por parte do canal franco-alemão Arte. Aquilo que começou por ser um web documentário, passou a designar-se jogo documentário, para no final originar um videojogo completo. Ao todo e com apoio do Centre National du Cinéma et de l'Image Animée (CNC), o jogo teve um investimento de 250 mil euros. No jogo trabalhou ainda uma equipa de alunos do curso de especialização em Experiências Digitais Interactivas da escola Gobelins. São dez níveis ao todo, sendo que o primeiro é tutorial e o último um nível de bónus. Os produtores estão interessados em continuar a criar novos níveis, ou fazer uma parte 2, caso consigam investimento para avançar na produção.
O que torna Type:Rider tão interessante é acima de tudo o modo criativo como foi realizada a fusão entre o tema da história da tipografia e a jogabilidade. Os 8 níveis levam-nos através da história da escrita, atravessando desde a pré-história, aos hieróglifos egipcios, passando pelo alfabeto grego, chegando às fonts modernas. Controlamos dois pontos unidos que atravessam cenários de plataformas, em que as plataformas são constituídas por letras nas mais variadas e inventivas posições, obrigando-nos através do controlo dos dois pontos, a ultrapassar cada obstáculo até chegar ao final de cada alfabeto. A gratificação do jogo socorre-se da apanha das várias letras espalhadas pelo cenário que temos de ir apanhando para completar cada nível.
Cada nível corresponde a um tipo de letra - Gothic, Garamond, Didot, Clarendon, Futura, Times e Helvetica - sendo que cada um destes apresenta toda uma atmosfera visual e sonora apropriada em termos históricos e de motivos. Por exemplo quando entramos em Clarendon respiramos uma atmosfera western, ou quando entramos em Gothic respira-se o medieval. À medida que vamos avançando no interior de cada alfabeto vamos ainda recolhendo elementos que nos dão acesso a páginas de livros que contêm a história de cada uma destas fonts. Podemos mais tarde aceder a cada livro, e ler sobre a história das fonts e dos seus criadores.
Type:Rider é a primeira produção de um videojogo por parte do canal franco-alemão Arte. Aquilo que começou por ser um web documentário, passou a designar-se jogo documentário, para no final originar um videojogo completo. Ao todo e com apoio do Centre National du Cinéma et de l'Image Animée (CNC), o jogo teve um investimento de 250 mil euros. No jogo trabalhou ainda uma equipa de alunos do curso de especialização em Experiências Digitais Interactivas da escola Gobelins. São dez níveis ao todo, sendo que o primeiro é tutorial e o último um nível de bónus. Os produtores estão interessados em continuar a criar novos níveis, ou fazer uma parte 2, caso consigam investimento para avançar na produção.
O que torna Type:Rider tão interessante é acima de tudo o modo criativo como foi realizada a fusão entre o tema da história da tipografia e a jogabilidade. Os 8 níveis levam-nos através da história da escrita, atravessando desde a pré-história, aos hieróglifos egipcios, passando pelo alfabeto grego, chegando às fonts modernas. Controlamos dois pontos unidos que atravessam cenários de plataformas, em que as plataformas são constituídas por letras nas mais variadas e inventivas posições, obrigando-nos através do controlo dos dois pontos, a ultrapassar cada obstáculo até chegar ao final de cada alfabeto. A gratificação do jogo socorre-se da apanha das várias letras espalhadas pelo cenário que temos de ir apanhando para completar cada nível.
Trailer "Type:Rider" (2013) da Arte
janeiro 14, 2014
Flow sem narrativa
"Rayman Legends" (2013) podia muito facilmente ter sido apenas mais do mesmo. Era difícil ultrapassar o brilhante "Rayman Origins" (2011) que aqui descrevi como sendo uma experiência exímia de regresso às origens de Rayman, assim como do gameplay de plataformas 2d. Não posso dizer que ultrapasse, mas que nos consegue fazer reviver as experiências de jogo sem sentirmos qualquer repetição, consegue.
Legends é mais completo, mais denso, oferece muito mais ao jogador, mantendo e elevando o potencial de “flow”. Um potencial que atinge o seu zénite nos níveis finais de cada área do jogo, quando o gameplay é sincronizado com a música de fundo, e nos faz querer chegar ao fim para ouvir o resto da música, uma música que vai sendo pontuada por cada um dos nossos cliques. Sentimos que o flow se começa a entranhar em nós, quando deixamos de racionalizar as nossas acções, e deixamos o nosso corpo fluir ao ritmo da música, apertando os botões, não em função dos obstáculos que se aproximam, mas em função do ritmo da música, sobre a qual praticamente “surfamos” (ver o exemplo do nível Mariachi Madness no vídeo aqui abaixo).
Esta descrição de flow num videojogo é passível de ser visionada no vídeo aqui acima, mas mais uma vez, impossível de experienciar por meio do mero conteúdo audiovisual. Nem a minha descrição, nem o vídeo, podem dar-vos a sentir do que é jogar o nível Mariachi Madness, porque só as acções somáticas do vosso corpo, em conjunto com o visual e o musical, conseguem gerar a palete completa de visceralidade despoletada.
De resto e como já tinha dito a propósito de Origins, Legends é riquíssimo no campo da ilustração, do humor e re-invenção de gameplay de plataformas. Por outro lado continua a não dar muita atenção à narrativa como em Origins, porque o que está aqui em “jogo” é o puro êxtase por via das mecânicas de jogo. O flow é todo ele gerado à custa da progressão de mestria do jogador em conjunto com a novidade e recompensa constantes, capazes de nos manter no reino ilusório, totalmente imersos durante o tempo em que ali vivemos, numa espécie de mundo encantado dos videojogos.
Desta vez podemos jogar com uma personagem feminina, a princesa Barbara
Legends é mais completo, mais denso, oferece muito mais ao jogador, mantendo e elevando o potencial de “flow”. Um potencial que atinge o seu zénite nos níveis finais de cada área do jogo, quando o gameplay é sincronizado com a música de fundo, e nos faz querer chegar ao fim para ouvir o resto da música, uma música que vai sendo pontuada por cada um dos nossos cliques. Sentimos que o flow se começa a entranhar em nós, quando deixamos de racionalizar as nossas acções, e deixamos o nosso corpo fluir ao ritmo da música, apertando os botões, não em função dos obstáculos que se aproximam, mas em função do ritmo da música, sobre a qual praticamente “surfamos” (ver o exemplo do nível Mariachi Madness no vídeo aqui abaixo).
Nível "Mariachi Madness" do jogo, Rayman Legends (2013)
Esta descrição de flow num videojogo é passível de ser visionada no vídeo aqui acima, mas mais uma vez, impossível de experienciar por meio do mero conteúdo audiovisual. Nem a minha descrição, nem o vídeo, podem dar-vos a sentir do que é jogar o nível Mariachi Madness, porque só as acções somáticas do vosso corpo, em conjunto com o visual e o musical, conseguem gerar a palete completa de visceralidade despoletada.
De resto e como já tinha dito a propósito de Origins, Legends é riquíssimo no campo da ilustração, do humor e re-invenção de gameplay de plataformas. Por outro lado continua a não dar muita atenção à narrativa como em Origins, porque o que está aqui em “jogo” é o puro êxtase por via das mecânicas de jogo. O flow é todo ele gerado à custa da progressão de mestria do jogador em conjunto com a novidade e recompensa constantes, capazes de nos manter no reino ilusório, totalmente imersos durante o tempo em que ali vivemos, numa espécie de mundo encantado dos videojogos.
janeiro 13, 2014
o tempo e a nossa condição...
Raras vezes temos oportunidade para experienciar como o tempo passa ao nosso redor. Por vezes somos impelidos por um qualquer motivo - fotografia, música, ou data - a parar para reflectir sobre anos passados sobre a nossa própria vida. Mas raramente temos a oportunidade de constatar visualmente como o mundo à nossa volta se altera. Acompanhando-o parece seguir ao nosso ritmo, nós como este vamos mudando, mas acreditamos viver sempre no mesmo presente.
Tudo isto a propósito de dois pequenos filmes ingleses recém criados, um da BBC, "London to Brighton Train Journey: 1953 - 2013" outro de Simon Smith com imagens do BFI, "London in 1927 & 2013". O primero dá conta da passagem de 60 anos numa linha férrea popular de Inglaterra. O segundo mostra como centro de Londres se modificou em 86 anos.
Dois filmes que mais parecem Máquinas do Tempo. E o que nos dão a ver, a experienciar realmente?
Para mim, a coisa mais notável que podemos extrair destes filmes, é que o mundo não precisa de nós para continuar a mover-se. Fá-lo lentamente, à sua vontade, e não à nossa. Os edifícios e pontes ali estão como que a olhar para nós imóveis e inalterados, enquanto nós seres humanos vamos nascendo e morrendo. Cheios de fome de viver, ansiamos por fazer, queremos sempre mais e mais. O mundo está aí, e nós para aqui sem nos resignarmos continuamos a lutar todos os dias, acreditando que vamos mudar e transformar tudo aquilo que encontrarmos pela frente.
Em certa medida, estes filmes dão-me alguma paz, ajudam-me a conceber o mundo de um modo verdadeiramente mais tranquilo...
