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abril 22, 2023

O Retrato do Casamento (2022)

O livro abre com a seguinte nota histórica: "Em 1560, com quinze anos, Lucrezia de' Medici, deixou Florença para iniciar a sua vida de casada com Alfonso II d'Este, duque de Ferrara. Menos de um ano depois estaria morta. A causa oficial de morte foi "febre pútrida", mas houve rumores de que teria sido assassinada pelo marido." E fecha com uma nota da autora, em que aprendo uma nova palavra "uxoricídio" (do latim uxor, esposa + cídio, matar; "assassínio da mulher pelo próprio cônjuge"), apresentada a propósito do rumor do uxoricídio da irmã de Lucrezia, Isabella em 1575, e ainda da cunhada Dianora, pelas mãos do irmão Pietro de' Medici, que tendo-o admitido nada lhe aconteceu.

abril 07, 2023

Guerra do Peloponeso, 431 a.C. a 404 a.C.

"História da Guerra do Peloponeso" foi escrito no século V a.C por Tucídides, sendo por isso mesmo um registo histórico de incomensurável valor, mas é também um marco da História enquanto disciplina académica. Neste último sentido, fez-me compreender que apesar de na última década me ter dedicado a ler mais e mais História, na verdade continuo longe da mesma, em termos académicos. Interessam-me as histórias sobre a História, não me interessam tanto os relatos descritivos, mesmo que mais fidedignos ou verdadeiros. Não me move chegar “à verdade”, move-me mais a ideia de que aquilo que se conta é baseado numa realidade. Desde logo, porque mesmo num livro tão descritivo, tão emocionalmente neutro e objetivo, é possível denotar viés a ponto de hoje alguns historiadores o classificarem mesmo como apenas literatura. Claro que falo de um ponto de vista externo, não leio estas obras para documentar a minha investigação, se assim fosse falaria de modo distinto. Como leio apenas pelo prazer de ler, esse é maior quando a História usa o melhor da arte narrativa para chegar a nós, mesmo colocando em causa parte da sua factualidade que aceito bem quando é feito por via da especulação, mas não tanto quando pela mera invenção.

abril 02, 2023

Os Europeus e a cultura cosmopolita do século XIX

A experiência de "The Europeans" (2019) de Orlando Figes funciona como uma grande viagem cultural através de toda a Europa — da Rússia a Portugal — ao longo de todo o século XIX. Figes escolheu para companheiros de viagem: o ícone literário Ivan Turgenev, a renomeada cantora de ópera Pauline Viardot, e o seu marido Louis Viardot, crítico e historiador de arte. Três inseparáveis companheiros que percorreram toda a Europa durante as suas vidas, pondo em contacto as mais diversas culturas, dando assim suporte ao subtítulo: "Three Lives and the Making of a Cosmopolitan Culture". O registo apresenta uma simbiose perfeita entre a exposição de factos e o contar de histórias que poderiam quase ser ficcionais, quase checkovianas, mantendo-nos enredados ao longo das mais de 500 páginas. Figes faz-nos sentir nostalgia daquilo que não vivemos, nomeadamente quando dá conta do nascimento de correntes, de movimentos e renovados interesses da sociedade pela cultura e arte florescentes num tão diverso continente suportadas pela evolução tecnológica desse século, em particular os caminhos de ferro, o telégrafo, a imprensa, a fotografia, assim como a criação do copyright e do canône literário.

março 05, 2023

Re-interpretando a História, segundo as nossas agendas

Não vou tecer elogios ao livro, "The Dawn of Everything: A New History of Humanity" (2021) porque tenta claramente ser mais do que aquilo que é, apesar de inexplicavelmente ter uma enorme quantidade de pessoas a tecer louvores, nomeadamente a crítica jornalística e autores de best-sellers. Mas também por força desse enorme suporte, não sinto qualquer obrigação de inibir a minha crítica. Até porque, todo o livro está escrito como um ataque direto a outros autores, nomeadamente três contemporâneos — Pinker, Harari e Diamond — e dois clássicos — Rousseau e Hobbes. Mas vai além quando nem sequer pára para criticar, mas simplesmente decide ignorar totalmente a ciência, começando por Darwin e a biologia, passando por toda a Física, e mais grave ainda, tendo em conta que se fala de comportamento humano, toda a Psicologia. Os autores, sentados no seu pedestal antropológico, julgam-se no direito de pescar casos isolados, feitos de variáveis não conforme, e tecer sobre estes interpretações para demonstrar aquilo que a sua agenda exige. Ignora-se na generalidade metodologias científicas de carácter empirista, baseando grande parte das deduções em ideias de autores que nunca passaram pelo crivo da revisão por pares. Mas para repescar esses autores existe sempre uma condição especial, suportada na ideia de que foram preteridos pelas grandes conspirações que conspurcaram a ciência iluminista — o colonialismo e o androcentrismo.

"Quixotically, Graeber and Wengrow expect readers to give serious consideration to a perspective on human origins that does not acknowledge evolutionary theory at all." -- Knight, 2022

março 04, 2023

O Mago do Kremlin (2022)

“O Mago do Kremlin”, de Giuliano da Empoli, é um romance histórico-político centrado num dos mais relevantes focos da cena política global atual que domina não só as atenções políticas mas as de toda a sociedade, e que é o esforço de manutenção do Imperialismo Russo. Empoli é professor de Ciência Política na Sciences-Po em Paris, é presença assídua nos média italianos e franceses como comentador de política, tendo escrito mais de uma dezena de livros de ensaio, sendo este o seu primeiro romance. O livro ganhou Grande Prémio de Ficção da Academia Francesa 2022 e foi finalista do prémio Goncourt 2022. Esta breve apresentação será suficiente para dar conta da relevância do livro, mas não quero deixar de dizer que está muito bem escrito; e que a ficção apresenta um enorme nível de verossimilhança.

dezembro 24, 2022

A Torre dos Segredos (2022)

O título original — "A History of Water" — não faz muito sentido, porque não explicando do que trata, também não aproxima o leitor do sentimento geral da obra. Ainda que se possa dizer que a obra se foca em dois viajantes da era dourada das descobertas marítimas portuguesas: Luís de Camões (1524 - 1580) e Damião de Góis (1502-1574). Mas o sentimento é claramente melhor captado pelo título português — "A Torre dos Segredos" —, que não só evoca o relato das particularidades das vidas desses dois viajantes, mas denota também a presença central da Torre do Tombo, a torre onde desde 1378 a história de Portugal foi sendo escrita.

dezembro 01, 2022

Make It New: A History of Silicon Valley Design

Não sei como passei ao lado de "Make It New: A History of Silicon Valley Design", um livro já de 2015, mas é uma das maiores jóias sobre a História de Silicon Valley, sobre o nascimento das tecnologias multimédia, mas em particular sobre o modo como o design, e não o desenvolvimento, se tornou no centro da criação tecnológica. Li já dezenas de livros sobre esta história, mas este livro de Barry M. Katz, Professor de Design Industrial e Interação no California College of the Arts e Colaborador da IDEO, Inc., distingue-se por apresentar pela primeira vez uma perspectiva completa a partir do design. Foi, sem dúvida, uma das minhas leituras mais gratificantes de 2022.

O livro está editado pela MIT Press

outubro 29, 2022

Do escurecimento provocado pelo cristianismo

Tivesse eu lido este livro há alguns anos, teria ficado chocado com o que aqui se escreve sobre a vasta destruição dos pagãos pelos cristãos. Contudo, nada disto pode ser apresentado desta forma leve, desde logo porque a destruição apresentada ocorreu ao longo de séculos, sendo aqui apresentada como uma sucessão narrativa de causas e efeitos imediatos, o que retira alguma credibilidade ao relato. Os clássicos têm dois mil anos, as evidências que temos do que aconteceu são fragmentos de fragmentos. Não podemos a partir dos mesmos, pegar em momentos avulso no tempo, escolhidos pela sua intensidade, e criar um fio condutor que explica tudo com uma única dimensão ou causalidade. Claro que num pequeno livro, tal como num documentário, sobre assuntos complexos, não se pode entrar pelo detalhe dos múltiplos pontos-de-vista, arriscando a fragmentar o discurso, perdendo o foco e a atenção do leitor/espectador. Mas a simplificação do complexo, por mais ressalvas de imparcialidade que se façam, tende demasiadas vezes a criar viéses marcados pelo que se escolhe apresentar e não apresentar.