1927 - 2013
Tudo isto a propósito de dois pequenos filmes ingleses recém criados, um da BBC, "London to Brighton Train Journey: 1953 - 2013" outro de Simon Smith com imagens do BFI, "London in 1927 & 2013". O primero dá conta da passagem de 60 anos numa linha férrea popular de Inglaterra. O segundo mostra como centro de Londres se modificou em 86 anos.
"London to Brighton Train Journey: 1953 - 2013" (2013) da BBC
Dois filmes que mais parecem Máquinas do Tempo. E o que nos dão a ver, a experienciar realmente?
Para mim, a coisa mais notável que podemos extrair destes filmes, é que o mundo não precisa de nós para continuar a mover-se. Fá-lo lentamente, à sua vontade, e não à nossa. Os edifícios e pontes ali estão como que a olhar para nós imóveis e inalterados, enquanto nós seres humanos vamos nascendo e morrendo. Cheios de fome de viver, ansiamos por fazer, queremos sempre mais e mais. O mundo está aí, e nós para aqui sem nos resignarmos continuamos a lutar todos os dias, acreditando que vamos mudar e transformar tudo aquilo que encontrarmos pela frente.
Em certa medida, estes filmes dão-me alguma paz, ajudam-me a conceber o mundo de um modo verdadeiramente mais tranquilo...
"London in 1927 & 2013" (2013) de Simon Smtih
janeiro 09, 2014
Educação e Tecnologia, criação em "multitasking"
Cathy Davidson é directora da HASTAC (Humanities, Arts, Science, Technology Advanced Collaboratory) uma organização que se dedica a pensar o futuro da educação com as TIC. Em 2010 foi eleita para o Conselho do National Endowment for the Humanities dos EUA, e em 2012 recebeu o prémio Educators of the Year do World Technology Network. O seu livro "Now You See It: How the Brain Science of Attention Will Transform the Way We Live, Work, and Learn" (2011) apresenta várias ideias sobre o impacto da internet sobre os processo de multitasking e seus efeitos em contexto de escola que parecem estar na origem do relevo que a autora tem obtido no contexto educativo tecnológico americano.
É assim com alguma surpresa que constatamos que aquilo que nos traz neste seu livro não passa de “wishful thinking” sem suporte científico, propostas que mais parecem anseios e desejos de múltiplas agendas do mundo das TIC. Na verdade, e tendo em conta o que escrevi abaixo contra muito do que é dito ao longo deste livro, tenho que aceitar que o livro está bem escrito e toca em vários pontos relevantes. Porque se assim não fosse dificilmente me teria dignado a escrever tantas linhas de resposta como acabei por fazer. Dito isto, espero que o leiam, se partilho as minhas ideias é mais para poder lançar a discussão de uma forma crítica, e espero que construtiva.
Assim para aclarar a minha resposta ao livro, dividi a análise em duas partes, a primeira sobre a escola, e a segunda sobre o multistasking.
1. A Escola
1.1 – Diz Toffler que o modelo de escola atual é uma originalidade da Industrialização.
Davidson usa Toffler para iniciar todo o seu ataque à escola atual. Até aceito que Toffler tenha alguma razão no que diz, mas julgo que devemos ser cautelosos para não embarcar em generalidades. Julgo que muitos, incluindo o próprio Ken Robinson, caíram nesta ideia de generalizar a escola como um resultado da industrialização. Porque se existe algo industrial na escola da atualidade, e algo tipicamente século XX, é a massificação da escola, e não a escola enquanto conceito. Ou seja, o que é fruto da industrialização e “taylorização” é a massificação que obrigou a criar espaços de formação em série. Que por sua vez obrigou a estratificar a aprendizagem numa hierarquia fechada e a generalizar o que se aprende de forma igual para todos. Ensinar milhões de pessoas, tinha de ser diferente de ensinar uma elite.
Do que se fala é então de um problema logístico que é claro que acarretou imensos problemas para o ideal de escola, mas se olharmos para os efeitos na sociedade, esses problemas foram mais do que compensados. Uma sociedade educada, mesmo que através destes sistemas de massas, tem melhor qualidade de vida e é mais feliz do que uma não educada.
Quanto ao conceito de escola, não surge com a revolução industrial, mas com o conceito de civilização. A necessidade de passar conhecimento a quem está a aprender o que é o mundo, a quem está a aprender uma profissão, para que estes não tenham de começar do zero. A invenção da escrita facilitou o processo, as pessoas não precisavam de esperar que alguém lhes dissesse o que fazer e como fazer, podiam a seu tempo ler. Por outro lado complexificou tudo, tornou o conhecimento mais profundo, mais denso, mais detalhado. Obrigou a aumentar o tempo de aprendizagem do mundo, porque era preciso dominar um nível de abstração, a escrita, antes de chegar à realidade. Daí aos Gregos, Romanos, Renascimento, múltiplos meios de registo de comunicação, incluindo a internet, é tudo uma ordem de evolução natural.
De uma forma genérica, a escola de hoje difere pouco daquilo que eram as Guildas criadas no final da Idade Média. Para quem queria ser profissional de uma qualquer atividade, era preciso passar por um processo que durava longos anos até ser aceite por quem regia o meio. A diferença entre elas e a escola de hoje, está na obrigação que hoje existe de todos terem de atingir determinados níveis de escolaridade. Ou seja, não é o conceito que está em causa, mas o valor que a sociedade lhe passou a atribuir. Porque a ideia de todos serem obrigados a ir à escola até um certo ano, está ligada com os dados empíricos que demonstram os resultados de se ter uma sociedade mais educada. Uma pessoa que fica para trás na escola, não cria um problema apenas para si, mas para toda a sociedade, se esta for inclusiva.
1.2 – A revolução industrial e a escola criaram uma absurda “categorização, divisão e hierarquização”, segundo Cathy Davidson.
Como disse acima, em termos logísticos, foi necessário proceder assim. Não é um problema da industrialização, mas da massificação, de muitas mais pessoas poderem aceder a patamares superiores da hierarquia social. A “categorização, divisão e hierarquização” é uma ideia do mercado laboral do século XX, segundo Davidson! Será? Como é que vos parece que seria possível gerir um site com os milhões de encomendas diárias que tem a Amazon, sem este tipo de estruturas?
Mas não é uma questão logística, é antes fruto da progressão e avanço do conhecimento que detemos enquanto espécie. Porque avançar nessa compreensão implica avançar na criação de camadas de abstração sobre a realidade. E estas camadas são naturalmente constituídas por categorias, hierarquias, divisões e indexações, pois são elas que permitem a interligação conceptual, entre as várias camadas de abstração, e nos permitem conhecer em maior profundidade o mundo que nos rodeia. Basta pensar em qualquer sistema que nos rodeia desde o biológico ao solar. O que são estes sistemas, se não camadas de abstração criadas por nós, que nos ajudam a conceber mentalmente o mundo. O que são se não categorizações, comparações, classificações, relações, efeitos e impactos?!
1.3 - "A Escola Mata a Criatividade"
A ideia de que as escolas matam a criatividade é mais uma ideia muito em voga, proclamada ad nauseum desde que Ken Robinson proferiu uma TED talk em 2006 sobre o tema que se tornou viral. Mas a esta ideia também respondo não. Porque não posso, nem criticar, nem criar nada de novo, se não absorver muito daquilo que existe [leia-se a simples recomendação de Stephen King, "se quer escrever, leia"]. Mesmo quando quero criar o totalmente novo, preciso de conhecer o mundo em que me insiro. A escola deve dar a conhecer o que existe no mundo, deve fornecer saber e informação, e deve fazê-lo apresentando sempre o pró e o contra, e só desta base surgirão as competências para articular o pensamento, e agir criticamente. A reflexão não pode ser feita no vazio, correndo o risco de ser totalmente inconsequente. A escola formata, sem dúvida, mas cabe a cada um de nós depois "sair da caixa", como nos diz David Foster Wallace no discurso inaugural de 2005 na Universidade Kenyon College ou José Saramago,
Mais grave ainda acontece quando nos diz que a mudança constante que a sociedade vive, nos deve conduzir a deixar de preocupar com as tarefas repetitivas, porque essas serão feitas pelas máquinas, ou serão fruto de outsourcing!!! (quando a China se tornar um país desenvolvido, vamos começar a realizar outsourcing para Marte?). E se assim é, como é que eu explico a alguém que quer ser pianista, que quer ser animador 3d, que quer escrever, filmar, pintar, no fundo que quer criar, que só o poderá fazer se repetir milhares de vezes a mesma ação, e se o fizer ao longo de 10 mil horas?
A grande questão é que pessoas como Cathy Davidson seguem estas correntes de pensamento, de ideias feitas no mundo do discurso de sound bytes, porque é com elas que ganham atenção. Constroem ideias em cima de castelos de cartas, e quem os quiser seguir, dando-se mal, problema seu. Davidson não é propriamente imparcial nestas suas acusações contra a escola. Disléxica, viveu num tempo em que não se compreendiam os seus problemas, e por isso teve de se esforçar muito mais do que todos os outros para chegar onde chegou. Mas na realidade se ela chegou até aqui, é exatamente porque se esforçou dessa forma, porque conseguiu construir os modelos de pensamento na sua cabeça capazes de a ajudar a compreender o mundo que a rodeia. Não deveria agora, simplesmente querer atirar tudo para o lixo, condicionando o futuro daqueles que estão a crescer.