setembro 01, 2022

O reino de narciso

Cheguei a "O Reino" (2014), não por ter sido um enorme sucesso em França quando saiu, mas por ser apresentado como um ficcionar dos primeiros anos do cristianismo, focado nas vidas de Paulo e Lucas. Tenho-me interessado cada vez mais pelos chamados romances históricos, pelo modo como facilitam o nosso acesso ao conhecimento da História. Mas não foi nada disso que aqui encontrei. Carrère reconta e parafraseia a partir de dezenas de textos históricos e teológicos, oferecendo-nos a sua interpretação sobre os mesmos. Existe ficção nessa sua interpretação, na interpretação das ideias, mas não existe propriamente dramatização, ou seja, recriação das ações dos personagens. Carrère segue um discurso colado ao registo dos documentários de televisão, em que vai comentando os escritos e teorias, algo que poderia até funcionar como não-ficção, mas que se esfuma porque muito do que vai dizendo é pura especulação. Por isso, perde também aquilo que afirma ser a sua forma de escrever quando nos diz que nunca conseguiu acabar de ler as “Memórias de Adriano” de Marguerite Yourcenar, por não se rever no ato de ficcionar, dada a impossibilidade de imparcialidade das histórias. Mas estes seu discurso, mesmo estando sempre colado ao real, com reparos de dúvida constante, é o da sua pessoa e das suas memórias, por isso mesmo não deixa de estar pejado dessa parcialidade. Mais, não há aqui qualquer método para tentar diminuir esse viés, existe antes uma aceitação tácita que, segundo ele, lhe dá liberdade para dizer o que quiser, alardeando que o que diz pode mesmo ter acontecido assim, em certa medida colocando-se no lugar dos autores dos próprios Evangelhos.

agosto 27, 2022

A Idade Brilhante, entre 476 e 1320

Nos últimos anos temos assistido ao redescobrir da Europa Medieval por meio de muitos académicos historiadores que nos têm vindo a alertar para o facto das ideias do senso comum sobre a idade média não estarem corretas. É corrente encontrar na literatura, cinema ou jogos a idade média representada como um tempo de escuridão, sujidade e podridão assim como falta de educação, superstição e ignorância. Ora isto parece não encontrar paralelo na história real, aquela que tem vindo a ser estudada e aprofundada. "The Bright Ages: A New History of Medieval Europe" (2022) é apenas o mais recente exemplo deste trabalho de elucidação histórica a ser publicado. Ajudou-me a compreender melhor as motivações e a necessidade desta revisão da História, e ainda que tenha ficado com dúvidas sobre os avanços cultural e científico desta época, fiquei com poucas dúvidas sobre a hipérbole de trevas como temos representado este período em termos populares.

maio 08, 2022

O Massacre de Nanquim

Não tivesse Iris Chang cometido suicídio em 2004, provavelmente não teria lido o seu livro “The Rape of Nanking” (1997). Chang foi fortemente atacada pelo Japão na forma da sua desacreditação, mas não parece ter sido esse o único motivo do seu fim. Quando morreu estava a trabalhar o tema da “Marcha da Morte de Bataan”, mais um crime de guerra japonês pouco conhecido. A leitura de “The Rape of Nanking” foi uma das minhas mais violentas experiências de leitura de sempre, por duas vezes senti o vómito subir-me à garganta. No final do livro, percebe-se que muitos dos que sobreviveram àquele inferno pereceram precocemente pouco depois. Isto fez-me sentir que talvez a nossa capacidade cognitivo-emocional não esteja preparada para tamanha dissonância. Levar uma vida normal de empatia humana enquanto se convive interiormente com horrores deste calibre.

Estátua de Iris Chang no Memorial das Vítimas. Nanquim, China

abril 30, 2022

O humano Aristóteles

A partir de um apurado levantamento histórico Annabel Lyon especula sobre os três anos em que Aristóteles foi professor de Alexandre o Grande. Aristóteles tinha cerca de 40 anos e Alexandre 13. Mas não se espere um mundo perfeitamente delineado e amigável. Lyon construiu um texto minimalista, oferecendo muito poucas referências, raramente enquadrando os episódios supostamente mais conhecidos das vidas de ambos, ao mesmo tempo que constrói as cenas num modo abstrato, situa-as ligeiramente no espaço e tempo, mas apenas por forma a lançar o leitor numa mais profusa especulação sobre o que e como terá acontecido. Esta abordagem torna o texto em si distante e pouco envolvente, já que procura estimular o efeito dramático no leitor que para o efeito tem de recorrer à História. Por outro lado, Lyon apresenta um mundo de comportamentos com dois mil anos, distantes, mas também feitos de carne, de desejos e ódios, o que não raras vezes nos faz bater de frente com imaginários de uma suposta elevação da Grécia Antiga.

abril 09, 2022

Direitos da Revolução Francesa

 A Revolução Francesa (RF) é um dos eventos mais marcantes da História da Europa, em grande parte responsável pelo desenho societal que ainda hoje vigora no continente. Por isso, e porque tenho vindo a ler cada vez mais ficção histórica, foi com alguma pena que percebi que os livros passados na RF não são tantos como se esperaria. Ainda assim, tendo encontrado uma obra escrita pela notável Hilary Mantel — "A Place of Greater Safety" (1992) — fez-me acreditar que o assunto estava resolvido. Mas não estava. Pouco depois de o começar, sentindo a falta de contexto, acabei por ir atrás de suporte, acabando a ler simultaneamente "A Revolução Francesa 1789-1799" (1992) de Michel Vovelle, "Citizens: A Chronicle of the French Revolution" (1989) de Simon Schama, e ainda o mais recente, "A New World Begins: The History of the French Revolution" (2019) de Jeremy D. Popkin. 

abril 02, 2022

Da Mesopotâmia ao Helenismo

Apesar do título, “Babilónia”, o livro de 2010, foca-se verdadeiramente no subtítulo, a “Mesopotamia and the Birth of Civilization”. Paul Kriwaczek inicia o historiar com o império Sumério, passa ao Acádio, chegando ao Assírio e por fim Babilónia. A ideia do foco em Babilónia terá que ver com a representação do fim dos grandes impérios da Mesopotâmia que deram origem não apenas a uma das primeiras grandes civilizações, mas mais importante do que isso, porque deram origem à civilização em que ainda hoje vivemos. Kriwaczek, fala numa espécie de primeira metade da História, até ao final de Babilónia (1894-332 a.C.), e uma segunda metade, aquela que agora vivemos. E por estarmos a aproximar-nos, em número de anos, no sentido oposto, da extensão dessa primeira metade, vislumbra a tragédia, apontando o momento atual como de declínio já aceite e interiorizado por nós.

fevereiro 10, 2022

A ciência de "O Clã do Urso das Cavernas"

Fui apanhado completamente de surpresa, não conhecia “O Clã do Urso das Cavernas” (1980) de Jean M. Auel, descobri-o porque procurava obras de ficção histórica, mas acabei descobrindo algo mais porque esta é uma obra de ficção científica, não num sentido futurista ou espacial, mas no de ficcionar o conhecimento científico sobre um passado muito distante. O livro que inaugurou a série “Filhos da Terra”, constituída por 6 livros que venderam mais de 45 milhões de volumes, foca-se na vida quotidiana de duas espécies humanas, o Neandertal e o Sapiens, há cerca de 30.000 anos, altura em que os neandertais se aproximavam da extinção e o Sapiens iniciava a conquista da Europa e do mundo. Apesar de ser um livro de ficção, o trabalho é extensivamente fundamentado em conhecimento existente nos anos 1970 das áreas da Arqueologia, Paleontologia e Antropologia. Como se não bastasse, muitas das ideias de Auel aqui apresentadas têm-se mantido relevantes em face das novas descobertas arqueológicas ao longo dos últimos 50 anos.

Foram publicadas duas edições em Portugal, uma pela Europa-América, e outra mais recente pela Esfera dos Livros.

janeiro 16, 2022

O Triunfo do Cristianismo. Como uma Religião Proibida Mudou o Mundo

Não é um tema que me tenha atraído nos últimos anos, contudo a leitura de "Heaven and Hell" (2020) de Bart Ehrman despertou-me o interesse, diga-se também que combinado com o meu crescente interesse pelos clássicos. Neste livro, "O Triunfo do Cristianismo" (2017), Ehrman situa a análise da afirmação do cristianismo entre o século I e o século V, levando-nos pela mão, permitindo que aprendamos imenso, fazendo da leitura uma experiência imensamente compensadora. Apesar da complexidade das questões, Ehrman partindo do trabalho de muitos outros académicos e seu, apresenta uma teorização credível sobre o modo como o cristianismo suplantou não só o judaísmo, mas em particular o paganismo, e como se afirmou e tornou na religião de facto de  todo um império.