Porque todo este discurso anti-escola já cansa, nomeadamente nos discursos nas áreas da criatividade e de fusão entre arte e ciência, tanta “arrogância tecnológica”. Só em 2013 saíram dois livros que consideram a escola perniciosa, e apresentam caminhos alternativos baseados nos seus percursos pessoais, "Hacking Your Education: Ditch the Lectures, Save Tens of Thousands, and Learn More Than Your Peers Ever Will" de Dale J. Stephens e “Don’t Go Back to School” de Kio Starck que a Maria Popova fez questão de logo idolatrar no seu BrainPickings. Não é um discurso novo, os discursos anti-escola já vêm de trás, um dos mais emblemáticos é o "Deschooling Society" (1971) de Ivan Illich.
Eu não acredito que todos tenham de comer e gostar da mesma sopa, por isso defendo escolas técnico-profissionais. Estes caminhos alternativos podem até representar uma saída de excelência para algumas mentes brilhantes, mas não para a generalidade das pessoas, e é por isso que idolatrar este tipo de discursos é no mínimo perigoso. Porque se a escola é assim tão maléfica, destruidora das mentes das nossas crianças, castradora de todo o seu potencial criativo, como é que se explica que os países com maiores níveis de escolaridade (ex. Suécia e Finlândia) sejam mais criativos e mais felizes que os que têm menores níveis de escolaridade (ex. Portugal e Grécia)?
Julgo que é tempo de parar com tanto discurso feito, tanto fascínio tecnológico, e fazer um reset discursivo, de volta aos básicos. Um pouco como nos disse a semana passada Gonzalo Frasca, mais importante que os videojogos em sala, é aquilo que um professor consegue fazer em termos de atividades e exercícios de jogos com as crianças, usando o comum papel e cartão.
2. Internet e multitasking
Neste campo Davidson segue a mesma lógica que antes, mas aqui não se agarra apenas ao discurso do senso comum. E se percebo que Davidson está em grande parte a reagir à negatividade que a sociedade tem tentado atirar para cima da internet, das tecnologias de comunicação e dos videojogos, não aceito que o faça desta forma tão leviana. Não basta pegar em meia-dúzia de teorias da psicologia, das neurociências, do estudo do cérebro e atirar para a frente. Como diz Mark Changizi na sua análise do livro para o WSJ,
E não é que Davidson apenas utilize uma ou outra teoria para suportar algumas ideias, se assim fosse, quem de nós já não o fez? O problema emerge do cerne que suporta toda a argumentação deste livro, incluindo capa e título. Davidson aposta tudo na teoria “inattentional blindness” de Daniel Simons e Christopher Chabris para lançar as amarras que sustentam todo o seu discurso. Esta teoria, mais conhecida por “gorila invisível”, demonstra que quando estamos muito focados em algo, somos incapazes de nos dar conta das coisas mais flagrantes que se passam à nossa volta (ver o vídeo abaixo). Davidson pegando na sua dislexia, conclui que cada um de nós está destinado a perder alguma coisa quando demasiado focado. Davidson assume assim que será muito mais vantajoso se agirmos colaborativamente, porque poderemos colmatar as falhas uns dos outros, colectivamente compreenderemos melhor a realidade. Partindo desta ideia, Davidson afirma que no caso do multitasking apenas temos de usar a mesma estratégia, trabalhar colaborativamente para colmatar as falhas de cada um de nós.
Ora não sou eu a dizer que Davidson é quem não vê a realidade, são os próprios autores da teoria. Chabris diz no NYT,
A realidade, e quem trabalha criativamente sabe bem disso por experiência no terreno, só podemos criar textos de longo alcance, com novas ideias, novas interpretações, quando desligamos do mundo, quando deixamos a nossa mente focar, aprofundar, e ver o mundo de múltiplas perspectivas abstractas. A concentração sobre um tópico para encontrar o não visível à superfície é fundamental. E não existe trabalho colaborativo que substitua este trabalho subterrâneo mental.
Aliás, são os próprios exemplos anedóticos dados por Davidson que nos dizem isto mesmo. Quando Davidson pergunta a Aza Raskin, o designer da interface do Firefox, como é que ele lida com a distração originada pelo multitasking, a resposta é muito clara: usa 3 computadores distintos. Um para o seu trabalho principal, um segundo mais perto para o e-mail, e um terceiro mais longe para a internet em geral, redes sociais, etc. Ou seja quando quer aceder ao e-mail tem de se levantar e ir ao segundo computador, quando quer aceder à net, tem de se levantar e caminhar ainda mais para chegar ao mesmo. É deste modo que Raskin consegue manter-se concentrado nas atividades principais em que está a trabalhar. Ou seja, ele assume claramente que precisa de erradicar tudo o resto, para se concentrar no código que quer escrever, ou nos artigos que quer produzir. Para Davidson, isto é apenas uma técnica para lidar com a distracção, para mim é a assunção de que o multitasking não existe.
Porque apesar disto Davidson passa o livro a insistir que o nosso cérebro está desenhado para o multitasking, esquecendo que apesar de funcionarmos em pensamento associativo a um nível não consciente, o nosso nível consciente tem uma capacidade bastante limitada para filtrar a múltipla informação que nos chega do exterior. Aliás, para quem tem dúvidas, basta tentar escrever um SMS enquanto conduz um carro, e verá como NÃO é dotado de qualquer super-poder de multitasking.
Não quero dizer que Davidson não tenha alguma razão quando se refere aos processos criativos. O trabalho colaborativo serve-nos, a interacção com as pessoas à nossa volta é vital para nos ajudar a despoletar novas ideias, são poderosos gatilhos que acionam as nossas ligações neuronais, e nos ajudam a proceder a fusões e misturas de ideias. Leia-se sobre os processos criativos na Pixar. Mesmo o multitasking pode também servir no despoletar destes gatilhos criativos. Mas é preciso ter em atenção que eles servem apenas para exactamente despoletar ou desencadear algo dentro de nós. Desencadeadas as ligações, precisamos do foco, do aprofundamento para chegar a compreender onde aqueles gatilhos nos podem realmente levar.
Esta ideia do multitasking como modus operandi regular ou de normalidade, é tão desprovida de senso, que Davidson assume a sua dificuldade, mas colmata-a então com o cooperativo e colaborativo, entrando assim adentro dum reino de idealismo ingénuo como nos diz Christine Wenderoth no Journal of the American Theological Library Association,
Podemos e devemos evoluir a escola que temos, com as tecnologias, com a personalização da aprendizagem, com a substituição dos exames pelas abordagens projetuais, etc., mas não esperem que simplesmente porque temos uma nova tecnologia, a internet ou outra que venha a seguir, os nossos cérebros, a nossa biologia e cognição, se transformem da noite para o dia.
É assim com alguma surpresa que constatamos que aquilo que nos traz neste seu livro não passa de “wishful thinking” sem suporte científico, propostas que mais parecem anseios e desejos de múltiplas agendas do mundo das TIC. Na verdade, e tendo em conta o que escrevi abaixo contra muito do que é dito ao longo deste livro, tenho que aceitar que o livro está bem escrito e toca em vários pontos relevantes. Porque se assim não fosse dificilmente me teria dignado a escrever tantas linhas de resposta como acabei por fazer. Dito isto, espero que o leiam, se partilho as minhas ideias é mais para poder lançar a discussão de uma forma crítica, e espero que construtiva.
Assim para aclarar a minha resposta ao livro, dividi a análise em duas partes, a primeira sobre a escola, e a segunda sobre o multistasking.
1. A Escola
1.1 – Diz Toffler que o modelo de escola atual é uma originalidade da Industrialização.
Davidson usa Toffler para iniciar todo o seu ataque à escola atual. Até aceito que Toffler tenha alguma razão no que diz, mas julgo que devemos ser cautelosos para não embarcar em generalidades. Julgo que muitos, incluindo o próprio Ken Robinson, caíram nesta ideia de generalizar a escola como um resultado da industrialização. Porque se existe algo industrial na escola da atualidade, e algo tipicamente século XX, é a massificação da escola, e não a escola enquanto conceito. Ou seja, o que é fruto da industrialização e “taylorização” é a massificação que obrigou a criar espaços de formação em série. Que por sua vez obrigou a estratificar a aprendizagem numa hierarquia fechada e a generalizar o que se aprende de forma igual para todos. Ensinar milhões de pessoas, tinha de ser diferente de ensinar uma elite.
Do que se fala é então de um problema logístico que é claro que acarretou imensos problemas para o ideal de escola, mas se olharmos para os efeitos na sociedade, esses problemas foram mais do que compensados. Uma sociedade educada, mesmo que através destes sistemas de massas, tem melhor qualidade de vida e é mais feliz do que uma não educada.
Quanto ao conceito de escola, não surge com a revolução industrial, mas com o conceito de civilização. A necessidade de passar conhecimento a quem está a aprender o que é o mundo, a quem está a aprender uma profissão, para que estes não tenham de começar do zero. A invenção da escrita facilitou o processo, as pessoas não precisavam de esperar que alguém lhes dissesse o que fazer e como fazer, podiam a seu tempo ler. Por outro lado complexificou tudo, tornou o conhecimento mais profundo, mais denso, mais detalhado. Obrigou a aumentar o tempo de aprendizagem do mundo, porque era preciso dominar um nível de abstração, a escrita, antes de chegar à realidade. Daí aos Gregos, Romanos, Renascimento, múltiplos meios de registo de comunicação, incluindo a internet, é tudo uma ordem de evolução natural.
De uma forma genérica, a escola de hoje difere pouco daquilo que eram as Guildas criadas no final da Idade Média. Para quem queria ser profissional de uma qualquer atividade, era preciso passar por um processo que durava longos anos até ser aceite por quem regia o meio. A diferença entre elas e a escola de hoje, está na obrigação que hoje existe de todos terem de atingir determinados níveis de escolaridade. Ou seja, não é o conceito que está em causa, mas o valor que a sociedade lhe passou a atribuir. Porque a ideia de todos serem obrigados a ir à escola até um certo ano, está ligada com os dados empíricos que demonstram os resultados de se ter uma sociedade mais educada. Uma pessoa que fica para trás na escola, não cria um problema apenas para si, mas para toda a sociedade, se esta for inclusiva.
1.2 – A revolução industrial e a escola criaram uma absurda “categorização, divisão e hierarquização”, segundo Cathy Davidson.
Como disse acima, em termos logísticos, foi necessário proceder assim. Não é um problema da industrialização, mas da massificação, de muitas mais pessoas poderem aceder a patamares superiores da hierarquia social. A “categorização, divisão e hierarquização” é uma ideia do mercado laboral do século XX, segundo Davidson! Será? Como é que vos parece que seria possível gerir um site com os milhões de encomendas diárias que tem a Amazon, sem este tipo de estruturas?
Mas não é uma questão logística, é antes fruto da progressão e avanço do conhecimento que detemos enquanto espécie. Porque avançar nessa compreensão implica avançar na criação de camadas de abstração sobre a realidade. E estas camadas são naturalmente constituídas por categorias, hierarquias, divisões e indexações, pois são elas que permitem a interligação conceptual, entre as várias camadas de abstração, e nos permitem conhecer em maior profundidade o mundo que nos rodeia. Basta pensar em qualquer sistema que nos rodeia desde o biológico ao solar. O que são estes sistemas, se não camadas de abstração criadas por nós, que nos ajudam a conceber mentalmente o mundo. O que são se não categorizações, comparações, classificações, relações, efeitos e impactos?!
1.3 - "A Escola Mata a Criatividade"
A ideia de que as escolas matam a criatividade é mais uma ideia muito em voga, proclamada ad nauseum desde que Ken Robinson proferiu uma TED talk em 2006 sobre o tema que se tornou viral. Mas a esta ideia também respondo não. Porque não posso, nem criticar, nem criar nada de novo, se não absorver muito daquilo que existe [leia-se a simples recomendação de Stephen King, "se quer escrever, leia"]. Mesmo quando quero criar o totalmente novo, preciso de conhecer o mundo em que me insiro. A escola deve dar a conhecer o que existe no mundo, deve fornecer saber e informação, e deve fazê-lo apresentando sempre o pró e o contra, e só desta base surgirão as competências para articular o pensamento, e agir criticamente. A reflexão não pode ser feita no vazio, correndo o risco de ser totalmente inconsequente. A escola formata, sem dúvida, mas cabe a cada um de nós depois "sair da caixa", como nos diz David Foster Wallace no discurso inaugural de 2005 na Universidade Kenyon College ou José Saramago,
Neste sentido também, Davidson recorre a uma outra afirmação muito conhecida de Toffler, "learn, unlearn and relearn" que quando retirada de contexto pode assumir contornos totalmente despropositados. O que Toffler realmente quer dizer é apenas e só, que o estudante do futuro tem de Aprender a Aprender. Isto é completamente diferente de assumir que as mudanças constantes na nossa sociedade levarão a que estejamos constantemente a apagar o passado. E menos ainda, isto quer dizer que não precisamos de aprender a classificar, categorizar e hierarquizar como Davidson procura afirmar.“A escola deveria ensinar a ouvir. Cabe-lhe ensinar o aluno a escrever corretamente e também explicar por que as regras são assim, e não de outra maneira. Mas a escola não será o lugar onde se subverte e revoluciona a estrutura da língua. Essa tarefa pertence aos escritores, se estes consideram que têm motivos para o fazer. (…)Os estilos saem do ovo da sua própria necessidade. Ensine-se a pensar claro e a escrita será clara. E, já agora, gostaria que houvesse uma luta implacável contra o erro de ortografia. A língua é uma ferramenta de comunicação de todas a mais perfeita, e as ferramentas (pergunte-se a um operário) têm de estar limpas e em condições de trabalhar eficazmente. (…)A escola não é o lugar em que se subverte a estrutura da língua porque ela não tem preparação própria suficiente para se arriscar nessa aventura. As regras são como os sinais de trânsito numa estrada. Estão ali para orientar e dar segurança ao condutor. Claro que é possível viajar por uma rodovia onde não haja sinais de trânsito, mas para isso é indispensável ser um bom condutor. Aí está a diferença. ” José Saramago (2003)
Mais grave ainda acontece quando nos diz que a mudança constante que a sociedade vive, nos deve conduzir a deixar de preocupar com as tarefas repetitivas, porque essas serão feitas pelas máquinas, ou serão fruto de outsourcing!!! (quando a China se tornar um país desenvolvido, vamos começar a realizar outsourcing para Marte?). E se assim é, como é que eu explico a alguém que quer ser pianista, que quer ser animador 3d, que quer escrever, filmar, pintar, no fundo que quer criar, que só o poderá fazer se repetir milhares de vezes a mesma ação, e se o fizer ao longo de 10 mil horas?
A grande questão é que pessoas como Cathy Davidson seguem estas correntes de pensamento, de ideias feitas no mundo do discurso de sound bytes, porque é com elas que ganham atenção. Constroem ideias em cima de castelos de cartas, e quem os quiser seguir, dando-se mal, problema seu. Davidson não é propriamente imparcial nestas suas acusações contra a escola. Disléxica, viveu num tempo em que não se compreendiam os seus problemas, e por isso teve de se esforçar muito mais do que todos os outros para chegar onde chegou. Mas na realidade se ela chegou até aqui, é exatamente porque se esforçou dessa forma, porque conseguiu construir os modelos de pensamento na sua cabeça capazes de a ajudar a compreender o mundo que a rodeia. Não deveria agora, simplesmente querer atirar tudo para o lixo, condicionando o futuro daqueles que estão a crescer.
Porque todo este discurso anti-escola já cansa, nomeadamente nos discursos nas áreas da criatividade e de fusão entre arte e ciência, tanta “arrogância tecnológica”. Só em 2013 saíram dois livros que consideram a escola perniciosa, e apresentam caminhos alternativos baseados nos seus percursos pessoais, "Hacking Your Education: Ditch the Lectures, Save Tens of Thousands, and Learn More Than Your Peers Ever Will" de Dale J. Stephens e “Don’t Go Back to School” de Kio Starck que a Maria Popova fez questão de logo idolatrar no seu BrainPickings. Não é um discurso novo, os discursos anti-escola já vêm de trás, um dos mais emblemáticos é o "Deschooling Society" (1971) de Ivan Illich.
Eu não acredito que todos tenham de comer e gostar da mesma sopa, por isso defendo escolas técnico-profissionais. Estes caminhos alternativos podem até representar uma saída de excelência para algumas mentes brilhantes, mas não para a generalidade das pessoas, e é por isso que idolatrar este tipo de discursos é no mínimo perigoso. Porque se a escola é assim tão maléfica, destruidora das mentes das nossas crianças, castradora de todo o seu potencial criativo, como é que se explica que os países com maiores níveis de escolaridade (ex. Suécia e Finlândia) sejam mais criativos e mais felizes que os que têm menores níveis de escolaridade (ex. Portugal e Grécia)?
Julgo que é tempo de parar com tanto discurso feito, tanto fascínio tecnológico, e fazer um reset discursivo, de volta aos básicos. Um pouco como nos disse a semana passada Gonzalo Frasca, mais importante que os videojogos em sala, é aquilo que um professor consegue fazer em termos de atividades e exercícios de jogos com as crianças, usando o comum papel e cartão.
2. Internet e multitasking
Neste campo Davidson segue a mesma lógica que antes, mas aqui não se agarra apenas ao discurso do senso comum. E se percebo que Davidson está em grande parte a reagir à negatividade que a sociedade tem tentado atirar para cima da internet, das tecnologias de comunicação e dos videojogos, não aceito que o faça desta forma tão leviana. Não basta pegar em meia-dúzia de teorias da psicologia, das neurociências, do estudo do cérebro e atirar para a frente. Como diz Mark Changizi na sua análise do livro para o WSJ,
"In general, I'm receptive to knock-down-the-pillars theses, but Ms. Davidson's book is ultimately a disappointment, mostly because of the way it treats "the science"—in particular, my own specialty, brain science. Ms. Davidson writes as if the human mind's functions are almost totally elastic…Este seu livro configura-se assim no género que já podemos denominar de Gladwelliano, ou seja a exposição de ideias suportadas por apenas partes de estudos científicos, depois simplificados ao ponto de qualquer leigo perceber, para garantir a veracidade da teoria que se pretende afirmar, ofuscando na generalidade o que os estudos realmente demonstram. Leia-se o artigo de Benjamin Bratton a propósito deste género de divulgação de ciência que tem sido amplamente propalado pelas TED talks.