janeiro 04, 2022

História Íntima da Humanidade

Confesso que parti para este livro cheio de expectativas. O que procurava era a vida vivida por pessoas reais e comuns. Em termos históricos, estou um pouco cansado de ler sobre imperadores, reis, filósofos, artistas ou heróis de guerra. Queria saber mais sobre o modo como viveram as pessoas comuns ao longo do tempo, e como se têm alterado as vivências. Sei que isto não é um modo de historiar muito convencional porque naturalmente existe menos material sobre as pessoas comuns do que sobre os que a História decidiu imortalizar, mas é algo que se vai fazendo em obras como "A History of Private Life" (1987) assim como em muitos outro livros sobre a "everyday life". Contudo, não foi nada disso que encontrei em "História Íntima da Humanidade" (1994) de Theodore Zeldin.

janeiro 01, 2022

"Hamnet" (2020) de Maggie O'Farrell

"Hamnet" (2020) dificilmente não se tornará num clássico. Escrito num modo que dificilmente conseguimos separar da trilogia Cromwell de Hillary Mantel, pelo uso distinto dos verbos presente, e também futuro do presente, que cosem a descrição com estranheza e, tal como em Cromwell, contribuem para criar a peculiar atmosfera do século XVI. Maggie O'Farrell usa, muito habilmente, este espaço atmosférico como espaço imaginário para alargar aquilo que conhecemos da História. Sabendo nós pouco, quase nada, sobre a vida privada de Shakespeare, O'Farrell consegue a proeza de nos transportar no tempo e dar a ver, num tom imensamente credível, como poderá ter sido essa. Se o título se foca sobre o filho perdido aos 11 anos, Hamnet, fazendo por vezes recordar a tensão mágica de Lincoln e o seu também defunto filho Willie, imaginado por George Saunders, o foco é na verdade a mulher, Agnes Hathaway. É este foco que revitaliza o nosso imaginário sobre Shakespeare, sendo-nos oferecido numa descrição feminina e poderosa, mágica mesmo, do seu mundo privado desconhecido. Shakespeare nunca é nomeado, mas o livro não é sobre ele, o artista, é sobre as relações de uma família, a sua.

dezembro 24, 2021

Imperium de Robert Harris

“Imperium” (2006) é uma obra de ficção histórica com capacidade para nos envolver nas tramas da época, entretendo-nos enquanto vamos aprendendo sobre a época, neste caso o século I a.C. na Roma Antiga. Robert Harris escolheu como personagem principal Marco Túlio Cícero, o grande orador, mas principalmente o senador romano que mais escritos nos deixou e que perduraram até aos nossos dias. São esses escritos que permitem aos historiadores ter um acesso privilegiado a uma época já com 2000 anos, assim como aos romancistas aceder a matéria direta para o seu trabalho de recriação. Harris nada arrisca na forma, limita-se a descrever a ação, situando no espaço-tempo e gerindo conflitos conhecidos da história, criando suspense que nos faz virar páginas, que nos levam a descobrir os porquês, usando alguns comportamentos sociais como adereços, mas deixando praticamente de fora os mundos interiores de cada personagem.

outubro 17, 2021

Abelardo e Heloísa

Pedro Abelardo foi um filósofo francês que ficou conhecido pela tragédia proporcionada a partir do seu romance com a erudita Heloísa de Argenteuil. O seu legado é maior, teve grande impacto na filosofia e teologia da época medieval e influenciou o ensino tendo tido influência no surgimento da própria Universidade enquanto instituição. Ousado e muito à frente do seu tempo, muito deve, segundo ele, ao castigo que lhe foi infligido. O tio de Heloísa, após descobrir o casamento em segredo de ambos, mandou castrá-lo. Como legado pessoal, ficaram as cartas que escreveram um ao outro, numa época posterior e que podemos ler nesta obra. O texto das mesmas é bastante direto, expondo de forma clara o impacto dos acontecimentos sobre a pessoa de cada um deles.