Ms. Davidson goes on to discuss a much wider variety of science. She touches on hot topics such as mirror neurons and cross-cultural studies of how children learn categorization. But they often seem cherry-picked, as if she began with a suite of optimistic ideas regarding how we can adjust to changing technology and then shopped for justifications at the mall of brain science." (Changizi, 2011)
E não é que Davidson apenas utilize uma ou outra teoria para suportar algumas ideias, se assim fosse, quem de nós já não o fez? O problema emerge do cerne que suporta toda a argumentação deste livro, incluindo capa e título. Davidson aposta tudo na teoria “inattentional blindness” de Daniel Simons e Christopher Chabris para lançar as amarras que sustentam todo o seu discurso. Esta teoria, mais conhecida por “gorila invisível”, demonstra que quando estamos muito focados em algo, somos incapazes de nos dar conta das coisas mais flagrantes que se passam à nossa volta (ver o vídeo abaixo). Davidson pegando na sua dislexia, conclui que cada um de nós está destinado a perder alguma coisa quando demasiado focado. Davidson assume assim que será muito mais vantajoso se agirmos colaborativamente, porque poderemos colmatar as falhas uns dos outros, colectivamente compreenderemos melhor a realidade. Partindo desta ideia, Davidson afirma que no caso do multitasking apenas temos de usar a mesma estratégia, trabalhar colaborativamente para colmatar as falhas de cada um de nós.
Selective Attention Test (Simons e Chabris, 1999). As pessoas focadas na contagem do número de passes dados com a bola, não conseguem ver o gorila que atravessa o espaço (+ info).
Ora não sou eu a dizer que Davidson é quem não vê a realidade, são os próprios autores da teoria. Chabris diz no NYT,
“she provides little but anecdotal support for a central argument of the book... Like many authors who embrace new ideas rather than build on what has come before, Davidson sets out to destroy the old beliefs, as if burning down a forest in order to plant new crops."
“Indeed, Davidson is such a good storyteller, and her characters are so well drawn, it’s easy to overlook the lack of hard evidence in favor of the intriguing ideas she advocates...Como diz Chabris são muitos os estudos que demonstram que o multitasking é um mito, que se quisermos fazer trabalho de excelência, teremos de o fazer em série, e não em paralelo. Aliás ainda há pouco tempo aqui falei do trabalho de Nicholas Carr. Mas esta abordagem ao multitasking de Davidson está no fundo intimamente ligado às ideias que propala sobre a Escola, ideias de que a escola parou no tempo e não prepara os jovens para o futuro. Para Davidson no tempo da internet e dos videojogos, já não faz sentido ensinar uma profissão, interessa apenas aprender um pouco de tudo, e desse modo o multitasking é a melhor solução. Davidson e muitos dos arautos destes mitos deveriam ler "Focus: The Hidden Driver of Excellence Hardcover" (2013) de Daniel Goleman, que saiu há poucos meses.
Davidson correctly notes that there is no data showing that the Internet hurts our brains, though she errs in implying that no evidence of an effect means evidence that there is no effect. She also thinks multitasking has gotten a bad rap. Switching rapidly from one task to another actually helps us see connections between ideas and be more creative than we would if we held ourselves to a regimen of completing one task before we start another, she suggests. “Mind-wandering,” she writes, “might turn out to be exactly what we need to encourage more of in order to accomplish the best work in a global, multimedia digital age.” But this speculation is up against facts Davidson omits: the results of experiments showing that for all but perhaps an elite 2 to 3 percent of subjects, doing things in sequence leads to better performance than trying to do them simultaneously.” (Chabris, 2011)
A realidade, e quem trabalha criativamente sabe bem disso por experiência no terreno, só podemos criar textos de longo alcance, com novas ideias, novas interpretações, quando desligamos do mundo, quando deixamos a nossa mente focar, aprofundar, e ver o mundo de múltiplas perspectivas abstractas. A concentração sobre um tópico para encontrar o não visível à superfície é fundamental. E não existe trabalho colaborativo que substitua este trabalho subterrâneo mental.
Aliás, são os próprios exemplos anedóticos dados por Davidson que nos dizem isto mesmo. Quando Davidson pergunta a Aza Raskin, o designer da interface do Firefox, como é que ele lida com a distração originada pelo multitasking, a resposta é muito clara: usa 3 computadores distintos. Um para o seu trabalho principal, um segundo mais perto para o e-mail, e um terceiro mais longe para a internet em geral, redes sociais, etc. Ou seja quando quer aceder ao e-mail tem de se levantar e ir ao segundo computador, quando quer aceder à net, tem de se levantar e caminhar ainda mais para chegar ao mesmo. É deste modo que Raskin consegue manter-se concentrado nas atividades principais em que está a trabalhar. Ou seja, ele assume claramente que precisa de erradicar tudo o resto, para se concentrar no código que quer escrever, ou nos artigos que quer produzir. Para Davidson, isto é apenas uma técnica para lidar com a distracção, para mim é a assunção de que o multitasking não existe.
Porque apesar disto Davidson passa o livro a insistir que o nosso cérebro está desenhado para o multitasking, esquecendo que apesar de funcionarmos em pensamento associativo a um nível não consciente, o nosso nível consciente tem uma capacidade bastante limitada para filtrar a múltipla informação que nos chega do exterior. Aliás, para quem tem dúvidas, basta tentar escrever um SMS enquanto conduz um carro, e verá como NÃO é dotado de qualquer super-poder de multitasking.
Não quero dizer que Davidson não tenha alguma razão quando se refere aos processos criativos. O trabalho colaborativo serve-nos, a interacção com as pessoas à nossa volta é vital para nos ajudar a despoletar novas ideias, são poderosos gatilhos que acionam as nossas ligações neuronais, e nos ajudam a proceder a fusões e misturas de ideias. Leia-se sobre os processos criativos na Pixar. Mesmo o multitasking pode também servir no despoletar destes gatilhos criativos. Mas é preciso ter em atenção que eles servem apenas para exactamente despoletar ou desencadear algo dentro de nós. Desencadeadas as ligações, precisamos do foco, do aprofundamento para chegar a compreender onde aqueles gatilhos nos podem realmente levar.
Esta ideia do multitasking como modus operandi regular ou de normalidade, é tão desprovida de senso, que Davidson assume a sua dificuldade, mas colmata-a então com o cooperativo e colaborativo, entrando assim adentro dum reino de idealismo ingénuo como nos diz Christine Wenderoth no Journal of the American Theological Library Association,
“She is not right in saying that we will all work together happily towards a common goal unaffected by interruptions and multiple demands on our time and attention. Her anthropology is incredibly naive. Decentralized and distributed work life? Sure we can do that. Self-control and self-regulation? Maybe we can manage that. But loss of ego and suspicion, innate ability to multitask, placing the common good over the personal? No. Trust is not an automatic thing. We may need to reexamine how we work, but some of her idealism is just plain, well, idealistic.” (Wenderoth, 2011)No final o que mais me incomoda é que o livro até tem boas ideias a apresentar. A forma como Davidson procura trazer as ideias de mecânicas de jogo para escola, baseando-se no trabalho Jane McGonigal, não difere do que Gonzalo Frasca advoga. Ou seja, agilizar as atividades com mecânicas de jogo, preocupando-se menos com o facto de ser ou não digital. Desenvolver estratégias de avaliação baseadas em atividades lúdico-projetuais. Porque aquilo que importa é a relação que o professor constrói com o aluno, olhos nos olhos, e não através da tecnologia. Neste sentido também tenho de dizer que estou imensamente de acordo com todo ataque que Cathy Davidson desfere contra a obsessão pelos exames, testes, e standards classificatórios ao longo do livro. Por como ela própria diz, não servem a ninguém diretamente relacionado,
"I would stop, immediately, the compulsory end-of-grade exams for every child in an American public school. The tests are not relevant enough to the actual learning kids need, they offer little in the way of helpful feedback to either students or their teachers, and there are too many dire institutional consequences from failure resting on our children’s shoulders. The end-of-grade exam has become a ritual obligation, like paying taxes, and no one wants our kids to grow up thinking life’s inevitabilities are death, taxes, and school exams. That’s a disincentive to learning if ever there was one. " Cathy Davidson (2011:218)No fundo aquilo que sempre importou e continuará a importar, baseia-se na capacidade que o professor tem para desenvolver nos alunos empatia pelo que tem para partilhar com eles. A base da aprendizagem continua a ser a teoria da mente, ou seja a imitação, e enquanto não tivermos tecnologias capazes de simular seres humanos, estas continuarão sempre muito longe de poder substituir o ensino por via do semelhante. Tentar mudar toda a base biológica e cognitiva da aprendizagem devido ao surgimento de brinquedos tecnológicos externos parece-me no mínimo irracional. As tecnologias servem a educação como complementos, a internet e os videojogos nada mais fizeram do que aumentar e diversificar o acesso ao conhecimento que o livro possuía.
Podemos e devemos evoluir a escola que temos, com as tecnologias, com a personalização da aprendizagem, com a substituição dos exames pelas abordagens projetuais, etc., mas não esperem que simplesmente porque temos uma nova tecnologia, a internet ou outra que venha a seguir, os nossos cérebros, a nossa biologia e cognição, se transformem da noite para o dia.
janeiro 08, 2014
Cartazes de cinema: o medo da criatividade
Os cartazes de cinema já foram um ex-líbris da ilustração e composição visual, estampas de imaginação, sonho, magia, e muita criatividade. Com a transformação de Hollywood numa máquina de satisfação de massas à escala global os cartazes não poderiam ficar imunes. Assim aquilo que hoje temos, nomeadamente em termos de filmes de grande orçamento, são cartazes básicos, simplistas, que apenas servem a venda, restando pouco, ou nada, para sonhar.
Para demonstrar isto podemos ver o trabalho do francês Christophe Courtois que se tem dedicado, ao longo dos últimos anos, a reunir cartazes em função da semelhança visual: cor, lettering e motivo. Este trabalho foi entretanto convertido num vídeo, "WTF Happened to Movie Posters?" (2013) por Cecil Trachenburg do canal YouTube GoodBadFlicks, que poderia no mínimo ter citado a fonte no final do mesmo. Se descobri a fonte foi graças ao The Awesomer.
Se Christophe Courtois no seu trabalho de colagem visual apenas se dedicou a tornar evidente as semelhanças, Cecil Trachenburg procurou no vídeo explicar a razão por detrás das semelhanças. E para Trachenburg a causa é apenas e só, falta de tempo e dinheiro!!! Será? Mas alguém acredita que um filme que passa mais de um ano em produção (por vezes chega aos três anos) para o qual são desenvolvidos materiais artísticos da mais elevada qualidade visual, em que se investe para cima de 100 milhões de dólares, não tenha tempo nem dinheiro para criar um bom cartaz?!!
Não querendo ser dono da verdade, e tendo em conta o pouco que percebo de marketing e de Hollywood, para mim a razão está enraizada mais no âmago da produção deste tipo de cinema. Estamos a falar de filmes extremamente caros, que precisam de ser vendidos em todo o planeta para gerar retorno suficiente para se pagarem. Estamos a falar ainda de um tipo de produto que é impossível de prever a aceitação das pessoas, pode funcionar muito bem e gerar imenso lucro, ou pode levar um estúdio inteiro à falência. Deste modo, quando se trata de promover o filme, nomeadamente fazer um cartaz, quem é que tem a última palavra? Será o artista ou o marketeer?
A dúvida não existe, o artista aqui é apenas um técnico às ordens do marketeer (formado em gestão), que quer maximizar a venda do seu produto. Para tal um cartaz tem de obrigatoriamente ter os nomes das estrelas, já que são elas o garante da venda. Mas como a venda tem de ser feita em larga escala, o ideal é que apareçam as caras dos atores, e não apenas o texto, porque as massas conhecem as caras, não os nomes. Além disso é muito mais fácil veicular emoções, facilmente compreensíveis prontas a digerir, por via de caras e corpos humanos, do que através de detalhes de ilustração ou fotográficos. Quanto ao resto do cartaz, torna-se quase irrelevante, umas letras por cima das caras pode ser suficiente, ou então encaixá-lo no género. Ou seja na família de modelos que têm sido feitos para os filmes do género, seja acção ou outro. O objetivo é convencer as pessoas de que o filme será tão bom como o outro que viram, já que a capa lhes faz lembrar o anterior.
Desta forma seguindo a familiaridade evita-se o risco de afastar as pessoas pela capa do filme, claro que o reverso da medalha é a erradicação do rasgo criativo, e a ausência de qualquer identidade no cartaz. Para quem hoje quiser sentir essa centelha criativa ligada ao cinema, o melhor será procurar os cartazes feitos por fãs de forma independente. E foi por isso mesmo que Matthew Chojnacki resolveu coligir no livro "Alternative Movie Posters: Film Art from the Underground"(2013) cerca de 200 cartazes de filmes alternativos. Se for do vosso interesse, preparem-se para perder horas a ler (olhar e interpretar) alguns dos mais belos cartazes de cinema alguma vez criados.
"Atores de costas" de Christophe Courtois
"Lado a lado de costas" de Christophe Courtois
"WTF Happened to Movie Posters?" (2013) por Cecil Trachenburg
Se Christophe Courtois no seu trabalho de colagem visual apenas se dedicou a tornar evidente as semelhanças, Cecil Trachenburg procurou no vídeo explicar a razão por detrás das semelhanças. E para Trachenburg a causa é apenas e só, falta de tempo e dinheiro!!! Será? Mas alguém acredita que um filme que passa mais de um ano em produção (por vezes chega aos três anos) para o qual são desenvolvidos materiais artísticos da mais elevada qualidade visual, em que se investe para cima de 100 milhões de dólares, não tenha tempo nem dinheiro para criar um bom cartaz?!!
Não querendo ser dono da verdade, e tendo em conta o pouco que percebo de marketing e de Hollywood, para mim a razão está enraizada mais no âmago da produção deste tipo de cinema. Estamos a falar de filmes extremamente caros, que precisam de ser vendidos em todo o planeta para gerar retorno suficiente para se pagarem. Estamos a falar ainda de um tipo de produto que é impossível de prever a aceitação das pessoas, pode funcionar muito bem e gerar imenso lucro, ou pode levar um estúdio inteiro à falência. Deste modo, quando se trata de promover o filme, nomeadamente fazer um cartaz, quem é que tem a última palavra? Será o artista ou o marketeer?
"Texto sobre caras" de Christophe Courtois
"Fogo e chamas sobre preto e branco" de Christophe Courtois
A dúvida não existe, o artista aqui é apenas um técnico às ordens do marketeer (formado em gestão), que quer maximizar a venda do seu produto. Para tal um cartaz tem de obrigatoriamente ter os nomes das estrelas, já que são elas o garante da venda. Mas como a venda tem de ser feita em larga escala, o ideal é que apareçam as caras dos atores, e não apenas o texto, porque as massas conhecem as caras, não os nomes. Além disso é muito mais fácil veicular emoções, facilmente compreensíveis prontas a digerir, por via de caras e corpos humanos, do que através de detalhes de ilustração ou fotográficos. Quanto ao resto do cartaz, torna-se quase irrelevante, umas letras por cima das caras pode ser suficiente, ou então encaixá-lo no género. Ou seja na família de modelos que têm sido feitos para os filmes do género, seja acção ou outro. O objetivo é convencer as pessoas de que o filme será tão bom como o outro que viram, já que a capa lhes faz lembrar o anterior.
Desta forma seguindo a familiaridade evita-se o risco de afastar as pessoas pela capa do filme, claro que o reverso da medalha é a erradicação do rasgo criativo, e a ausência de qualquer identidade no cartaz. Para quem hoje quiser sentir essa centelha criativa ligada ao cinema, o melhor será procurar os cartazes feitos por fãs de forma independente. E foi por isso mesmo que Matthew Chojnacki resolveu coligir no livro "Alternative Movie Posters: Film Art from the Underground"(2013) cerca de 200 cartazes de filmes alternativos. Se for do vosso interesse, preparem-se para perder horas a ler (olhar e interpretar) alguns dos mais belos cartazes de cinema alguma vez criados.
janeiro 06, 2014
"Abita", crianças de Fukushima
Fukushima foi palco de um enorme desastre radioativo após um tsunami que varreu a costa do Japão em 2011. A discussão em redor da libertação de radiotividade da central nuclear e os seus efeitos na população tem sido bastante limitada. Nesse sentido Shoko Hara, japonesa a residir na Alemanha, resolveu fazer o seu filme de fim de curso em Media Design na Universidade Estatal Cooperativa de Baden-Württemberg (DHBW), juntamente com o seu colega de curso Paul Brenner, sobre as crianças de Fukushima que não podem brincar na rua.
"Abita" (2012) foi apresentado em vários festivais de animação, e continua a concurso em vários outros. Em 2013 ganhou o prémio de Melhor filme de Animação no International Uranium Filmfestival, Rio de Janeiro, 2013. Em termos técnicos temos uma brilhante fusão entre 3d e ilustração a aguarela, o que lhe confere um caráter atual mas tradicional ao mesmo tempo. As pequenas fragilidades de câmara e de animação de personagem são fortemente compensadas pela animação do traço a aguarela. Por outro lado a mensagem que o filme transporta, de tão forte faz-nos esquecer por momentos que estamos a ver uma simples animação, convertendo-nos àquele universo, àquela idea, empatizando com aquela, e milhares de outras crianças, que vivem hoje naquela cidade.
"Abita", animated short film about Fukushima children who can't play outside because of the radioactivity. About their dreams and realities.
"Abita" (2012) foi apresentado em vários festivais de animação, e continua a concurso em vários outros. Em 2013 ganhou o prémio de Melhor filme de Animação no International Uranium Filmfestival, Rio de Janeiro, 2013. Em termos técnicos temos uma brilhante fusão entre 3d e ilustração a aguarela, o que lhe confere um caráter atual mas tradicional ao mesmo tempo. As pequenas fragilidades de câmara e de animação de personagem são fortemente compensadas pela animação do traço a aguarela. Por outro lado a mensagem que o filme transporta, de tão forte faz-nos esquecer por momentos que estamos a ver uma simples animação, convertendo-nos àquele universo, àquela idea, empatizando com aquela, e milhares de outras crianças, que vivem hoje naquela cidade.
"O simbolismo japonês foi uma fonte de inspiração em nosso filme. A Libélula representa a primeira ilha japonesa, por causa de sua forma. A libélula também simboliza a esperança, a perspectiva, o sonho, a energia no Japão e une todos os elementos naturais como água, terra e ar. O desastre de Fukushima acabou destruindo estas energias positivas, contaminando a água, terra e o ar - assim deixando as crianças sem qualquer perspectiva para o futuro. As libélulas no Japão são portadores de fertilidade - agora comprometida pela radioatividade." Shoko Hara
"Abita" (2012) de Shoko Hara e Paul Brenner
janeiro 03, 2014
Como será o storytelling no final do século XXI?
No World Science Festival pergunta-se a um conjunto de académicos e escritores, "como será o storytelling no final do século XXI?" e assistimos a mais um momento de alguma perplexidade. Tenho participado em algumas discussões e reuniões deste tipo, por exemplo especular sobre tecnologias e áreas de investigação para daqui a 30 ou 50 anos, e o que se verifica é que temos muita dificuldade em sair do contexto que nos rodeia. Funcionamos numa base sempre incremental, e quando algum de nós "sai demasiado da caixa", ficam todos a olhar para nós com ar de incredulidade e por vezes até de alguma reprovação. É fácil obter aprovação quando se percebe o que outro está a dizer, e de onde parte o seu discurso, quando ele corta demasiado com o estado das coisas, quem nos ouve não consegue lidar com o assunto, e por isso a primeira fase é de refutação. Ou seja, é extremamente difícil perspectivar o futuro, e por isso o caminho proposto por este grupo de pensadores, "Podem os Videojogos ser o Futuro do Storytelling" não é o futuro, mas o presente, como ainda na semana passada tive oportunidade de escrever na Eurogamer, "A forma de expressão mais relevante do século XXI".
No grupo temos Jonathan Gottschall, mais conhecido pelo livro “The Storytelling Animal: How Stories Make Us Human” (2012), temos Paul Bloom conhecido por todo o seu trabalho à volta da ciência do prazer, "How Pleasure Works: The New Science of Why We Like What We Like" (2011), temos Keith Oatley conhecido por toda a sua investigação em redor da emoção nas histórias, "The Passionate Muse: Exploring Emotion in Stories" (2012) e ainda os escritores Jeffrey Eugenides, vencedor do Pulitzer Prize, e Joyce Carol Oates vencedora de inúmeros prémios literários. Ou seja, um belíssimo grupo de pensadores sobre os assuntos da narrativa, storytelling, seus efeitos e impactos.
Na pequena discussão Gottschall lança o mote dos videojogos, e os restantes seguem atrás. Nesse sentido acabam sendo discutidos dois modos, supostamente novos, de aceder às histórias, a participação e a colaboração. Em ambas coloca-se em causa a questão da autoria da história, seja pelo lado da participação no desvelar da narrativa, seja pelo lado da criação em modo colaborativo muito em voga nos tempos da Web 2.0. Ambos os modos nunca deixaram de estar entre nós. A participação existe desde que contávamos histórias junto à fogueira, e íamos comentando o que se dizia, nos ríamos, chorávamos, e em tempo real o contador adaptava-se ao modo como o público reagia. Quanto ao colaborativo, e como é referido por Joyce Carol Oates, "originalmente as histórias não tinham um autor", eram de todos, e todos podiam acrescentar, cortar, e fazer evoluir as histórias. Os grandes mitos, lendas ou contos de fadas que hoje temos são fruto dessa teia humana de grande co-criação, da colaboração selecionada pelos processos naturais da evolução das civilizações.
Ou seja, é natural que a natureza da narrativa sofra transformações, mas no final o que conta é aquilo que cada criador pretende expressar. Todos os media criados serviram sempre para comunicar ideias, a forma como o fizeram tem sido quase sempre submetendo-se ao espartilho da narrativa. Mas esse espartilho foi sempre sendo posto a prova. Podemos dizer que existem muitos lugares comuns, muitos padrões que se repetem neste enquadramento que nos ajuda a organizar a informação, mas aquilo que cada autor faz é sempre uma tentativa de se expressar de uma forma pessoal.
Para tornar essa expressão mais pessoal, mais original e única, pode fazê-lo contando algo totalmente novo, que nunca ninguém tenha ouvido. Ou se o que tem a dizer não é propriamente original, pode criar uma forma de organizar aquilo que quer contar de uma forma totalmente nova - deslinearizando, fragmentando, intertextualizando, etc. Por fim, se aquilo que tem para dizer e a forma como o vai dizer não são novas, pode ainda socorrer-se dos elementos plásticos, ou seja do tipo de media e das suas convenções - literatura, cinema, videojogos, transmedia, etc. - para gerar a diferença.
O que será da narrativa daqui a 100 anos? Não faço a mais pequena ideia. Mas tenho ideia que as diferenças não serão tão grandes como pensamos como diz, um dos meus académicos preferidos da atualidade, o Paul Bloom. Elas existirão, e a forma de contar histórias continuará a mudar, mas ao ritmo da nossa capacidade de as experienciar, e não ao ritmo das tecnologias. Apesar de todo o interesse sobre o tema que as tecnologias têm feito despertar nos últimos anos - veja-se os cursos online, assim como as iniciativas online para descobrir o novo storytelling, ou ainda as tentativas do jornalismo de se reinventar.
[Vídeo enviado por David Mota]
Could Video Games Be the Future of Storytelling? (2013)
No grupo temos Jonathan Gottschall, mais conhecido pelo livro “The Storytelling Animal: How Stories Make Us Human” (2012), temos Paul Bloom conhecido por todo o seu trabalho à volta da ciência do prazer, "How Pleasure Works: The New Science of Why We Like What We Like" (2011), temos Keith Oatley conhecido por toda a sua investigação em redor da emoção nas histórias, "The Passionate Muse: Exploring Emotion in Stories" (2012) e ainda os escritores Jeffrey Eugenides, vencedor do Pulitzer Prize, e Joyce Carol Oates vencedora de inúmeros prémios literários. Ou seja, um belíssimo grupo de pensadores sobre os assuntos da narrativa, storytelling, seus efeitos e impactos.
Na pequena discussão Gottschall lança o mote dos videojogos, e os restantes seguem atrás. Nesse sentido acabam sendo discutidos dois modos, supostamente novos, de aceder às histórias, a participação e a colaboração. Em ambas coloca-se em causa a questão da autoria da história, seja pelo lado da participação no desvelar da narrativa, seja pelo lado da criação em modo colaborativo muito em voga nos tempos da Web 2.0. Ambos os modos nunca deixaram de estar entre nós. A participação existe desde que contávamos histórias junto à fogueira, e íamos comentando o que se dizia, nos ríamos, chorávamos, e em tempo real o contador adaptava-se ao modo como o público reagia. Quanto ao colaborativo, e como é referido por Joyce Carol Oates, "originalmente as histórias não tinham um autor", eram de todos, e todos podiam acrescentar, cortar, e fazer evoluir as histórias. Os grandes mitos, lendas ou contos de fadas que hoje temos são fruto dessa teia humana de grande co-criação, da colaboração selecionada pelos processos naturais da evolução das civilizações.
Ou seja, é natural que a natureza da narrativa sofra transformações, mas no final o que conta é aquilo que cada criador pretende expressar. Todos os media criados serviram sempre para comunicar ideias, a forma como o fizeram tem sido quase sempre submetendo-se ao espartilho da narrativa. Mas esse espartilho foi sempre sendo posto a prova. Podemos dizer que existem muitos lugares comuns, muitos padrões que se repetem neste enquadramento que nos ajuda a organizar a informação, mas aquilo que cada autor faz é sempre uma tentativa de se expressar de uma forma pessoal.
Para tornar essa expressão mais pessoal, mais original e única, pode fazê-lo contando algo totalmente novo, que nunca ninguém tenha ouvido. Ou se o que tem a dizer não é propriamente original, pode criar uma forma de organizar aquilo que quer contar de uma forma totalmente nova - deslinearizando, fragmentando, intertextualizando, etc. Por fim, se aquilo que tem para dizer e a forma como o vai dizer não são novas, pode ainda socorrer-se dos elementos plásticos, ou seja do tipo de media e das suas convenções - literatura, cinema, videojogos, transmedia, etc. - para gerar a diferença.
O que será da narrativa daqui a 100 anos? Não faço a mais pequena ideia. Mas tenho ideia que as diferenças não serão tão grandes como pensamos como diz, um dos meus académicos preferidos da atualidade, o Paul Bloom. Elas existirão, e a forma de contar histórias continuará a mudar, mas ao ritmo da nossa capacidade de as experienciar, e não ao ritmo das tecnologias. Apesar de todo o interesse sobre o tema que as tecnologias têm feito despertar nos últimos anos - veja-se os cursos online, assim como as iniciativas online para descobrir o novo storytelling, ou ainda as tentativas do jornalismo de se reinventar.
Human history is rich with stories, and as our culture and technology changes, so do the ways we tell stories. For example, from its roots in oral tradition, storytelling branched off into literature, artwork, and film. Where are narratives headed next? Depending on your hobbies, the answer may or may not surprise you. Literary scholar and author Jonathan Gottschall believes that video games will be (and arguably already are) the next step in storytelling in this digital age. He cites video games' ability to allow people to play an active role in narratives to be their greatest strength.
[Vídeo enviado por David Mota]
janeiro 02, 2014
iPhone: A inovação criativa não é mero remix
Adoro a série “Everything is a Remix” de Kirby Ferguson, mas desta vez acabou metendo os pés pelas mãos com o trabalho “Everything is a Remix Case Study: The iPhone” (2013). Ferguson é licenciado em Inglês, e se isso lhe deu background para realizar comparações entre filmes e músicas, assim como analisar em parte a história do copyright, está longe de lhe ter garantido as ferramentas necessárias para proceder a uma análise de um objecto tão complexo, na sua inovação, como o iPhone.
É verdade que tudo no nosso planeta é fruto do remix, porque a ação essencial de criação assenta no remix, mas a inovação criativa não brota apenas da realização de remix (por engenhosa, trabalhosa ou brilhante que seja), ela exige mais, exige um corte com o antes, um rasgar das convenções estéticas e sociais. A inovação criativa exige mais do que um mero incremento a partir daquilo que já antes existia. A inovação criativa é um risco, é um tiro no escuro, e pode funcionar muito bem, sendo capaz de criar caminhos completamente novos para quem vem a seguir, ou simplesmente afundar e arrastar para o buraco quem por aqui se arrisca. Deste modo ser capaz de arriscar no caminho da inovação criativa, não é algo que está ao alcance de todos, nem sequer daqueles que realizam remix, porque requer além de visão, muita obstinação, requer uma atitude de afronta constante ao mundo, uma insatisfação para com o que ele nos apresenta, e isso nem sempre nos traz o melhor do mundo (leiam People don’t actually like creativity, 2013).
Deste modo o iPhone (2007) assim como o Macintosh (1984), representam grandes revoluções de inovação criativa no mundo da computação, marcas deixadas por Steve Jobs. É claro que são fruto de remix, mas são bastante mais do que isso, o remix é apenas a base de partida. Aliás para chegar a esses produtos, para rasgar e vingar, é preciso falhar, ninguém inova sobre inovação, a aprendizagem e evolução acontece com o erro. A Apple e Jobs tiveram vários fracassos, como uma consola de jogos (PipPin), um PDA (Newton), ou ainda a própria companhia NeXT que Jobs criou quando esteve fora da Apple. Ou seja, não existem pessoas criativas por defeito, existem pessoas que de tão obstinadas pelo diferente, e não pelo remix, de vez em quando quebram o status quo, e fazem a sociedade avançar.
Tudo isto para dizer que o filme de Ferguson é uma mão cheia de nada. Dizer que a interface do iPhone é uma cópia de coisas da realidade, e usar uma palavra complexa, skeumorphism, para o definir, em vez de simplesmente falar em metáforas, só me dá vontade de rir. Demonstra que não percebeu nada daquilo que esteve na origem da inovação do iPhone, porque lhe falta conhecimento nas áreas da tecnologia, do design, e ainda mais no design de interação. Aconselho-o vivamente a ler o texto “The Day Google Had to 'Start Over' on Android” (2013) na The Atlantic para ter apenas um pequenino insight sobre aquilo que o iPhone representou em 2007.
Porque não basta ter o dom da palavra e da edição audiovisual. Fazer um trabalho como este que nos é aqui apresentado requer uma enorme bagagem do campo que só pode ser conseguida com vários anos de pesquisa. Não basta ler uns textos na internet e fazer meia dúzia de pesquisas na Wikipedia. Além de que fica muito mal apresentar todas estas ideias como se fossem dos autores do filme. Não são eles a dizer que tudo é um remix, então a partir de onde fizeram o seu remix? Porque o fizeram, basta seguir os links na wikipedia para perceber de onde vieram estas ideias. Depois não deixa de ser estranhíssimo ver no final toda uma lista de referências das imagens, vídeos e sons que foram utilizadas do istock.com e não ver qualquer referência aos textos e vídeos utilizados para compilar as ideias apresentadas. Será que o reconhecimento das fontes na cultura do remix só deve funcionar quando existe financiamento em questão?
É verdade que tudo no nosso planeta é fruto do remix, porque a ação essencial de criação assenta no remix, mas a inovação criativa não brota apenas da realização de remix (por engenhosa, trabalhosa ou brilhante que seja), ela exige mais, exige um corte com o antes, um rasgar das convenções estéticas e sociais. A inovação criativa exige mais do que um mero incremento a partir daquilo que já antes existia. A inovação criativa é um risco, é um tiro no escuro, e pode funcionar muito bem, sendo capaz de criar caminhos completamente novos para quem vem a seguir, ou simplesmente afundar e arrastar para o buraco quem por aqui se arrisca. Deste modo ser capaz de arriscar no caminho da inovação criativa, não é algo que está ao alcance de todos, nem sequer daqueles que realizam remix, porque requer além de visão, muita obstinação, requer uma atitude de afronta constante ao mundo, uma insatisfação para com o que ele nos apresenta, e isso nem sempre nos traz o melhor do mundo (leiam People don’t actually like creativity, 2013).
Deste modo o iPhone (2007) assim como o Macintosh (1984), representam grandes revoluções de inovação criativa no mundo da computação, marcas deixadas por Steve Jobs. É claro que são fruto de remix, mas são bastante mais do que isso, o remix é apenas a base de partida. Aliás para chegar a esses produtos, para rasgar e vingar, é preciso falhar, ninguém inova sobre inovação, a aprendizagem e evolução acontece com o erro. A Apple e Jobs tiveram vários fracassos, como uma consola de jogos (PipPin), um PDA (Newton), ou ainda a própria companhia NeXT que Jobs criou quando esteve fora da Apple. Ou seja, não existem pessoas criativas por defeito, existem pessoas que de tão obstinadas pelo diferente, e não pelo remix, de vez em quando quebram o status quo, e fazem a sociedade avançar.
Tudo isto para dizer que o filme de Ferguson é uma mão cheia de nada. Dizer que a interface do iPhone é uma cópia de coisas da realidade, e usar uma palavra complexa, skeumorphism, para o definir, em vez de simplesmente falar em metáforas, só me dá vontade de rir. Demonstra que não percebeu nada daquilo que esteve na origem da inovação do iPhone, porque lhe falta conhecimento nas áreas da tecnologia, do design, e ainda mais no design de interação. Aconselho-o vivamente a ler o texto “The Day Google Had to 'Start Over' on Android” (2013) na The Atlantic para ter apenas um pequenino insight sobre aquilo que o iPhone representou em 2007.
Porque não basta ter o dom da palavra e da edição audiovisual. Fazer um trabalho como este que nos é aqui apresentado requer uma enorme bagagem do campo que só pode ser conseguida com vários anos de pesquisa. Não basta ler uns textos na internet e fazer meia dúzia de pesquisas na Wikipedia. Além de que fica muito mal apresentar todas estas ideias como se fossem dos autores do filme. Não são eles a dizer que tudo é um remix, então a partir de onde fizeram o seu remix? Porque o fizeram, basta seguir os links na wikipedia para perceber de onde vieram estas ideias. Depois não deixa de ser estranhíssimo ver no final toda uma lista de referências das imagens, vídeos e sons que foram utilizadas do istock.com e não ver qualquer referência aos textos e vídeos utilizados para compilar as ideias apresentadas. Será que o reconhecimento das fontes na cultura do remix só deve funcionar quando existe financiamento em questão?
Everything is a Remix Case Study: The iPhone (2013) de Kirby Ferguson
Filmes de Dezembro 2013
Passei o mês de Dezembro a tentar terminar alguns videojogos de 2013 para poder fechar as minhas escolhas deste ano, desse modo sobrou muito pouco tempo para cinema. Ainda assim consegui surpreender-me com "Don Jon", um filme na forma bastante tradicional mas com uma abordagem temática de fuga ao tradicional embelezamento da realidade, uma comédia com substrato. Por outro lado fiquei um tanto desiludido com os últimos Tornatore e Blomkamp.
xxxx The Attack 2012 Ziad Doueiri Lebanon
xxxx Don Jon 2013 Joseph Gordon-Levitt USA
xxx The Best Offer 2013 Giuseppe Tornatore Italy
xxx Elisyum 2013 Neill Blomkamp USA
xxx Now you see Me 2013 Louis Leterrier USA
xxx Stoker 2013 Chan-wook Park USA
xxxx The Attack 2012 Ziad Doueiri Lebanon
xxxx Don Jon 2013 Joseph Gordon-Levitt USA
xxx The Best Offer 2013 Giuseppe Tornatore Italy
xxx Elisyum 2013 Neill Blomkamp USA
xxx Now you see Me 2013 Louis Leterrier USA
xxx Stoker 2013 Chan-wook Park USA